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Lotta de Macedo Soares

MARIA CARLOTA COSTALLAT DE MACEDO SOARES
(57 anos)
Paisagista, Urbanista e Aristocrata

* Paris, França (16/03/1910)
+ New York, Estados Unidos (25/09/1967)

Maria Carlota Costallat de Macedo Soares foi uma paisagista, urbanista autodidata e aristocrata brasileira, à convite de Carlos Lacerda foi umas das responsáveis pelo projeto do Parque do Flamengo, localizado na cidade do Rio de Janeiro, o maior aterro urbano do mundo.

Uma personagem marcante da vida carioca nos anos 50 e 60, que mudou a paisagem do Rio de Janeiro, desconhecida das novas gerações, e de um monumento da poesia americana, Elizabeth Bishop, uma mulher muito discreta.

Nasceu em Paris, no dia 16/03/1910, seu pai José Eduardo, então primeiro-tenente da Marinha baseado na Europa, sua mãe Adélia de Carvalho Costallat, irmã do famoso jornalista e cronista carioca Benjamin Costallat, teve mais uma filha em Paris, Maria Elvira, conhecida por Marieta.

José Eduardo deixou a armada em 1912, voltando ao Brasil com sua família, chegando ao Rio de Janeiro fundou o jornal O Imparcial, precursor do Diário Carioca.

No fim de 1915, José Eduardo, comprou a Fazenda Samambaia, incluindo a Casa Grande, vinda de meados do século XVIII e demais benfeitorias. Lotta, aos 5 anos, chegou onde o destino teria reservado o melhor para sua vida: Samambaia.

Com O Imparcial, José Eduardo, insuflava o pensamento crítico, desde a campanha civilista com os discursos inflamados de Ruy Barbosa ao surto modernista do início dos anos 20 e a dura oposição ao governo de Epitácio Pessoa e suas fraudes.

A vitória contumaz de Arthur Bernardes, fruto da "eleição a bico de pena", do "voto de cabresto" e dos "currais eleitorais" envolvia o pleito em aura de suspeição, abalando a credibilidade e deflagrando a Revolta Tenentista em 05/07/1922, tendo como marco o episódio dos "Dezoito do Forte".

Assumindo o governo em 15/11/1922, Arthur Bernardes, decreta estado de sítio no país, O Imparcial é fechado definitivamente, José Eduardo é preso em sua propriedade em Maricá e transferido com outros presos políticos para instalações na Ilha Rasa.

Com o auxílio de sua brilhante imaginação e de seu irmão José Roberto, José Eduardo consegue fugir do seu cárcere e do país, exilando-se com sua família na Europa.

Lotta, então com 13 anos, passou a frequentar um dos melhores colégios internos da Suíça até os seus 18 anos, em 1928, quando voltou com a família ao Brasil.

Adélia de Carvalho Costallat e José Eduardo se separam em 1929, na partilha dos bens a Fazenda da Samambaia fica com Adélia.

Dois anos de governo de Getúlio Vargas bastaram para transformar o ídolo de José Eduardo em um ditador imperdoável. Na oposição mais uma vez o Diário Carioca é empastelado por forças getulistas.

Temendo por sua vida e pelo confisco de seus bens pelo governo, José Eduardo transferiu todas as suas propriedades, incluindo as terras de Maricá, Saquarema e o próprio Diário Carioca, para Horácio de Carvalho Junior, por quem tinha grande afeto, admiração e confiança. Horácio passou a ser o administrador dos negócios, enquanto José Eduardo se dedicava ao jornalismo e a política, tornando-se senador da República em 1934.

No princípio da década de 40, Lotta residiu em New York, onde faz cursos no Museu de Arte Contemporânea.

Lotta e Marieta com isso ficaram sem a herança oriunda da família Macedo Soares. Lotta não concordou com a transferência do controle dos bens para Horácio, ficou magoada com o pai, mas respeitou sua decisão. Marieta ao contrário, inconformada, lutou na justiça pela anulação da doação e brigou com Lotta por não acompanhá-la na empreitada.

Em 1940, Adélia vendeu a Casa Grande da Fazenda Samambaia e as terras circunjacentes para a família Leite Garcia, reservando no entanto cerca de um milhão de metros quadrados da propriedade que foram transmitidos em partes iguais as suas filhas Lotta e Marieta.

A Casa Grande da Fazenda Samambaia, parada obrigatória de tropeiros no caminho do ouro no século XVIII, foi restaurada em 1942 pelo arquiteto Wladimir Alves de Souza e atualmente é sede do Instituto Samambaia de Ciência Ambiental (ISCA).

Lotta, herdeira de fazendas e imóveis no Estado do Rio de Janeiro, tinha ideias mais interessantes com que ocupar o tempo. No Brasil, donas de casa milionárias, quando resolvem trabalhar, costumam montar butiques ou se dedicar a obras filantrópicas.

Lotta realmente teve uma ideia. Uma delas: convenceu seu amigo Carlos Lacerda, recém-eleito governador do Estado da Guanabara em 1960, a fazer no Aterro do Flamengo o mais espetacular parque urbano do lado de baixo do Equador. "Deve ser um Central Park para os cariocas", dizia Lotta. Para tocar o projeto, sugeriu seu próprio nome.

Quando, nas eleições seguintes, Carlos Lacerda perdeu o governo, Lotta retirou-se da construção do Aterro do Flamengo.

Lotta não era mesmo uma milionária comum. Ela dividia o mesmo teto com Elizabeth Bishop, uma das maiores poetas americanas do século 20. Durante quinze dos quase vinte anos em que Elizabeth Bishop permaneceu no Brasil, elas mantiveram uma relação marcada pela paixão e pela tragédia.

Elizabeth Bishop

Antes mesmo de enfrentar a tarefa de erguer o Parque do Flamengo, Lotta já agitava a vida do Rio de Janeiro. Era a ovelha negra de uma família tradicional que em plenos anos dourados só usava calças compridas e camisas masculinas. Era culta e simpática, conhecia as pessoas certas e tinha energia. À frente do parque, cuja execução se arrastou por anos a fio, tornou-se um galo de briga, capaz de passar pitos inesquecíveis em Carlos Lacerda e ir ao presidente Castelo Branco, para afirmar suas ideias.

Lotta de Macedo SoaresElizabeth Bishop nunca fizeram segredo de sua união. Lotta aparece em qualquer perfil biográfico da poeta, morta em 1979. Há diálogos inteiros travados entre as duas protagonistas na intimidade. Trata-se de "Uma Arte", coletânea de mais de 300 cartas pessoais escritas pela poeta no decorrer da vida. "Uma Arte" também é um livro surpreendente.

Robert Lowell (1917-1977), um dos grandes poetas americanos, disse certa vez que, quando as cartas de Elizabeth Bishop fossem publicadas, ela seria considerada não apenas uma escritora excepcional mas também uma das mais prolíficas de seu tempo. Tinha razão. As cartas de Elizabeth Bishop são deliciosas de ler. Nelas, a poeta de versos econômicos e personalidade introvertida dá lugar a uma escritora cativante, cheia de imaginação. Sob sua visão, fatos rotineiros ganham vida. As cartas mais reveladoras são as enviadas à sua médica de New York, Anny Baumann. E os quinze anos que Elizabeth Bishop passou no Brasil são os cenários das passagens mais marcantes de sua correspondência.

Das cartas emerge uma Elizabeth Bishop muito mais comunicativa e franca do que ela jamais foi em seus poemas. A poesia de Elizabeth Bishop, feita de pequenos e sutis observações do cotidiano, é muito econômica nas palavras e rigorosa nas formas, uma poesia contida, às vezes ríspida.

No trato pessoal, Elizabeth Bishop não era diferente. Basta lembrar que, em seus quinze anos de Brasil, se conta nos dedos de uma mão os amigos que fez. De modo geral, para os amigos de Lotta, sua companheira era taxada de chata e antipática.

Nas cartas, Elizabeth Bishop deixa aparecer a pessoa por trás da poeta. Quando escreve a Marianne Moore, transparece sua angústia por ser praticante órfã - seu pai morreu quando ela tinha 8 meses e pouco depois sua mãe foi internada num hospício. A vida inteira andou em busca de substitutos para o pai e a mãe.

Em sua correspondência, comenta livremente o romance com Lotta. Descreve também os anos que passou em Ouro Preto, antes e depois da morte da companheira, de onde saiu convencida de que jamais deveria ter posto os pés no Brasil.

Baixinha e Atrevida

As passagens no entanto, são aquelas que mostram Lotta em contato com políticos e burocratas na construção do Parque do Flamengo. Ela não era arquiteta ou paisagista e nem sequer tinha diploma universitário. Mas era uma mulher viajada, lida, educada, culta e de bom gosto. Seduzido, Carlos Lacerda entusiasmou-se pela ideia do parque e criou para ela o cargo - não remunerado - de "Assessora Especial do Departamento de Parques e Jardins".

Os engenheiros e arquitetos do órgão, desde o início, a viam como um corpo estranho, uma baixinha atrevida. Sua primeira providência: cortar o número de pistas para carros, de quatro para duas. Segunda: chamar uma comissão de notáveis, como o arquiteto Afonso Reidy e o paisagista Roberto Burle Marx, para criar o parque, engavetando as ideias dos chefões do departamento. O tempo fechou.

Ao defender suas ideias, entre elas a instalação dos imensos postes que até hoje estão no parque, Lotta conseguiu brigar tanto com os burocratas quanto com a maioria dos notáveis. Sua discussão com Burle Marx, outro temperamental de carteirinha, iniciada por causa de um playground infantil, é engraçadíssima.

A cada dificuldade que surgia no projeto do parque, Lotta recorria ao governador Carlos Lacerda, que àquela altura da vida política do país, com a Revolução de 1964 iminente, tinha pouco tempo para a amiga. Ela não tinha dúvidas: cruzava os portões do Palácio Laranjeiras e brandia o dedo na direção do governador. Nessas conversas, ouviam-se insultos.

O governador Carlos Lacerda aguentava porque acreditava nas ideias de Lotta, e também achava que ela era um tipo inteligente e interessante. Certa vez, com o parque quase pronto, a Marinha cismou de instalar ali uma estátua do Almirante Barroso, o herói da Batalha do Riachuelo, na Guerra do Paraguai, alegando que ela se encontrava muito longe do mar, no centro da cidade.

"Por que diabos Barroso sentiria saudades do mar se ele foi herói de uma batalha fluvial?", devolveu Lotta, encerrando o assunto. Uma tirada típica de uma personagem que mudou a paisagem do Rio de Janeiro, e esquecida pela História.

Morte

Todas essas questões políticas em que estava envolvida e mais o afastamento de sua companheira Elizabeth Bishop, que a esta altura já estava em New York, levaram-na à depressão. Elizabeth Bishop era uma das poetisas mais famosas da época.

Lotta e Elisabeth viveram juntas de 1951 a 1965.

Em 1967, quando já separadas, Lotta resolveu viajar para New York a fim de encontrar Elizabeth Bishop. No mesmo dia em que chegou, Elizabeth Bishop encontrou-a caída na cozinha, com um vidro de antidepressivo nas mãos. Lotta entrou em coma, falecendo poucos dias depois.

No Cinema

A vida de Lotta de Macedo Soares com Elizabeth Bishop e seu envolvimento com o governo de Carlos Lacerda, bem como seu apoio ao Golpe Militar de 1964, são o tema do filme de Bruno Barreto "Flores Raras". No papel de Lotta está atriz Glória Pires.

Fonte: Wikipédia,  Instituto Lotta, Veja, 29/11/1995, 1420 e Super Interessante, 09/2001, 168