Péricles

PÉRICLES DE ANDRADE MARANHÃO
(37 anos)
Cartunista

☼ Recife, PE (14/08/1924)
┼ Rio de Janeiro, RJ (31/12/1961)

Péricles de Andrade Maranhão foi um cartunista brasileiro de grande sucesso nas décadas de 40 e 50. Ele foi um adolescente desenhista daquele com talento de enlouquecer qualquer professor. Jovem durante a fase áurea dos quadrinhos, por vezes imitou os traços de Dick Tracy, Agente Secreto X-9 e Flash Gordon.

Péricles nasceu no bairro do Espinheiro, no Recife, PE, no dia 14/08/1924, estudou no Colégio Marista e fez sua primeira charge para o Diário de Pernambuco. A charge viveu nas páginas de O Cruzeiro de 23/10/1943 a 03/02/1962.

Menor de idade, chegou ao Rio de Janeiro, com uma carta de recomendação para Leão Gondim de Oliveira, manda-chuva dos Diários Associados, de Assis Chateaubriand, então a mais poderosa rede de comunicações do país.

Em sua estréia, no dia 06/06/1942, era o funcionário mais jovem da empresa. Nove meses depois seu primeiro personagem cômico no Diário da Noite, Oliveira, o Trapalhão, já divertia os leitores.


No ano de 1943 a revista O Cruzeiro baseada numa equipe jovem e de qualidade, iniciou a revolução que faria nos anos seguintes se tornando a revista mais importante do Brasil. Péricles participou com um tipo humorístico que traduzisse "a verve típica e o humor carioca", que captasse "o estado de espírito daquele que vive no Rio de Janeiro, não importa onde tenha nascido".

Rabisca pra cá, rabisca para lá, Péricles colocou o lápis para pensar e emergiu uma figura que lhe parecia apropriada: Baixinho, cabelo penteado para trás à base de gumex, summer jacket, bigodinho safado e olhar de peixe morto. Fez tanto sucesso, que as tiradas que antes ficavam na capa e contra-capa passaram a ser dentro da revista, evitando que as pessoas apenas as folheassem sem pagar.

O Amigo da Onça foi utilizado para fazer jornalismo e críticas e em muitas situações o Amigo da Onça esculhamba instituições como o casamento, exército e a hipocrisia social contida no jogo de aparências. Estreou em 23/10/1943, capturando de imediato a atenção dos leitores.


Coube a Leão Gondim de Oliveira o batismo do personagem, baseado numa piada da época:

Dois caçadores conversam em seu acampamento:
- O que você faria se estivesse agora na selva e uma onça aparecesse na sua frente?
- Ora, dava um tiro nela.
- Mas se você não tivesse nenhuma arma de fogo?
- Bom, então eu matava ela com meu facão.
- E se você estivesse sem o facão?
- Apanhava um pedaço de pau.
- E se não tivesse nenhum pedaço de pau?
- Subiria na árvore mais próxima!
- E se não tivesse nenhuma árvore?
- Sairia correndo.
- E se você estivesse paralisado pelo medo?
Então, o outro, já irritado, retruca:
- Mas, afinal, você é meu amigo ou amigo da onça?


O sucesso do Amigo da Onça entre os leitores era enorme, mal se podia esperar pela próxima revista para vê-lo cometer as maiores maldades: Enganar um podre transeunte na rua, pregar uma peça na sogra, azedar com o cara que pedia dinheiro emprestado, botar uma armadilha para o chefe mal-humorado, etc.

O Amigo da Onça foi publicado durante mais de 20 anos ininterruptos em O Cruzeiro. Ao contrário de repórteres como David Nasser e Jean Manzon, desenhistas de humor como Carlos Estevão ou escritores como Rachel de Queiroz, que transformaram seus nomes em grifes, quão difícil era desvincular seu nome do personagem.

Dono de uma personalidade atormentada, o sucesso fez com que o cartunista passasse a odiar sua criação, pois era sempre citado como "O criador do Amigo da Onça". Apesar disso, continuou ilustrando suas histórias semanalmente, por 17 anos ininterruptos.

Comentário Crítico

O Amigo da Onça, é uma espécie de herói irônico ou "figura do homenzinho macunaímico que satiriza costumes e acontecimentos". O personagem encarna com olhar cínico e dissimulado o espírito de porco que se encontra em algum lugar entre o malandro carioca da Lapa e o grã-fino da vida mundana do Rio de Janeiro. Sempre alinhado, de cabelo engomado, calças pretas, paletó branco e gravata-borboleta, o Amigo da Onça está pronto para tirar vantagem de tudo, em geral colocando seus interlocutores em situações humilhantes e vexatórias.

O personagem nasceu na revista ilustrada O Cruzeiro, em 1943, inspirado no quadro The Enemies Of Man, da revista americana EsquireLeão Gondim de Oliveira, editor da revista brasileira, teve a idéia de criar uma figura fixa e convocou o desenhista Augusto Rodrigues para dar forma ao Amigo. Contudo, seu desenho solto parecia não combinar com o humor negro implacável do personagem. Então convidou o jovem Péricles, recém-chegado do Recife, PE, e já colaborador em outros periódicos dos Diários Associados de Assis Chateaubriand, com a série "Oliveira, o Trapalhão" da revista A Cigarra, para dar vida ao personagem. O homem de baixa estatura e nariz proeminente, desenhado em linhas bem-feitas e formas estilizadas, é prontamente aprovado.

Em popularidade, o Amigo da Onça tem antecedentes na história do humor gráfico brasileiro em figuras como Zé Povo, Jeca Tatu e Juca Pato. No entanto, diferentemente destes, não está associado aos oprimidos e sua luta. Ao contrário, em mais de mil páginas semanais, o Amigo da Onça assumiu diversos papéis sociais: é tanto o mendigo como o grã-fino, o chefe e o subalterno, o adulto e a criança, o ladrão e o policial, o retirante nordestino e o gaúcho, o náufrago e o comandante.

Tal mobilidade indica a universalidade na falta de valores e na suspensão de juízo crítico que orienta o personagem. Nos quadros do Amigo da Onça o leitor defronta um mundo cuja competição permanente exige ações livres de qualquer bom sentimento para quem quer ser vencedor. Nesse sentido, os quadros de Péricles - contemporâneo do teatro de Nelson Rodrigues, do projeto desenvolvimentista e da bossa nova - ironizam as afirmações de harmonia social advindas tanto da esquerda como da direita política e testemunham um processo de deterioração de valores sociais que se querem acima de qualquer poder ou exercício de exploração de um sobre o outro.

Por suas criações, Péricles é considerado um dos responsáveis pela inovação do humorismo brasileiro. Apesar dos diversos trabalhos de alta qualidade executados ao longo da vida - por exemplo, ao lado de Millôr Fernandes durante dez anos na coluna O Pif-Paf, também na revista O Cruzeiro, ou com charges políticas -, é com a figura baixinha do Amigo da Onça que o desenhista encontrou fama nacional.

Morte

Por trás da personalidade irreverente, havia uma pessoa muito sensível. No último dia do ano de 1961, sentindo-se só, suicidou-se abrindo o gás no seu apartamento em Copacabana, no Rio de Janeiro. Péricles era desquitado e estava longe dos parentes e amigos. Antes de cometer o suicídio, fixou na porta um cartaz onde se lia: "Não risquem fósforos".

Depois da morte de Péricles, o "Amigo da Onça" foi desenhado por Carlos Estevão, sendo publicado até 1972. Os diretores da revista O Cruzeiro queriam criar um personagem fixo e já tinham até o nome, adaptado de uma famosa anedota.

Sobre ele, escreveu o poeta Carlos Drummond de Andrade:

"A solidão do caricaturista seria talvez reação contra a personagem, que o perseguia, que lhe era necessária e que lhe travara os meios de comunicar-se e comungar com outros seres!"

Indicação: Miguel Sampaio