Mãe Menininha do Gantois

MARIA ESCOLÁSTICA DA CONCEIÇÃO NAZARÉ
(92 anos)
Iyálorixá

* Salvador, BA (10/02/1894)
+ Salvador, BA (13/08/1986)

Conhecida como Mãe Menininha do Gantois, foi uma Iyálorixá (mãe-de-santo) brasileira, filha de Oxum. Nasceu em 1894, no dia de Santa Escolástica, na Rua da Assembléia, entre a Rua do Tira Chapéu e a Rua da Ajuda, no Centro Histórico de Salvador, tendo como pais Joaquim e Maria da Glória.

Descendente de escravos africanos, ainda criança foi escolhida para ser Iyálorixá do terreiro Ilê Iyá Omi Axé Iyamassê, fundado em 1849 por sua bisavó, Maria Júlia da Conceição Nazaré, cujos pais eram originários de Agbeokuta, sudoeste da Nigéria.

Foi apelidada Menininha, talvez por seu aspecto franzino.

"Não sei quem pôs em mim o nome de Menininha… Minha infância não tem muito o que contar… Agora, dançava o candomblé com todos desde os seis anos."

Foi iniciada no culto dos orixás de Keto aos 8 anos de idade por sua tia-avó e madrinha de batismo, Pulchéria Maria da Conceição (Mãe Pulchéria), chamada Kekerê - em referência à sua posição hierárquica, Iyá Kekerê (Mãe Pequena). Menininha seria sua sucessora na função de Iyalorixá do Gantois. Com a morte repentina de Mãe Pulchéria, em 1918, o processo de sucessão foi acelerado. Por um curto período, enquanto a jovem se preparava para assumir o cargo, sua mãe biológica, Maria da Glória Nazareth, permaneceu à frente do Gantois.

Foi a quarta Iyálorixá do Terreiro do Gantois e a mais famosa de todas as Iyálorixá brasileiras. Sucessora de sua mãe, Maria da Glória Nazareth, foi sucedida por sua filha, Mãe Cleusa Millet.

"Minha avó, minha tia e os chefes da casa diziam que eu tinha que servir. Eu não podia dizer que não, mas tinha um medo horroroso da missão (...): passar a vida inteira ouvindo relatos de aflições e ter que ficar calada, guardar tudo para mim, procurar a meditação dos encantados para acabar com o sofrimento."

O terreiro, que inicialmente funcionava na Barroquinha, na zona central de Salvador, foi posteriormente, transferido para o bairro da Federação onde hoje é o Ilê Axé Iyá Nassô Oká, na Avenida Vasco da Gama, do qual Maria Júlia da Conceição Nazaré sua avó também fazia parte. Com o falecimento da Iyálorixá da Casa Branca Iyá Nassô, sucedeu Iyálorixá Marcelina da Silva, Oba Tossi. Após a morte desta, Maria Júlia da Conceição e Maria Júlia Figueiredo, disputaram a chefia do Candomblé, cabendo à Maria Júlia Figueiredo que era a substituta legal, Iyakekerê, tomar a posse como Mãe do Terreiro.

Maria Júlia da Conceição afastou-se com as demais discidentes e fundaram outra Ilé Axé, o Terreiro do Gantois, instalando-se em terreno arrendado aos Gantois (família de traficantes de escravos e proprietários de terras de origem belga) pelo cônjuge de Maria Júlia, o negro alforriado Francisco Nazareth de Eta.

Situado num lugar alto e cercado por um bosque, o local de difícil acesso era bem conveniente numa época em que o Candomblé era perseguido pelas forças da ordem. Geralmente, os rituais terminavam subitamente com a chegada da polícia.

Em 1922, através do jogo de búzios, os Orixás Oxóssi, Xangô, Oxum e Obaluaiyê confirmaram a escolha de Menininha, então com 28 anos. Em 18 de fevereiro de 1922, ela assume definitivamente o terreiro. "Quando os orixás me escolheram eu não recusei, mas balancei muito para aceitar", contava.

A partir da década de 1930, a perseguição ao Candomblé vai arrefecendo, mas uma Lei de Jogos e Costumes, condicionava a realização de rituais à autorização policial, além de limitar o horário de término dos cultos às 22 horas. Mãe Menininha foi uma das principais articuladoras do término das restrições e proibições. "Isso é uma tradição ancestral, doutor", ponderava a Iyálorixá diante do chefe da Delegacia de Jogos e Costumes. "Venha dar uma olhadinha o senhor também."

Mãe Menininha abriu as portas do Gantois aos brancos e católicos - uma abertura que, em muitos terreiros, ainda é vista com certo estranhamento. Mas afinal, a Lei de Jogos e Costumes foi extinta em meados dos anos 1970.

"Como um bispo progressista na Igreja Católica, Menininha modernizou o candomblé sem permitir que ele se transformasse num espetáculo para turistas", analisa o professor Cid Teixeira, da Universidade Federal da Bahia.

Nunca deixou de assistir à missa e até convenceu os bispos da Bahia a permitir a entrada nas igrejas de mulheres, inclusive ela, vestidas com as roupas tradicionais do Candomblé.

Aos 29 anos, Menininha casou-se com o advogado Álvaro MacDowell de Oliveira, descendente de escoceses. Com ele teve duas filhas, Cleusa da Conceição Nazaré de Oliveira e Carmem da Conceição Nazaré de Oliveira.

"Meu marido, quando me conheceu, sabia que eu era do candomblé… A gente viveu em paz porque ele passou a gostar de Candomblé. Mas, quando fui feita Iyalorixá, passamos a morar separados. No meu terreiro, eu e minhas filhas, marido não. Elas nasceram aqui mesmo."

Em uma entrevista à revista Revista IstoÉ, Mãe Carmem conta que ela adorava assistir telenovelas, sendo que uma de suas preferidas teria sido Selva de Pedra. Era colecionadora de peças de porcelana, louça e de cristais, que guardava muito zelo. Não bebia Coca-Cola, pois certa vez lhe disseram que a bebida servia para desentupir os ralos de pias, e ela temia que a ingestão da bebida fizesse efeito análogo em si.

Mãe Menininha do Gantois faleceu em Salvador em 1986 de causas naturais, aos 92 anos de idade.

Fonte: Wikipédia

Ludgero Prestes

LUDGERO PRESTES
(43 anos)
Professor

* Proximidades de Canudos, BA (15/11/1890)
+ Amparo, SP (13/10/1934)

Foi um menino sobrevivente da Guerra de Canudos, trazido para São Paulo pelo escritor e jornalista Euclides da Cunha. Ludgero se formou professor e veio a ser o primeiro diretor do Grupo Escolar de Bebedouro.

Crianças Como Butim de Guerra

Além da destruição total do arraial de Canudos, a degola em massa dos prisioneiros de guerra e o estupro de muitas mulheres e mocinhas sertanejas, a Guerra de Canudos foi marcada pelo extravio e distribuição desordenada de centenas de crianças, órfãs ou não, pelos militares.

Estas crianças eram encontradas em péssimas condições: feridas, nuas, esqueléticas, morrendo de fome. Após serem levadas pelos militares acontecia que meninas eram defloradas pelos seus supostos protetores, e muitas crianças passaram a viver como escravas nas casas de quem as abrigava. Na boca do povo, eram chamadas de jaguncinhos, um termo que aparece frequentemente durante os últimos dias da guerra.

O Comitê Patriótico da Bahia formou uma comissão para recolher crianças sertanejas feitas prisioneiras, e em seu relatório final descreve a situação em que muitos menores foram encontrados:

"E, pesa-nos dizê-lo, que grande parte dos menores reunidos pela comissão, dentre eles meninas púberes e mocinhas, se achavam em casa de quitandeiras e prostitutas. Foi, pois, para lamentar a distribuição indevida das crianças, sendo muitas remetidas para vários pontos do estado e para a capital, como uma lembrança viva de Canudos ou como um presente, sem que parentes ou o governo lhes conheça o paradeiro."

Mulheres e crianças presas durante os últimos dias da guerra de Canudos (1897)
O trabalho principal da comissão foi recolher o máximo possível destas crianças e, caso ainda tivessem pais ou parentes vivos, trazê-los de volta à sua família. Menores órfãos e sem família eram deixados em orfanatos ou com famílias de confiança. Mas no momento de instauração da comissão, a maior parte das crianças já estava longe, acompanhando militares oriundos de todo o território nacional.

O Jaguncinho de Euclides da Cunha

Também Euclides da Cunha, que estava em Canudos como correspondente de guerra para O Estado de São Paulo, recebeu um jaguncinho. No dia 21 de setembro de 1897 anotou em sua caderneta de campo:

"À 1 hora o general Artur mandou-me chamar para a prosa. (...) Conversamos até a hora do jantar. (...) Interrogamos um jaguncinho quase inanido vindo de Cocorobó."

No dia seguinte, continua:

"Noto com tristeza que o jaguncinho que me foi dado pelo general continua doente e talvez não resista à viagem para Monte Santo."

Euclides da Cunha o levou consigo e o menino sobreviveu, chegando à Pauliceia a 21 de outubro de 1897. A Gazeta de Notícias do dia seguinte escreve:

"Em companhia do Dr. Euclides veio um jaguncinho de sete anos, que ficará sob a proteção do Dr. Gabriel Prestes, diretor da Escola Normal. O jaguncinho não tem nem pai nem mãe, é muito vivo e narra com precisão admirável todos os episódios sangrentos dos últimos combates nos quais ele perdeu os pais."

Chegando em São Paulo, Euclides da Cunha entregou Ludgero para ser criado pelo influente educador Gabriel Prestes. Segundo Laura Rodrigo Otávio, esposa de Rodrigo Otávio Filho e amiga da família, Ludgero era "vesgo, um tanto desengonçado".

Não tendo filhos, Gabriel Prestes ofereceu a Ludgero um lar e muita ternura. Ludgero acabou se formando pela escola de seu pai adotivo, a Escola Normal Caetano de Campos.

Em Busca de sua Origem

A República e seus defensores não pouparam esforços para varrer Canudos do mapa. As lembranças tinham de ser apagadas inclusive dos corações e das mentes dos jaguncinhos. Escreve a historiadora Vanessa Sattamini:

"Apesar de toda a violência da guerra, das mortes, dos assassinatos que não pouparam mulheres e crianças, esta pareceu-me a maior e mais cruel das violências empreendidas pelo governo republicano: tirar de crianças que já haviam perdido tudo, o direito sobre a sua própria história de vida."

Em São Paulo, o jaguncinho trazido por Euclides da Cunha recebeu o sobrenome de seu orientador, passando a chamar-se Ludgero Prestes. Também lhe deram uma data de nascimento: 15 de novembro, o dia da Proclamação da República em nome da qual Canudos tinha sido destruída, data escolhida simbolicamente para reforçar a sua ingressão no mundo civilizado.

Na sua primeira matrícula escolar, de 1898, nos seus dados de filiação consta apenas o nome de Gabriel Prestes como tutor, e Bahia como lugar de origem. Mas parece que Ludgero, com o passar dos anos, foi se identificando cada vez mais com o seu passado e sua origem no sertão baiano, porque no último ano do curso complementar seu diploma de professor primário não refere mais a Gabriel Prestes, e sim a um homem chamado João Luiz, presumidamente seu verdadeiro pai. Além disso, a cidade de origem aparece claramente assinalada como Canudos, Bahia. A sua certidão de casamento é o primeiro documento conhecido que menciona também o nome de sua mãe: Maria Luiz, casada com João Luiz. No entanto, é pouco provável que Ludgero tenha realmente nascido em Canudos.

Em 1890, o ano de seu nascimento, Canudos não passava de uma fazenda com poucas casas. A maior parte dos habitantes de Canudos começou a chegar a partir de 1893, ano em que Antônio Conselheiro se estabeleceu no local. E visto que ele, órfão aos 7 anos, desconhecia o sobrenome de seus pais, é possível que tampouco tenha sabido onde nasceu. Euclides da Cunha faz crer que o menino teria vindo do Cocorobó, uma fazenda a 15 km de Canudos.

Ludgero Prestes como diretor do Grupo Escolar de Bebedouro, SP (1913)

Vida Adulta

Ludgero Prestes de Euclides da Cunha, que neste meio tempo tinha se tornado um célebre escritor:

"... não poderei traduzir-te a minha comoção ao ver aparecer-me quase homem - e homem na mais digna significação da palavra - o pobre jaguncinho que me apareceu pela primeira vez há onze anos no final de uma batalha."

Tornou-se professor em Serra Negra, onde casou-se com a também professora Beatriz da Cunha Lima Prestes e teve seu primeiro filho, Gabriel.

Em 7 de abril de 1913 foi nomeado diretor interino do recém-fundado Grupo Escolar de Bebedouro, interior de São Paulo. Em 1914 tornou-se professor em Amparo. De 1921 a 1927 foi diretor do Grupo Escolar de Olímpia, atualmente chamada de Escola Estadual Dona Anita Costa, em Olímpia.

Faleceu a 13 de outubro de 1934, em Amparo, aos 43 anos de idade, de Câncer de Fígado. Deixou esposa e quatro filhos.

Fonte: Wikipédia