Chico Rey

FRANCISCO APARECIDO JESUS GOMES
(63 anos)
Cantor

☼ Arapongas, PR (09/11/1952)
┼ Maceió, AL (26/02/2016)

Francisco Aparecido Jesus Gomes, mais conhecido pelo nome artístico Chico Rey, foi um cantor brasileiro que fez, junto com o irmão José Cláudio Gomes, conhecido por Paraná, a dupla sertaneja Chico Rey & Paraná.

Irmãos, nascidos em Arapongas, no interior do estado do Paraná, eles possuem uma carreira de grandes sucessos. O primeiro disco de Chico Rey & Paraná foi gravado em 1981, mas o sucesso só veio em 1988 com a música "Quem Será Seu Outro Amor". Era o quinto álbum gravado pela dupla paranaense.

Em 2011, para comemorar os 30 anos de carreira, 21 discos gravados e um DVD, os irmãos lançaram uma biografia. São 228 páginas escritas pelo radialista e compositor Clayton Aguiar.

"Os dois têm uma história de luta. Eles saíram do interior sem dinheiro e construíram uma carreira sólida e de sucesso. São boas referências num mundo que hoje ensina que não vale a pena trabalhar. Eles mostram que trabalhar e sonhar é possível. Por isso, e para comemorar as três décadas de sucesso, decidi escrever o livro."
(Clayton Aguiar, autor e primeiro empresário dos cantores)

Chico Rey & Paraná
A passagem mais triste da história de Chico Rey & Paraná ocorreu quando eles tinham 6 e 4 anos, respectivamente.

"Os pais deles foram levar a irmã mais nova ao médico de charrete. Ela tinha uns 15 dias de vida. No meio do caminho, o couro que prendia a carroça no cavalo se rompeu. E Dona Aparecida, a mãe dos cantores, levou um susto tão grande que teve um surto psicótico e passou a ter a idade mental de uma criança de 5 ou 6 anos de idade."
(Clayton Aguiar)

A partir dessa data os irmãos nascidos em Arapongas, no interior do Paraná, tiveram que assumir a responsabilidade de cuidar da casa e da mãe, enquanto o pai trabalhava. "Mas também tem muita história curiosa e engraçada no livro", diz o radialista e amigo da dupla.

Quando começou a cantar, a dupla usava o nome Devanil & Denival.

"Conheci eles com esse nome num programa de auditório em Brasília, DF. Eles sempre cantaram lindamente. Depois de alguns anos, reencontrei os dois num show e eles me convidaram para empresariar a carreira deles. A primeira coisa que fiz foi trocar o nome."

Clayton Aguiar cuidou dos negócios da dupla até meados da década de 1980, quando lançou seu primeiro álbum e começou a fazer shows. Foi aí que o empresário escolheu cuidar da própria carreira. "Mas continuamos muito amigos", justifica.

Depois do estouro em 1988, a dupla continuou cantando no interior do país, mas perdeu a visibilidade na capital. "Eles nunca pagaram para tocar numa rádio", afirma Clayton Aguiar.

Em 2006, gravaram "Alma Transparente" com o cantor Leonardo. A música foi uma das mais pedidas nas rádios de São Paulo e desde então, os irmãos mantinham uma média de 100 shows por ano.

Morte

Chico Rey faleceu por volta das 15h00 de sexta-feira, 26/02/2016, aos 63 anos. De acordo com o produtor da dupla e sobrinho do cantor, Tayann Gomes, Chico Rey estava de férias com a esposa Meire e as duas filhas do casal, Camila e Flávia.

"Ele sofria de diabetes e, por isso, fazia hemodiálise. Ontem ele teve um problema na fístula, ela começou a sangrar, e ele foi ao Hospital Vida, em Maceió, para receber um ponto. Hoje o sangramento continuou e ele foi recolhido para ficar internado. A partir daí ele teve uma parada cardíaca e não resistiu."
(Breno César, amigo da família)

De acordo com Tayann Gomes, o corpo ainda aguarda liberação para ser transportado de Maceió para Brasília, cidade em que Chico Rey morava e onde será realizado o velório e enterro.

"Estamos tentando que o corpo seja liberado para pegar o voo de 4h00, que chega em Brasília por volta de 6h00."

Ainda segundo o sobrinho, toda a família está bastante abalada com o falecimento.

"Há alguns anos ele já enfrentava problemas de saúde. A gente meio que esperava, mas nunca estamos de fato preparados!"

O enterro de Chico Rey deve ocorrer no Cemitério de Taguatinga, em Brasília.

Fonte: Wikipédia, Ego e Só Notícias
Indicação: Miguel Sampaio, Nelson Carvalho e Edmar Fernandes

Mestre Trambique

JOSÉ BELMIRO LIMA
(70 anos)
Percussionista e Compositor

☼ Rio Novo, MG (19/05/1945)
┼ Rio de Janeiro, RJ (22/02/2016)

José Belmiro Lima conhecido como Mestre Trambique nasceu em Rio Novo, MG, em 19/05/1945. Mudou-se de Minas Gerais para o Rio de Janeiro com meno de um ano de idade.

No Rio de Janeiro se criou, fez seu nome no mundo da música a partir dos 16 anos e se transformou num dos maiores percussionistas brasileiros.

Mestre Tambique era músico profissional desde 1963, ligado à escola de samba Unidos de Vila Isabel. Fundador da escola de samba mirim Herdeiros da Vila, Mestre Trambique, que tocou com cantores como Martinho da Vila e Ney Matogrosso, integrou o Grupo Semente a partir de 2003, com o qual a cantora Teresa Cristina se projetou ao longo dos anos 2000.

Mestre Trambique foi também compositor, tendo sido parceiro de Nei Silva e Paulinho Correia na criação do samba "Na Aba", lançado pelo cantor Bezerra da Silva em 1982, mas propagado na voz de Martinho da Vila, em gravação de 1984. Mestre Trambique foi um mestre como ritmista de samba.

Mestre Trambique, Teresa Cristina e Bernardo Dantas
 Minha História

Meu nome é José Belmiro Lima, mais conhecido como Mestre Trambique. Minha história começou cerca de 35 anos na minha comunidade, quando comecei a perceber que dentro dela havia um grupo muito ocioso de jovens. Foi então que resolvi desenvolver um projeto de aula de percussão.

O primeiro passo foi trabalhar a questão do respeito, responsabilidade, comprometimento, etc. Afinal, para participar do projeto era necessário ser assíduo na escola e também tirar notas boas. Assim surgiu a Bateria Mirim de Vila Isabel, com um lindo trabalho de aulas de percussão, ensinando a tocar, afinar e se apresentar.

Hoje em dia a maioria desses jovens fazem parte da Bateria da Unidos de Vila Isabel e muitas outras escolas de samba. Muitos deles são músicos profissionais de sucesso como Dudu Nobre, Bruno Cunha, Alisson, músico do Marcelo D2, e tantos outros.

Sou músico profissional desde 1963, fiz parte da banda e gravação de CD e DVD de vários artistas como Ney Matogrosso, João Nogueira, Cartola, Wilson das Neves, Wilson Moreira, Bezerra da Silva e ultimamente faço parte do Grupo Semente que acompanha a cantora Tereza Cristina. Quero resgatar essa cultura de formação de talentos na comunidade!

O público que beneficio são de crianças, adolescentes e pessoas com deficiência.

O trabalho que desenvolvo é por conta própria, não tenho nenhum tipo de parceria. As oficinas de precursão são sempre na porta da minha casa, onde tenho uma oficina com alguns instrumentos de percussão que adquiri ao longo do meu trabalho. As aulas são de cuíca, tamborim, chocalho, reco-reco, marcação, repique, caixa, etc.

Na verdade eu não tenho um número estipulado de alunos. Quem tem o desejo de aprender, as portas da minha casa estarão abertas. Já cheguei a ensinar à bateria da Herdeiros da Vila, onde sou fundador da escola com a saudosa Dinorah das Gatas, com 150 crianças.

O meu sonho é ter uma estrutura e uma melhor organização. Busco apoio para continuar pondo em prática o meu sonho de resgatar a cultura de formação de talentos na comunidade.

Essa ação já mudou a vida de muitas pessoas, como a minha também. Na verdade eu que aprendo mais com eles. Existem muitas histórias de superação. Acabo sendo um membro da família de cada um deles.

Morte

José Belmiro Lima, o Mestre Trambique, morreu na madrugada de segunda-feira, 22/02/2016, aos 70 anos, no Rio de Janeiro, RJ, vítima de um câncer, informaram a escola de samba Unidos de Vila Isabel e o Grupo Semente.

O enterro ocorreu na terça-feira, 23/02/2016, no Cemitério do Catumbi, a partir das 13h30.

A escola de samba Unidos de Vila Isabel lamentou, em rede social, a morte do músico:

"É com pesar que a Unidos de Vila Isabel informa o falecimento de José Belmiro Lima, o notável mestre Trambique. Vítima de um câncer, ele faleceu na madrugada desta segunda-feira e o sepultamento acontece no cemitério do Catumbi, a partir das 13h30 desta terça-feira, dia 23 de fevereiro. O velório tem início ás 10h00, no mesmo local. Um dos músicos mais conceituados do cenário musical brasileiro, Trambique é 'cria' da Unidos de Vila Isabel e sempre levou o nome da Escola nos trabalhos que fez fora do carnaval. Mais recentemente, ele integrava o grupo Semente, que acompanha a cantora Tereza Cristina, mas trabalhou também com Ney Matogrosso, João Nogueira, Cartola, Wilson das Neves, Wilson Moreira e Bezerra da Silva. Outro serviço de muita relevância para a cultura do samba prestado por Trambique foi a fundação da Herdeiros da Vila, agremiação mirim da azul e branca do bairro de Noel."

Indicação: Miguel Sampaio

Myriam Fraga

MYRIAM DE CASTRO LIMA FRAGA
(78 anos)
Poetisa e Escritora

☼ Salvador, BA (09/11/1937)
┼ Salvador, BA (15/02/2016)

Myriam de Castro Lima Fraga foi uma poetisa e escritora brasileira nascida em Salvador, BA, em 09/11/1937. Era filha de Orlando de Castro Lima e Beatriz Ponde de Castro Lima.

Iniciou suas atividades literárias publicando assiduamente em revistas e suplementos literários, e estreou em livro com "Marinhas", poesia, no ano de 1964, pelas Edições Macunaíma - editora especializada em publicações de tiragem limitada e de alto padrão gráfico, sob a orientação artística do gravador Calasans Neto.

Com poemas traduzidos para o inglês, francês e alemão, participava de diversas antologias no Brasil e no exterior. É citada em várias publicações nacionais e estrangeiras, entre elas: "Pequeno Dicionário de Literatura Brasileira", de José Paulo Paes e Massaud Moisés (1968); "Grande Enciclopédia Delta Larousse" (1972); "Enciclopédia de Literatura Brasileira", de Afrânio Coutinho, (1990), "História da Literatura Brasileira", de Luciana Stegagno Picchio (1997), "Dicionário Crítico de Escritoras Brasileiras: 1711-2001", por Nelly Novaes Coelho (2002).

Participou como escritora convidada de inúmeras conferências e seminários no Brasil e em outros países, como:
  • 1981 - I Encontro da Poesia Brasileira - Semana Joaquim Cardoso, Recife
  • 1984 - II Bienal Nestlé de Literatura, São Paulo
  • 1985 - Brasilian Writters Project, Estados Unidos
  • 1986 - 40º Congresso da União Brasileira de Escritores (UBE), São Paulo
  • 1986 - Simpósio Sobre a Cultura e a Literatura Caboverdianas, em Mindelo, Cabo Verde
  • 1986 - III Bienal Nestlé de Literatura, em São Paulo
  • 1998 - Encontro Poesia em Lisboa, em Lisboa
  • 2001 - 5º Encontro Nacional de Acervos Literários Brasileiros, PUC-RS
  • 2002 - III Congresso Nacional de Escritores, Pernambuco
  • 2002 - Colloque Jorge Amado, Sorbonne, Paris
  • 2005 - Encontro sobre poesia, Journée d’Etudes sur le sujet "A quoi bon la poésie aujourd’hui", Universidade de Rennes, França
  • 2006 - Festival Literário de Parati (FLIP), Rio de Janeiro
  • 2007 - Festival Literário de Porto de Galinhas, Recife
  • 2007 - Semana do Brasil, La Rochelle, França
  • 2011 - Salão do Livro de Guarulhos
  • 2012 - Dia Internacional do Museu - Casa das Rosas - Espaço Haroldo de Campos de Poesia e Literatura, São Paulo
  • 2012 - 1ª Bienal Brasil do Livro e da Leitura, Brasília

Eleita por unanimidade membro efetivo da Academia de Letras da Bahia, tomou posse no dia 30/07/1985, passando a ocupar a Cadeira de nº 13, que tem como patrono o poeta Francisco Moniz Barreto, na vaga de Luiz Fernando Seixas de Macedo Costa.

Foi membro do Conselho Federal de Cultura, de 1990 a 1993, do Conselho Federal de Política Cultural, de 1993 a 1996, do Conselho Estadual de Cultura, de 1992 a 2006, do Conselho da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia (FAPESB), de 2004 a 2006, e atualmente era membro do Conselho Universitário da Universidade Federal da Bahia, do Conselho da Fundação Pierre Verger e do Instituto Carybé.

Diretora Executiva da Fundação Casa de Jorge Amado desde sua instituição, em julho de 1986, vinha se dedicando, igualmente, à área de Administração Cultural.

Entre 1980 e 1986, esteve à frente de projetos pioneiros na Fundação Cultural do Estado da Bahia, quando coordenou a Coleção dos Novos e foi responsável pelo projeto de criação do Centro de Estudos de Literatura Luiz Gama, hoje Departamento de Literatura.

Como diretora da Fundação Casa de Jorge Amado vinha promovendo seguidamente cursos, colóquios e conferencias sobre literatura com ênfase na obra de Jorge Amado contando com a participação e o apoio de instituições de relevância como Academia de Letras da Bahia e Universidades como Universidade Federal da Bahia (UFBA) e Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS).

Era membro do Conselho Universitário da Universidade Federal da Bahia (CONSUNI) e do Conselho da Associação Baiana de Imprensa (ABI), além de manter colaboração em revistas e jornais, foi responsável pela coluna Linha D’Água, sobre assuntos culturais, publicada aos domingos no jornal A Tarde, de Salvador, de 1984 a 2004.

Morte

Myriam Fraga morreu, aos 78 anos, no início da tarde de segunda-feira, 15/02/2016, em Salvador, BA. Segundo informações da Fundação Casa de Jorge Amado, Myriam Fraga morreu por volta dde 12h00, no Hospital Aliança, onde estava internada desde o dia 20/01/2016. Ela tinha leucemia.

O sepultamento de Myriam Fraga realizou-se na terça-feira, 16/02/2016, às 11h00, no Cemitério Jardim da Saudade.

Myriam Fraga deixou quatro filhos.

Títulos e Prêmios

  • 1969 - Prêmio Arthur de Salles (Secretaria de Educação e Cultura do Estado da Bahia)
  • 1972 - Prêmio Casimiro de Abreu (Secretaria da Educação e Cultura do Estado do Rio de Janeiro)
  • 1984 - Medalha Castro Alves (Ordem Brasileira dos Poetas da Literatura de Cordel, Salvador)
  • 1984 - Medalha do Mérito Castro Alves (Secretaria de Educação e Cultura do Estado da Bahia)
  • 1987 - Personalidade Cultural (União Brasileira de Escritores - UBE, Rio de Janeiro)
  • 1996 - Medalha Maria Quitéria (Câmara dos Vereadores da Cidade do Salvador)
  • 1996 - Prêmio COPENE de Cultura e Arte (Salvador)
  • 1997 - Troféu Catarina Paraguaçu (MAM e TGM, Salvador)
  • 1998 - Prêmio Alejandro José Cabassa (UBE, Rio de Janeiro)

Livros Publicados

Poesia

  • 1964 - Marinhas
  • 1969 - Sesmaria
  • 1975 - O livro dos Adynata
  • 1975 - A Ilha
  • 1979 - O Risco na Pele
  • 1979 - A Cidade
  • 1981 - As Purificações ou o Sinal de Talião
  • 1983 - A Lenda do Pássaro Que Roubou o Fogo
  • 1985 - Six Poems (Tradução Richard O’Connell)
  • 1992 - Os Deuses Lares
  • 1994 - Die Stadt (Tradução Curt Meyer-Clason)
  • 1996 - Femina
  • 2008 - Poesia Reunida

Antologias

  • 1966 - Cinco Poetas
  • 1967 - Antologia da Moderna Poesia Baiana
  • 1968 - 25 Poetas da Bahia
  • 1975 - Sete Cantares de Amigos
  • 1976 - Antologia de Poetas da Bahia (Em Alfabeto Braile)
  • 1984 - Em Carne Viva (Org. Olga Savary)
  • 1985 - Poetas Contemporâneos (Org. Henrique Alves)
  • 1993 - Simulations (Org. Richard O’Connell)
  • 1995 - Sincretismo - A Poesia da Geração 60 (Org. Pedro Lyra)
  • 1997 - Modernismo Brasileiro (Org. Curt Meyer-Clason)
  • 1997 - Poésie du Brasil (Org. Lourdes Sarmento)
  • 1998 - Poesia em Lisboa
  • 1999 - A Poesia Baiana no Século XX (Org. Assis Brasil)
  • 2000 - Águas dos Trópicos (Org. Beatriz Alcântara e Lourdes Sarmento)
  • 2000 - Antologia de Poetas Brasileiros (Sel. Org. Mariazinha Congílio)
  • 2000 - A Paixão Premeditada (Org. Simone Lopes Pontes Tavares)
  • 2001 - Poetas da Bahia Século XVII ao Século XX (Org. Ildásio Tavares)
  • 2001 - Antologia da Poesia Brasileira (Org. Xose Lois Garcia)
  • 2003 - Companhia de Poetas (Org. José Alberto Pinho Neves)
  • 2003 - Palavra de Mulher (Álvaro Alves de Faria)
  • 2004 - Perfil Grécia - Em Poetas do Brasil (Org. Stella Leonardos)
  • 2007 - Geopoemas - Geopoems (Org. Luiz Angélico da Costa)
  • 2013 - Transbrasiliana - 36 Mujeres Poetas de Brazil (Org. Antonio Miranda, Salomão Souza e José Guillhermo Vargas)
  • 2009 - O Cangaço na Poesia Brasileira
  • 2011 - Poesia Viva em Revista

Biografias

  • 1986 - Flor do Sertão
  • 1997 - Uma Casa de Palavras
  • 2002 - Leonídia, a Musa Infeliz do Poeta Castro Alves

Infanto-Juvenis

  • 2001 - Castro Alves (Coleção Crianças Famosas)
  • 2002 - Jorge Amado (Coleção Crianças Famosas)
  • 2003 - Jorge Amado (Mestres da Literatura)
  • 2004 - Castro Alves (Mestres da Literatura)
  • 2005 - Luiz Gama
  • 2005 - Carybé (Mestres da Pintura)
  • 2007 - Graciliano Ramos (Mestres da Literatura)
  • 2012 - O Pássaro do Sol

Prosas

  • 1997 - Uma Casa de Palavras
  • 2013 - Uma Casa de Palavras - Vinte e Cinco Anos Depois
  • 2013 - Memórias de Alegria

Indicação: Miguel Sampaio

Roberto Audi

ROBERTO AUDI
(63 anos)
Cantor e Compositor

☼ Rio de Janeiro, RJ (10/02/1934)
┼ Rio de Janeiro, RJ (12/02/1997)

Roberto Audi iniciou sua carreira artística como corista nos shows de Carlos Machado na boate Night And Day.

Cunhado do letrista David Nasser, passou a atuar com freqüência na antiga TV Tupi, bem como na Rádio Tupi.

Estreou em disco em 1958 cantando a toada "Geada" (Armando CavalcantiDavid Nasser), e o fox "No Azul Pintado de Azul" (Modugno e Puzzaglia), com versão de David Nasser, em dueto com Leny Eversong, cantora que o descobriu. No mesmo ano, fez suas primeiras gravações solo, os sambas-canção "E Me Deixe Entrar" (Jossicar e Verinha Falcão), e "Não Tens Reconhecimento" (Fausto Guimarães e Verinha Falcão), realizadas na gravadora Copacabana, onde fez um total de 22 discos entre os anos de 1958 e 1963. Ainda em 1958, recebeu da revista Radiolândia o troféu Antena de Prata depois de eleito por um júri composto de críticos especialistas e representantes de agências de propaganda como o cantor revelação do ano na TV.

Em 1959 apresentou-se no "Super Show" da TV Tupi do Rio de Janeiro, passando posteriormente a atuar em programas da Rádio Nacional, TV Tupi, TV Rio e, em São Paulo, na TV Record e na Bandeirantes. No mesmo ano, gravou a toada "A Canção é Você" e o samba canção "Noite Triste Sem Ninguém", ambas de Fred Chateubriand e Vinícius de Carvalho. Nessa época, gravou o LP "E As Operetas Voltaram", onde conhecidos trechos de operetas europeias entrelaçadas com operetas americanas foram vertidos e adaptados para o português pelo compositor Lamartine Babo, que foi também o produtor do disco. Participou do LP "A Música de Dolores" uma homenagem da gravadora Copacabana à cantora e compositora Dolores Duran falecida prematuramente naquele ano. Nesse disco interpretou o samba-canção "Noite de Paz".


Em 1960 gravou o fox "Ninguém é de Ninguém" (Umberto Silva, Toso Gomes e Luiz Mergulhão), e o samba canção "Um Novo Céu" (Ted Moreno e Fernando César).

Em 1961 foi premiado pela Revista do Rádio e Radiolândia  como Cantor Revelação. No mesmo ano, gravou a guarânia "Duas Rosas" (Lourival Faissal e Arsênio de Carvalho), e o bolero "Noite Após Noite" (Nelson GonçalvesDavid Nasser).

Entre os anos de 1961 e 1964 fez shows pelo Brasil e excursionou a Portugal, Estados Unidos, Uruguai e Argentina.

Em 1963 gravou "Meu Bem" (Getúlio Macedo), e, da dupla João Roberto KellyDavid Nasser, os sambas-canção "Poeira no Meu Caminho" e "O Céu do Teu Olhar".

Em 1964 gravou "Tédio" (Nazareno de Brito e Fernando César).

Sua primeira composição gravada foi "Encontrei Afinal, Meu Amor" (Roberto Audi e Ribamar).

Lançou ainda os LPs "Música Para Nós Dois" e "Com Vocês, Roberto Audi", ambos pela gravadora Copacabana. Ao abandonar a gravação de discos passou a se apresentar em shows pelo interior do país.

Discografia

78 RPM
  • 1958 - Geada / No Azul Pintado de Azul (Copacabana)
  • 1958 - E Me Deixe Entrar / Não Tens Reconhecimento (Copacabana)
  • 1958 - Telefonei / Vida de Artista (Copacabana)
  • 1959 - Noite de Paz / Outros Caminhos (Copacabana)
  • 1959 - Matei a Saudade / Cravo Branco - Carnaval de 1960 (Copacabana)
  • 1960 - Romântica / Férias de Amor (Copacabana)
  • 1960 - A Canção é Você / Noite Triste Sem Ninguém (Copacabana)
  • 1960 - Ninguém é de Ninguém / Um Novo Céu (Copacabana)
  • 1960 - Eu Amei / O Maior Amor (Copacabana)
  • 1961 - Duas Rosas / Música Para Nós Dois (Copacabana)
  • 1961 - Sino de Belém / Boas Festas (Copacabana)
  • 1961 - Valsa da Despedida / Feliz Natal, Meu Amor (Copacabana)
  • 1961 - Dinheiro Não Há / Adeus Mangueira (Copacabana)
  • 1961 - Renunciei / Ponto Final (Copacabana)
  • 1961 - São João Diferente / Noite Após Noite (Copacabana)
  • 1961 - Vou Beber Até Cair / É Incrível (Copacabana)
  • 1962 - Loucura, Loucura / Palhaço de Botequim (Copacabana)
  • 1962 - Sofrimento / O Lelê da Lalá (Copacabana)
  • 1962 - Adeus, Amor, Adeus / Quero e Não Quero (Copacabana)
  • 1963 - Poeira no Caminho / O Céu do Teu Olhar (Copacabana)
  • 1963 - Ao Nascer do Sol / Meu Bem (Copacabana)
  • 1963 - Meu Castigo / Eu e Elas (Copacabana)
  • 1963 - Fim de Ano / Noite Silenciosa (Copacabana)
  • 1964 - Estranho na Praia / Tédio (Copacabana)
  • 1964 - Meu Patuá / Festa Brava (Copacabana)
  • 1964 - Que Fez Você / O Carrinho (Copacabana)


LPs
  • 1959 - Concerto Para Senhoras (Copacabana)
  • 1960 - E as Operetas Voltaram (Copacabana)
  • 1960 - Música Para Nós Dois (Copacabana)
  • S/DT - Presença de Roberto Audi (Copacabana)
  • S/DT - Com Vocês, Roberto Audi (Copacabana)

Fonte: Dicionário Cravo Albin da MPB e Discomentando
Indicação: Miguel Sampaio

Luiz Felipe Lampreia

LUIZ FELIPE PALMEIRA LAMPREIA
(74 anos)
Sociólogo e Diplomata

☼ Rio de Janeiro, RJ (19/10/1941)
┼ Rio de Janeiro, RJ (02/02/2016)

Luiz Felipe Palmeira Lampreia foi um sociólogo e diplomata brasileiro. Filho de João Gracie Lampreia e Maria Carolina Palmeira Lampreia, graduado em sociologia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), em 1962. Ingressou no Instituto Rio Branco (IRBr) no mesmo ano.

Foi nomeado terceiro-secretário em novembro de 1963, foi embaixador em Paramaribo, Suriname, em Lisboa, Portugal, e em Genebra, Organização Mundial do Comércio (OMC) e outros organismos internacionais.

Foi Secretário Geral do Itamaraty entre 1992 e 1993 e Ministro das Relações Exteriores no governo Fernando Henrique Cardoso entre 1995 e 2001.

Era também professor associado de Relações Internacionais da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM-Rio).

Foi ligado institucionalmente ao Centro Brasileiro de Relações Internacionais (CEBRI), um think tank de relações internacionais, do qual foi vice-presidente emérito.

Foi também presidente do Conselho de Relações Internacionais da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (FIRJAN). Além disso, foi membro dos conselhos de várias empresas internacionais de consultoria em planejamento estratégico, como McLarty Associates e Oxford Analytica, empresas industriais, como Partex Oil And Gas, Souza Cruz e Coca-Cola, e do banco português Caixa Geral de Depósitos.


A objetividade e o pragmatismo sempre foram marcantes no embaixador. Quando era ministro das Relações Exteriores no governo Fernando Henrique Cardoso, Luiz Felipe Lampreia não gostava de conversas longas. Costumava resolver tudo em menos de meia hora, enquanto ouvia cantos gregorianos em seu gabinete.

Crítico ao governo do Partidos dos Trabalhadores (PT), Luiz Felipe Lampreia escreveu artigos contra a entrada da Venezuela no Mercosul e os passos dados pelo seu sucessor, Celso Amorim, no Itamaraty. Um deles foi o fim das negociações para a criação da Área de Livre Comércio das Américas (ALCA).

Apesar das divergências, Luiz Felipe Lampreia sempre teve o Estado como prioridade. Assim, há cerca de um mês, assinou, junto com mais 40 embaixadores aposentados de todas as tendências políticas, um manifesto em favor do governo brasileiro no impasse com Israel. As autoridades israelenses tornaram público o nome do líder de assentamentos em territórios palestinos, Dani Dayan, para ser embaixador em Brasília, antes mesmo da concessão do agrément, ou seja, da autorização do Brasil.

Mesmo aposentado, Luiz Felipe Lampreia nunca parou. Mantinha um blog sobre Política Internacional na página de O Globo, escrevia artigos e participava de debates e entrevistas sobre política externa com frequência. Era vinculado ao Centro Brasileiro de Relações Internacionais (CEBRI) e presidente do Conselho de Relações Internacionais da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (FIRJAN).

Morte

Luiz Felipe Lampreia morreu aos 74 anos, na terça-feira, 02/02/2016, após uma parada cardíaca durante a manhã, um mês depois de ter alta do Hospital Samaritano, no Rio de Janeiro. Ele havia sido internado para tratar um tumor de pulmão.

Anhanguera

BARTOLOMEU BUENO DA SILVA
(68 anos)
Bandeirante, Explorador e Sertanista

☼ Parnaíba, SP (1672)
┼ Vila de Goiás, GO (19/09/1740)

A história do Brasil conhece dois bandeirantes com o nome de Bartolomeu Bueno da Silva: Pai e Filho.

Bartolomeu Bueno da Silva (pai), o Anhanguera, nascido e morto em datas incertas, faz parte daqueles primeiros bandeirantes que, movidos pelas dificuldades econômicas, pelo tino sertanista e pelo espírito de aventura, partiram de São Paulo, aproveitando-se, inclusive, da localização geográfica da vila, que se assentava num centro de circulação fluvial e terrestre, para desbravar o interior do Brasil.

Desde os primeiros tempos da colonização foram constantes as arremetidas rumo ao sertão. Primeiro, numa espécie de bandeirismo defensivo, que visava garantir a expansão e a posse da terra, e que prepararia a expansão paulista do século 17, o grande século das bandeiras, aquele em que se iniciaria o bandeirismo ofensivo propriamente dito, cujo propósito era, em grande parte, o lucro imediato proporcionado pela caça ao índio. Da vila de São Paulo, especialmente, partiam as bandeiras de apresamento chefiadas por Antônio Raposo Tavares, Manuel Preto, André Fernandes, entre outros.

O apogeu do apresamento ocorreu entre 1628 e 1641, quando os paulistas resolveram arremeter contra as reduções jesuíticas espanholas, em volta das quais se agregavam centenas de indígenas sob proteção missionária.

Casa do Sertanista Anhanguera em Santana do Parnaíba
As investidas sucederam-se desde que Manuel Pinto e Antônio Raposo Tavares iniciaram os ataques à região do Guairá, em 1628, destruindo as reduções, capturando os índios e expulsando os jesuítas para a margem ocidental do rio Paraná. Depois vieram muitos outros, incluindo Bartolomeu Bueno da Silva (pai).

Gradativamente, esses sertanistas passariam do bandeirismo de apresamento para o bandeirismo minerador, em busca de minas de ouro. É nessa época que se encontra a principal bandeira de Bartolomeu Bueno da Silva.

Em 1682, sua expedição partiu de São Paulo e atravessou o território do atual Estado de Goiás, seguindo até o Rio Araguaia. Ao retornar desse rio, à procura do curso do Rio Vermelho, encontrou uma aldeia indígena do povo Goiá. Diz a lenda que as índias estavam ricamente adornadas com chapas de ouro e, como se recusassem a indicar a procedência do metal, Bartolomeu Bueno da Silva pôs fogo a uma tigela contendo aguardente, afirmando que, se não informassem o local de onde retiravam o ouro, lançaria fogo em todos os rios e fontes. Admirados, os índios informaram o local e o apelidaram de Anhanguera, em tupi, añã'gwea, que significa Diabo Velho.

Essa bandeira deu origem à lenda das minas da Serra dos Martírios, buscada por vários sertanistas, e que, segundo fontes da época, "tinha por obra da natureza uma semelhança da coroa, lança e cravos da paixão de Jesus Cristo" esculpidos em ouro e cristais.

Ainda segundo a lenda, seu filho, Bartolomeu Bueno do Silva, à época ainda um menino, o acompanhava nessa bandeira.

Anhanguera, o Filho

Bartolomeu Bueno da Silva (filho), o segundo Anhanguera, nasceu em Parnaíba, São Paulo, em 1672 e faleceu em 19/09/1740 na Vila de Goiás, em Goiás.

Em 1701, atraído pelos descobrimentos de ouro na região de Minas Gerais, o segundo Anhanguera estabeleceu-se em Sabará e, mais tarde, em São João do Pará e em Pitangui, onde foi nomeado assistente do distrito.

Os conflitos entre emboabas e mineradores de São Paulo e os levantes ocorridos em Pitangui, encabeçados por seu genro Domingos Rodrigues do Prado, levaram-no a voltar para a capitania de São Paulo e a se fixar em Parnaíba.

Em 1720 dirigiu uma representação a Dom João V, pedindo licença para voltar às terras de Goiás, onde seu pai encontrara amostras de ouro. Em troca, solicitava do soberano o direito de cobrar taxas sobre as passagens de rios.

Em 1722, sob seu comando, a bandeira seguiu para Goiás, juntamente com numerosa parentela do sertanista, que, durante quase três anos explorou os sertões goianos em busca da lendária Serra dos Martírios.

Em 1725 conseguiu encontrar ouro no Rio Vermelho, próximo à antiga capital de Goiás. Voltou à região no ano seguinte, quando, na qualidade de capitão-mor regente das minas, fundou o Arraial de Santana, elevado em 1739 à categoria de vila como Vila Boa de Goiás, atualmente Cidade de Goiás, conhecida como Goiás Velho.

Além do referido cargo, Dom João V concedeu-lhe sesmarias e a cobrança de direitos sobre a passagem de rios que conduziam às minas goianas.

No entanto, a pretexto de que o Anhanguera havia sonegado as rendas reais, o direito de passagem lhe foi retirado em 1733. Na medida em que se organizava a administração estatal de Goiás, a autoridade do sertanista ia sendo limitada pelos delegados régios.

Ao falecer, em 1740, Bartolomeu Bueno da Silva estava pobre e reduzido a um exercício de mando quase decorativo.

Na antiga capital de Goiás ainda existe a Cruz do Anhanguera, por ele levantada em 1722, e que perpetua a memória do início da colonização do território goiano.

A Expedição do Anhanguera
(José Peixoto da Silva Braga)

Após dois séculos de constante procura de pedras preciosas (ouro e diamantes) no interior da colônia, enfim, os paulistas descobriram as ricas minas da tribo Goyá. A proeza coube a expedição comandada por Bartolomeu Bueno da Silva, o Anhanguera filho, depois de uma tentativa fracassada, por quase três longos anos, perdida no desconhecido sertão goiano, onde passaram por todo o tipo de dificuldade.

A famosa expedição saiu de São Paulo em 1722, com toda a pompa da época, organizada sob as bênçãos do governador da Capitania, como o grande evento ao ano. Com um contingente de aproximadamente 250 homens, seguiu por uma estrada cavaleira percorrendo  uma rota próxima ao rio Tietê, até chegar ao Rio Grande, na divisa com Minas Gerais. Atravessaram a região onde hoje está o Triângulo Mineiro e seguiram em direção ao Rio Paranaíba para penetrar nas terras goianas, pelo rumo de Catalão, e prosseguiu margeando, posteriormente o Rio Corumbá. A partir desse local a expedição, já bastante fragilizada, devido, principalmente ao grande cansaço e a falta de mantimentos,  mudou de direção e seguiu por um caminho totalmente desconhecido, permanecendo nessa condição por quase três anos.

As terras goianas  pertenceram à Capitania de São Paulo até o ano de 1748, quando Goiás e Mato Grosso foram desmembrados e transformados em capitanias.

Cruz do Anhanguera Original

A seguir veja o precioso relato que o alferes José Peixoto da Silva Braga concedeu ao Padre Diogo Soares sobre a Expedição do Anhanhguera que fundou o primeiro povoado em terras goianas. Ambos foram membros dessa expedição.

"Saí da cidade de São Paulo a três de julho de 1722 em companhia do capitão Bartolomeu Bueno da Silva, o Anhangüera de alcunha, que era o cabo da tropa com 39 cavalos, dois religiosos bentos, frei Antonio da Conceição e frei Luiz do Sant'Anna, um franciscano, frei Cosme de Santo André, e 152 armas, entre as quais iam também vinte índios, que o Srº Rodrigo Cezar, general que então era de São Paulo deu ao cabo Bartolomeu Bueno, para a condução das cargas e necessário. Dos brancos quase todos eram filhos de Portugal, um da Bahia e cinco ou seis paulistas com os seus índios e negros e todos à sua custa.
Passado o Rio Tietê, fomos pousar neste dia junto ao mato do Jundiaí, quatro léguas distante da cidade de São Paulo. Na manhã seguinte, entramos no mato e gastamos nele quatro dias. Saídos do mato passamos o Rio Mogi, que é rio de canoa, e muito peixe tem, e dá mostras de ouro, mas com pouca conta. Aqui falhamos um dia e, no seguinte, marchando sempre ao norte, demos com um rio também de canoa, a que pusemos o nome e nele pousamos esta noite. É o caminho todo campo com alguns capões de matos, bons pastos e bastantes aguadas.
No dia seguinte passamos o rio em um vão com água pelo peito, e fomos pousar no meio do campo distância de três para quatro léguas. É todo bom caminho, bons pastos e muita caça, e tem alguns córregos com bastante peixe. Deste ponto fomos dormir distância de quatro léguas junto a um córrego, que entra como os mais no Rio Grande. Daqui passamos na manhã seguinte encostados a uns paus, e presos com uns cipós para vencermos a muita violência e grande força d'água com que corria. Neste pouso falhamos um dia, sendo a causa o requerer toda a tropa a Anhangüera lhe fizesse a resenha que lhe tinha prometido antes fazer em Mogi, e a que tinha já faltado. Escusou-se este com a promessa de que, em chegando o capitão João Leite da Silva Ortiz, seu genro, que nos tinha ficado atrás e era o outro descobridor, a faria e, caso que este não chegasse a tempo competente, a faria ele, cabo, no rio Grande.
Com esta esperança marchou toda a tropa, sete ou oito dias, sempre por campos e matos grossos, e pousando sempre à beira de córregos e rios. Não faltou em todos eles caça e peixe. Deste último pouso fomos ao Rio Grande, passamo-lo em canoas feitas de paus de sumaúma depois de dormirmos, e falhamos nele dois dias, esperando se nos fizesse a resenha prometida, mas faltou como sempre, o Anhangüera. Partiu deste sítio toda a tropa ainda junta, mas já desconfiada, e foi dormir distância de quatro léguas junto a um córrego, que deságua no Rio Grande. Aqui nos começou a faltar o mantimento, e assim nos foi preciso marchar cinco dias passando com o que dava a espingarda, pássaros, macacos, palmitos e algum mel.
No fim destes cinco dias chegamos ao Rio das Velhas, que entra no Rio Grande, é caudaloso, tem bastante peixe, mas sem mostras de ouro. Falhamos nele dois dias, pescando e caçando por ter bons matos, e para provimento da viagem. Aqui nos deixou o Anhangüera adiantando-se com parte da tropa, ficando a mais expedindo-se para seguir. Neste tempo, e ausente já o cabo, chegou João Leite com a sua gente, por cuja causa falhamos mais esse dia. No seguinte seguimos com João Leite ao Anhangüera e, depois de quatro dias de marcha, o achamos com ranchos feitos entre o mato, passamos do caminho alguns córregos, que nos permitiram o vadeá-los por ser tempo de seca.
Avistada a tropa com o cabo, lhe pediu João Leite que fizesse a resenha prometida tantas vezes não só em São Paulo, mas no sertão, porque havia desconfiado, e temia se malograsse por esta causa a empresa que ambos tinham oferecido não só ao general Rodrigo Cezar, mas ao mesmo soberano. Respondeu-lhes que a resenha era escusada, porque os emboabas, assim chamam aos reinóis, não era gente que lho merecesse. Com esta resposta, desconfiados não só os emboabas, mas ainda os poucos paulistas que nos acompanhavam, determinaram voltar-se logo para São Paulo mas, acudindo a isto João Leite, os obrigou com rogos e com promessas, e muito mais com o seu natural agrado, a que o não desamparassem.
Reduzida, a tropa se pôs em marcha depois de quinze dias de falhas, que se gastaram nestas desordens, como também em fazer algum provimento do que permitia o mato, e como este não era muito, nem todos tinham quem lhe caçasse, obrigou a alguns a matarem e comerem um cavalo que tinha quebrado uma perna, e eu fui um dos que aproveitaram dela. Aqui quisemos falhar mais alguns dias por entrarem já as águas, e temermos não só os rios e córregos, mas a falta de matos, e com ela o necessário e preciso para o sustento. Resolveu porém o cabo a marchar em ódio dos emboabas de quem era o voto. Seguiu a tropa, e fomos dormir nesse dia junto de um córrego, que tinha algum peixe, com melhores pastos e bastante mato. Aqui desconfiamos, de todo persuadidos, que o Anhangüera nos queria acabar no meio daqueles matos, e alguns houve que se resolviam a ficar, lançando roças e plantando alguns poucos pratos de milho, que tinham ainda para o seu sustento, mas o capitão João Leite os tornou de novo a animar e reduzir a que passassem avante como passaram.
Passados alguns dias de marchas, e neles alguns rios e córregos, com assaz trabalho e perigo, por serem as águas muitas, e maior a fome, nos fomos arranchar perto da meia ponte. É a Meia Ponte um rio caudaloso, tem bastante peixe, bons pastos e muito mato. Passado este rio em umas pequenas canoas, que fizemos de cascas de árvores, fomos dormir na outra banda do rio, que nos hospedou toda a noite com uma famosa trovoada, que durou até a manhã seguinte com tanta água, que não nos deu lugar a podermos fazer ranchos, e por isso me vali de uma tolda, que tinha comigo. Da Meia Ponte, distância de dois dias de viagem, se deixou ficar frei Antonio com ânimo de lançar roça com dez negros, um seu sobrinho e um mulato, com outro branco paulista, que consigo tinha. Sentiu toda a tropa naquela noite a falta do dito religioso, deu-se parte ao Anhangüera, mandou-o este persuadir a que voltasse e marchasse adiante, como faziam os mais. Mas teve por resposta visto que, a falsidade que S. M.ce tinha usado com todos, faltando a tudo o que lhes tinha prometido em São Paulo, lhe não era possível o podê-lo acompanhar, que ele determinava plantar algum milho, com que se pudesse recolher a povoado.
Desenganado o Anhangüera, marchou com a mais tropa e, julgando que indo sempre ao norte, como até ali tinha feito, lhe ficavam já atrás os Guaiazes, que procurava, mudou de rumo, e seguiu a nordeste 4ª do norte.
Passaram de cento e tantas léguas as que andamos a este rumo, sem mais sustento que o que dava o mato, e esse pouco. Nestes dias lhe fugiram ao cabo oito índios dos seus, publicando primeiro todos, que íamos errados, porque os Guaiazes nos ficavam já atrás. Destes índios foram apanhados depois de alguns dias só três, que trouxe presos João Leite, que se expediu a buscá-los com dois negros e quatro brancos: trouxe também nesta volta consigo a frei Antonio, que nos ficava distante perto de oitenta léguas: mas ainda que veio frei Antonio, nem por isso desamparou a sua roça, porque deixou nela o sobrinho com quase todos os negros. Nesta ocasião demos em umas grandes chapadas faltas de todo o necessário, sem matos, nem mantimentos, só sim com bastantes córregos, em que havia algum peixe, dourados, traíras e upiabas, que foram todo o nosso remédio, achamos também algum palmito, do que chamam jaguaroba, que comíamos assado, e ainda que é amargoso sustenta mais que os mais.
Aqui nos começou a gente a desfalecer de todo: morreram-nos quarenta e tantas pessoas entre brancos e negros, ao desamparo, e o eu ficar com vida o devo ao meu cavalo, que para me montar nele, pela nímia fraqueza em que me achava, me era preciso o lançar-me primeiro nele de braços levantados sobre o primeiro cupim que encontrava.
Vendo-se o cabo nessa miséria, e temendo a falta e mortandade de gente, e muito mais considerando o erro que tinha dado no rumo que então seguia, se valeu do céu, e foi a primeira vez que o vi lembrar-se de Deus, prometendo, e fazendo várias novenas a Santo Antonio para que nos deparasse algum gentio, que conquistado, nos valêssemos dos mantimentos que lhe achássemos, para remédio da fome, que padecíamos. Passados quinze dias com bastante moléstia, e trabalho, demos em uma picada nos mesmos campos, seguimo-la nove dias, achando nela alguns ranchos feitos de pau e ramos, com alguns grãos de milho, já nascidos: no fim destes nove dias chegamos a uma serra, cujas vertentes deságuam para o norte, e lançando adiante quatro índios a farejar o gentio os seguimos três dias de viagem. Éramos só dezesseis com o cabo, porque a mais tropa e bagagem deixamos atrás com os doentes.
Na noite do terceiro dia avistamos as rancharias do gentio, e seus fogos: emboscamo-nos no mato para lhes darmos na madrugada, mas sendo sentidos dos cachorros que tinham muitos, e bons, quando os avançamos, nos receberam com os seus arcos e flechas.
Não demos um só tiro por ordem do cabo, de que resultou o fugir-nos quase todo o gentio, o investir um deles ao sobrinho do cabo com tal ânimo que, lançando-lhe a mão à rédea do cavalo, lhe tirou a espingarda da mão, e da cinta o traçado, e dando-lhe com ela um famoso golpe em um dos ombros, e o outro no braço esquerdo, fugiu levando-lhe consigo as armas. Desembaraçado do tapuia, o paulista correu sobre ele sem mais efeito, que recuperar a espingarda que lhe largou o tapuia, retirando-se com o traçado.
Nesta mesma ocasião outro tapuia em uma das suas portas feriu levemente no peito com uma flecha a um Francisco Carvalho de Lordelo, e acudindo outro lhe deu na cabeça com um porrete de que caiu logo; caindo-lhe, deu outra porretada outro tapuia, que apareceu de novo, deixando-o já por morto.
É para admirar que, em todo esse conflito, não fizesse ação alguma mais o nosso cabo, que o andar sempre ao longe, gritando, e requerendo-nos que atirássemos só ao vento por não atemorizar o gentio.
Foi Deus servido levarmos os ranchos chovendo sobre nós as flechas e os porretes.
Retiraram-se para o mato os tapuias, mas sem nunca nos perderem de vista, e tanto que, querendo dar sepultura ao Carvalho, persuadidos de que estaria morto, procuraram em duas avançadas que nos deram, o tirá-lo e comê-lo, e vendo-se rebatidos nos pediram por acenos lhe déssemos ao menos a metade para a comerem, por ser diversa a língua da geral. Retirado o dito Francisco de Carvalho, o achamos com a boca, nariz, e feridas cheias de bichos, mas vendo que lhe palpitava ainda o coração, e que tinha outros mais sinais de vida, o recolhemos na rancharia, curando-lhe as feridas com urina e fumo, e sangrando-o com a ponta de uma faca, por não termos melhor lanceta: aproveitou tanto a cura, que o Carvalho pela noite tornou em si, abriu os olhos, mas não pôde falar, senão no dia seguinte: o regimento que teve, não passou dum pouco de angu e algumas batatas, das que achamos nas rancharias.
Em todo esse tempo nos deixou o gentio, perseguindo-nos os negros, que nos iam conduzir algumas batatas de 25 batatais que tinham grandes, e excelentes no gosto: destes negros nos mataram um, e um cavalo, o que visto pelo cabo se fez forte em um dos ranchos, que lhe pareceu melhor, mandando recolher todo o milho, que se achou, a um paiol, a que pôs guardas, como o fez também a sete índios, que cativamos, mandando-lhe lançar a todos suas correntes, excetuando um índio torto, também cativo, a que ao depois deu liberdade. Recolhido no seu rancho o Anhangüera mandou logo os doentes, e mais bagagem.
Nesse tempo se tinha humanizado já mais o gentio, buscando-nos, e servindo-nos sem arco e flecha, e admirando muito as nossas armas. Ofereceram-nos paus, trazendo-nos em um destes dias dezesseis índias ainda moças, muitas claras e bem feitas, não éramos mais os brancos, em sinal de amizade. Repugnou ao cabo aceitá-las, contradizendo todos os mais companheiros, e eu fui o que mais o persuadia a aceitá-las, dizendo-lhe que, na consideração de sermos tão poucos, e estes fracos, e mortos de fome, e muito o gentio, o não escandalizássemos, e que postas em guarda as ditas índias com as mais, que se achavam já presas, podíamos facilmente catequizar a todo o mais gentio, não só a ajuste das pazes, mas a darem-nos alguns que nos ensinassem o verdadeiro caminho dos Guaiazes. Mas a nada disto se moveu o Anhangüera com a ambição de querer para si todo o gentio, motivo por que escusou sempre a resenha, e porque desconfiado o gentio desapareceu logo no outro dia: temeroso, que ao entrar nova gente nas rancharias, eram os doentes, e bagagens, os queríamos matar para os comermos a todos; assim nô-lo certificaram as índias, que se achavam entre nós. Desesperado o cabo com a ausência do gentio, largou o torto com algumas facas, tesouras e outras galanterias, para que os persuadisse a voltar, mas o torto foi, e nunca mais o vimos.
Chama-se este gentio Quirixá, vive aldeado, usa de arco, flecha e porrete; é muito claro e bem feito; anda todo nu, assim homens como mulheres. Tinham dezenove ranchos todos redondos, bastantemente altos, e cobertos de palmito, com uns buracos junto ao chão em lugar de portas; em cada um destes viviam vinte e trinta casais juntos, as camas eram uns cestos de buritis, que lhes serviam de colchão e cobertor; eram pouco mais de seiscentas almas; estava situada toda esta aldeia junto dum grande córrego com bastante peixe, e bom: no 2o dia, que marchamos a buscá-la, encontramos um rio caudaloso, em que havia muitos peixes caijus, palmito e muita e grande caça, que nos serviu muito. Nesta aldeia achamos duzentas mãos de milho, 25 batatais, muitas araras, e também alguns periquitos, que nos serviam de sustento e de regalo: tinham também bastante cópia de cabaças e panelas, e uma grande multidão de cães, que mataram quando fugiram e se retiraram de todo, só a fim de não serem sentidos das nossas armas, como experimentamos depois nas bandeiras, que se lançaram a espiá-los.
Aqui nos detivemos três meses sem neles nos dar o cabo milho nenhum, reservando-o todo para si só, e para a sua comitiva, desculpando esta sua tirania com dizer-nos lhe era preciso para as bandeiras, que havia de lançar, mas suposto lançou duas, nem por isso foi muito o milho de que as proveu; não faltou este nem farinhas aos seus cavalos e à sua comitiva. Eu só tive a fortuna de me darem dezessete espigas, e se tive mais algum milho o devo ao trabalho, e perigo, com que o recolhi das roças, que tinha deixado o gentio de refugo; assim o fizeram todos os mais, não se isentando do mesmo trabalho ainda religiosos, por que se o quiseram, o carregaram e tiraram por suas próprias mãos, escoltados sempre de outros por medo do gentio. Antes de nos apresentarmos nos fugiram quatro dos índios, que o cabo tinha presos, e nunca mais se viram.
Na demora que fizemos nesta aldeia, vendo toda a tropa que o cabo, sobre faltar a resenha tantas vezes prometida, tinha a culpa de perdermos o gentio, se amotinou, e tanto que se resolveram dois bastardos e um mulato mameluco com alguns paulistas a querer-lhe tirar a vida, e levantar a seu irmão Simão Bueno por cabo, por ser de melhor e mais dócil condição. Eu que soube a sua resolução, não obstante o não mo merecer o Anhangüera, fiz todo o possível para os dissuadir de semelhante intento, insinuando-lhes o muito que deviam a João Leite. Dissuadidos os bastardos e seus sequazes, seguimos viagem costeando o córrego da rancharia, ou aldeia, até darmos em um rio, que fomos costeando também pela parte do norte a buscar novo gentio, que nos pudesse ensinar o caminho dos Guaiazes. Nestas marchas gastamos 76 dias, andando dois deles sem achar água, de sorte que, quando chegamos às margens dum rio, foi tal alegria em nós, que cobramos nova alma, e tanto, que nem os cavalos havia os tirasse da água por mais pancadas que para isso lhes davam. Aqui falhamos 12 ou 15 dias, esperando por João Leite, que nos tinha ficado atrás em busca dos índios, e não chegava.
Neste sítio ouvindo dizer ao cabo nos ficava já perto o Maranhão me resolvi a deixá-lo, e rodar rio abaixo buscando alguma terra já povoada, por não perecer a fome e sede no meio daqueles matos. Seguiram-me três camaradas, que foram José Alves, Francisco de Carvalho, seu irmão, Manoel de Oliveira, paulista, e João da Matta, filho da Bahia, ainda rapaz, José Alves, com um negro e uma negra, seu irmão com um só negro, eu com três e um mulato, que foram todas as peças que nos escaparam da viagem do Anhangüera, entrando eu com seis negros e o mulato, o Alves com cinco e o irmão com três. Repugnou o cabo que saíssem comigo os dois irmãos sem que primeiro lhe satisfizessem quarenta e seis mil réis, que deviam a João Leite, que já era chegado com Frei Antônio, paguei por eles, porque lhe não vi outro remédio. Porém, João Leite vendo-me ausentar insistiu, e com ele Frei Antônio quanto lhe foi possível, a que não os desamparássemos; mas as insolências do cabo, que dizia publicamente havia de enforcar aos emboabas, me obrigaram a dar gosto a João Leite e a Frei Antônio. O certo era que o Anhangüera tinha passado ordem a um dos seus tapuias para matar ao Alves por uma bem leve causa; o pior foi que, vendo o mesmo Anhangüera que eu o deixava, me catequizou um negro bom mateiro, chamado Pascoal, e o deixou ficar consigo. Vendo-me sem ele voltei ao sítio do cabo distância de meia légua, rogando-lhe me restituísse o negro; respondeu-me que o negro não estava em seu poder, nem sabia dele. Fiz então procuração a frei Antônio para que o tomasse a si, e me remetesse o procedido dele, caso que o vendesse, à minha mulher Leonarda Peixota, à Cidade de Braga. Soube João Leite desta procuração e, estranhando esta ação de seu sogro, me mandou oferecer um moleque por Estevão Mascate Francês em lugar do negro, que aceitei logo por ser preciso mais gente para remar nas canoas; publicando neste tempo o cabo, que já que nos íamos, e o deixávamos, morreríamos naqueles rios e matos, por nosso próprio gosto, sendo que o melhor seria o matarmos, que o deixar-nos perecer entre as águas; não duvido que nos quisesse herdar os negros, como tinha feito a todos os mais sócios.
Estas duas canoas, e dado o meu cavalo a frei Luiz, para mo dizer em missas a N. Sa. da Boa Viagem, por lhe ter morrido o seu? rodamos rio abaixo pelo interesse do peixe, a caça, que era muita; passados oito dias de próspera viagem demos na barra doutro rio, que vinha da mão direita, e terras de Portugal, tão grande, como o por que rodávamos; passada esta barra, e depois de quatro dias, avistamos outra barra dum rio mais pequeno, que vinha da mesma parte direita, e desta a quinze ou vinte dias, buscando sempre ao norte, que era o rumo a que corria o nosso, demos em outro rio maior, que vinha da parte esquerda, em que achamos com as cheias inumeráveis jangadas feitas de buritis, que tinham rodado, e com elas sinal de haver gentio perto. Navegamos adiante e, depois de cinco ou seis dias, avistamos alguns recifes de pedras, e não poucas cachoeiras, que passamos junto à terra da parte direta, sirgando as canoas por entre os penedos, mas não com tanta cautela que não topasse uma em uma pedra e se partisse pelo meio, perdendo nela duas canastras com roupas, ouro e prata, tachos, espingardas, traçados, anzóis, linhas, e outros trastes necessários no sertão, e que nele se precisam; entre estes foi o mais sensível a perda de um pacote de chumbo com duas arrobas, escapando outro com o mesmo número, e um pequeno barril de pólvora, que veio boiando acima; escaparam também três espingardas de oito que trazíamos, e tudo o mais se perdeu.
Passado este perigo fomos na outra canoa buscar a parte esquerda por baixo da cachoeira, onde o rio fazia remanso com uma excelente praia: nela matamos dois porcos, que nos serviram de matalotagem para a viagem, e fizemos de novo outra canoa com três machados e duas enxós, que também nos escaparam, vertendo sangue as mãos por ser de tamboril duríssimo o pau de que a fizemos; gastamos na sua fabricação 12 dias abrigados à sombra daqueles matos, e como perdemos os anzóis, e linhas, perdemos também gosto ao peixe, e nos valíamos do palmito bocajuba, que depois de esfolado, e feito em uns pequenos pedaços o secávamos ao fogo, e seco o socávamos em uma pedra, e o comíamos em mingaus, servindo-nos de taco ou panela uma pequena bacia de arame, que também nos escapou. Feita a canoa seguimos nossa derrota, e passados três dias de viagem demos com um pau cortado na beira do mesmo rio: abordamos as canoas a expiar algum macaco para comermos e matarmos a fome, que era já muita quando descobrimos um arraial de gentio pouco menos distante que um ou dois tiros de espingarda; era o arraial grande, e teria mais de trinta ou quarenta ranchos redondos. Vistos, nos tornamos logo a embarcar, fugindo a todo o remar por não sermos sentidos deles, e tanto que fomos dormir distância de quatro ou cinco léguas rio abaixo, arranchando-nos no mato da parte esquerda, onde achamos algum palmito indaiá, mas foi tal a perseguição dos morcegos nessa noite, que sobre nos tirarem o sono, nos custou muito a livrar deles; porque como vínhamos já nus, tanto que fechávamos os olhos, se pregavam logo a nós e nos sangravam, de sorte que acordávamos banhados todos em sangue, motivo por que desamparamos mais cedo do que queríamos aquele sítio.
Daqui rodamos rio abaixo e demos em um jenipapeiro, com cuja fruta nos regalamos dois dias, e no fim destes como a fome era muita entramos pelas sementes das ditas frutas; mas estas nos puseram em tal estado, e impediram de tal sorte o curso, que nos consideramos mortos. Valemo-nos duns pequenos paus, e com eles em lugar de cristel obrigamos a natureza a alguma evacuação. Falhamos neste ponto 4 ou 5 dias, que gastamos em buscar alguma caça para comermos, e, para que nos não faltasse também o peixe, fizemos do virote duma espada, que cortamos a enxó, um formoso anzol, e aguçado com uma pedra tiramos bastante peixe, servindo-nos de linha um pouco de ambé, era o peixe excelente, muito, e grande, e tanto como o do mar: matamos também aqui muitos barbados que, postos de moquém, nos serviram de nova matalotagem para o caminho. Caminhamos rio abaixo e depois dalguns dias nos quebrou a outra canoa em uma pedra, que estava na beira duma grande correnteza em que demos; aqui se nos acabou de perder tudo, e eu, como não sabia nadar, me peguei à mesma canoa, valendo-me dum cipó, com que me atei a ela e fui sair em um recife de pedras: pior sucedeu a um dos meus negros, que rodou pela cachoeira abaixo mais de dois ou três tiros de espingarda levado da correnteza da água; e, quando o supúnhamos já morto, o achamos sentado sobre um grande penedo que havia no meio do rio, tinha este um quarto bom de légua de largo. Perdemos também aqui o nosso estimado anzol, que nos roubou um formoso e grande peixe, e assim ficamos só a palmito e jenipapo, e esses quando os achávamos.
Neste pouso consertamos a canoa, e, rodando pelo rio mais de quinze dias abaixo, nos vimos obrigados em todos eles a dormir nas suas ilhas, que eram muitas, enterrados na areia por medo do gentio, que era inumerável, e o mais é sem podermos dar um só tiro, para remédio da fome, que não era pouca. Aqui vimos várias barras doutros rios pequenos, que duma e doutra parte se metiam no em que rodávamos: passadas estas descobrimos a poucas léguas a barra dum grande rio, que vinha da mão direita, dormimos essa noite entre uma e outra barra, mas saindo na manhã seguinte costeando o rio pela mesma parte direita, pela extraordinária largura, que aqui tinha, demos com um grande palmital, e nele com três gentios junto à praia; pegou um dos companheiros na espingarda, tirou a um, e feriu-o; ferido, acudiu logo todo o mais gentio, que andava ao corredio (sic), dando tais urros, e tocando tão horríveis tararacas, que parecia se nos abrira naquele sítio o inferno, valeu-nos não ter este gentio de canoa, atravessamos logo o rio, fugindo quanto então nos foi possível; aqui nos vimos perdidos novamente porque as ondas, e marretas eram tais, ao atravessar da corrente, que tememos muito nos submergissem; chegamos bem cansados e quase mortos a uma ilha e, prendendo as canoas em uma das suas pontas, nos fomos arranchar na outra enterrando-nos na areia para evitar o gentio se viesse sobre nós.
Passado este susto, depois de dois dias de viagem, sem mais sustento, que os dos coquinhos, que nos davam alguns palmitos, com algum palmito indaiá, onde se achava, demos em um outro perigo, topando no meio do rio com um recife de pedras, em que a minha canoa se viu perdida, porque saída das pedras deu em um jupiá, aonde depois de dezessete ou dezoito voltas que nele deu, a mesma violência d?água a lançou fora; a outra tomou melhor caminho: foi encostada à terra e passou sem susto; dormimos esta noite na beira do mesmo rio junto a um mato, com não menos fome, e chuva que foi muita e durou toda a noite. Passados dois dias de viagem matamos uma anta, mas tão magra, que por tal nos esperou um tiro, de que caiu, e mal assada se comeu; nessa noite demos em trilha de brancos com que cobramos sem dúvida novos alentos: e vimos entrar no nosso da parte esquerda um rio, que ao depois soubemos ser Araguaia, e o por que navegamos o Tocantins. Seguimos a dita trilha, por ser esta sempre à beira do rio, e, dando daí a três dias com oito ilhas, nos vimos perplexos por não sabermos o canal que seguiríamos; buscamos então a terra e, junto a ela e duns penedos, quisemos varar as canoas, e não pudemos pela pouca água que ali havia.
Falhamos aqui quatro dias buscando algum palmito, ou caça, que era pouca, e como a fome era mais, mandei ao meu mulato a matar alguma coisa para comer; voltou este sem nada, mas só com o seguro de ter achado picada certa de branco; peguei da espingarda, e assim nu, como estava, segui a dita picada, acompanhado só do paulista, e a menos de quarto de léguas avistamos uma missão dos R. R. P. P. da companhia que formava de novo. Vendo-nos um dos padres nus, e com armas, fugiu logo e deu aviso ao mais, persuadido que era gentio Manas, que também usa de armas de fogo pelo comércio que tem com os holandeses, e são nossos inimigos. Acudiu prontamente o capitão-mor, que se achava entre os padres, com toda a sua soldadesca armada, e tocando caixas; acudiam também os índios com os seus arcos e flechas: lançando em terra as armas, e batendo as palmas em sinal de paz, nos veio buscar logo o R. P. Marcos Coelho, que era o superior da missão, e vendo que éramos portugueses nos levou consigo com extraordinária alegria e amor, e ouvindo-nos contar o que tínhamos padecido não podia reter as lágrimas, e assim, sabendo que tínhamos mais companheiros, os mandou logo buscar pelos índios em uma das suas canoas, e chegados, por não haver na capela outro sino, nos recebeu com três alegres repiques, que formavam os golpes dum pequeno ferro em uma pedra.
Nesta primeira e amorosa hospedagem começamos a matar logo a fome: não faltaram feijão e peixe, e como um e outro eram temperados, não deixou de o estranhar por muito tempo o estômago. Durou-nos esta alegria só quinze dias, porque no fim deles nos remeteu ao Pará, ao dito capitão-mor Domingos Portela de Mello, gastando vinte dias na viagem. Chegados ao Pará, se deu parte ao governador João da Maia da Gama, veio este ver-nos logo ao porto, e ouvindo os trágicos sucessos da viagem, que trazíamos, nos não deu crédito, antes intentou prender-nos para justificarmos se os negros, que trazíamos, eram nossos ou furtados à mesma tropa de que tínhamos desertado; respondi-lhe que catequizasse os negros e que se catequizados confessassem não serem nossos, nos castigasse, o que não obstante e menos a miséria em que nos via, pois estávamos todos nus, e com a pele só sobre os ossos, nos deixou ficar na mesma praia, e porto das canoas, sem resolver nada, e sem mais sustento e cama que a que nos deram os cavacos e cascas dos paus do estaleiro real.
Porém emendaram logo na manhã seguinte os particulares a indispensável falta deste seu governador, vindo nos buscar à praia do estaleiro o reverendo cônego João de Mello, com mais algumas pessoas graves da cidade, e compadecidos do miserável estado em que nos viam, nos levaram a todos para as suas casas. Eu tive a do mesmo reverendo cônego João de Mello; João Alves foi para a de Manoel de Góes com seu irmão; Manoel de Oliveira para a de João de Souza, filho de Basto, e João da Matta para a de João da Silva, filho de Guimarães. No Pará adoeci depois dalguns meses duma febre que me pôs em perigo, e tanto que, degenerando em maleitas, estive ungido; duraram-me estas oito meses; enquanto estive de cama levaram alguns dos negros mau caminho, porque um me morreu de bobas e o mulato, de veneno que lhe deu uma tapuia: e assim me embarquei só com dois para o Maranhão; destes conservo ainda um, porque o outro me foi preciso vendê-lo para comprar dois cavalos que me conduziram a estas Minas, gastando no caminho dez únicos meses com alguns dias falhos; e desde que deixamos o grande Anhangüera até Deus nos trazer ao Pará quatro meses e onze dias, entrando nestes as falhas.
Lembra-me que antes de darmos no Jupiá, quando fugimos do gentio de que falo acima nos números 21 e 22, por ser o rio muito largo, e quase morto, nos lançamos à matroca aquela noite, prendendo uma canoa à outra, e dormindo todos os mais, eu por mais temeroso e acautelado vigiei toda a noite, e não me valeu de pouco; porque ouvindo roncar ao longe o mesmo rio, os acordei gritando que tínhamos perto cachoeira, e assim foi porque varados em uma ilha, vimos logo na madrugada o perigo de que escapamos de noite: porque a cachoeira era horrível, e tão alta, que teria quinhentos palmos, e entre penedo bruto, que fazia mais formidável e com tantas ondas, fumaças e cachões que parecia um inferno; passamos por cima duns recifes lançando as canoas pelo canal à fortuna: saíram estas abaixo da cachoeira cheias de água, e rombos, tiramo-las, então a nado, e consertadas como pudemos, seguimos nossa derrota. Estes são, R. Senhor os trabalhos, as misérias e as grandes conveniências que tirei das novas Minas dos Guaiazes etc."

Minas Gerais, Passagem das Congonhas, 25 de agosto de 1734.

(Ass.) José Peixoto da Silva