Preto Amaral

JOSÉ AUGUSTO DO AMARAL
(55 anos)
Assassino em Série

☼ Conquista, MG (15/08/1871)
┼ São Paulo, SP (02/07/1927)

José Augusto do Amaral, conhecido por Preto Amaral, nascido em 15/08/1871, solteiro, era natural de Conquista, Minas Gerais. Seus pais escravos africanos do Congo e de Moçambique, haviam sido comprados pelo Visconde de Ouro Preto.

Preto Amaral foi voluntário da Força Pública do Estado de São Paulo, mas desertou. Era reincidente nesse tipo de atitude, que tomou em todos os corpos militares onde serviu: Brigada Policial do Rio Grande do Sul, Grupo de Artilharia Pesada em Bagé, Regimento de Infantaria de Porto Alegre, 13º Regimento de Cavalaria do Rio de Janeiro. Também se alistou na Marinha, mas abandonou o compromisso logo em seguida.

Em seu registro policial constam várias identificações para fins militares, três prisões por vadiagem em São Paulo (1920 e 1921), por vagabundagem em Bauru e Santos (1922) e, nesse mesmo ano por furto em São Paulo.

Nessa época, pós-escravatura no Brasil, era comum que negros fossem presos por esse motivo, pois muitos não conseguiam se empregar oficialmente e viviam de pequenos e eventuais trabalhos. Dessa forma, Preto Amaral constava como pessoa de maus antecedentes pela prática do que se denominava contravenção.

Os Crimes

13/02/1926: O menino Rocco, pequeno engraxate de 9 anos, trabalhava nas imediações da praça da Concórdia, próximo ao Teatro Colombo, no Brás. Cansado, estava pronto para ir embora. A garoa fina que caia espantava os fregueses naquela tarde cinzenta de São Paulo. As poucas pessoas que passavam pela rua estavam apressadas, tentando escapar da chuva.

Um homem alto, negro, aproximou-se de Rocco, pedindo que o ajudasse a carregar uma caixa com roupas, serviço pelo qual ele pagaria 4$000 (quatro mil réis). O menino, excitado com a oportunidade de ganhar um dinheiro extra, aceitou depressa. Seguiu-o da Avenida Celso Garcia até a ponte sobre o Rio Tamanduateí, próximo à Estação da Cantareira. Ao entrarem pela Rua João Theodoro, Rocco sentiu um frio no estômago ao ver-se desprotegido pela pouca luz... A rua estava sem iluminação. Antes que pudesse ficar com medo e sem nenhum aviso, o homem atacou o menino diretamente no pescoço, tentando estrangulá-lo. O garoto lutou bravamente com todas suas forças, mas, sem conseguir respirar, desmaiou. Julgando-o morto, o estranho arrastou-o para debaixo da ponte, rasgou suas roupas e preparou-se para violentá-lo, quando num golpe de sorte, um carro aproximou-se e estacionou. Receoso de ser flagrado, o estranho largou Rocco e fugiu.

O menino acordou um tempo depois, gemendo sem parar. Com muito esforço, machucado e enlameado, chegou até a rua. Duas moças que passavam por ali viram o menino e chamaram imediatamente um policial.

O motorista de táxi Basílio Patti estava saindo para trabalhar quando foi parado pelo grupo, ao atravessar a ponte da Rua João Theodoro. O policial pediu a Basílio Patti que levasse Rocco até a casa dos pais.

Aturdida com a história contada pelo filho, a família não deu queixa a polícia.

O criminoso tinha certeza de ter matado o menino. Depois de vagar a noite inteira pelo centro da cidade, voltou ao local no dia seguinte para dar vazão aos seus desejos sexuais. Surpreso, não achou cadáver algum...

05/12/1926: Sob as árvores da Avenida Tiradentes, sentado em um banco, Antônio Sanchez descansava e pensava em como faria para comprar uma refeição naquele dia. Tinha vindo de Barra Bonita, interior de São Paulo, para trabalhar na capital. Antônio Sanchez era franzino, doente e um pouco afeminado. Aparentava ter bem menos idade do que seus 27 anos. Morava em um apartamento alugado na Lapa, mas não sabia como iria arcar com as despesas. Estava morrendo de fome e não tinha conseguido ganhar dinheiro algum.

Um homem desconhecido, negro e alto, sentou-se ao seu lado. Disse chamar-se Amaral e começaram a conversar. Antônio Sanchez vendo que ele fumava, pediu-lhe um cigarro, comentando sobre a miséria em que se encontrava. Não tinha nem como pagar comida e sentia muita fome. Amaral, dando uma de bom samaritano, chamou o rapaz para almoçar com ele no Botequim do Cunha, que ficava em uma esquina da Rua Teodoro Sampaio. O convite foi aceito por Antônio Sanchez num piscar de olhos.

Depois de ver o rapaz almoçar com o prazer de quem aplaca a dor da fome, Amaral convidou-o para ir com ele até o Campo de Marte para ajudá-lo a fazer um serviço. Seria bem pago. Antônio Sanchez sentiu-se finalmente com sorte. Além de comer, acabava de arrumar um trabalho que ainda lhe renderia uns trocados. Confiando no novo "amigo", seguiu-o.

Ao chegarem ao Campo de Marte, seguindo uma picada que Amaral parecia conhecer bem, começou o ataque. Estavam em um lugar ermo, atrás de um bambual. Antônio Sanchez reagiu sem acreditar no que acontecia.

Os golpes de Amaral vinham sem trégua, e o rapaz tentava, em desespero, escapar. Mas o homem era bem mais forte que ele. Depois de uma luta desigual, Antônio Sanchez foi estrangulado. Ao ver o moço desfalecido, abaixou-se para ouvir se seu coração ainda batia. A lembrança do menino fujão de tempos atrás permanecia em sua memória. Com a certeza de que o rapaz não dava sinais de vida, violentou-o e fugiu em seguida. Para ele, não fazia diferença o fato de fazer sexo com Antônio Sanchez já morto.

24/12/1926: José Felippe de Carvalho, 12 anos, morava no Alto do Pari e conhecia bem os locais por onde perambulava. Às 16:00 hs, brincava com seu estilingue caçando passarinhos pela redondeza. Mais tarde, pediu permissão a mãe para ir a missa de Natal da Igreja de Santo Antônio. Ela regozijada com a religiosidade do filho, permitiu.

Chovia em São Paulo. Caminhando pelas proximidades do Canindé, José Felippe avistou um homem vendendo balões de gás. Fascinado, o menino aproximou-se e pediu um. O homem deu-lhe de presente e puxou conversa. Perguntou onde ele morava e o que fazia ali sozinho, e não deixou de reparar que o garoto tinha no bolso um estilingue. Alguns minutos depois, o balão de gás de José Felippe estourou. Amuado, pediu que o homem lhe desse mais um. O simpático sujeito satisfez-lhe a vontade e, continuando a conversa, comentou que em uma mata perto dali havia um local com muitos passarinhos. Se o garoto quisesse acompanhá-lo, poderia mostrar-lhe o local.

O menino, feliz da vida, concordou. Amaral, seguido por ele, foi até o Campo de Marte. Da mesma maneira que fez com Antônio Sanchez, atacou José Felippe, cometeu homicídio e, em seguida, deu vazão a seus desejos sexuais.

A mãe do menino ficou desesperada quando o filho único não voltou para casa. Saiu pelas ruas, de igreja em igreja, procurando-o freneticamente. Quando sua triste busca em nada resultou, deu queixa em uma delegacia do Brás pelo desaparecimento.

Como no caso de Antônio Sanchez, o corpo da vítima não foi localizado. José Felippe só seria reconhecido dias depois pelas roupas que vestia, quando sua mãe tomou conhecimento por meio de jornais que a polícia havia encontrado cadáveres de meninos sem identificação.

01/01/1927: Antônio Lemes, 15 anos e compleição franzina, estava de folga do trabalho. Era operário em uma fábrica de tecidos. Saiu de casa pedindo à mãe que guardasse seu almoço. Antônio Lemes disse que chegaria mais tarde, pois ia fazer um serviço extra para uma senhora no bairro da Penha.

Amaral, aproveitando o feriado, apostava dinheiro nos jogos de azar que se davam nas proximidades do Mercado Central. Logo avistou Antônio Lemes entre outras crianças que brincavam por ali. Levantou-se e convidou o garoto para almoçar com ele no Restaurante Meio-Dia, como fazia habitualmente. O rapaz aceitou.

Comeram, beberam vinho, e Amaral ofereceu 2$000 (dois mil réis) a ele para que o acompanhasse até a Penha. Como Antônio Lemes conhecia bem o bairro e tinha mesmo que fazer um serviço ali, concordou de bom grado.

Os dois seguiram para o largo do Mercado, onde tomaram o bonde. No ponto final da linha, seguiram a pé pela estrada de São Miguel. De vez em quando paravam em bares pelo caminho, para que Amaral tomasse uns tragos.

Na altura do quilômetro 39, Amaral pegou um atalho da estrada recém-construída. Quando se afastaram o suficiente, enlaçou fortemente o rapaz com o braço esquerdo, esganando-o com a mão direita. Antônio Lemes, pego de surpresa, não resistiu. Apenas empalideceu e desmaiou. Sem querer arriscar, Amaral enrolou um cinto de brim branco, de 85 centímetros de comprimento no pescoço de sua vítima e apertou-o com máxima força. Depois jogou-o no chão, tirou-lhe a calça, rasgou-lhe a camisa e fez sexo com o cadáver. Logo em seguida fugiu.

Dessa vez, o assassino não teria a mesma sorte. O corpo de Antônio Lemes foi encontrado no dia seguinte.

As Investigações

Ao começarem as investigações na área do Mercado, perto de onde o rapaz morava, alguém disse tê-lo visto na companhia de um homem negro. A polícia, sem perder tempo, começou a investigar todos os homens negros com antecedentes de pederastia, uma vez que Antônio Lemes havia sido sodomizado. Os jornais também noticiaram o crime com alarde.

A primeira testemunha a comparecer à delegacia, Roque Siqueira, havia lido as notícias sobre o crime nos jornais e informou ter visto, no primeiro dia do ano, um sujeito negro convidando um menino para almoçar com ele. Almoçaram no mesmo restaurante em que Roque Siqueira estava. Ele viu o adulto pagando algum dinheiro ao garoto. A testemunha disse à polícia que o sujeito era conhecido nas imediações do Mercado como um vagabundo que vivia da exploração do jogo de cartas naquela redondeza.

Os investigadores, acompanhados de Roque Siqueira, saíram a procura do suspeito. Não demorou muito para que o encontrassem.

Prisão e Confissão dos Outros Crimes

José Augusto do Amaral foi preso pelo assassinato de Antônio Lemes, mas não demorou a confessar seus crimes anteriores. Segundo ele, os atos de pederastia eram praticados somente após a certeza da morte da vítima, como se esse argumento atenuasse a sua culpa. As declarações do Preto Amaral foram feitas com naturalidade e sem a menor demonstração de emoção, segundo os relatos dos policiais e jornais da época.

Organizaram-se então diligências para pesquisar o Campo de Marte, onde o criminoso alegou ter deixado os outros corpos. Sem hesitar, Preto Amaral guiou os investigadores até um local próximo a um bambual, onde foi encontrada uma ossada humana. Mais adiante, sob a ramagem de uma pequena moita ressequida, jazia o cadáver de outro menino.

A polícia estava pronta para processar Preto Amaral e colocá-lo na cadeia pelo resto da vida, mas outra confirmação ainda surgiria: O Srº Carmine, pai do engraxate Rocco, procurou a polícia e contou o que acontecera com seu filho no ano anterior. O menino foi trazido ao gabinete do delegado, onde reconheceu Preto Amaral como seu agressor.

Outro que compareceu à delegacia foi Antonio Manoel Neves Filho, 16 anos, que quase caiu na armadilha do mesmo assassino. Ele foi abordado na Rua Voluntários da Pátria e seguiu Preto Amaral até Ponte Grande. Por sorte, quando estava no meio do matagal, conseguiu fugir. Também reconheceu Preto Amaral como seu agressor.

Mais uma vítima se apresentou, Manoel Antonio Neves, 13 anos. Ele contou ter sido convidado por um negro de nariz recurvo para acompanhá-lo até a Estação da Cantareira, com a finalidade de ajudar a trazer um embrulho para o Campo de Marte, onde estavam. Pelo serviço, receberia 1$000 (mil réis). Depois de alguns momentos na companhia do homem, Manoel Antonio Neves achou que alguma coisa estava errada e resolveu fugir. Ele também reconheceu formalmente José Augusto do Amaral como o homem que o "contratou".

A polícia não conseguiu comprovar a culpa de Preto Amaral no desaparecimento de outras crianças ocorridos na mesma época:

  • Antonio Ramalho Filho, 16 anos, desapareceu em 23/12/1926.
  • Luis Bicudo, 15 anos, encanador, desapareceu em 25/12/1926.
  • Sarkis Delclarei, 14 anos, desapareceu em 27/12/1926.
  • Vicente Scagelli, 17 anos, desapareceu em 27/12/1926.
  • Luis Hirah, 15 anos, telegrafista, desapareceu em 31/12/1926.

Estavam confirmadas todas as declarações de homicídio do suspeito, que dizia estar se sentindo melhor depois de sua confissão, mas ele não reconheceu ter abordado as vítimas vivas que o reconheceram na delegacia.

Segundo o Preto Amaral, suas noites estavam sendo atormentadas pelos fantasmas das pessoas para as quais fez algum mal. Esperava, com a admissão de seus crimes, viver em paz.

Enquanto estava preso, à espera de julgamento, Preto Amaral foi submetido a exames físicos e psiquiátricos. Os médicos concluíram que se tratava de criminoso sádico, necrófilo e pederasta, sendo a criança seu objeto especial. Tinha habilidade de praticar seus crimes sem ser descoberto e, se não fosse sua confissão, dificilmente os restos mortais de suas vítimas seriam encontrados.

No exame físico, foi constatado que seu órgão genital tinha um tamanho descomunal. Segundo Preto Amaral, uma "mulher da vida" jamais o atendia duas vezes. Ele atribuía esse fato a uma simpatia que fez quando adolescente. Aconselhado por amigos, teria marcado numa bananeira o tamanho desejado para seu pênis, com dois traços riscados a faca. Passado algum tempo, ao perceber que seu pênis se desenvolvia sem parar, correu até a árvore para modificar o traçado, mas já era tarde. Ela crescera demais e a distância entre os traços também. Desesperado, Amaral derrubou-a a machadadas na tentativa de interromper o processo, mas, segundo ele, o "encanto" permaneceu.

Na face anterior do braço esquerdo tinha tatuado desde os 14 anos, as iniciais do nome de sua mãe, Francisca Cláudia.

Preto Amaral era analfabeto, inteligente, tocava instrumentos musicais de ouvido e tinha excelente memória. Era ferreiro e cozinheiro. Morou em Minas Gerais, Espírito Santo, Bahia, Ceará, Amazonas, Pará, Bolívia, Argentina, Uruguai, Rio Grande do Sul e, finalmente, São Paulo.

Alegava ter alucinações depois de ter cometido seu primeiro crime. Jamais mostrou algum sinal de arrependimento sobre seus atos. Não se sabe se matou meninos nos locais onde morou antes de chegar a São Paulo.

Preto Amaral não refletia sobre suas ações. Era completamente impulsivo em relação a elas. Não percebia nada de anormal em seu comportamento.

Morte

O Preto Amaral, Monstro Negro, Papão de Crianças, Besta-Fera, Espigado ou Tucano, como também foi chamado, foi ficando cada vez mais debilitado enquanto estava na cadeia. Emagreceu, tinha febre constante e dores reumáticas.

Foi removido para a enfermaria da Cadeia Pública, onde faleceu vítima de tuberculose pulmonar em 02/07/1927, aos 55 anos, ainda sob prisão preventiva. Nunca chegou a ser julgado.

Preto Amaral é considerado o primeiro Serial Killer brasileiro e hoje sua história faz parte do Museu do Crime em São Paulo.

Fonte: "Serial Killer Made In Brazil" (Ilana Casoy)

Eduardo Collen Leite

EDUARDO COLLEN LEITE
(25 anos)
Militante e Guerrilheiro

* Campo Belo, MG (28/08/1945)
+ Guarujá, SP (08/12/1970)

Eduardo Collen Leite, codinome: Bacuri, foi um militante e guerrilheiro de organizações armadas de extrema-esquerda durante a ditadura militar no Brasil. Líder e participante ativo de ações diretas contra o regime, foi o guerrilheiro que, depois de preso, mais tempo foi torturado pelos agentes da repressão, passando 109 dias em poder de seus captores sob todo tipo de torturas até ser executado.

Filho de Alberto Collen Leite e Maria Aparecida Leite, começou a militar desde adolescente na Organização Revolucionária Marxista Política Operária (PELOP). Em 1967, depois de servir ao Exército, trabalhou como técnico em eletricidade e telefonia, até ingressar na militância comunista e na luta armada, como integrante da Vanguarda Popular Revolucionária (VPR). Depois de tornar-se líder da Rede Democrática (REDE), com a extinção desta participou das ações da Aliança Libertadora Nacional (ALN), dirigida por Carlos Marighella.

Prisão, Tortura e Morte

Um dos mais ativos guerrilheiros nas ações armadas urbanas do período, depois de participar dos sequestros do cônsul do Japão em São Paulo e do embaixador alemão Ehrenfried von Holleben no Rio de Janeiro, onde matou a tiros o policial federal Irlando de Moura Régis, segurança de Ehrenfried von Holleben, ambos no primeiro semestre de 1970, Bacuri (Seu apelido na guerrilha) foi preso no Rio de Janeiro por oficiais do Centro de Informações da Marinha (CENIMAR), em 21/08/1970, quando fazia o levantamento da rotina do embaixador do Reino Unido, com vistas a mais um sequestro objetivando a libertação de presos políticos pelo governo militar, especialmente de sua mulher, Denise Crispim, há um mês detida no Departamento de Ordem Política e Social (DOPS) e grávida.

Entregue pelos militares à equipe do delegado Sérgio Fleury, um dos mais extremistas agentes da repressão policial aos opositores da ditadura, que acompanhava a equipe da Marinha e o algemou pessoalmente numa rua do bairro da Gávea, entre setembro de dezembro de 1970, Bacuri foi constantemente levado a centros de interrogatórios do Destacamento de Operações de Informações - Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-CODI), prisões e casas isoladas, na Operação Bandeirante (OBAN) e no presídio da Ilha das Cobras, onde fez greve de fome e recusou atendimento médico, sendo brutalmente torturado e interrogado dezenas de vezes, sem nada dizer aos torturadores.

Denise Crispim o viu pela última vez depois de retirada da cadeia do DOPS, grávida de sete meses, na delegacia do bairro de Vila Rica, em São Paulo, à qual foi levada pelos homens de Sérgio Fleury, algemado e com hematomas e queimaduras por toda pele.

Em 26 de outubro, ele ficou sabendo que não mais seria deixado com vida, depois de lhe ser mostrado nos jornais a notícia plantada pela polícia de que tinha fugido e desaparecido, após ser levado para o reconhecimento do corpo de outro companheiro.

Considerado pela repressão como o mais perigoso dos guerrilheiros, por seu denodo durante as ações armadas da guerrilha de que participou, foi assassinado em 08/12/1970, no Forte dos Andradas, no Guarujá, em São Paulo, logo depois do sequestro do embaixador suíço Giovanni Enrico Bucher, no Rio de Janeiro, por guerrilheiros comandados por Carlos Lamarca, para que não fosse libertado na troca de reféns, não apenas por sua importância como pelo estado físico a que havia sido reduzido pelos torturadores. Bem antes disso, ele já não tinha mais o movimento das pernas por causa das torturas, para as quais era levado arrastado, a que vinha sendo submetido.

Seu corpo, encontrado no litoral de São Sebastião, São Paulo, foi entregue à família em um caixão lacrado, na tentativa de esconder o que ele havia sofrido nas mãos dos torturadores. Porém, seus familiares abriram o caixão e se depararam com um Bacuri desfigurado, com orelhas decepadas, inúmeras queimaduras, hematomas, dentes arrancados, olhos vazados, dois tiros no peito e dois na cabeça.

Em junho de 2011, foi lançado o livro "Eduardo Leite, o Bacuri", da jornalista Vanessa Gonçalves, uma biografia de sua vida que se desdobra com mais detalhes em seus 109 dias na mão dos torturadores. Nele, Artur Paulo de Souza e Jorge Zuchowski, dois colaboradores da polícia política que se infiltraram como militantes na Frente de Libertação Nacional, são apontados como os traidores que apontaram sua localização ao Centro de Informações da Marinha e o levaram a ser preso em 1970.

Em 2010, um deles, Arthur de Souza, pediu indenização ao Estado como perseguido político, que lhe foi negada.

Fonte: Wikipédia

Sérgio Fleury

SÉRGIO FERNANDO PARANHOS FLEURY
(45 anos)
Policial

* Niterói, RJ (19/05/1933)
+ Ilhabela, SP (01/05/1979)

Sérgio Fernando Paranhos Fleury foi um policial que atuou como delegado do Departamento de Ordem Política e Social (DOPS) de São Paulo, durante a ditadura militar no Brasil e ficou notoriamente conhecido por sua pertinácia ao perseguir os opositores do regime. Sofreu diversas acusações formais pelo Ministério Público pela contumácia na prática de tortura e homicídios contra os opositores do golpe de estado orquestrado pelos militares em 1964.

Vários depoimentos, testemunhas e relatos de presos políticos, apontam que ele usava sistematicamente a tortura durante os interrogatórios que comandava na época do regime militar brasileiro. Vários dos militantes que eram capturados pelo delegado Fleury não resistiram a essas torturas e acabaram morrendo, como no caso de Eduardo Collen Leite, guerrilheiro de renome, que foi torturado por cerca de quatro meses.

Sérgio Fleury foi o principal responsável pela tentativa de captura e morte de Carlos Marighella, ícone da extrema-esquerda, apontado como participante da Chacina da Lapa e de mais uma série de casos envolvendo combate e morte de opositores do regime.

Carreira

Bacharel em Direito, delegado em 1966, atuou no serviço de radio-patrulhamento da cidade de São Paulo, ganhando notoriedade no combate enérgico às organizações armadas de esquerda, utilizando-se também de violência.

Em 1968, foi requisitado pelo Departamento de Ordem Política e Social (DOPS), para lutar contra os movimentos de oposição ao governo militar no Brasil.

Pela sua participação nas ações desenvolvidas pelas Forças Armadas do Brasil durante a chamada "guerra subversiva", foi condecorado pelo Exército Brasileiro com a Medalha do Pacificador e pela Marinha de Guerra com o título de "Amigo da Marinha".

Sérgio Fleury participou da prisão dos estudantes da União Nacional dos Estudantes (UNE), Congresso de Ibiúna, 1968. Foi acusado de determinar o extermínio de militantes comunistas em São Paulo (1968-1969). Chefiou a captura, seguida da troca de tiros que matou Carlos Marighella em 04/11/1969 e de buscas visando a prender diversos opositores à ditadura militar ligados a este último, em 1971.

A Inversão da Tática

Ao contrário dos métodos do Exército, empregados na repressão aos movimentos subversivos nos demais estados brasileiros, que copiavam modelos empregados pela França e pelos Estados Unidos na luta contra a insurgência, envolvendo equipamentos sofisticados e até o uso de satélites, o delegado Sérgio Fleury adotou a inversão dessa tática.

Um artigo publicado na revista Veja de 12/11/1969, ressaltava que o sucesso de Sérgio Fleury no combate à luta armada da esquerda, deveu-se a sua experiência no combate aos criminosos comuns. Para ele, a motivação política era secundária.

"Um assalto a banco, praticado por um subversivo, deveria ser investigado como um assalto comum. O subversivo que roubasse um automóvel deveria ser procurado como qualquer 'puxador'."

A tática usada no cerco a Carlos Marighella foi a mesma empregada na captura de marginais. A revista, entrevistando um delegado do DOPS paulista, obteve a seguinte informação:

"Quando a gente prende um malandro, ladrão ou assassino, enfim um bandido, e a gente sabe que ele tem um companheiro, obrigamos o preso a nos levar até o barraco onde o outro mora. O bandido vai lá, bate na porta, o outro pergunta: 'quem é?', e o bandido responde: 'sou eu'. O camarada abre a porta e entram dez policiais junto com o bandido. Foi assim que Fleury obteve sucesso no combate à subversão: em cada dez diligências, sete eram proveitosas."

Esquadrão da Morte e Anistia Política

Além de acusado pela prática de tortura contra guerrilheiros, foi investigado e denunciado pelos Promotores de Justiça Hélio Bicudo e Dirceu de Mello por supostos assassinatos praticados pelo Esquadrão da Morte.

O delegado Sérgio Fleury foi apontado pelo Ministério Público de São Paulo como o principal líder desse Esquadrão. Apesar de algumas condenações, não chegou a cumprir pena.

Foi condecorado pelo governador Abreu Sodré em 1969, e foi escolhido Delegado do Ano em duas oportunidades, em 1974 e 1976, em meio a diversas acusações de tortura e homicídios.

Em 1978, na convenção da Aliança Renovadora Nacional (ARENA) em São Paulo, apoiou a candidatura do coronel Erasmo Dias à Câmara dos Deputados. Opôs-se à anistia política promulgada em 1979.

Foi beneficiado por uma lei que facultava a liberdade aos réus primários e com residência fixa que ficou conhecida como Lei Fleury.

Morte

Sérgio Fleury morreu vítima de afogamento, segundo a sua mulher Maria Izabel Oppido, presente em sua lancha na madrugada do dia 01/05/1979. Seu corpo foi sepultado sem ter sido necropsiado, o que gerou comentários de que ele teria sido assassinado pela esquerda como vingança ou como "queima de arquivo" pelos seus antigos colaboradores da ditadura.

Segundo relatos no livro "Memórias de Uma Guerra Suja", o ex-delegado do Departamento de Ordem Política e Social (DOPS) do Espírito Santo, Cláudio Antônio Guerra, assume na condição de um ex-agente da repressão aos opositores da ditadura militar, que o também delegado Sérgio Paranhos Fleury teria sido assassinado por ordem dos próprios militares.

Segundo Claudio Guerra, "o delegado Fleury tinha se tornado um homem rico desviando dinheiro dos empresários que pagavam para sustentar as ações clandestinas do regime militar e não obedecia mais a ninguém, agindo por conta própria".

Segundo o mesmo, "Fleury teria sido dopado e levado uma pedrada na cabeça antes de cair no mar, fato que justificaria a estranha ausência da necropsia do cadáver".

O delegado Sérgio Fleury era conhecido e temido publicamente no Estado de São Paulo como agente apoiador da ditadura, torturador e assassino de opositores ao regime militar. Assim, quando sua morte foi anunciada pelo jornalista Juca Kfouri no famoso Comício do Sindicato dos Metalúrgicos do Grande ABC no estádio da Vila Euclides, em São Bernardo do Campo, ainda durante o 1º de maio, ele teve a duvidosa homenagem de ter a notícia de sua morte festejada e efusivamente aplaudida por aproximadamente 100 mil pessoas.

Cinema

Sérgio Fleury é interpretado por Cássio Gabus Mendes no filme "Batismo de Sangue" (2007), do diretor Helvécio Ratton. Também por Ernani Moraes, como Delegado Flores no filme "Lamarca" (1994), de Sérgio Rezende. O personagem de um delegado da repressão interpretado pelo ator Carlos Zara no filme "Pra Frente Brasil" (1980), também é vagamente inspirado no delegado Sérgio Fleury.

Fonte: Wikipédia