JOÃO PANDIÁ CALÓGERAS
(63 anos)
Engenheiro, Geólogo, Jornalista, Escritor, Historiador e Politico
* Rio de Janeiro, RJ (19/06/1870)
+ Petrópolis, RJ (21/04/1934)
João Pandiá Calógeras nasceu no Rio de Janeiro, então capital do Império, em 19/06/1870, filho de Michel Calógeras e de Júlia Ralli Calógeras. Seu pai, de ascendência francesa, orientou a construção da Estrada de Ferro Mauá até Petrópolis, e dirigiu a ferrovia que ligava Macaé a Campos, na então província do Rio de Janeiro. A família Calógeras era de origem grega, proveniente de Chipre.
Pandiá Calógeras fez os primeiros estudos com professores particulares alemães, ingressando aos 14 anos no Colégio Pedro II, onde completou o curso secundário. Matriculou-se em seguida na Escola de Minas de Ouro Preto, em Minas Gerais, pela qual se formou engenheiro em 1890. Seu primeiro trabalho depois de formado foi a realização de pesquisas geológicas em Cariguaba, SC.
Casou-se em 1891 com
Elisa da Silva Guimarães, filha de
Joaquim Caetano da Silva Guimarães, ministro do Supremo Tribunal Federal, e sobrinha do escritor
Bernardo Guimarães. Ainda em 1891, foi nomeado engenheiro, da então província de Minas Gerais e iniciou duradoura colaboração científica com publicações do Rio de Janeiro.
Em 1894, assumiu o cargo de consultor técnico do secretário de Agricultura, Comércio e Obras Públicas de Minas Gerais, Francisco Sá.
Foi eleito deputado federal na legenda do Partido Republicano Mineiro (PRM) para a legislatura de 1897-1899, logo destacou-se na Câmara por seu conhecimento dos problemas nacionais, especialmente os ligados à engenharia e à mineração. Defendeu a redução das tarifas alfandegárias, manifestou-se sobre a questão de fronteiras com a Guiana Francesa e se opôs à transferência da Escola de Minas para Barbacena, MG.
Tendo ficado contra o presidente da República,
Prudente de Moraes, na cisão do Partido Republicano Federal (PR Federal), não conseguiu a reeleição para a Câmara no pleito de 1900 por lhe faltar o apoio dos grupos oligárquicos que, na época, controlavam as eleições no país.
Depois de trabalhar algum tempo na mineração de manganês e de realizar uma viagem à Europa, Pandiá Calógeras retornou ao país e, em 1903, publicou "As Minas do Brasil e Sua Legislação", obra que lhe valeu projeção nacional. No livro, defendia a tese que mais tarde apresentou na Câmara e foi transformada na Lei Calógeras: propunha que se estabelecesse uma distinção entre a propriedade do solo e a do subsolo, assegurando ao governo o direito de desapropriar o subsolo para explorá-lo.
Retornou à Câmara ainda em 1903, eleito pelo Distrito de Ouro Preto na legenda do Partido Republicano Mineiro (PRM), e em pouco tempo adquiriu a reputação de uma das figuras mais expressivas do Congresso. Reeleito sucessivamente em 1906, 1909 e 1912, manteve-se no Parlamento até 1914, participando com destaque do debate de todas as principais questões nacionais da época.
Pronunciou-se sobre a valorização do café, a caixa de conversão, a reforma tributária, a política de transportes, a consolidação das fronteiras, a generalização de instrução pública de nível primário e, naturalmente, a mineração. Apresentou o projeto transformado na
Lei Calógeras e, a convite do
Barão do Rio Branco, integrou a delegação brasileira à
III Conferência Pan-Americana, realizada no Rio de Janeiro em 1906. Interveio na questão do condomínio da Lagoa Mirim, na fronteira entre Brasil e Uruguai, e da livre navegação no rio Jaguarão no Rio Grande do Sul.
Em 1908, discursou na Câmara sobre o reaparelhamento bélico. Participou da IV Conferência Pan-Americana, realizada em Buenos Aires em 1910, e ainda nesse período converteu-se ao catolicismo, manifestando-se em debates parlamentares contra o divórcio e a favor da instalação de uma representação diplomática permanente junto ao Vaticano.
Em seu último mandato fez cerrada oposição ao governo do marechal
Hermes da Fonseca, e colaborou com a revista
Defesa Nacional, dirigida pelo grupo dos
"jovens turcos", oficiais que haviam estagiado no Exército alemão e pretendiam modernizar as forças armadas brasileiras. Eram conhecidos assim em alusão ao movimento nacionalista que atuava no processo de modernização da Turquia na mesma época.
No Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio
Ao assumir o governo federal, em 15/11/1914, o presidente
Wenceslau Brás aceitou a sugestão de militares ligados aos
"jovens turcos" e nomeou
Pandiá Calógeras para a pasta da Agricultura, Indústria e Comércio. Em sua gestão, que durou apenas até julho do ano seguinte, o novo titular promoveu a reorganização de todos os departamentos do ministério, fixou as bases do crédito agrícola, aplicou a lei de sua autoria na regulamentação da propriedade das minas e estudou o uso do álcool como substituto da gasolina, em virtude de problemas de abastecimento causados pela Primeira Guerra Mundial. Baixou ainda decretos reorganizando os serviços de veterinária e de inspeção de defesa agrícola.
No Ministério da Fazenda
Em junho de 1915, substituiu interinamente o ministro da Fazenda, Sabino Alves Barroso Júnior, impedido por motivo de doença. Após acumular as duas pastas durante um mês, foi efetivado no Ministério da Fazenda, onde encontrou uma situação precária, marcada pela carência de rendas para cobrir as necessidades mais urgentes, uma grande dívida flutuante, a arrecadação aduaneira reduzida a 1/3, a suspensão da cobrança de impostos até que se resolvessem alguns protestos e reclamações, a paralisia dos transportes marítimos e a existência de um segundo funding loan (consolidação dos empréstimos brasileiros junto aos credores ingleses).
Além desses problemas, Pandiá Calógeras enfrentou a incúria administrativa e a corrupção, o que lhe valeu ataques publicados na imprensa pelos beneficiários desse estado de coisas. Superando os obstáculos, o novo ministro regularizou a dívida flutuante, reorganizou a Casa da Moeda e assumiu a responsabilidade integral pelo funding, promovendo um acordo com os credores estrangeiros que impediu seu controle sobre as alfândegas brasileiras. Ao deixar a pasta, em setembro de 1917, recebeu da Casa Rothschild um documento atestando que nunca as finanças brasileiras tinham se apresentado tão florescentes.
Reconduzido à Câmara Federal em 1918, recebeu do presidente eleito
Francisco de Paula Rodrigues Alves a incumbência de elaborar um relatório da situação do país, que viria a ser posteriormente publicado sob o título de
"Problemas da Administração". Em novembro desse ano, motivos de saúde impediram a posse de
Rodrigues Alves no seu segundo mandato à frente do governo federal, assumindo então, por pouco tempo, o vice-presidente eleito
Delfim Moreira.
Com o término da Primeira Guerra Mundial, realizou-se em Versalhes, França, a Conferência de Paz.
Pandiá Calógeras integrou a delegação brasileira ao congresso, presidida pelo senador
Epitácio Pessoa. Entretanto,
Epitácio Pessoa foi eleito presidente da República para completar o quadriênio, e retornou ao Brasil.
Pandiá Calógeras assumiu a chefia da delegação e, após o encerramento do
Congresso de Versalhes, permaneceu ainda algum tempo na Europa, representando o Brasil em alguns encontros internacionais e chefiando a missão comercial que esteve na Inglaterra em 1919.
No Ministério da Guerra
Regressando ao Brasil,
Pandiá Calógeras não retomou seu mandato parlamentar em virtude de ter sido nomeado ministro da Guerra do governo de
Epitácio Pessoa, tornando-se o único civil a ocupar esse cargo na história republicana do país. Sua escolha foi aprovada por um grande número de oficiais do Exército, que já lhe haviam prestado homenagens quando de sua atuação nos outros ministérios. Também repercutira favoravelmente um discurso que pronunciara na Câmara no ano anterior sobre a situação das forças armadas.
Em sua administração, iniciada em outubro de 1919, o Exército brasileiro experimentou intensa modernização, expansão e aperfeiçoamento em todos os setores, contando para isso, a partir de 1920, com a assessoria da missão militar francesa chefiada pelo general Maurice Gustave Gamelin, que teve profunda influência na reorganização do Exército e na formação de oficiais de estado-maior.
Pandiá Calógeras promoveu a reforma da instrução dos quadros e da tropa, tornando-a mais técnica com a criação de escolas para cada especialidade, entre elas a Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais. Além disso, baixou nova regulamentação para as escolas de Estado-Maior, de Aviação, de Veterinária e para os colégios militares. Instituiu também a instrução física obrigatória para todas as armas.
Alterou ainda a divisão territorial militar e a organização das divisões do Exército, reorganizando a Artilharia de Costa e criando a Diretoria Geral de Intendência de Guerra.
Fez grandes aquisições de material bélico moderno para as diversas armas e serviços, incrementando a indústria militar nacional, sobretudo as fábricas instaladas em Realengo, no Rio de Janeiro, e em Piquete, SP. Construiu 103 estabelecimentos militares espalhados por todo o país, tomando cuidados especiais com as instalações de serviços básicos nas casernas. No setor de aviação, montou novas esquadrilhas, inclusive de aviões de caça.
Por influência direta da missão francesa, surgiram em 1920 o Regulamento Disciplinar do Exército (RDE) e o Regulamento Interno de Serviços Gerais (RISG). Data também dessa época a formulação da primeira política de defesa nacional abrangendo todos os aspectos de vida do país, desde a preparação militar propriamente dita até o desenvolvimento de indústrias estratégicas, como a siderurgia. Foi o desdobramento dessa concepção que levou à criação, em 1927, do Conselho de Defesa Nacional.
Ainda em 1920 o Governo Federal adquiriu a Fazenda Quitaúna, em São Paulo, onde Pandiá Calógeras construiu um quartel-general que serviu de apoio à ampliação da força militar estacionada nesse estado.
No final de sua gestão à frente do Ministério da Guerra ocorreu o levante de 05/07/1922, inaugurando o ciclo de movimentos tenentistas que marcou a década.
Pandiá Calógeras participou diretamente dos acontecimentos que antecederam a revolta, bem como da repressão ao levante. Foi ele que, a pedido do presidente
Epitácio Pessoa, enviou em 1º de julho um aviso de repreensão ao marechal
Hermes da Fonseca, presidente do Clube Militar, por suas declarações contra a participação de tropas federais no conflito entre forças políticas pernambucanas em torno do resultado das eleições estaduais ali realizadas. A polêmica então estabelecida entre o marechal e o governo levou à sua prisão e ao fechamento do Clube Militar no dia 2 de julho, o que revoltou parcela ponderável da juventude militar. Informado dos preparativos para uma revolta no forte de Copacabana,
Pandiá Calógeras enviou o capitão
José da Silva Barbosa, acompanhado pelo general
Bonifácio Costa, para substituir
Euclides Hermes da Fonseca, filho de
Hermes da Fonseca, no comando dessa corporação. A prisão desses oficiais legalistas pela guarnição de Copacabana configurou o início do levante, que envolveu também a Escola Militar e algumas tropas da Vila Militar, no Rio de Janeiro, além do contingente estacionado em Mato Grosso.
Em todas essas frentes, a revolta foi rapidamente sufocada. Esperançosos de obter o apoio dos oficiais da Vila Militar, os alunos da Escola Militar, chefiados pelo coronel João Maria Xavier de Brito Júnior, começaram sua marcha sobre a cidade. Recebidos a tiros pela guarnição, recuaram para Realengo, onde se renderam. Como conseqüência, mais de quinhentos alunos foram expulsos da escola. Também em Mato Grosso a rebelião foi logo dominada, com o deslocamento de tropas da Força Pública de São Paulo, que obtiveram a rendição dos rebeldes.
No forte de Copacabana, a revolta teve início em um ambiente de desilusão, causado pela certeza de que não poderiam contar com o apoio dos companheiros de conspiração. Apesar disso, os revoltosos atingiram o prédio do Ministério da Guerra com tiros de canhão, o que alarmou as autoridades e levou à mudança do quartel-general legalista para a guarnição do Corpo de Bombeiros situada do outro lado da praça fronteiriça, o Campo de Santana. Em 6 de julho, o forte foi cercado e Pandiá Calógeras começou a ameaçar seus ocupantes com um ataque por terra e mar, caso não se rendessem. Diante da situação, o capitão Euclides Hermes liberou seus soldados e oficiais para optarem, permanecendo no quartel apenas 28 voluntários dispostos a lutar. Pouco depois, Euclides Hermes foi preso ao sair do forte para parlamentar com Pandiá Calógeras.
Sob o comando do tenente Antônio Siqueira Campos, os revoltosos resolveram então abandonar o quartel e continuar a luta marchando pela avenida Atlântica de encontro às forças legalistas, desencadeando então o episódio conhecido como Os 18 do Forte, última escaramuça da revolta de 1922, que resultou na morte de vários revoltosos e ferimentos nos restantes.
Depois de 1922
Com o fim do mandato de
Epitácio Pessoa, 15/11/1922,
Pandiá Calógeras deixou o ministério e se afastou da política por discordar da eleição de
Arthur Bernardes para a presidência da República.
Entre 1923 e 1929, presidiu a Companhia Nacional de Artefatos de Cobre (Conac), desenvolvendo também grande atividade intelectual como jornalista, conferencista e escritor. Nesse período, publicou "A Política Exterior do Império", em três volumes, considerada sua obra mais importante como historiador e, em 1930, "Formação Histórica do Brasil". Em 1928, foi eleito presidente da Sociedade Brasileira de Engenharia.
Quando das eleições presidenciais de março de 1930, apoiou
Getúlio Vargas, candidato da Aliança Liberal (AL), coligação interpartidária de oposição. Com a vitória do situacionista
Júlio Prestes, as forças oposicionistas aceleraram os preparativos para uma revolta armada que, deflagrada em 3 de outubro, foi vitoriosa ao cabo de 21 dias de luta. Convidado,
Pandiá Calógeras recusou-se a participar da junta governativa que exerceu o poder até a formação, em 3 de novembro, do
Governo Provisório, chefiado por
Getúlio Vargas. Esse governo nomeou-o em 1931 relator do projeto sobre legislação de minas nas comissões legislativas então instituídas e membro da Comissão de Estudos Financeiros e Econômicos dos Estados e Municípios. No mesmo ano, a convite do governo mineiro, estudou a reforma do sistema tributário desse estado.
Em 1932 tornou-se presidente da
Liga Eleitoral Católica e manifestou simpatias pela
Revolução Constitucionalista, deflagrada em São Paulo para exigir a imediata reconstitucionalização do país e a devolução da autonomia estadual. Mesmo derrotada, a Revolução teve influência na convocação de eleições para a Assembléia Nacional Constituinte em 1933. Nesse pleito, concorrendo em Minas Gerais na legenda do Partido Progressista (PP),
Pandiá Calógeras obteve a maior votação até aí alcançada no Brasil por um candidato a deputado. Pouco depois, seu nome foi incluído na lista apresentada por líderes mineiros a
Getúlio Vargas para que este escolhesse o interventor que substituiria o governador
Olegário Maciel, recém-falecido, na chefia do Executivo estadual. A escolha do chefe do
Governo Provisório recaiu, entretanto, sobre
Benedito Valadares.
Foi em Petrópolis, RJ, que
Pandiá Calógeras viveu os últimos anos de sua profícua existência e onde provavelmente escreveu
"Ascensões D'alma", obra publicada em 1934, com prefácio do
Padre Leonel Franca, verdadeira obra-prima que revela seu amor pelo Criador e sua fidelidade aos ensinamentos do Evangelho.
Pandiá Calógeras faleceu em Petrópolis, no Sanatório São José, anexo aos Hospital Santa Tereza, onde se achava em tratamento havia poucos dias, às 20:30 hs do dia 21/04/1934. Seu corpo foi sepultado no Cemitério Municipal, numa sepultura em cuja lápide ainda hoje podem-se ler os dizeres:
"Ad pedes tuos... Fiat voluntas tua..."
(Aos teus pés... Faça-se a tua vontade...)"
Dizeres que refletem a resignação e a humildade evangélica que acompanharam sua alma profundamente cristã nos estertores de sua existência.
Pandiá Calógeras faleceu na vigência de seu mandato constituinte.
Foi patrono da cadeira nº 7 e membro correspondente no exterior da Academia Carioca de Letras. Além de inúmeros discursos, relatórios e artigos, publicou obras sobre diferentes temas, nas áreas de sociologia, história, finanças, indústria, administração, engenharia, política e pedagogia, entre as quais "As Minas do Brasil e Sua Legislação" (3v., 1904-1905), "La Politique Monétaire du Brésil" (1910), "Os Jesuítas e o Ensino" (1911), "Novos Rumos Econômicos" (1912), "Rio Branco e a Política Exterior" (1916), "A Política Exterior do Império" (3v., 1927-1933), "A União Brasileira" (1927), "A Ordem de São Bento e a Civilização" (1927), "Problemas de Governo" (1928), "Formação Histórica do Brasil" (1930), "Conceito Cristão do Trabalho" (1932), "Problemas de Administração" (1933), "Estudos Históricos e Políticos (Res Nostra)" (2ª ed., 1936), "O Marquês de Barbacena" (1936), "Ascensões D'alma (Uma Página Íntima)", "As Relações Exteriores do Brasil" e "A Lei de Minas".
Deixou vários inéditos, entre os quais "Diário da Conferência de Paz", um ensaio sobre a eucaristia, e um trabalho de caráter íntimo chamado "Méditations".
Muitos artigos e livros foram escritos sobre a vida de Pandiá Calógeras, entre os quais o de de E.M de Castro e Silva, "À Margem do Ministério Calógeras", a coletânea "Pandiá Calógeras na Opinião de Seus Contemporâneos" (1934), o de Antônio Gontijo de Carvalho, "Calógeras" (1935) e o de Luís Pinto, "Pandiá Calógeras" (1955).