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Eneida de Moraes

ENEIDA DE VILLAS BOAS COSTA DE MORAES
(66 anos)
Jornalista, Escritora, Pesquisadora e Militante Política

* Belém, PA (23/10/1904)
+ Rio de Janeiro, RJ (27/04/1971)

Eneida de Villas Boas Costa de Moraes, ou simplesmente Eneida, como ela preferia ser chamada, foi jornalista, escritora, militante política e pesquisadora brasileira. Eneida é sempre descrita em relatos de amigos e parentes como uma mulher forte, viva, corajosa, audaciosa e inteligente.

"Eneida sempre livre / Eneida sempre flor / Eneida sempre viva / Eneida sempre amor", diz o poeta João de Jesus Paes Loureiro.

Filha de um comandante de navios, desde pequena nutriu grande afeição pelos rios e pela Amazônia. Ainda criança, participou de um concurso de Jovens Escritores, obtendo o primeiro lugar, com um texto que falava do imaginário de um caboclo amazônida.

Eneida foi uma mulher que contestou os padrões instituídos ao papel feminino de sua época, transitando em redutos considerados masculinos: a redação de jornais, a publicação de livros e a célula partidária - mecanismos que ela utilizou para o exercício de sua militância em 50 anos de atuação no cenário político e jornalístico-literário brasileiro (1920-1970).


A abrangência desse período pode ser dividida em três momentos:

1920-1930, época  em que a escritora residia em Belém do Pará, sua terra natal, e ingressou oficialmente no jornalismo colaborando, entre outros, nos jornais o Estado do Pará e Para Todos (RJ) e nas revistas Guajarina, A Semana e  Belém Nova. Participou também de vários grupos  e associações de intelectuais em Belém e no Rio de Janeiro, e publicou o livro "Terra Verde".

1930-1945, período em que fixou residência no Rio de Janeiro e, seduzida pelas idéias socialistas, filiou-se ao Partido Comunista do Brasil (PCB) engajando-se no ativismo revolucionário dos anos 30, aderindo ao discurso proletário quando este se fez uma motivação radical. Declaradamente marxista, contestou o poder constituído participando de movimentos de reivindicações sociais e de agitação e propaganda comunista, produzindo uma escritura panfletária veiculada em volantes e jornais de células. Envolveu-se diretamente nas revoluções de 1932 e 1935, o que resultou em prisões, torturas, clandestinidade e exílio. Na prisão, conheceu Olga Benário e Graciliano Ramos, que a imortalizou em "Memórias do Cárcere".

1945-1970, fase caracterizada por uma "escrita consentida", atuando como jornalista profissional em periódicos partidários e da grande imprensa, nas  funções de repórter e de cronista, entremeando essas atividades com a publicação de 11 livros e várias traduções.

Escreveu "História do Carnaval Carioca" (1958), a primeira grande obra sobre este assunto, que estabeleceria as principais categorias do carnaval brasileiro ao definir o conceito de cordões, corso, ranchos, sociedades e entrudo, entre tantos outros. Foi criadora do Baile do Pierrot no Rio de Janeiro e em Belém.

As escolas de samba Salgueiro em 1973, com o tema "Eneida, Amor e Fantasia e Paraíso do Tuiuti" em 2010, com "Eneida, o Pierrot Está de Volta", homenagearam a jornalista no carnaval.

Obras

  • 1958 - História do Carnaval Carioca
  • Terra Verde (Poesia)
  • O Quarteirão (Crônicas)
  • Paris e Outros Sonhos (Crônicas)
  • Sujinho da Terra (Crônicas)
  • Cão da Madrugada (Crônicas)
  • Aruanda (Crônicas)

Fonte: Wikipédia

Iara Iavelberg

IARA IAVELBERG
(27 anos)
Guerrilheira e Militante

* São Paulo, SP (07/05/1944)
+ Salvador, BA (20/08/1971)

Iara Iavelberg foi uma militante e guerrilheira de extrema-esquerda, integrante da luta armada contra a ditadura militar brasileira. Psicóloga e professora, depois de entrar na luta contra o regime militar, primeiro integrando a Organização Revolucionária Marxista Política Operária (Polop) e depois o Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR-8), tornou-se companheira do ex-capitão do exército Carlos Lamarca, um dos principais líderes da oposição armada ao governo militar no Brasil, até morrer num cerco de agentes de segurança em Salvador, Bahia, em agosto de 1971.

Iara Iavelberg nasceu numa rica família judia paulistana e aos 16 anos já estava casada. O casamento, com um médico, durou apenas três anos e ela deixou a relação para entrar na militância política. Separada, e mal entrada nos vinte anos, virou adepta do amor livre, moda na época, e entre um de seus casos esteve o líder estudantil José Dirceu.

Alta, bonita, de olhos claros e corpo bem cuidado, virou a musa da intelectualidade estudantil paulista de esquerda no meio da década de 60. Destemida e vaidosa, nos seus tempos de clandestinidade era capaz de sair de um "aparelho" para cortar os cabelos nos melhores salões de Ipanema, no Rio de Janeiro.

Iara Iavelberg chegou ao Marxismo através do movimento estudantil e, militando no MR-8, conheceu Carlos Lamarca, comandante da Vanguarda Popular Revolucionária (VPR) dois meses depois dele desertar do exército, em abril de 1969.

Carlos Lamarca treinando Iara Iavelberg
A paixão entre a filha de milionários paulista que tornou-se socialista e o filho de sapateiro carioca, capitão desertor do exército brasileiro e um líderes da luta armada, foi fulminante. Os dois foram viver juntos e passaram dez meses escondidos em "aparelhos" pelo país. Uma das companhias do casal nestes esconderijos e que testemunhou de perto a relação entre os dois, foi a guerrilheira Vanda, da VPR, codinome de Dilma Roussef, décadas depois a primeira mulher presidente do Brasil.

Em 1970, começaram treinamento militar no Vale do Ribeira, onde Iara Iavelberg deu aulas teóricas de marxismo aos guerrilheiros, e, caçados pelo exército, cartazes com a foto dos dois, entre outros, foi espalhado por todos os cantos do país. Neste ano, em 7 de dezembro, Carlos Lamarca liderou o sequestro do embaixador suíço Giovanni Bucher, no Rio de Janeiro, em troca da libertação de 70 presos políticos.

Nos primeiros meses de 1971, a maioria das organizações de esquerda já estavam desarticuladas e semi-destruídas, e os restos da VPR juntaram-se ao MR-8. Na nova organização, Iara Iavelberg, intelectual, teve um cargo de cúpula e Carlos Lamarca, considerado mais despreparado pela nova direção, foi rebaixado a militante de base, enviado para o interior da Bahia, enquanto a mulher se estabeleceu em Salvador, BA.

A viagem, em junho de 1971, de Iara Iavelberg e Carlos Lamarca do Rio de Janeiro para a Bahia, foi a última vez em que estiveram juntos, antes da morte de ambos.

Morte

As causas e até a data de sua morte permanecem envoltas em mistério. A data oficial é contestada por relatório do Ministério da Aeronáutica, segundo o qual ela teria se suicidado em 06/08/1971, acuada pela polícia em uma residência em Salvador. Alguns militantes, presos no Destacamento de Operações de Informações - Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-CODI) de Salvador, dizem ter ouvido seus gritos quando era torturada, o que contradiz a versão do Ministério da Marinha, segundo a qual ela teria sido morta durante "ação de segurança".

O jornalista Elio Gaspari, em seu livro "As Ilusões Armadas, A Ditadura Escancarada" (2002) relata em detalhes o que seriam os momentos de cerco e morte de Iara Iavelberg, por suicídio. Ela e Carlos Lamarca fugiram para a Bahia em julho de 1971, após o sequestro do embaixador Giovanni Bucher e a desarticulação da organização guerrilheira. Iara Iavelberg, codinome Clara, separou-se dele em Feira de Santana, depois indo para Salvador, enquanto Carlos Lamarca seguia para o interior baiano.

Com a prisão de um dos integrantes da organização na capital baiana, sabedor do paradeiro do casal e que, após duas semanas de tortura, passou informações à repressão, na manhã de 20/08/1971 dezenas de agentes dirigiram-se a um prédio na Rua Minas Gerais, na Pituba, onde esperavam encontrar Carlos Lamarca. Lá quem estava era Iara Iavelberg. O prédio e o apartamento indicados, 201, foram envolvidos por bombas de gás lacrimogênio e após a invasão, dele saíram os policiais com três presos, uma empregada e dois menores.

Um menino morador do apartamento vizinho, porém, quando os policiais se retiravam, descobriu Iara Iavelberg agachada, de arma na mão, no vão entre os dois apartamentos, e chamou a policia de volta. Encurralada num quarto cheio de gás lacrimogêneo, ela matou-se com um tiro que trespassou o coração e o pulmão. O cadáver foi levado ao Instituto Médico Legal (IML) de Salvador e somente algumas horas depois descobriu-se que aquela era a mulher de Carlos Lamarca. Seu corpo foi deixado por mais de mês numa gaveta do necrotério, como isca para Carlos Lamarca.

Nilda Cunha, a adolescente secundarista de 17 anos capturada na batida ao apartamento, era integrante do MR-8 e lá morava sozinha com o namorado, também militante, até receber ordens da direção da organização para hospedar Iara Iavelberg. Torturada pelos militares num quartel e obrigada a tocar no cadáver da guerrilheira, enlouqueceu, teve cegueira e foi internada várias vezes, morrendo numa de suas crises, com um prosaico "edema cerebral a esclarecer" como consta seu atestado de óbito. Meses depois, sua mãe, Esmeraldina Cunha, suicidou-se, enforcando-se com o fio de uma máquina de calcular elétrica.

A certidão de óbito dá a morte de Iara Iavelberg, oficialmente, como 20/08/1971, assinada pelo legista Drº Charles Pittex, informando ainda que ela foi sepultada pela família no Cemitério Israelense de São Paulo. Seu corpo foi entregue à família em caixão lacrado, com a proibição explícita de que fosse aberto. Carlos Lamarca morreria menos de um mês depois, em 17/09/1971, em Pintada, no sertão da Bahia.

Exumação

Em 2003, após anos de negativas, através de um mandado judicial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, os familiares de Iara Iavelberg, inconformados com a versão oficial da morte dela por suicídio, conseguiram que a Federação Israelita de São Paulo fizesse a exumação do corpo da guerrilheira, que havia sido entregue à família em caixão lacrado. O resultado da nova autópsia descobriu que Iara Iavelberg tinha sido morta com vários tiros. Os restos mortais da guerrilheira puderam assim, mais de trinta anos depois, ser removidos da ala de suicidas, onde tinham sido enterrados, para perto do túmulo de seus pais, em outra área do cemitério judeu.

Homenagens

O Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo prestou uma homenagem à antiga aluna e deu seu nome ao centro acadêmico, passando a ser chamado Centro Acadêmico Iara Iavelberg. Seu nome também batiza uma praça no bairro de Bangu, na cidade do Rio de Janeiro e outra no bairro de Pirituba, na cidade de São Paulo.

No filme "Lamarca", de 1994, dirigido por Sérgio Rezende e baseado no livro biografia de Emiliano José e Miranda Oldack, "Lamarca", o capitão da guerrilha, ela é vivida pela atriz Carla Camurati.

Em 2014 foi lançado o filme-documentário "Em Busca de Iara", escrito e produzido por sua sobrinha, Mariana Pamplona.

Fonte: Wikipédia

Mestre Irineu

RAIMUNDO IRINEU SERRA
(78 anos)
Fundador da Doutrila Religiosa Santo Daime

* São Vicente Ferrer, MA (15/12/1892)
+ Rio Branco, AC (06/07/1971)

Raimundo Irineu Serra, mais conhecido como Mestre Irineu, foi o fundador da doutrina religiosa do Santo Daime que usa como sacramento a bebida chamada Ayahuasca, batizada por ele de Daime, associada a orações e cânticos (hinos) a diversas divindades, caracterizando um culto resultante da mistura de diversas religiões e crenças indígenas, africanas e europeias. Predominam, no entanto, o Deus Pai, Jesus Cristo e Nossa Senhora, e os adeptos da doutrina a consideram uma doutrina cristã. Tem também grande influência do espiritismo.

Mestre Irineu era filho do ex-escravo Sancho Martino e Joana Assunção, família humilde, descendentes de escravos que viviam do trabalho de cultivo da terra. Mestre Irineu chegou ao estado do Acre com vinte anos, afro-brasileiro de alta estatura, integrando o movimento migratório da extração do látex em seringais.

Em 1912 foi para Manaus, no Porto de Xapuri, onde residiu por dois anos, indo trabalhar posteriormente nos seringais da Brasiléia durante três anos e, em seguida, em Sena Madureira, onde residiu por mais três anos. Foi ali  no coração das florestas da América do Sul, que o Mestre Irineu cristianizou as tradições caboclas e xamânicas da bebida sacramental Ayahuasca, conhecida desde antes dos incas e rebatizou-a com o nome de Daime, significando, com isso, a invocação espiritual que deveria ser feito pelo fiel, ao comungar com a bebida: Dai-me amor, Dai-me luz, etc.


De volta ao Rio Branco, foi para a Guarda Territorial, até chegar ao posto de cabo, e em seguida participou e passou no concurso para integrar a Comissão de Limites, entidade do Governo Federal que delimitava as fronteiras entre Acre, Bolívia e Peru, órgão este, comandado pelo Marechal Rondon. E foi o próprio Rondon que nomeou Irineu Tesoureiro da Tropa, um cargo de confiança.

Em Rio Branco começou a trabalhar com um pequeno círculo de discípulos. Instalou definitivamente sua família e um grupo de seguidores na localidade denominada Alto Santo.

Posteriormente retornou à floresta, de volta ao seringal, conheceu aquele que tornou-se um grande amigo: Antônio Costa.

Relatos colhidos na região contam que Antônio Costa tomava a bebida, por volta de 1918, com o ayahuasquero peruano Dom Crescêncio Pizango, que se acreditava herdeiro dos conhecimentos de um rei inca de nome Huascar.


Numa reunião com a presença de doze pessoas, a miração estava forte quando o caboclo Pizango se acercou do grupo, de modo que só Irineu percebeu sua presença. A certa altura do trabalho, o caboclo aproximou-se e entrou na cuia grande onde era servida a Ayahuasca, olhou para Irineu e lhe disse para convidar seus companheiros a olhar dentro da cuia, para falarem o que viam. Mas eles olhavam e repetiam que só viam a bebida.

"Só tu tem condições de trabalhar com a Ayahuasca. Ninguém mais está vendo o que tu está vendo", anunciou o caboclo a Irineu, avisando-lhe que ele era o único capacitado para trabalhar com a bebida.

Certo dia, Mestre Irineu tomou a Ayahuasca e foi se deitar na rede. Era uma noite iluminada e muito bela. Sentiu vontade de olhar para a lua, que foi se aproximando até ficar bem pertinho. Dentro da lua, ele avistou uma senhora muito formosa de nome Clara, que lhe disse:

"O que está vendo agora ninguém jamais viu, só tu. Eu vou te entregar esse mundo para tu governar. Tu vais te preparar, porque eu não vou te entregar nada agora. Vai ter uma preparação para ver se tu tens merecer verdadeiramente. Tu vais passar oito dias comendo só macaxeira (mandioca) cozida insossa, com água e mais nada. Também não pode ver mulher, nem uma saia de mulher a mil metros de distância."

Após esta preparação, Mestre Irineu recebeu da Virgem da Conceição, a Rainha da Floresta os fundamentos da Doutrina do Santo Daime, e dentro deste contexto ele determinou o seu futuro, assim como o futuro de todos aqueles que viriam a seguir os seus passos: O povo de Juramidam.

Desde a mais tenra idade que Mestre Irineu conheceu as adversidades da vida, mas a medida que se tornou homem formado e digno de sua herança devota, religiosa, também se aprofundou, se aperfeiçoou e mergulhou nos segredos e mistérios da floresta.

Descendente de escravos, este negro forte e de estatura avantajada, media 1,98m e calçava 48, se casou quatro vezes e deixou um único filho, chamado Walcírio.

O Centro de Iluminação Cristã Luz Universal - Alto Santo, é hoje dirigido por Dona Peregrina Gomes Serra, viúva do Mestre Irineu, e fica na Vila Irineu Serra, no estado do Acre. Graças a ela que nos Trabalhos os Hinos são acompanhados com instrumentos de corda, o violão.

Morte

Na manhã de 06/07/1971, por volta das 09:00 hs, Mestre Irineu se despedia do planeta terra. Com uma forte crise de urina, desmaiou por cima da rede quando tentava urinar. Seguro por Francisco Martins, que gritou pela presença de madrinha Peregrina, o Mestre dava seus últimos suspiros já com uma vela na mão. O clamor e a tristeza tomavam conta da região. Em pouco tempo a notícia ganhava dimensão. O radialista Mota de Oliveira, uma das últimas pessoas curadas pelas mãos de Mestre Irineu, anunciava seu falecimento nas ondas da Rádio Capital. A cidade de Rio Branco parava para ouvir a triste notícia. A irmandade que morava na capital, era tolhida pela notícia da perda. Iniciava-se nas primeiras horas daquela manhã, um dos dias mais tristes da história da Doutrina do Santo Daime.

Providências para a realização do velório foram tomadas. O corpo de Mestre Irineu ficou em sua residência até ser vestido com a farda oficial utilizada pelo grande líder. Na sede, os homens arrumavam os bancos e a mesa central para o ritual de velório. Fardados em branco, todos os irmãos receberam o corpo de Mestre Irineu, perfilados em forma de "V" que significava vitória. Seu caixão foi colocado ao centro, coberto pela Bandeira Nacional, que lhe dava as honras de um Chefe de Estado. Na cidade, o governo Valério Magalhães divulgava nota de pesar ao falecimento do grande líder. Uma crônica lida na rádio também evidenciava o triste acontecimento.


Durante o restante do dia e toda a noite de 06 para 07 de julho, foram cantados os hinários base da Doutrina por ele difundida. A emoção e o sentimento de dor e tristeza era visíveis, principalmente na execução dos hinos do hinário "O Cruzeiro". O semblante de cada seguidor parecia flutuar em um fato que jamais eles esperavam que fosse acontecer naquele momento.

Ao amanhecer, após longas horas de palestras e discursos de autoridades e oradores do centro, acompanhados pela Banda da Polícia Militar, em toque fúnebre, perfilados em fileiras masculinas e femininas, o batalhão cantando os hinos novos, seguia para a morada final escolhida por Mestre Irineu, bem ao lado da residência de Leôncio Gomes da Silva. Todos, de adultos a crianças choravam pela perda. Dona Peregrina Gomes Serra acompanhada de sua mãe e irmãos, recebia os pêsames das autoridades, amigos e admiradores do grande líder. Sentia, mais que todos, naturalmente, a profunda perda do grande companheiro, conselheiro, amigo e esposo. Alguns como o orador Luiz Mendes do Nascimento, chegaram a desmaiar por cima do caixão fechado de Mestre Irineu. A irmandade dava adeus ao Mestre, comovida, os 78 anos de história marcavam aquele momento inesquecível. Os mistérios e encantos de uma vida dedicada à bondade e ao companheirismo. Abria-se um novo capítulo na história daquele povo.

Júlia Kubitschek


JÚLIA COELHO KUBITSCHEK DE OLIVEIRA
(98 anos)
Professora

☼ Diamantina, MG (1873)
┼ Belo Horizonte, MG (01/05/1971)

Júlia Coelho Kubitschek de Oliveira foi uma professora brasileira nascida em Diamantina, MG, em 1873. Foi mãe do presidente brasileiro Juscelino Kubitschek de Oliveira.

Teve como pais Augusto Elias Kubitschek e Maria Joaquina Coelho Kubitschek. Casou-se em 1898, aos 25 anos, com João César de Oliveira com quem teve três filhos: Eufrosina Kubitschek de Oliveira, em 1900, Maria da Conceição Kubitschek de Oliveira em 1901 e, já citado, Juscelino Kubitschek de Oliveira em 12/09/1902.


Apelidada carinhosamente por familiares como Dona Naná, possuía ascendência tcheca. Era neta de um marceneiro checo nascido na Boémia chamado Jan Nepomuscký Kubitschek, que chegou ao Brasil por volta de 1831, o ano em que Dom Pedro I abdicou do trono.

Foi professora primária em Diamantina, MG, por muitos anos.

Em 1905 ficou viúva de João César de Oliveira e teve que criar sozinha seus três filhos. Com a morte do marido, Júlia Kubitschek se mudou para uma casa no interior onde ela e suas crianças viveriam por 11 anos. A residência da família abriga hoje o museu Casa de Juscelino.

Em sua homenagem, seu nome foi dado a um bairro do município de Coronel Fabriciano, MG, e a uma das principais avenidas do centro da cidade de Cabo Frio, RJ.

Fonte: Wikipédia

Rubens Paiva

RUBENS BEYRODT PAIVA
(41 anos)
Político e Engenheiro Civil

☼ Santos, SP (26/12/1929)
┼ Assassinado e Corpo Ocultado (20/01/1971)

Rubens Beyrodt Paiva foi um engenheiro civil e político brasileiro desaparecido durante o regime militar. Era filho de Jaime Almeida Paiva, advogado, fazendeiro do Vale do Ribeira e despachante do Porto de Santos, e de Araci Beyrodt.

Casou-se com Maria Lucrécia Eunice Facciolla, com quem teve cinco filhos: Marcelo Rubens Paiva, escritor e jornalista, além de mais quatro filhas: Vera Silvia Facciolla Paiva (psicóloga e professora), Maria Eliana Facciolla Paiva (jornalista, editora de arte e professora), Ana Lucia Facciolla Paiva (matemática e empresária) e Maria Beatriz Facciolla Paiva (psicóloga e professora).

Formou-se em Engenharia Civil pela Universidade Mackenzie, em São Paulo, em 1954. Militou no movimento estudantil na campanha do "O Petróleo é Nosso". Foi presidente do centro acadêmico e vice-presidente da União Estadual dos Estudantes de São Paulo.

Carreira Política

Sua vida política tomou impulso em outubro de 1962, quando foi eleito deputado federal por São Paulo, na legenda do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB). Assumiu o mandato em fevereiro do ano seguinte e participou da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), criada na Câmara dos Deputados para examinar as atividades do Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais - Instituto Brasileiro de Ação Democrática (IPES-IBAD). A instituição financiava palestrantes e escritores que escreviam artigos avisando sobre a chamada "Ameaça Vermelha" no Brasil. Nas investigações da CPI, Rubens Paiva começou a descobrir os cheques que eram depositados nas contas de alguns militares.

Com o Golpe Militar de 1964, devido ao fato de ter participado da CPI do Instituto Brasileiro de Ação Democrática (IBAD), teve seu mandato cassado no dia 10/04/1964, editado no dia anterior (AI-1) pela junta militar que assumiu o poder a partir da deposição de João Goulart.

Rubens Paiva e Família
O Exílio e a Volta ao Brasil

Rubens Paiva se exilou na Iugoslávia e depois em Paris, França. Passados nove meses, iria para Buenos Aires, se encontrar com João Goulart e com Leonel Brizola, quando em uma escala do vôo no Rio de Janeiro disse à aeromoça que ia comprar cigarro, saiu do avião e pegou outro vôo para São Paulo, seguindo para a casa de sua família. Teria aparecido de surpresa, dizendo: "Entrei no Brasil, estou no Brasil, vou ficar no Brasil". Se mudaram então para o Rio de Janeiro e Rubens Paiva voltou a exercer a engenharia e cuidar de seus negócios, mas sempre fazendo contatos com os exilados.

Fundou com o editor Fernando Gasparian o Jornal de Debates e foi diretor do jornal Última Hora de São Paulo, até o mesmo ser vendido por Samuel Wainer ao Grupo Folha da Manhã, de Octavio Frias de Oliveira, que se expandia.

Depois de estar em visita em Santiago, Chile, para ajudar a filha de seu amigo Bocayuva Cunha, Rubens Paiva voltou para o Brasil. Nisso, após a prisão das pessoas que traziam a carta para Rubens de Helena Bocayuva, antes implicada no sequestro do embaixador americano. Outras cartas trazidas pelas mesmas pessoas fizeram com que os agentes da repressão identificassem Rubens Paiva como contato de "Adriano", codinome de Carlos Alberto Muniz, militante do Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR-8) e contato de Carlos Lamarca, à época o homem mais procurado do país.

Prisão e Desaparecimento

Na esperança de prender "Adriano" e consequentemente chegar à Carlos Lamarca, sua casa no Rio de Janeiro, em 20/01/1971, foi invadida por pessoas armadas de metralhadoras que, sem apresentar qualquer mandado de prisão, se diziam da Aeronáutica. Teve tempo de se arrumar e saiu de terno e gravata, guiando o próprio carro, cuja recuperação posterior seria a prova de que fora preso, já que os órgãos de repressão se negavam a afirmar oficialmente tal ação.

Desde então Rubens Paiva foi dado como desaparecido. Segundo nota oficial dos órgãos de segurança, o carro que o conduziu dois dias depois da prisão ao Centro de Operações de Defesa Interna (CODI) teria sido abalroado e atacado por indivíduos desconhecidos que o teriam sequestrado.

Maria Lucrécia Eunice Facciolla Paiva, sua esposa, permaneceu durante doze dias incomunicável, após haver sido detida com sua filha Eliana, então com 15 anos, esta presa por 24 horas e solta no dia seguinte e deixada, na Praça Saens Peña, na Tijuca.

Eliana e Maria Lucrécia Eunice Paiva foram interrogadas na mesma sala em que as pessoas eram torturadas, tendo visto o pau-de-arara, sangue e o retrato do marido nas fichas de reconhecimento, além de ouvir os gritos dos torturados no DOI-CODI. Entre esse dia e o seguinte, Rubens Paiva foi transferido para o Destacamento de Operações Internas (DOI), situado no Quartel da Polícia do Exército, onde teria sido novamente torturado.

Rubens Paiva possivelmente morreu em seguida por causa dos ferimentos, e com o testemunho do médico do exército Amilcar Lobo. Anos depois, Amilcar Lobo, que na época era médico do DOI-CODI, declarou em reportagem especial à revista Veja que o ex-deputado teria sido morto após sessões de tortura.

Em carta, ainda em 1971, ao Conselho de Defesa dos Direitos Humanos, com base em relato de testemunhas, Eunice Paiva afirmava que provavelmente seu marido começou a ser torturado no mesmo dia de sua prisão, durante o interrogatório realizado na III Zona Aérea, localizada junto ao aeroporto Santos Dumont, no Rio de Janeiro, à época sob o comando do brigadeiro João Paulo Burnier.

O brigadeiro João Paulo Burnier era também acusado de matar Stuart Angel Jones, que teria sido obrigado a "fumar" um escapamento de jipe até morrer.

Rubens Paiva é reconhecido legalmente como morto, mas mesmo com a realização de escavações em locais em que possivelmente teria sido enterrado, seu corpo até hoje não foi encontrado.

Em 1996, após projeto de lei dos Desaparecidos enviado ao Congresso pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso, foi entregue à viúva e família um atestado de óbito reconhecendo a sua morte.

Esclarecimento da Morte

Em fevereiro de 2014, a Comissão Nacional da Verdade denunciou que o assassino de Rubens Paiva foi o ex-tenente do exército Antônio Fernando Hughes de Carvalho, oficial do Centro de Preparação de Oficiais da Reserva (CPOR) ligado ao Centro de Informações de Segurança da Aeronáutica (Cisa), através de depoimento de outro dos envolvidos, o coronel da reserva Armando Avólio Filho, ex-integrante do Pelotão de Investigações Criminais da Polícia do Exército (PIC-PE), presente ao interrogatório e tortura de Rubens Paiva. A morte do ex-deputado se deu nas dependências do Destacamento de Operações de Informações (DOI) do I Exército, na Rua Barão de Mesquita, Tijuca, Zona Norte do Rio de Janeiro. Por seu trabalho na repressão aos subversivos, o tenente Antônio Fernando Hughes de Carvalho, já falecido, foi condecorado com a Medalha do Pacificador em 1971.

No mês seguinte, o jornal carioca O Globo publicou o depoimento de militares envolvidos no caso, sob condição de anonimato. Depois de morto no quartel da Polícia do Exército, entre 20 e 22 de janeiro de 1971, o corpo de Rubens Paiva foi, a princípio, enterrado em lugar ermo do Alto da Boa Vista, próximo à Avenida Edson Passos, mesmo local onde seu carro seria encontrado incendiado, numa operação levada a cabo por oficiais e sargentos do Exército. Dali foi retirado posteriormente, pelo temor de que obras iniciadas na avenida acabassem descobrindo o corpo, e enterrado nas areias da praia do Recreio dos Bandeirantes, Zona Oeste da cidade, então um lugar ainda praticamente desabitado.

Dois anos depois, sob ordens do Gabinete do Ministro, o militar responsável pela operação, o então capitão do exército Paulo Malhães, também envolvido com a tortura, morte e desaparecimento de presos políticos na chamada Casa da Morte, em Petrópolis, região serrana do Estado do Rio de Janeiro, comandou uma equipe de busca na área, formada por cerca de 15 outros militares em roupas civis. Entre eles o capitão José Brant Teixeira, parceiro de diversas outras operações e os sargentos Jairo de Canaan Cony e Iracy Pedro Interaminense Corrêa, encontrou os restos do corpo ensacado de Rubens Paiva enterrado depois de quinze dias, cavando buracos na areia disfarçados de turistas, o retirou, e os restos foram transportados num caminhão até o Iate Clube do Rio de Janeiro, onde foram embarcados numa lancha, levados até alto mar e lançados ao oceano num momento propício das correntes marinhas. Num depoimento posterior à Comissão Nacional da Verdade (CNV), Paulo Malhães negou ter participado pessoalmente desta missão.

O roteiro da prisão, tortura, morte e destino final de Rubens Paiva foi:

  • Preso em casa, no Leblon;
  • Interrogatório e agressões na 3ª Zona Aérea, Aeroporto Santos Dumont, carceragem da Cisa (Centro de Informações da Aeronáutica);
  • Torturado e morto no quartel da Polícia do Exército na Tijuca;
  • Enterrado no Alto da Boa Vista;
  • Desenterrado, transportado e novamente enterrado no Recreio dos Bandeirantes;
  • Desenterrado e levado para o Iate Clube na Urca;
  • Embarcado em lancha e jogado ao largo da costa fluminense.
Estes fatos ocorreram num período de dois anos.

Ana Lucia Facciolla Paiva, Rubens Paiva e Marcelo Rubens Paiva
Homenagens

Em 1992, Telma de Souza, prefeita de Santos, terra natal de Rubens Paiva, o homenageou colocando seu nome no Terminal Municipal de Passageiros, localizado no bairro do Valongo. Na inauguração estavam presentes a viúva e um dos filhos de Rubens Paiva, o escritor Marcelo Rubens Paiva.

Em 24/09/1998, foi inaugurada no bairro da Pavuna a Estação Rubens Paiva do Metrô Rio.

Em 01/03/2012 a Assembléia Legislativa de São Paulo instalou a Comissão da Verdade Rubens Paiva em sua homenagem, comissão criada para investigar violações de direitos humanos no período de 1964 a 1982.

Fonte: Wikipédia
Indicação: Simone Cristina Firmino

Anna Amélia

ANNA AMÉLIA DE QUEIROZ CARNEIRO DE MENDONÇA
(75 anos)
Poetisa, Tradutora e Feminista

* Rio de Janeiro, RJ (17/08/1896)
+ Rio de Janeiro, RJ (1971)

Anna Amélia nasceu no Rio de Janeiro no dia 17 de agosto de 1896,  filha do engenheiro e colecionador José Joaquim de Queiroz Júnior. Passou a infância em uma fazenda no interior de Minas Gerais, onde recebeu instruções de professoras estrangeiras: aprendendo inglês, francês e alemão. Dos 12 aos 14 anos, começou a escrever versos, publicados em 1911, com o título de "Esperanças". Em 1922, publicou seu segundo livro de poemas, "Alma", em 1926, "Ansiedade", em 1936, "A harmonia das Coisas e dos Seres", em 1939, "Mal de Amor", em 1951, "50 Poemas de Anna Amelia" e em 1957, "Todomundo".

Para além de suas atividades literárias, Anna Amélia foi profundamente ativa para o reconhecimento da mulher no Brasil. Dirigiu durante dois anos a página feminina do Diário de Notícias. Foi a primeira mulher a ser membro do Tribunal Eleitoral (1934), fazendo parte também de uma mesa apuradora. Foi nomeada por Getúlio Vargas representante do Brasil no I Congresso Feminista Internacional, da Woman League International, em Istambul, 1935. Nesta época era vice-presidente da Federação Brasileira Pelo Progresso Feminino. Foi delegada do Brasil de 1941 a 1943 na Comissão Interamericana de Mulheres.

Entre estas atividades, Anna Amélia fundou em 1939 a Casa do Estudante do Brasil, sendo por este motivo eleita a "Rainha dos Estudantes Brasileiros". Com sede especialmente construída, a Casa do Estudante do Brasil era uma instituição voltada para o intercâmbio cultural entre os estudantes. Reunindo alguns residentes e muitos associados, o prédio possuía um restaurante, salão de festa e conferência, auditórios para cursos de extensão universitária, biblioteca, apartamentos para professores visitantes, consultórios médico e dentário, farmácia e barbearia. Tinha ainda uma publicação chamada "Rumo", onde eram publicados artigos sobre o ensino, história do Rio de Janeiro e do país, debates de temas atuais e textos literários.

Toda esta estrutura educacional fora idealizada por Anna Amélia, que foi presidente vitalícia da instituição até a sua morte, em 1971. E em retribuição a sua dedicação, a Casa do Estudante do Brasil ergueu, em 1975, o busto em um largo em frente a sua sede, no Castelo. Este largo, no dia da inauguração do busto passou a ser chamado Praça Anna Amélia. A cerimônia foi concorrida e noticiada em quase todos os jornais da cidade. Estiveram presentes ministros, o prefeito da cidade, o secretário de Educação, várias escolas de primeiro grau, o coral do Colégio Pedro II, a família, amigos intelectuais e os dirigentes da Casa do Estudante do Brasil. No discurso de Paschoal Carlos Magno está explícita a intenção da bronzificação.

"Não faltam por aí pessoas sempre dispostas a fundar instituições que se apresentam como beneficentes e, as mais das vezes, prestam serviços a certo grupo de necessitados. Na maioria dos casos, porém, o objetivo principal consiste em promover os fundadores e mantenedores - seja com propósitos eleitorais, seja com finalidade lucrativa. Bem diferente é o caso da Casa do Estudante do Brasil. Ana Amélia que dirigiu a Casa do Estudante até o seu último dia de vida, era uma poetisa ilustre, uma dama de prestígio social e era rica. Não precisava se promover. Só pensou em servir. Seu busto foi agora colocado à frente da Casa. Ela continua, em espírito eterno e em bronze eterno, no lugar que gostava." 

Anna Amélia casou-se com Marcos Carneiro de Mendonça, goleiro e historiador. A partir de 1944 o casal passou a residir em um palacete do século 19 no bairro do Cosme Velho, conhecido como "Solar dos Abacaxis", por conta dos adornos em ferro fundido que ainda hoje decoram a balaustrada das janelas frontais do solar. A mansão foi erguida em 1843 pelo bisavô de Anna Amélia, o comendador Borges da Costa.

Em seu segundo livro "Alma", em 1922, a poetisa introduziu o tema do futebol na poesia brasileira e colaborou a seu modo para difundir e popularizar esse esporte. Ensinava o jogo aos operários da fábrica de seu pai e dava instruções preciosas durante as partidas. Desde muito jovem era entusiasta do esporte: no seu 12º aniversário, pediu aos pais como presente, uma bola, uma botina de sola grossa e começou a treinar.

Anna Amélia e Marcos tiveram três filhos, sendo a mais nova a crítica teatral Bárbara Heliodora.

Anna Amélia é considerada hoje uma expressão importante da literatura brasileira do século XX. Rever a sua vida é resgatar a importância da mulher para a nossa cultura e arte. 

Fonte: Wikipédia e Bolsa de Mulher

Joãozinho da Goméia

JOÃO ALVES DE TORRES FILHO
(56 anos)
Sacerdote do Candoblé de Angola

* Inhambupe, BA (27/03/1914)
+ São Paulo, SP (19/03/1971)

Existem muitas histórias sobre Joãozinho da Goméia. De família católica, chegou a ser coroinha, mas por motivo de saúde, ainda menino João Alves Torres Filho foi iniciado para o mundo do Candomblé na feitura de santo pelo Pai Severiano Manuel. Com a morte de seu Pai-de-Santo, refez o santo no Terreiro do Gantois com Mãe Menininha do Gantois, mudando da nação angola para ketu.

Em 1924 aos 10 anos, o garoto já havia dado mostras de sua personalidade forte. Contra a vontade dos pais, deixou a casa da família para tentar a sorte na capital Salvador. Teve que se virar para sobreviver e foi trabalhar num armazém de secos e molhados, onde conheceu e foi apadrinhado por uma senhora que morava na Liberdade, e que ele considerava sua madrinha. Foi essa senhora quem teve a idéia de levá-lo ao terreiro de Severiano Manoel de Abreu, conhecido como Jubiabá, nome do seu caboclo. Joãozinho sofria de fortes dores de cabeça, que não eram explicadas, nem curadas pelos médicos. Também tinha sonhos com "um homem cheio de penas", que não o deixava dormir.

Para os adeptos do Candomblé, é facil interpretar esse "homem de penas" como Pedra Preta, seu caboclo. Bastou que ele fosse feito, no dia 21 de dezembro de 1931, para que as dores fossem embora. Elas seriam somente um aviso dos Minkisi, que cobravam a iniciação do menino.


Polêmicas

Sempre existiu polêmica, em se tratando de Joãozinho da Goméia, para alguns estudiosos, o Jubiabá que o iniciou não é o mesmo da obra de Jorge Amado. Para outros, João sequer foi feito (iniciado). Porém, há filhos de Joãozinho que contam detalhes de sua feitura, como a Ialorixá Maria José dos Santos, de 92 anos, que declarou ao Correio da Bahia:

"Eu duvido que, se ele fosse vivo, alguém tivesse coragem de questionar isso na frente dele"

Em direção totalmente oposta vai a pesquisadora norte-americano Ruth Landes em seu livro A Cidade das Mulheres:

"Há um simpático e jovem pai Congo, chamado João, que quase nada sabe e que ninguém leva a sério, nem mesmo as suas filhas-de-santo (...); mas é um excelente dançarino e tem certo encanto. Todos sabem que é homossexual, pois espicha os cabelos compridos e duros e isso é blasfemo. – Qual! Como se pode deixar que um ferro quente toque a cabeça onde habita um santo!"

Outra polêmica levantada por Ruth Landes é que João "recebia" um caboclo. Os caboclos não são Orixás, mas espíritos encantados, originários das religiões indígenas, sem relação com a África. Esses Candomblés de caboclo eram alvo do desprezo do povo-de-keto, zelosos de sua "pureza" africana porque, nessa época, havia um empenho por parte de influentes intelectuais comandados por Arthur Ramos e Edison Carneiro em firmar a idéia de que havia nos terreiros keto uma "pureza" com relação às raízes africanas.

O certo é que João foi um homem não só adiante de seu tempo como também dono de um projeto particular de ascensão social e religiosa, buscando a diferença como dado de divulgação de si mesmo e sua "roça": negro que alisava os cabelos por vaidade, sem se preocupar com a polêmica de poder ou não colocar ferro quente na cabeça de um iniciado; homem que não se envergonhava de ser homossexual na homofóbica Bahia do início do século XX; Pai-de-Santo que afrontava os princípios de que homens não podiam "receber" o Orixá em público, tornando-se famoso pela sua dança; incorporava ao Candomblé a entidade indígena do Caboclo Pedra Preta; adepto de Angola, numa cidade dominada pela cultura Jeje-Nagô; Babalorixá jovem, numa cultura dominada por Ialorixás mais velhas o que, segundo seus Filhos-de-Santo, ativou o despeito das mães-de-santo tradicionais da Bahia.

Também sua ascensão precoce era mal-vista no mundo do Candomblé, onde a idade avançada é considerada um atributo importante para a escolha dos sacerdotes – e a própria Mãe Menininha do Gantois sofreu resistências por causa disso, quando assumiu a chefia do seu terreiro aos 26 anos de idade.

Lendas à parte, o caso é que as Ialorixás mais tradicionais não sabiam como encarar as novidades trazidas por Joãozinho. Também não é verdade a afirmação de Ruth Landes de que Joãozinho não era respeitado pelos seus "filhos", a quem na verdade tratava com mão de ferro: era muito autoritário e enérgico.

Seu primeiro terreiro foi num bairro chamado Ladeira de Pedra, mas logo foi para o local que o tornou famoso, a ponto de incorporar o endereço ao próprio nome: Rua da Goméia. Lá, tocava indiferentemente angola e keto, o que contribuía – e muito – para aumentar o escândalo em torno de seu nome.


Irreverência

Em 1948, despediu-se de Salvador com uma festa no Teatro Jandaia, apresentando ao público pagante danças típicas do Candomblé, escândalo final para adeptos baianos, e mudou-se para o Rio de Janeiro, onde abriu casa na Rua General Rondon, nº 360, em Duque de Caxias, Baixada Fluminense.

Nesse endereço a lenda em torno de Joãozinho da Goméia só fez aumentar, atendia políticos, embaixadores, consules, o próprio Getúlio Vargas e a sogra de Juscelino Kubitschek, além de artistas como Ângela Maria, na época a "Rainha do Rádio". Tudo isso fez com que passasse a freqüentar a imprensa.

O próprio João nunca revelou os nomes de seus filhos ou clientes. Seus Filhos-de-Santo que espalharam essas notícias, orgulhosos do status da casa de seu pai. Costas quentes ou não, o caso é que Joãozinho nunca teve seu terreiro invadido pela polícia, nem jamais foi preso, ao contrário de Mãe Menininha do Gantois, que tem registradas duas passagens pela polícia, acusada de "tocar candomblé".

Diz a lenda que Joãozinho até mesmo chegou a fazer despacho para Exu em plena Praça XV. O caso é que tornou-se o primeiro Pai-de-Santo realmente conhecido no Brasil. Sabia do poder da imprensa e manteve relações com publicações importantes como a revista O Cruzeiro, deixando-se fotografar com os trajes dos Orixás.

Em 1956, João participou do carnaval vestido de mulher. O assunto rendeu uma polêmica terrível com outros Babalorixás e chefes de terreiros da Umbanda. João defendeu-se através da revista O Cruzeiro, reivindicando seu direito ao livre-arbítrio e declarando que jamais permitiria que qualquer outro Pai-de-Santo ou Mãe-de-Santo se intrometesse em sua vida.

Participou de shows no Cassino da Urca, apresentando as danças dos Orixás, sempre unanimemente considerado um bailarino de raras qualidades. Chegou a participar do filme Copacabana Moun Amour, de Rogério Sganzerla, no papel de um Pai-de-Santo que faz um Ebó na atriz Helena Ignez.

Teve numerosos Filhos-de-Santo: chegou a fazer um barco com 19 Iaôs, façanha lembrada por todos, dada sua extrema dificuldade de realização. Apesar das brigas com as alas mais conservadoras da religião, eis porque Joãozinho da Goméia é considerado um dos maiores divulgadores da religião dos Orixás no Brasil.

Em 1966, outro momento repleto de contradições: João voltou à Bahia e deu "obrigação" com Mãe Menininha do Gantois. Segundo a Iyalorixá Mãe Tolokê de Logunedé, "foi fazer a obrigação dele; tirar a mão de Vumbi e fazer bodas de prata. (...) Depois, ele fez a festa no Rio de Janeiro, para os filhos que não puderam ir à Bahia."

Ainda segundo seus Filho-de-Santo, Joãozinho da Goméia não apenas fez sua obrigação com Mãe Menininha do Gantois como foi o primeiro homem que ela permitiu que vestisse o Orixá e dançasse em público "virado" no santo. Para entender a importância desse ato (mesmo que apenas mais um aspecto da lenda) é preciso ler em Ruth Landes as restrições que Mãe Menininha do Gantois fazia quanto à apresentação pública de homens em transe.

Porém, é fato que, embora o próprio Joãozinho até o fim da vida continuasse tocando tanto angola quanto keto, a partir desse momento passou a insistir com seus Filhos-de-Santo para que seguissem uma orientação única, optando entre keto e angola.


Morte

Joãozinho da Goméia morreu em São Paulo, dia 19 de março de 1971, no Hospital das Clínicas (Vila Clementino), durante uma cirurgia para retirada de um Tumor Cerebral, e após uma Parada Cardiorrespiratória. Foi sepultado em um cemitério de Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, num dia em que uma chuva de proporções míticas caiu sobre o Rio de Janeiro, exatamente na hora em que seu ataúde baixava à sepultura. Para os adeptos, uma manifestação de Iansã recebendo seu filho, que culminou com muita gente "virando no santo" em pleno cemitério. A passagem foi relatada na revista O Cruzeiro.

A Goméia do Rio de Janeiro foi vendida para uma incorporadora, que no local construiu um prédio. Os assentamentos de Joãozinho da Goméia foram transferidos para uma nova Goméia, em Franco da Rocha, São Paulo, onde os ibás de seu Oxóssi e de sua Iansã estão sendo devidamente cuidados e "alimentados", e podem ser visitados pelos adeptos que fazem parte da família de santo.

Fonte: Wikipédia

Stuart Angel Jones

STUART EDGARD ANGEL JONES
(25 anos)
Militante do Movimento Revolucionário 8 de Outubro

* Salvador, BA (11/01/1946)
+ Rio de Janeiro, RJ (14/06/1971)

Foi um integrante da luta armada contra a Ditadura Militar no Brasil e militante do Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR-8), preso, torturado, morto e dado como desaparecido político brasileiro.

Stuart era filho do americano Norman Jones e de Zuleika Angel Jones, mais conhecida como Zuzu Angel, figurinista e estilista conhecida internacionalmente.

Bicampeão carioca de remo pelo Clube de Regatas Flamengo na adolescência, ele foi estudante de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Possuía dupla nacionalidade, brasileira e americana.

Na virada das décadas de 60/70, passou a militar no Movimento Revolucionário 8 de Outubro, grupo de extrema-esquerda que fazia a luta armada contra o Regime Militar, onde usava os codinomes Paulo e Henrique.

Preso, torturado e morto por membros do Centro de Informações de Segurança da Aeronáutica (CISA) em 14 de junho de 1971, aos 25 anos de idade. Foi casado com a também militante e guerrilheira Sônia Maria de Moraes Angel Jones, presa, torturada e morta dois anos depois e também dada como desaparecida.

Morte

Preso próximo a seu aparelho, no bairro do Grajaú, perto da Avenida 28 de Setembro, na Zona Norte do Rio de Janeiro, Stuart foi levado pelos agentes do Centro de Informações de Segurança da Aeronáutica (CISA) à Base Aérea do Galeão para interrogatório. Dele, os militares queriam a informação da localização do ex-capitão Carlos Lamarca, chefe do Movimento Revolucionário 8 de Outubro e então o grande procurado pelo regime. Negando-se a falar, Stuart Angel Jones foi então barbaramente torturado no pátio da base, vindo a morrer em consequência dos maus tratos.

A versão mais conhecida e aceita de sua tortura e morte foi dada pelo ex-guerrilheiro Alex Polari, também preso na base, e que assistiu da janela de sua cela as torturas feitas contra Stuart, presenciando inclusive a cena em que ele foi arrastado por um jipe militar, com o corpo completamente esfolado e com a boca no cano de descarga do veículo, pelo pátio interno do quartel, o que causou sua morte por asfixia e envenenamento por gás carbônico. Alex Polari escreveu uma carta a Zuzu Angel contando-lhe o ocorrido com o filho. De posse dela, a estilista denunciou o assassinato de Stuart - que tinha cidadania brasileira e americana - ao senador Edward Kennedy, que levou o caso ao Congresso dos Estados Unidos.

O livro Desaparecidos Políticos, de Reinaldo Cabral e Ronaldo Lapa, aponta duas versões para o desaparecimento do corpo do guerrilheiro:

"A primeira é de que teria sido transportado por um helicóptero da Marinha para uma área militar localizada na Restinga de Marambaia, na Barra de Guaratiba, próximo à (então) zona rural do Rio de Janeiro, e jogado em alto-mar pelo mesmo helicóptero. Mas, de acordo com outras informações, o corpo de Stuart teria sido enterrado como indigente, com o nome trocado, num cemitério de um subúrbio carioca, provavelmente Inhaúma."

Os responsáveis, segundo eles:

"Os brigadeiros João Paulo Burnier e Carlos Afonso Dellamora, o primeiro, chefe da Zona Aérea e, o segundo, comandante do CISA; o tenente-coronel Abílio Alcântara, o tenente-coronel Muniz, o capitão Lúcio Barroso e o major Pena - todos do mesmo organismo; o capitão Alfredo Poeck – do Centro de Informações da Marinha (CENIMAR); Mário Borges e Jair Gonçalves da Mota - agentes do Departamento de Ordem Política e Social (DOPS)".

Pelos anos seguintes, a mãe de Stuart, Zuzu Angel, peregrinou pelo poder militar tentando conseguir explicações e informações sobre o corpo do filho, oficialmente dado como desaparecido. Sua campanha chegou ao mundo da moda, na qual tinha destaque, com desfiles de coleções feitas com roupas estampadas com manchas vermelhas, pássaros engaiolados e motivos bélicos. O anjo, ferido e amordaçado em suas estampas, tornou-se também o símbolo do filho. Zuzu Angel chegou a realizar em Nova York um desfile-protesto, no consulado do Brasil na cidade.

Usando de sua relativa notoriedade internacional, ela envolveu celebridades de Hollywood que eram suas clientes, como Joan Crawford, Liza Minelli e Kim Novak, em sua causa, e durante a visita de Henry Kissinger, então secretário de estado norte-americano, ao Brasil, chegou a furar a segurança para entregar-lhe um dossiê com os fatos sobre a morte do filho, também portador da cidadania americana.

Zuzu Angel morreu em 1976, num acidente de automóvel nunca devidamente explicado no bairro de São Conrado, Rio de Janeiro, sem jamais conseguir descobrir o paradeiro do corpo de Stuart Angel.

Cinema e Literatura

Em 2006, a vida de Stuart Angel Jones e de sua mãe foram levadas ao cinema, com o filme Zuzu Angel, dirigido por Sérgio Rezende, com Daniel de Oliveira e Patrícia Pillar no papel do militante-guerrilheiro e da estilista.

O escritor José Louzeiro escreveu o romance "Em Carne Viva", com personagens e situações que lembram o drama da morte de Stuart Angel.

Stuart Jones é patrono da Juventude Revolucionária 8 de Outubro, seção de jovens do Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR-8), hoje uma facção política integrante do Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB).

Fonte: Wikipédia