Mostrando postagens com marcador 1924. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador 1924. Mostrar todas as postagens

Tia Ciata

HILÁRIA BATISTA DE ALMEIDA
(70 anos)
Cozinheira e Mãe de Santo

* Santo Amaro da Purificação, BA (11/01/1854)
+ Rio de Janeiro, RJ (11/04/1924)

Hilária Batista de Almeida, conhecida como Tia Ciata, foi uma cozinheira e mãe de santo brasileira. Foi a mais famosa de todos as baianas, a mais influente, relembrada em todos os relatos do surgimento do samba carioca e dos ranchos, onde seu nome aparece gravado SiataCiata ou Assiata. Foi iniciada no candomblé em Salvador por Bangboshê Obitikô, era filha de Oxum. No Rio de Janeiro era Iyakekerê na casa de João Alabá

Seu nome, afirmado por seus descendentes e que figura nos livros que se referem à baiana, quando escrito por extenso, é Hilária Batista de Almeida. Entretanto, no seu atestado de óbito, está como Hilária Pereira de Almeida, e numa petição para sócio do Clube Municipal encaminhada por seu filho João Paulo em 1949, este escreve o nome da mãe como Hilária Pereira Ernesto da Silva. Dúvidas documentais sem maior importância.

Também ficou marcada como uma das principais animadoras da cultura negra nas nascentes favelas cariocas. Ela era a dona de uma casa onde se reuniam sambistas e onde foi criado "Pelo Telefone", o primeiro samba gravado em disco, assinado por Donga e Mauro de Almeida, na voz do cantor Bahiano, nascido também em Santo Amaro da Purificação.

Tia Ciata nasceu em Santo Amaro da Purificação em 13/01/1854. Foi a mais famosa das tias baianas, que eram na maioria Iyalorixás do candomblé que deixaram Salvador por causa das perseguições policiais, do início do século. Eram negras baianas que foram para o Rio de Janeiro especialmente na última década do século XIX e na primeira do século XX para morar na região da Cidade Nova, do Catumbi, Gamboa, Santo Cristo e arredores.

Em 1876, com 22 anos, chegou ao Rio de Janeiro, indo morar inicialmente na Rua General Câmara. Tempos depois, se mudou por conveniência para as vizinhanças de um dos líderes da colônia baiana no Rio de Janeiro, Miguel Pequeno, marido de Dona Amélia do Kitundi, na Rua da Alfândega, 304. Com 22 anos, Tia Ciata trouxe o Samba de Roda para o Rio de Janeiro.

Tia Ciata e Tia Josefa
Logo na chegada ao Rio de Janeiro, conheceu Noberto da Rocha Guimarães com o qual se envolveu e acabou ficando grávida de sua primeira filha, lhe dando o nome de Isabel. O caso dos dois não foi adiante. Ela acabou se separando de Noberto e, para sustentar a filha, começou a trabalhar como quituteira na Rua Sete de Setembro, sempre paramentada com suas vestes de baiana. Era na comida que ela expressava suas convicções religiosas, ou seja, a sua fé no candomblé, religião proibida e perseguida naqueles tempos. Ia para o ponto de venda com sua roupa de baiana uma saia rodada e bem engomada, turbante e diversos colares (guias ou fio-de-contas) e pulseiras sempre na cor do orixá que iria homenagear. O tabuleiro era famoso e farto, repleto de bolos e manjares que faziam a alegria dos transeuntes de todas as classes sociais.

Mais tarde, Tia Ciata casou-se com João Batista da Silva, que para aquela época era um negro bem-sucedido na vida. Deste casamento resultaram 14 filhos, uma relação fundamental para a sua afirmação na Pequena África, como era conhecida a área da Praça Onze nesta época.

Recebia todos os finais de semana em sua casa, nos pagodes, que eram festas dançantes, regadas a música da melhor qualidade e claro seus quitutes. Partideira reconhecida, cantava com autoridade respondendo aos refrões das festas, que se arrastavam por dias. Tia Ciata cuidava para que a comida estivesse sempre quente e saborosa e o samba nunca parasse.

Foi em sua casa que se reuniram os maiores compositores e malandros, como Donga, Sinhô e João da Baiana, para saraus. A hospitalidade dessas baianas fornecia a base para que os compositores pudessem desenvolver no Rio de Janeiro. A casa da Tia Ciata na Praça Onze era tradicional ponto de encontro de personagens do samba carioca, tanto que nos primeiros anos de desfile das escolas de samba, era "obrigatório" passar diante de sua casa.

Normalmente, a polícia perseguia estes encontros, mas Tia Ciata era famosa por seu lado curandeiro e foi justamente um investigador e chofer de polícia, conhecido como Bispo que proporcionou a ela uma interessante história envolvendo o presidente da República, Wenceslau Brás. O presidente estava adoentado em virtude de uma ferida na perna que os médicos não conseguiam curar e este investigador então disse ao presidente que Tia Ciata poderia curá-lo. Feito isto, foi falar com ela, dizendo:


- Ele é um homem, um senhor do bem. Ele é o criador desse negócio da Lei de um dia não trabalha...

E ela respondeu:

- Quem precisa de caridade que venha cá!

Ela então incorporou um Orixá que disse aos presentes haver cura para a tal ferida e recomendou a Wenceslau Brás que fizesse uma pasta feita de ervas que deveria ser colocada por três dias seguidos. O presidente ficou bom e em troca ofereceu a realização de qualquer pedido. Tia Ciata respondeu que não precisava de nada, mas que seu marido sim, pedindo para o presidente um trabalho no serviço público, "pois minha família é numerosa", explicou ela.

Além dos doces, Tia Ciata alugava as roupas de baiana para os teatros, para que fossem usados como figurinos de peça e para o Carnaval dos clubes. Nesta época, mesmo os homens, se vestiam com as suas fantasias, se divertindo nos blocos de rua. Com este comércio, muita gente da Zona Sul da cidade, da alta sociedade, ia à casa da baiana e passando assim a frequentar as suas festas. Era nessas festas que Tia Ciata passou a dar consultas com seus Orixás. Sua casa é uma referência na história do samba, do candomblé e da cidade.

Em 1910, morreu seu marido João Batista da Silva, mas ela já havia conquistado o seu lugar de estrela no universo do samba carioca. Era respeitada na cidade, coisa de cidadão, muito longe da realidade comum dos negros de sua época.

Todo o ano, durante o Carnaval, armava uma barraca na Praça Onze, reunindo desde trabalhadores até a fina flor da malandragem. Na barraca eram lançadas as músicas, as conhecidas marchinhas, que ficariam famosas no Carnaval do Rio de Janeiro.

Tia Ciata morreu no Rio de Janeiro, em 1924, aos 70 anos, mas até hoje é parte fundamental da memória do samba. Curiosamente, existem pouquíssimas imagens de dela.

Pinto Martins

EUCLIDES PINTO MARTINS
(31 anos)
Aviador

* Camocim, CE (15/04/1892)
+ Rio de Janeiro, RJ (12/04/1924)

Euclides Pinto Martins foi um aviador brasileiro. Ainda jovem e em fins de 1922 foi escolhido como parte da tripulação do avião Dornier DO-X fretado pelo jornal The New York World, que patrocinava a tentativa de uma viagem aérea pioneira entre as Américas do Norte e do Sul. Nasceu em Camocim, CE, no dia 15/04/1892. Entretanto, só foi batizado três meses depois, em 28/07/1892, na Igreja Matriz de  Macau, RN. O fato ocorreu porque seu pai, Antônio Pinto Martins, natural de Mossoró, RN, foi convidado para representar a Companhia de Salinas Mossoró Assú, em Macau. Por isso, Pinto Martins foi batizado na Matriz de Macau e registrado no Cartório Civil daquela cidade.

Sua mãe chamava-se Maria Araújo do Carmo Martins e dedicou-lhe muito amor e carinho. Pinto Martins era um menino  bem criado e de inteligência incomum. Aos cinco anos já começava a estudar na escola pública local. Três anos depois, em agosto de 1900,  seus pais se mudaram para Natal  e o jovem teve que continuar seus estudos primários no Colégio Americano, conhecido como Colégio das Capas Verdes.

Em 1903, já com onze anos, se transferiu para o Colégio Atheneu Norte Rio Grandense e, paralelamente, ingressou num curso noturno de náutica. Observem aí o seu gosto pelas viagens e aventuras.

Em 1907 embarcou no navio Maranhão saindo no ano seguinte, para ser segundo piloto do navio Pará. Infelizmente, um acidente de bordo interrompeu esta rápida carreira naval e, Pinto Martins, com problemas na carótida, desembarcou em Natal sendo aconselhado pelos médicos a abandonar a carreira.

No início de 1909, seu pai o mandou para os Estados Unidos com US$ 300,00 e uma recomendação para que uma empresa de amigos lhe repassasse uma certa quantia mensal para sua manutenção. Pinto Martins não perdeu tempo e matriculou-se no Drexell Institute na Filadélfia onde, três anos depois se formou em Engenharia Mecânica.

Além de estudar, Pinto Martins trabalhava como estagiário na Baldwin Locomotive, uma fábrica de vagões. Ali, o jovem  aprendeu a falar inglês rapidamente e se inseriu na sociedade local, conquistou uma namorada e se casou com Gertrudes Mc Mullan.

Pinto Martins regressou ao Brasil logo após a formatura em 1911. Desembarcou  do navio Booth Line, em Fortaleza. Convidado por seu pai, viajou para Natal, onde passou a trabalhar como engenheiro na Inspetoria Federal de Obras Contra a Seca e na Estrada de Ferro.

Como seu pai era maçom, Pinto Martins acompanhou-o e ingressou na loja maçônica "21 de Março".

Em Natal,  nasceu em 1914 sua primeira filha, Ceres, que viria a morrer, tragicamente, aos 31 anos de idade num acidente de avião em Porto Rico, com seu marido.

A vida de Pinto Martins foi marcada por constantes viagens e mudanças. No final da I Guerra Mundial, 1917, ele se mudou para Recife, PE, onde viveu por 2 anos. Ali, ingressou na Loja "Segredo e Amor"  (Loja Maçônica). A maçonaria foi outro fato marcante na vida de Pinto Martins.

Em 1918, faleceu sua jovem esposa e Pinto Martins, muito sentido,  retornou aos Estados Unidos. Apesar da dor da perda, acalentava no peito o desejo de uma grande aventura entre o Brasil e os Estados Unidos.

Procurou parcerias e acabou se associando a  Ladislau do Rego, que juntos, compraram um navio com  a idéia de criar, no Brasil, uma companhia de navegação de cabotagem. Lamentavelmente, o negócio não deu certo, pois o navio afundou.

Pinto Martins permaneceu nos Estados Unidos enquanto seu sócio neste negócio fracassado, voltou ao Brasil, terminando assim sua primeira tentativa de fazer algo grandioso.

Pinto Martins não esmoreceu, casou-se novamente com a americana Adelaide Sulivan. Adelaide era advogada e doze anos mais velha que seu marido, tendo lhe dado em 1920, uma filha: Adelaide Lillian.

Sampaio Correia II
O Avião

Euclides Pinto Martins não se conformou apenas com a navegação marítima. Colocou seu foco na aviação que se desenvolvia de forma espetacular por causa da guerra. Como parte desta idéia, entrou num curso de aviação e conseguiu o brevet de piloto em 1921. Com sua entrada no meio aeronáutico, conheceu  um veterano na área, Walter Hilton, instrutor de vôo na Flórida.

Com este novo amigo e a afinidade de idéias, Pinto Martins resolveu confidenciar a respeito de um velho sonho: Atravessar o Atlântico numa viagem de avião New York - Rio de Janeiro, desbravando assim essa rota aérea. A idéia encontrou eco na mente de seu colega e, juntos, começaram a trabalhar. Lutaram com força de vontade e, finalmente, conseguiram um banqueiro, Andrew Smith Jr., que asseguraria verbas para o atrevido projeto.

Assim, contrataram da Fábrica Curtis, um hidroavião biplano com 28 metros de envergadura e dois motores Liberty de 400 hp, cada. A máquina voadora pesava 8000 kg. Depois do avião pronto decidiram batizá-lo de Sampaio Corrêa em homenagem  ao senador e presidente do Aeroclube do Rio de Janeiro.

A tripulação era composta pelo piloto Walter Hinton, co-piloto Pinto Martins, mecânico de bordo Jonh Edward Wilshusen, da Fábrica Curtiss, e para retratar a travessia George Thomas Bye, jornalista do New York Word e o cinegrafista John Thomas Baltzel da Pathé News.


A Viagem

O hidroavião com sua equipe deveria decolar no dia 16/08/1922, mas ao colocá-lo no Rio Hudson, houve uma pequena avaria na asa esquerda, adiando então sua partida. Por fim, no dia 17/08/1922, decolou do estuário do Hudson o majestoso Sampaio Corrêa, aplaudidos por milhares de pessoas.

A meteorologia que iniciava seus estudos, previa riscos de tempestades mas a equipe, afoita, não se importou e decolou  sumindo no horizonte, assistidos das margens do Rio Hudson entre as ilhas de Manhatam e New Jersey. Logo abaixo o depoimento da Revista Semana do Rio de Janeiro, sobre a decolagem:

"A Doca do North River, diante da Rua 86, parecia mais um formigueiro humano. Mais de um milhão de pessoas havia se aglomerado de encontro ao cais com os olhos fixos no grande pássaro mecânico. O hidroavião Sampaio Corrêa, pintado de novo, ostentava nos flancos as bandeiras consteladas das duas grandes repúblicas irmãs. Às 15:00 horas contadas uma por uma nos relógios da cidade, os possantes motores começaram a roncar soturnamente. Com quatro  ou cinco manobras hábeis o aparelho movia-se, evoluía entre embarcações apinhadas de gente, procurando a parte mais ampla e livre do rio. Houve então um prodígio. Erguendo-se daquele milhão de almas em desatino, dez talvez cem milhões de vivas atroaram os ares. Concentraram-se neles, durante largo tempo, todos  os rumores da metrópole tumultuosa e fervilhante. New York que palpitou naquele brado, partido daquelas bocas de todas as idades, de todos os feitios, de todas as condições. Dir-se-ia que era a boca da cidade que gritava".    

A verdade é que, apesar de saberem estar na época de grandes temporais, nossos afoitos aventureiros, se atreveram a iniciar a viagem. Neste mesmo dia, 17/08/1922,  o avião foi obrigado a pousar em Nanten, por causa de um forte temporal. Pernoitaram ali, e decolaram de manhã com destino a Southport,  onde chegaram dia 19/08/1922. Prosseguiram viagem e dia 20/08/1922 chegaram em Charlston, sem dificuldades. Reiniciaram a viagem e tiveram que pousar em West Palm Beach devido a outro temporal. Partiram dia 21/08/1922 às 11:00 horas e amerissaram em Nassau, onde pernoitaram, seguindo de manhã com destino a Porto Príncipe no Haiti. Neste trecho foram surpreendidos por forte borrasca, perderam altitude e caíram no mar por volta das 20:00 hs, ao leste da ilha de Cuba, além do Cabo Maisi.

As coisas nesta noite ficaram pretas. Eles estavam em pleno Atlântico, escuridão total, riscos de tubarões e afogamento. Felizmente, não ficaram feridos na queda. O Sampaio Corrêa ainda flutuava e eles localizaram as pistolas sinalizadoras, encontradas com dificuldades no escuro. Assim os fogos de artifícios  iluminaram os céus do oceano, naquela noite, num desesperado pedido de socorro. Lamentavelmente, estes  sinais não foram vistos...

A situação tendia a complicar, pois no avião entrava água por buracos feito pela colisão com o mar. Foi neste clima de preocupação, que Pinto Martins com seus bons conhecimentos de náutica, lembrou-se que tinham uma lanterna grande, a qual achou numa parte do avião, ainda seca. O jovem intrépido subiu no nariz da nave naufragando e passou a  fazer sinais luminosos de socorro. Não demorou muito, pois perto dali, a Canhoneira da Marinha Americana Denver, viu os sinais luminosos e apitou, seguindo em socorro dos náufragos. Foram feitas tentativas, em vão, de rebocar o Sampaio Corrêa que acabou indo para o fundo do mar sob os olhares tristes dos aventureiros.

O próprio Pinto Martins deu a seguinte declaração ao Jornal do Brasil:

"... Sendo piores possíveis as condições atmosféricas, os aparelhos de altitude perderam a precisão. Reinava forte cerração e quando acreditávamos estar muito acima do nível das águas, nela batemos com violência. Com a força do choque o aparelho furou e foi invadido pela água..."

Avião perdido, os náufragos foram levados para a Base Naval de Guantânamo, em Cuba. Pinto Martins e seus amigos não enfraqueceram, continuaram com a idéia de provar que uma rota aérea ligando as Américas (norte e sul) era viável. Assim, acabaram conseguindo que o jornal The New York Word lhes dessem um outro avião para continuarem a viagem. Viajaram para Flórida, Escola Naval de Pensacola, onde outro avião adquirido pelo jornal os esperava. Era um hidroavião com seis anos de uso, que pertenceu a Base. Graças a esta doação, em 04/09/1922, em São Petersburgo,  na Flórida, receberam a nave e batizaram-na de Sampaio Corrêa II.

Nossos aventureiros continuavam afoitos e logo decolaram da Flórida, pousando em Porto Príncipe no Haiti em 07/09/1922. Ali, com problemas  no sistema de  refrigeração do avião ficaram 30 dias parados, até que peças de reposição chegassem de navio vindo dos Estados Unidos. Em 07/10/1922 decolam novamente com destino a São Domingos, República Dominicana, onde pernoitaram, seguindo para Porto Rico.

Continuaram a viagem chegando em Guadalupe e partiram para Martinica onde pousaram em 12/10/1922. Avião no ar novamente, com muitas dificuldades causadas por chuvas, chegaram em Port Spain, Trindad e Tobago, no dia 15/10/1922. Ali, perderam mais 30 dias com troca de hélices e outros consertos.

Em 21/11/1922, decolam para Georgetown na Guiana Inglesa, dali para Paramaribo, Guiana Holandesa, Caiena , Guiana Francesa e, finalmente em 01/12/1922, pousaram no Brasil, no Estado do Pará, no Rio Cunani, ao norte da foz do Rio Amazonas.

O episódio foi posteriormente narrado pelo próprio Pinto Martins a um repórter do jornal O Estado do Pará:

"Quando levantamos vôo de Caiena encontramos forte temporal pela proa. Rompemos o mau tempo com dificuldade, mas tivemos de procurar abrigo. Tomei a direção do aparelho (ele era co-piloto) e depois de reconhecer o Rio Cunani aí descemos às 3:30 hs. O tempo, lá fora, era impetuoso e ameaçador. Não nos foi possível prosseguir e passamos a noite matando mosquitos e com bastante fome, pois não contávamos interromper a rota…"

Os rapazes ávidos por aventuras, e estas não faltavam, prosseguiram para a Ilha de Maracá, Belém, e Bragança onde obrigados por um temporal, pousaram no Rio Caeté. Passaram três dias em Bragança seguindo viagem para São Luis, MA.

Às 12:00 hs do dia 14/12/1922, o Sampaio Correia II desceu na Baia de São Marcos, desembarcando na ilha de São Luis, no Maranhão, onde ficaram até dia 19/12/1922.

Finalmente, quatro horas e meia após a decolagem, dia 19/12/1922, pousaram em Camocim, terra natal de Pinto Martins. Depois das muitas já conhecidas homenagens, partiram no dia seguinte para Aracati, sem pousar em Fortaleza por dificuldades de amerissagem nas águas agitadas da enseada do Mucuripe.

Pernoitaram em Aracati e voaram para Natal onde dormiram um sono reparador. Logo bem cedinho, decolaram em direção ao sul. Mal viajaram 50 milhas quando o motor de bombordo apresentou um problema. Estavam sobrevoando ainda o território Potiguar, perto de Conguaretama, Bahia Formosa, e uma grave pane no motor esquerdo  os forçou a amerissar na citada Baía. Analisado o motor descobriram que algumas engrenagens estavam irremediavelmente danificadas e tinham que ser substituídas. Só conseguiram o conserto das peças em Recife, PE. Pinto Martins, que havia viajado para resolver o problema, retornou dias depois com as peças para reparar o motor.

Foi com muita dificuldades que decolaram de Bahia Formosa, rumo a Recife. Nova pane os forçou descer em Cabedelo, sendo que desta vez a coisa era bem pior. A viagem quase terminou por ali, não fosse o Comandante da Aviação Naval, Capitão de Mar e Guerra, Protógenes Guimarães que, vendo a situação desesperadora dos viajantes com o motor irrecuperavelmente danificado, doou-lhes um novo. Esta simpática doação possibilitou a continuação da viagem.

O futuro mostraria que este Comandante teria pela frente uma bela carreira e chegaria a ser Ministro da Marinha.

Trocado o malfadado motor, eles decolaram de Cabedelo e pousaram no Recife. Ali, como em todos os lugares que pararam, foram muito bem recebidos, com festas, visita ao Governador, enfim, todas as honrarias de heróis. Pinto Martins, em Recife, teve a alegria de abraçar seu pai e suas duas irmãs, Abgail e Carmen. Daí para frente, a viagem seria tranquila pois estavam no nordeste e a possibilidade de mal tempo era mínima.

Ficaram em Recife por 3 dias e seguiram viagem às 11:00 hs rumo a Alagoas, pousando em Maceió onde permaneceram até o dia seguinte. Dali até Salvador, após as festas costumeiras, foram apenas 3:50 hs. Na capital baiana, as festas e homenagens foram muitas. Autoridades diversas, inclusive o Cônsul Americano que prestigiou as cerimônias de saudações aos conquistadores da travessia.

Partiram no fim de semana, 04/02/1923, às 12:55 pousando em Porto Seguro às 16:30 hs. Após reabastecer o avião e tendo tido uma noite tranquila, partiram às 8:50 hs para Vitória no Espírito Santo. Eram 12:12 hs quando tiveram inícios as festividades de  recepção aos viajantes.

Walter Hilton e Euclides Pinto Martins
A Chegada

Faltava pouco para a chegada ao Rio de Janeiro e era necessário programar pois, uma esquadrilha da Aviação Naval, planejava escolta-los ao local da chegada. Autoridades estariam presentes, afinal seria a grande conquista de uma rota que viria a ser explorada, no porvir, por grandes empresas da aviação mundial.

Partiram, ansiosos, às 12:30 hs, com destino a Cabo Frio e depois ao Rio de Janeiro. Amerissaram em Cabo Frio às 15:15 hs em 07/02/1923 de fevereiro onde pernoitaram.

Às 10:35 hs decolaram voando sobre Araruama, Saquarema, Maricá e demais localidades costeiras fluminenses. Finalmente, às 11:32 hs do dia 08/02/1923, o avião é avistado sobrevoando a  Baía da Guanabara.

Ao pousar foram recebidos na lancha Independência do Ministério da Marinha onde o primeiro a ser abraçado pelo Senador Sampaio Correia foi Pinto Martins seguido por Hilton, o piloto, George Thomas, o jornalista e por fim o cinegrafista, John Thomas que, afinal, filmava o evento.
  
Vários dias de festas e glórias  aconteceram no Rio de Janeiro.

Viajou à Europa, voltou ao Rio de Janeiro e iniciou negociações para explorar petróleo.


Morte

Apesar de tantas glórias, Euclides Pinto Martins teve muitas dificuldades consequentes de suas aventuras. Dívidas adquiridas precisavam ser pagas. Após o "Raid", a fama e a glória, ele sentia o peso de ser um homem comum e com pouco dinheiro. Sua mulher se recusava a morar no Brasil e entrou com a ação e divórcio. Estava sendo pressionado para pagar o dinheiro emprestado para financiar o evento, U$19.000. Foi neste clima que, tristemente, encontraram  Pinto Martins  morto em seu quarto com um tiro na cabeça vitimado talvez por uma crise de depressão. Era o dia 12/04/1924, pouco mais de um ano depois de tão glorioso feito.

Nada mais se sabe a respeito de sua morte dada oficialmente como suicídio. Em profundo respeito a este grande conquistador nos limitaremos a reproduzir as palavras de seu pai sobre seu desaparecimento:

"Está provado que ele chegou a este estado de desespero levado por privações muito cruéis... Sua morte foi conseqüência da dignidade e altivez de seu caráter..."

Até hoje o episódio não está bem explicado, mas Monteiro Lobato, em seu livro "Escândalo do Petróleo e do Ferro", sustenta que Pinto Martins foi vítima dos poderosos lobbies interessados em atrasar o desenvolvimento brasileiro.

Em 1952, atendendo as aspirações dos seus conterrâneos, o presidente Café Filho sancionou lei no Congresso Nacional oficializando o nome de Pinto Martins para o aeroporto da capital cearense, que atualmente chama-se Aeroporto Internacional Pinto Martins. Justiça, mas ainda pequena, para o homem dinâmico que na década de 20 soube antever a importância econômica da ligação aérea regular entre os Estados Unidos e o Brasil. E que teve coragem de investir na exploração de petróleo, no Brasil, quando isso era por todos apontado como uma loucura. Sobre a relação de Pinto Martins com a exploração do petróleo, há algumas informações adicionais no livro de Monteiro Lobato "O Escândalo do Ferro e do Petróleo", que o coloca como um dos mártires dos estudos de prospecção de petróleo no país. A viagem New York - Rio de Janeiro também era considerada loucura, mas ele a concluiu.

A população de Camocim, CE, sua terra natal, considera-o um herói por seu ato de coragem e pioneirismo.

Nilo Peçanha

NILO PROCÓPIO PEÇANHA
(56 anos)
Político e Presidente do Brasil

* Campos dos Goytacazes, RJ (02/10/1867)
+ Rio de Janeiro, RJ (31/03/1924)

Nilo Procópio Peçanha foi um político brasileiro. Assumiu a Presidência da República após o falecimento de Afonso Pena, em 14/06/1909, e governou até 15/11/1910. Foi o primeiro mulato presidente do Brasil.

Primeiros Anos

Nilo Peçanha nasceu em 02/10/1867 em Campos dos Goytacazes, Rio de Janeiro, era filho de Sebastião de Sousa Peçanha, padeiro, e de Joaquina Anália de Sá Freire, descendente de uma família importante na política norte fluminense. Teve quatro irmãos e duas irmãs. A família vivia pobremente em um sítio no atual distrito de Morro do Coco, Campos dos Goytacazes até que se mudaram para o centro da cidade quando Nilo Peçanha chegou na idade escolar. Seu pai era conhecido na cidade como "Sebastião da Padaria".

Nilo Peçanha cursou o primeiro grau estudantil em sua cidade natal, completou os estudos na capital fluminense e se formou em direito pela Faculdade de Direito do Recife, em Pernambuco. Foi descrito como sendo mulato e frequentemente ridicularizado na imprensa em charges e anedotas que se referiam à cor da sua pele. Durante sua juventude, a elite social de Campos dos Goytacazes chamava-o de "O mestiço de Morro do Coco".


Carreira na Política

Em 1921, quando concorreu à Presidência da República como candidato de oposição, cartas atribuídas falsamente ao candidato governista, Arthur Bernardes, foram publicadas na imprensa e causaram uma crise política pois insultavam o ex-presidente marechal Hermes da Fonseca, representante dos militares, e também Nilo Peçanha, outro ex-presidente, que era xingado de mulato. Gilberto Freyre, escrevendo sobre futebol, usou-o como paradigma do mulato que vence usando a malícia e escondendo o jogo mencionando que "o nosso estilo de jogar (…) exprime o mesmo mulatismo de que Nilo Peçanha foi até hoje a melhor afirmação na arte política".

Alguns pesquisadores afirmam que suas fotografias presidenciais eram retocadas para branquear sua pele escura. Alberto da Costa e Silva disse que Nilo Peçanha foi apenas um dos quatro presidentes brasileiros que esconderam os seus ancestrais africanos, sendo os outros Campos Sales, Rodrigues Alves e Washington Luís. Já o presidente Fernando Henrique Cardoso confirmou ser descendente de uma escrava.

Abdias do Nascimento afirmou que, apesar de sua tez escura, Nilo Peçanha escondeu suas origens africanas e que seus descendentes e família sempre negaram que ele fosse mulato.

A biografia oficial escrita por um parente, Celso Peçanha, nada menciona sobre suas origens raciais, mas uma outra biografia posterior o faz. Portanto, alguns pesquisadores expressam dúvidas sobre se Nilo Peçanha era ou não mulato. Em qualquer caso, suas origens foram muito humildes: ele mesmo contava ter sido criado com "pão dormido e paçoca".

Terminou os estudos preliminares em sua cidade, no Colégio Pedro II. Estudou na Faculdade de Direito de São Paulo e depois na Faculdade do Recife, onde se formou.

Casou-se com Ana de Castro Belisário Soares de Sousa, conhecida como Anita, descendente de aristocráticas e ricas famílias campistas. O casamento foi um escândalo social, pois a noiva teve que fugir de casa para poder se casar com um sujeito pobre e mulato, embora político promissor.

Participou das campanhas abolicionista e republicana. Iniciou a carreira política ao ser eleito para a Assembleia Constituinte em 1890. Em 1903 foi eleito sucessivamente senador e presidente do estado do Rio de Janeiro, permanecendo no cargo até 1906 quando foi eleito vice-presidente de Afonso Pena. Como presidente do estado do Rio de Janeiro, assinou, em 26/02/1906, o Convênio de Taubaté.

Quatro dias após o Convênio de Taubaté, em 01/03/1906, foi eleito vice-presidente da república, com 272.529 votos contra apenas 618 votos dados a Alfredo Varela.

Seus seguidores eram chamados de Nilistas.

Foi maçom e Grão-mestre do Grande Oriente do Brasil de 23/07/1917 a 24/09/1919, quando renunciou ao cargo.


Presidente da República

Com a morte de Afonso Pena em 1909, assumiu o cargo de presidente. Seu governo foi marcado pela agitação política em razão de suas divergências com Pinheiro Machado, líder do Partido Republicano Conservador (PRC).

Apoiou o candidato Hermes da Fonseca a sua sucessão em 1910, contra Ruy Barbosa e o presidente de São Paulo Albuquerque Lins, candidatos de oposição que fizeram a campanha civilista. Hermes da Fonseca venceu as eleições e foi eleito presidente da república em 01/03/1910. Os conflitos entre as oligarquias estaduais se intensificaram, sobretudo em Minas Gerais e São Paulo. Minas Gerais apoiou Hermes da Fonseca e São Paulo apoiou Ruy Barbosa, lançando seu presidente Albuquerque Lins à vice presidência na Campanha CivilistaHermes da Fonseca foi eleito para governar de 1910 a 1914.

Durante seu governo presidencial, Nilo Peçanha criou o Ministério da Agricultura, Comércio e Indústria, o Serviço de Proteção aos Índios (SPI), e inaugurou o ensino técnico no Brasil.


Vida Após a Presidência

Ao fim do seu mandato presidencial, retornou ao Senado e, dois anos, depois foi novamente eleito presidente do Estado do Rio de Janeiro. Renunciou a este cargo em 1917 para assumir o Ministério das Relações Exteriores. Em 1918 foi novamente eleito senador federal.

Em 1921 foi candidato à presidência da República pelo Movimento Reação Republicana, que tinha como objetivo contrapor o liberalismo político contra a política das oligarquias estaduais. Embora apoiado pelas situações pernambucana, baiana, gaúcha e fluminense, e por boa parte dos militares, foi derrotado pelo candidato Arthur Bernardes nas eleições de 01/03/1922. O presidente da república na época, Epitácio Pessoa, não participou das negociações (demárches), sobre sua sucessão presidencial.

Arthur Bernardes teve 466.877 votos contra 317.714 votos dados a Nilo PeçanhaNilo Peçanha teve apoio apenas dos estados do Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Pernambuco e Bahia.

Nilo Peçanha faleceu em 31/03/1924, no Rio de Janeiro, afastado da vida política, e foi sepultado no Cemitério de São João Batista.

Fonte: Wikipédia