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Santa Dica

BENEDICTA CYPRIANO GOMES
(61 anos)
Figura Folclórica, Curandeira e Profetisa

☼ Fazenda Mozondó, a 40 km de Pirenópolis, GO (13/04/1909)
┼ Goiânia, GO (09/11/1970)

À mulher sempre foi destinado um papel social com valores visivelmente inferiores aos papéis desempenhados pelo homem. As mulheres possuem alguns relativos avanços, embora sejam, ainda, portadoras de uma bagagem construída à sombra do machismo e do patriarcalismo.

Sob essa égide, destaca-se a mítica figura de Santa Dica, mulher de vanguarda, a serviço do messianismo e do povo humilde de Goiás no início do século XX.

Benedicta Cypriano Gomes, a Dica, nasceu em 13/04/1909 na Fazenda Mozondó, a 40 km de Pirenópolis, no Estado de Goiás. Por volta dos 7 anos de idade, caiu gravemente enferma, chegando a ser considerada morta, pois não possuía os sinais vitais.

Durante a preparação do corpo para apresentação ao velório, familiares perceberam que Dica suava frio. Por receio de que fosse enterrada viva, o velório foi alongado, e o enterro suspenso. Muito choro contínuo e, após três longos e penosos dias, Dica ressurgiu da morte.

A residência de Santa Dica
Desperta do torpor mortal, a menina tornou-se possuidora de sabedorias secretas e de intimidades com o outro lado da vida, transformando-se em curandeira e, posteriormente, em profetisa. Seus feitos tinham a força de verdadeiros milagres.

A notícia correu pelos confins goianos e se espalhou pela região como isca de fogo em tempo de seca. Para os nativos, suas curas, profecias e milagres eram mesmo obra de Santa. Não tardaram a chegar fervorosos romeiros, gente roceira humilde, doentes desenganados, em busca das graças de Santa Dica.

De seus milagres à atuação política foi consequência natural. A mocinha Dica se indignava com a vida sofrida dos que estavam perto dela e, num ato de extrema lucidez política, comandou uma legião de oprimidos pelo sistema de governo, na tentativa de livrar seu povo que era massacrado, escravizado e sujeito às vontades oligárquicas das famílias endinheiradas patriarcais.

Seu chamado à luta deu-se pelas palavras da fé. Essa foi sua rebelião ao sistema. Santa Dica era acompanhada com fidelidade e devoção. Os sofridos vinham, se acampavam em torno de sua casa e, ali, foi nascendo um povoado.

Rio do Peixe, rebatizado por Santa Dica de Rio Jordão
De forma totalmente igualitária, a iluminada implantou um sistema comunitário de uso da terra e do dinheiro entre seu séquito. Para Dica, a terra era bem doado pelo Criador aos habitantes do planeta. Não conseguia entender cercas e arames farpados a impedir seu povo de desfrutar e cuidar do que era seu, por direito Divino.

Santa Dica possuía posses e não era pobre, mas o desejo de justiça e igualdade social eram temas recorrentes em suas pregações. Sua fazenda foi o primeiro cenário de compartilhamento de recursos, bens, oferendas e colheitas. Assim prosseguia, fazendo curas, milagres, rezando suas orações, ocupando lugar de Conselheira do pequeno povoado e pregando a valorização da mulher, a não violência, a justa distribuição de bens, e cultuando o coletivismo.

Com essas ações religiosas e de caráter político-social chegou a reunir uma legião de 15 mil almas, havendo em suas fileiras cerca de 1,5 mil homens trabalhadores acostumados com o uso das armas para suas atividades diárias de caça. Também estavam reunidos mais de 4 mil eleitores em torno dela. Essa soma foi o bastante para incomodar os coronéis goianos.


A fama de Santa Dica se alastrou, os fiéis se multiplicaram. Não demorou que percebessem que Santa Dica encarnava a reprodução do episódio de Canudos. Perigo certeiro, nas mãos de uma mulher forte de espírito e de corpo franzino. Dos latifúndios fugiam os subjugados, ditos "diqueiros". A imprensa local e do vizinho Estado de Minas Gerais, inclusive com atuação do clero, cobrava providências governamentais contra os "fanáticos".

Santa Dica foi além no empoderamento do feminino e na promoção de igualdade de gêneros e classes. Para reforçar sua liderança popular e política editou um jornal manuscrito: "A Estrela do Jordão Órgão dos Anjos, da Corte de Santa Dica". A líder criou em suas fileiras várias frentes, inclusive a de alfabetização, para que todos tivessem acesso aos documentos escritos.

E veio a represália. De um lado o exército "pé de palha", tática usada pela Iluminada para que seus seguidores aprendessem a marchar. De forma que era amarrada uma palha no pé esquerdo do seu soldado para acompanhar o ritmo direito-esquerdo peculiar das tropas.

Os adoradores da Santa Dica, armados, juravam protegê-la contra qualquer tentativa de prisão. As autoridades de Pirenópolis com a polícia municipal se declaram impotentes contra os diqueiros. Restou ao Governo Estadual, em março de 1925, mandar um destacamento, sitiar o local e prender Santa Dica. Um mínimo seria o suficiente para o massacre. Quando um tio de Dica atirou contra os policiais choveram projéteis de metralhadoras sobre as palhoças e o sítio de Dica.


Pela "boca do povo" diziam que as balas iam de encontro à Dica, enrolavam em seus cabelos, ou batiam em seu corpo, e caiam pelo chão. Tanto que houve apenas três mortes. Santa Dica ordenou a todos que atravessassem o rio Jordão, que passa por trás de sua casa, para fugir do massacre. Santa Dica foi resgatada por um de seus fiéis, puxada do rio pelos cabelos e acabou sendo presa. Dizem na tradição oral que Santa Dica neste episódio amarrou uma sucuri no poção, ao fundo de sua casa, para que os soldados não pudessem atravessar o rio. Até hoje a população de Lagolândia acredita e não nada naquele local com medo da sucuri da Santa Dica.

A Prisão de Santa Dica durou 6 meses. Pressionados pela população e sem provas criminatórias o governo acabou cedendo e liberou-a. A partir daí Santa Dica ingressou na política, seus seguidores votavam em quem ela mandasse. Formou exército e foi patenteada com a insígnia de cabo do Exército brasileiro. Comandava tropa de 400 homens, que ficaram sendo conhecidos como "pés com palha e pés sem palha", pelo motivo de que sendo a tropa integrada por analfabetos, confundiam esquerda com direita. Dica então usou o estratagema de amarrar um pedaço de palha em um dos pés para poder ensinar-lhes a marchar.

Guerra da Santa Dica

Cerca de 500 famílias, segundo uma série de depoimentos, viviam ao redor da Casa da Cura, onde Santa Dica vivia, na Lagoa, povoado às margens do Rio do Peixe, rebatizado por ela de Rio Jordão. Era o centro das festas do Divino e de São João, tradições do período colonial nos sertões goianos, promovidas por Santa Dica, que inovava com ritos e símbolos de uma nova religião. Autoridades começaram a questionar os riscos sanitários de um lugar sem condições para atender a população que chegava para as festas.

Diante das reações contrárias de padres e coronéis da região, Santa Dica colocou seu exército à disposição da oligarquia estadual de Totó Caiado, aliado do Palácio do Catete desde 1912, para engrossar, em 1924, a resistência à Coluna Prestes na cidade de Goiás, a 167 quilômetros de Pirenópolis. O Exército dos Anjos não chegou a enfrentar os tenentistas, mas voltou para o vilarejo da Lagoa mais influente.

Em reação, a Igreja Católica publicou em seus jornais que Santa Dica era "prostituta", "histérica" e "tresloucada". As romarias de sertanejos para vê-la tinham reduzido o número de devotos da Festa do Divino Pai Eterno, promovida pelos padres em Trindade.

O jornal Santuário de Trindade defendeu a destruição do reduto de Santa Dica: "Já se viu tamanha asneira! É o caso para a polícia intervir se não quiser uma repetição de Canudos!"

Outro periódico, O Democrata, bancado pelos coronéis, chamou Santa Dica de "Lenine do sexo diferente" e "Antônio Conselheiro de saias", acusando-a de charlatanismo e prática ilegal da medicina: "Canudos é de ontem, e nós sabemos o que foi Canudos!", advertiu o periódico.

Em 1928 casou com o jornalista carioca Mário Mendes, eleito prefeito de Pirenópolis em 1934, e tiveram cinco filhos e adotaram mais dois.

O exército dos "pés com palha e pés sem palha" participou da Revolução Constitucionalista de 1932 indo guerrear, com 150 homens, em São Paulo de onde voltou sem nenhuma baixa, resultado atribuído aos milagres da santa. Episódio famoso foi quando seu exército precisava passar pela ponte de Jaraguá, em São Paulo. A ponte estava minada e Santa Dica mandou que um de seu soldados a atravessasse de olhos vendados, fato concluído sem detonar nenhuma bomba. E assim foi com a tropa toda que vendados um a um transpuseram a ponte, que veio a ruir após passar o último soldado. Também teve Santa Dica enfrentado a Coluna Prestes. Com uma tropa de 400 homens impediu que a Coluna ingressasse no Triângulo Mineiro.

Morte

Santa Dica faleceu no dia 09/11/1970, em Goiânia, sendo sepultada, de acordo com seu desejo, debaixo da frondosa gameleira da sua casa em Lagolândia, distrito do município de Pirenópolis, no Estado de Goiás. A velha gameleira, que protegeu seu povo durante o ataque militar de 1925

Foi velada por sua legião por três dias, em ato de profundo amor e devoção à linda moça da Fazenda Mozondó, que foi guerreira e santa. Pilar na valorização dos direitos humanos em Goiás, na representação do feminismo e no empoderamento da mulher.

Lagolândia, hoje, é um povoado do município de Pirenópolis, GO, com algumas centenas de habitantes e muitas casas, que rodeiam uma bela praça onde o busto de Santa Dica lidera o espaço dividido entre bancos, flores, imagens de Nossa Senhora e o sepulcro sombreado da Santa. Em sua antiga casa descendentes mantêm um visitado altar dedicado à Santa e todo o povoado vive à sua memória.

Fonte: Xapuri SocioambientalEstadão e Projeto Foto Estrada
#FamososQuePartiram #SantaDica

Pai João de Camargo

JOÃO DE CAMARGO
(84 anos)
Religioso, Médium, Curandeiro, Santo Popular, Milagreiro e Preto Velho

* Sarapuí, SP (16/05/1858)
+ Sorocaba, SP (18/09/1942)

Pai João de Camargo foi um médium, curandeiro, religioso, também considerado santo popular, milagreiro e preto-velho. Era também conhecido como médico dos pobres.

Nhô João, nasceu no dia 16 de maio de 1858, na fazenda dos Camargo Barros, bairro dos Cocaes em Sarapuí, SP. Era filho de Francisca, escrava de Luís de Camargo Barros e de pai incógnito, batizado na Igreja Matriz de Nossa Senhora das Dores de Sarapuí.

Como escravo cresceu na fazenda em que nascera, herdou o sobrenome da família Camargo Barros, analfabeto não teve acesso à educação institucional, veio para Sorocaba, SP, logo após a abolição da escravatura, em 13 de maio de 1888.

Trabalhou em Sorocaba como cozinheiro para Manuel Lopes Monteiro, e também para a família de Inácio Pereira da Rocha. Em 1893, alistou-se como soldado voluntário, no batalhão dos Voluntários Paulistas, deu baixa em sua carreira militar em 1895, quando a Revolução Federalista terminou. Passou a trabalhar na lavoura em Pilar do Sul, lugar onde conheceu Escolástica do Espírito Santo, sua esposa.

Voltou para Sorocaba em meados de 1890, época em que Sorocaba fora atacada pela epidemia de febre amarela o que fez o casal abandonar a cidade e mudar-se para o Bairro da Ilha, em Salto de Pirapora, SP. Após cerca de cinco anos de convivência matrimonial vieram a separar-se por incompatibilidade. João de Camargo retornou à Sorocaba para recomeçar a vida, trabalhou em vários empregos para sobreviver desde o campo trabalhando na lavoura a olarias fazendo tijolos e telhas.

Recebeu influência na prática de curandeirismo e na religiosidade africana através de sua mãe, Nhá Chica, de sua sinhazinha, Ana Teresa de Camargo a iniciação ao catolicismo e do padre João Soares do Amaral os ensinamentos através de seus sermões, pois o conhecera ainda quando era adolescente e lhe tinha grande admiração. Sua religiosidade sincrética formou-se a partir do catolicismo popular, participando nas festas em devoção aos santos católicos a que se homenageavam na Casa Grande nos dias sagrados, bem como do aprendizado que adquirira com sua mãe.

Desde 1897 iniciara-se no caminho do misticismo, acendia velas, rezava ao pé da cruz e já praticava a cura em algumas pessoas. Em 1905 seguindo seu percurso pela Estrada da Água Vermelha, cumpria a sua obrigação junto a Cruz do Menino Alfredinho, em casa meditando por volta da meia-noite, percebeu que fenômenos estranhos como murmúrios, luzes, ventos entre outros sinais ocorriam a ele, fazendo-o muitas vezes a ser tomado como louco. Entre as vozes que ouvia, a mensagem para que parasse de beber era clara, uma vez que, segundo a voz que lhe falava o álcool o impedia de receber a missão designada, além de lhe estragar o corpo.

Em 1913 foi processado judicialmente acusado de praticar o curandeirismo. Absolvido e para se proteger de perseguições criou em sua Capela a Associação Espírita e Beneficente Capela do Senhor do Bonfim, reconhecida como pessoa jurídica em fevereiro de 1921.

Em 1915, fundou a Corporação Musical São Luís, composta por vinte e oito músicos, sendo muitos deles os que animavam os cordões carnavalescos da cidade, visto que apresentavam-se em festas religiosas e profanas. Seus maestros foram Francisco Dimas de Melo, Salvador Elisário, Pancrácio Inocêncio de Campos, e Avelino Soares.

Sua fama percorreu o mundo, foram-lhe dedicadas poesias, composições musicais e desenhos. João de Camargo foi tema de várias dissertações de mestrado, biografado por inúmeros escritores, pesquisadores e historiadores entre eles Antônio Francisco Gaspar, Florestan Fernandes, Genésio Machado, Roger Bastide, José Barbosa Prado, Aluísio de Almeida, Paulo Tortello, Rogich Vieira, Prof. Bene Cleto, Alcir Guedes e Antônio Carlos Guerra da Cunha.

Também sobre João de Camargo o jornalista Plínio Cavalcante publicou reportagem na revista semanal "O Malho", Rio de Janeiro em 1934 e na Europa o "Corriere Dela Sera" publicou reportagem em 1922. Em 1995 foi publicada sua biografia e um espetáculo teatral cujos autores, Sônia Castro e Fernando Antonio Lomardo tinham como intenção principal investigar O Homem - João de Camargo.

Em 1999 os pesquisadores Carlos de Campos e Adolfo Frioli publicaram o livro "João de Camargo - O Nascimento de Uma Religião de Sorocaba", sendo o tema principal "o preto velho e bom da Água Vermelha" uma vez que, Nhô João foi uma referência de fé popular nesta cidade. No mesmo ano de 1999, o pesquisador Carlos Carvalho Cavalheiro também dedicou-lhe algumas páginas de seu trabalho sobre o "Folclore em Sorocaba - Milagres de Nhô João de Camargo".

Pai João de Camargo faleceu no dia 18 de setembro de 1942 na cidade de Sorocaba, SP. Após sua morte a Capela Bom Jesus do Bonfim ficou fechada durante cinco anos por questões judiciais, Escolástica do Espírito Santo Maduro, sua ex- mulher apareceu requerendo sua parte no espólio.

O túmulo de João de Camargo é uma réplica da Capela Bom Jesus do Bonfim, levantada sob responsabilidade de um de seus devotos, João Massa em 1948. Seu túmulo é visitado por um número incontável de devotos e simpatizantes, principalmente no dia 02 de novembro, Finados.

Sobre sua vida, foram escritas inúmeras biografias por famosos escritores brasileiros. Em 2003, foi homenageado no enredo da escola de samba paulistana Império de Casa Verde. O desfile contou com a participação do ator Paulo Betti, que é devoto de Nhô João e produziu o filme "Cafundó", sobre sua vida.


Cafundó

"Cafundó" é inspirado em um personagem real saído das senzalas do século XIX. Um tropeiro, ex-escravo, deslumbrado com o mundo em transformação e desesperado para viver nele.

Este choque leva-o ao fundo do poço. Derrotado, ele se abandona nos braços da inspiração, alucina-se, ilumina-se, é capaz de ver Deus. Uma visão em que se misturam a magia de suas raízes negras com a glória da civilização judaico-cristã.

Sua missão é ajudar o próximo. Ele se crê capaz de curar, e acaba curando. O triunfo da loucura da fé.

Sua morte, nos anos 40, transforma-o numa das lendas que formou a alma brasileira e, até hoje, nas lojas de produtos religiosos, encontramos sua imagem, O Preto Velho João de Camargo.

"Cafundó", na linguagem popular, é um lugar de difícil acesso, situado longe de centros povoados. A origem do nome é indígena e "caa" significa mato em tupi. Por extensão, o termo passou a designar locais para os quais fugiam índios e negros escravos.


Principais Prêmios e Indicações

Festival de Gramado 2005:
  • Venceu nas categorias de Melhor Ator (Lázaro Ramos), Melhor Direção de Arte e Melhor Fotografia.
  • Ganhou o Prêmio Especial do Júri na categoria de Melhor Longa Metragem em 35mm Brasileiro.
  • Indicado na categoria de Melhor Filme.

Los Angeles Pan African Film Festival 2006:
  • Recebeu Menção Honrosa.


Elenco
  • Lázaro Ramos ... João de Camargo
  • Leona Cavalli ... Rosário
  • Leandro Firmino ... Cirino
  • Alexandre Rodrigues ... Natalino (Adulto)
  • Ernani Moraes ... Coronel João Justino
  • Luís Melo ... Monsenhor João Soares
  • Renato Consorte ... Ministro
  • Francisco Cuoco ... Bispo
  • Abrahão Farc ... Juiz