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Maria Quitéria

MARIA QUITÉRIA DE JESUS MEDEIROS
(61 anos)
Militar e Heroína

* Feira de Santana, BA (27/07/1792)
+ Salvador, BA (21/08/1853)

Foi uma militar brasileira, heroína da Guerra da independência do Brasil. Considerada a Joana d'Arc brasileira, é a patronesse do Quadro Complementar de Oficiais do Exército Brasileiro (Decreto de 28/06/1996).

Infância e Juventude

Maria Quitéria nasceu no Sítio do Licurizeiro, uma pequena propriedade no Arraial de São José das Itapororocas, na comarca de Nossa Senhora do Rosário do Porto de Cachoeira, atual município de Feira de Santana no estado da Bahia. Foi a filha primogênita dos brasileiros Gonçalo Alves de Almeida e Quitéria Maria de Jesus. A data mais aceita pelos pesquisadores para o seu nascimento é a de 1792.

Em 1803, tendo cerca de dez ou onze anos de idade, perdeu a mãe. Cinco meses após enviuvar, o pai casou-se em segundas núpcias com Eugênia Maria dos Santos, que veio a falecer pouco tempo depois, sem que da união nascessem filhos. A família mudou-se então para a Fazenda Serra da Agulha.

Na nova residência, Gonçalo Alves casou-se pela terceira vez, com Maria Rosa de Brito, com quem teve mais três filhos. A nova madrasta, afirma-se, nunca concordou com os modos independentes de Maria Quitéria. Embora sem uma educação formal, uma vez que à época as escolas eram poucas e restritas aos grandes centros urbanos, Maria Quitéria aprendera a montar, a caçar e a usar armas de fogo, conhecimentos essenciais à época.

As Lutas Pela Independência

Maria Quitéria encontrava-se noiva quando, entre 1821 e 1822, iniciaram-se na Província da Bahia as agitações contra o domínio de Portugal. Em Janeiro de 1822 transferiram-se para Salvador as tropas portuguesas, sob o comando do Governador das Armas Inácio Luís Madeira de Melo, registrando-se em fevereiro o martírio de Joana Angélica, no Convento da Lapa, naquela Capital.

Em 25 de junho, a Câmara Municipal da Vila de Cachoeira aclamou o Príncipe Regente Dom Pedro I como "Regente Perpétuo" do Brasil. Por essa razão, em julho, uma canhoneira portuguesa, fundeada na barra do Rio Paraguaçu, alvejou Vila de Cachoeira, reduto dos independistas baianos. A 6 de setembro, instalou-se na vila o Conselho Interino do Governo da Província, que defendia o movimento pró-independência da Bahia ativamente, enviando emissários a toda a Província em busca de adesões, recursos e voluntários para formação de um Exército Libertador.

Praça da Soledade - Bairro da Liberdade, Salvador, BA
O "Soldado Medeiros"

Tendo o velho Gonçalo, viúvo, sem filho varão, se escusado a colaborar, para a sua surpresa, a filha Maria Quitéria, pediu-lhe autorização para se alistar. Tendo o pedido negado pelo pai, fugiu, dirigindo-se a casa de sua meia-irmã Teresa Maria, casada com José Cordeiro de Medeiros e, com o auxílio de ambos, cortou os cabelos. Vestindo-se como um homem, dirigiu-se à Vila de Cachoeira, onde se alistou sob o nome de Medeiros, no Regimento de Artilharia, onde permaneceu até ser descoberta pelo pai, duas semanas mais tarde.

Defendida pelo major José Antônio da Silva Castro (avô do poeta Castro Alves), comandante do Batalhão dos Voluntários do Príncipe (popularmente apelidado de Batalhão dos Periquitos, devido aos punhos e gola de cor verde de seu uniforme), foi incorporada a esta tropa, em virtude de sua facilidade no manejo das armas e de sua reconhecida disciplina militar. Aqui, ao seu uniforme, foi acrescentado um saiote à escocesa.

A 29 de outubro seguiu com o seu batalhão para participar da defesa da Ilha de Maré e, logo depois, para Conceição, Pituba e Itapuã, integrando a Primeira Divisão de Direita. Em fevereiro de 1823, participou com bravura do combate da Pituba, quando atacou uma trincheira inimiga, onde fez vários prisioneiros portugueses (dois, segundo alguns autores), escoltando-os, sozinha, ao acampamento.

Em 31 de março, no posto de cadete, recebeu, por ordem do Conselho Interino da Província, uma espada e seus acessórios.

Finalmente, a 2 de julho de 1823, quando o Exército Libertador entrou em triunfo na cidade do Salvador, Maria Quitéria foi saudada e homenageada pela população em festa. O governo da Província dera-lhe o direito de portar espada. Na condição de cadete, envergava uniforme de cor azul, com saiote por ela elaborado, além de capacete com penacho.

A Heroína da Independência

Por seus atos de bravura em combate, o general Pedro Labatut, enviado por Dom Pedro I para o comando geral da resistência, conferiu-lhe as honras de 1º Cadete.

No dia 20 de agosto foi recebida no Rio de Janeiro pelo Imperador em pessoa, que a condecorou com a Imperial Ordem do Cruzeiro, no grau de Cavaleiro, com seguinte pronunciamento:

"Querendo conceder a Dona Maria Quitéria de Jesus o distintivo que assinala os Serviços Militares que com denodo raro, entre as mais do seu sexo, prestara à Causa da Independência deste Império, na porfiosa restauração da Capital da Bahia, hei de permitir-lhe o uso da insígnia de Cavaleiro da Ordem Imperial do Cruzeiro."

Além da comenda, foi promovida a Alferes de Linha, posto em que se reformou, tendo aproveitado a ocasião para pedir ao Imperador uma carta solicitando ao pai que a perdoasse por sua desobediência.

Os Últimos Anos

Perdoada pelo pai, Maria Quitéria casou-se com o lavrador Gabriel Pereira de Brito, o antigo namorado, com quem teve uma filha, Luísa Maria da Conceição.

Viúva, mudou-se para Feira de Santana em 1835, onde tentou receber a parte que lhe cabia na herança pelo falecimento do pai no ano anterior. Desistindo do inventário, devido à morosidade da justiça, mudou-se com a filha para Salvador, nas imediações de onde veio a falecer aos 61 anos de idade, quase cega e no anonimato.

Os seus restos mortais estão sepultados na Igreja Matriz do Santíssimo Sacramento e Sant'Ana, no bairro de Nazaré em Salvador.

Testemunhos

O pesquisador Aristides Milton, nas Efemérides Cachoeiranas, considera Maria Quitéria "tão valente quanto honesta senhora".

A inglesa Maria Graham, por sua vez, deixou registrado:

"Maria de Jesus é iletrada, mas viva. Tem inteligência clara e percepção aguda. Penso que, se a educassem, ela se tornaria uma personalidade notável. Nada se observa de masculino nos seus modos, antes os possui gentis e amáveis." (Journal Of a Voyage To Brazil)

Homenagens

Maria Quitéria é homenageada por uma medalha militar e por uma comenda com o seu nome, na Câmara Municipal de Salvador. Do mesmo modo, a Câmara Municipal de Feira de Santana instituiu a Comenda Maria Quitéria, para distinguir personalidades com reconhecida contribuição à municipalidade, e ergueu-lhe um monumento na cidade, no cruzamento da avenida Maria Quitéria com a Getúlio Vargas.

A sua iconografia mais conhecida é um retrato de corpo inteiro, pintado por Domenico Failutti (1920). Presenteado pela Câmara Municipal de Cachoeira, integra atualmente o acervo do Museu Paulista, em São Paulo.

Por decreto da Presidência da República, datado de 28 de junho de 1996, Maria Quitéria foi reconhecida como Patrono do Quadro Complementar de Oficiais do Exército Brasileiro. A sua imagem encontra-se em todos os quartéis, estabelecimentos e repartições militares da Força, por determinação ministerial.

Fonte: Wikipédia

Anita Garibaldi

ANA MARIA DE JESUS RIBEIRO
(27 anos)
Militante da Revolução Farroupilha

* Laguna, SC (30/08/1821)
+ Mandriole, Itália (04/08/1849)

Foi a companheira do revolucionário Giuseppe Garibaldi, sendo conhecida como a Heroína dos Dois Mundos. Ela é considerada, até hoje, uma das mulheres mais fortes e corajosas da época.

A Controvérsia Sobre o Local de Nascimento

Alguns estudiosos alegam que Anita Garibaldi teria nascido em Lages, que na cúria metropolitana daquela cidade estaria o registro dos irmãos mais velho e mais novo dela, e que teria sido retirada do livro a folha do registro de Ana Maria de Jesus Ribeiro.

Em 1998, entidades representativas da sociedade civil de Laguna promoveram uma ação judicial para obter o registro de nascimento tardio de Anita Garibaldi. A ação tramitou na primeira vara da comarca de Laguna, sendo instruída com diversos documentos que comprovariam que Anita nasceu no município de Laguna. Assim, em 5 de dezembro de 1998, proferiu-se:

"Ante o exposto, julgo procedente o pedido inicial, a fim de determinar o registro de nascimento de Ana Maria de Jesus Ribeiro, nascida em 30 de agosto de 1821, na cidade de Laguna, filha de Bento Ribeiro da Silva, natural de São José dos Pinhais, Paraná, e de Maria Antônia de Jesus Antunes, natural de Lages, Santa Catarina, sendo seus avós paternos Manuel Collaço e Ângela Maria da Silva e avós maternos Salvador Antunes e Quitéria Maria de Sousa, o que faço embasado no artigo 50, § 4º combinado com o 52, § 2º, da Lei n.º 6.015/73."
(Ação de Registro de Nascimento Tardio n.: 040.98.000395-4)

As pessoas que reivindicaram a exata data do nascimento de Anita se baseiam em provas fornecidas por autores, como Wolfwang Ludwig Rau, tal como mostra o jornal Página do Gaúcho.

Vida Familiar e Casamento

Anita Garibaldi, descendente de portugueses imigrados dos Açores à província de Santa Catarina no século XVIII, provinha de uma família modesta. O pai Bento era comerciante em Lages e casou-se com Maria Antônia de Jesus, com a qual teve seis filhos.

Após a morte do pai, Anita teve que ajudar no sustento familiar e, por insistência materna, casou-se, em 30 de agosto de 1835, aos 14 anos, com Manuel Duarte de Aguiar, na Igreja Matriz Santo Antônio dos Anjos da Laguna. Depois de somente três anos de matrimônio, o marido alistou-se no exército imperial, abandonando a jovem esposa. Ela então pede o desquite por abandono e volta a casa da mãe.

Revolução Farroupilha

Durante a Revolução Farroupilha ou Guerra dos Farrapos, o guerrilheiro italiano Giuseppe Garibaldi, a serviço da República Rio-Grandense, participa da tomada do porto de Laguna, na então província de Santa Catarina, onde conheceu Anita, que se apaixonou e decidiu lutar pela independência gaúcha e de outros territórios. Eles Ficaram juntos pelo resto da vida de Anita, que seguiu Giuseppe Garibaldi em seus combates em Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Uruguai (Montevidéu) e Itália.
Anita e Giuseppe Garibaldi passaram a andar a cavalo e lutar em guerras, sem ter lugar fixo para morar. Eles tiveram quatro filhos. 

Batalha de Curitibanos

Na Batalha de Curitibanos, no início de 1840, Anita foi feita prisioneira, mas o comandante do exército imperial, admirado de seu temperamento indômito, deixou-se convencer a deixá-la procurar o cadáver do marido, supostamente morto na batalha. Em um instante de distração dos guardas, tomou um cavalo e fugiu. Após atravessar a nado com o cavalo o Rio Pelotas, chegou ao Rio Grande do Sul, e encontrou-se com Giuseppe Garibaldi em Vacaria. Anita era uma mulher corajosa como poucos, enfrentava todo tipo de lutas e batalhas.

Em 16 de setembro de 1840 nasceu no estado do Rio Grande do Sul, na então vila e atual cidade de Mostardas o primeiro filho do casal, que recebeu o nome de Menotti Garibaldi, em homenagem ao patriota italiano Ciro Menotti. Depois de poucos dias, o exército imperial cercou a casa para prender o casal, e Anita fugiu a cavalo com o recém-nascido nos braços e alcançou um bosque aos redores da cidade, onde ficou deitada por quatro dias, até que Giuseppe Garibaldi a encontrou.

No Uruguai

Em 1841, quando a situação militar da República Rio-Grandense tornou-se insustentável, Giuseppe Garibaldi solicitou e obteve do general Bento Gonçalves a permissão para deixar o exército republicano: Anita, Giuseppe e Menotti transferiram-se a Montevidéu no Uruguai, onde permaneceram por sete anos. Em 1842 oficializaram sua união, casando-se na Paróquia de San Bernardino.

No Uruguai nasceram os outros três filhos do casal: Rosa (1843), Teresa (1845) e Ricciotti Garibaldi (1847). Rosa faleceu aos dois anos de idade por asfixia, por causa de uma infecção na garganta, o que fez Anita e Garibaldi sofrerem muito.

Na Itália

Em 1847, Anita foi para a Itália com os 3 filhos e encontrou-se com a mãe de Garibaldi. Elas depois viajaram para a cidade de Nizza, onde ficaram morando. O próprio Garibaldi reuniu-se a eles alguns meses depois, quando voltaram a Itália. Os filhos de Anita e Garibaldi ficaram morando na França com a mãe dele.

Em 9 de fevereiro de 1849, presenciou com o marido a proclamação da República Romana, mas a invasão franco-austríaca de Roma, depois da batalha no Janículo, obrigou-os a abandonar a cidade.

Com 3900 soldados (800 deles a cavalo), Giuseppe Garibaldi deixou Roma. Em sua perseguição saíram três exércitos (franceses, espanhóis e napolitanos) com quarenta mil soldados. Ao norte lhes esperava o exército austríaco, com quinze mil soldados. Anita e o marido tinham que enfrentar a guerra e lutar para salvar o território italiano. Mesmo grávida do 5º filho, ela enfrentou tudo até o fim.

Anita, no final da gravidez, tentou não ser um peso para o marido, querendo deixá-lo despreocupado para lutar sozinho na guerra, mas suas condições de saúde pioraram quando atingiram a República de San Marino. Ela e Garibaldi decidiram não aceitar o salvo-conduto oferecido pelo embaixador americano e continuaram a fuga, pois não teriam como lutar contra milhões de soldados e se fossem presos, morreriam na cadeia.

Com febre e perseguida pelo exército austríaco, foi transportada às pressas à Fazenda Guiccioli, próximo a Ravena, onde morreu no parto junto com a criança, em 4 de agosto de 1849, para desespero de Garibaldi.

Caçado pelos austríacos, sem nem sequer poder acompanhar o sepultamento da esposa, Garibaldi saiu outra vez para o exílio e nos dez anos em que esteve fora da Itália, os restos mortais de Anita foram exumados por sete vezes.

Por vontade do marido, seu corpo foi transferido a Nice. Em 1932, seu corpo foi finalmente sepultado no monumento construído em sua homenagem no Janículo, em Roma.

O Legado de Anita

Considerada, no Brasil e na Itália, um exemplo de dedicação e coragem, Anita foi homenageada pelos brasileiros com a designação de dois municípios, ambos no estado de Santa Catarina: Anita Garibaldi e Anitápolis.

Muitas cidades brasileiras possuem também ruas e avenidas com seu nome, como a Avenida Anita Garibaldi, em Salvador, Bahia.

Representações na Cultura

Na minissérie A Casa das Sete Mulheres, de Maria Adelaide Amaral e Walther Negrão, transmitida pela Rede Globo em 2003, Anita Garibaldi foi interpretada por Giovanna Antonelli, enquanto que Giuseppe Garibaldi foi interpretado por Thiago Lacerda. Camila Morgado fez o papel de Manuela de Paula Ferreira. No cinema, em Garibaldi In America, o papel de Anita foi interpretado por Ana Paula Arósio, com estréia prevista para o ano de 2011.

Fonte: Wikipédia

Frei Caneca

JOAQUIM DA SILVA RABELO
(45 anos)
Religioso, Político e Jornalista

* Recife, PE (20/08/1779)
+ Recife, PE (13/01/1825)

Joaquim da Silva Rabelo, depois Frei Joaquim do Amor Divino Rabelo, mas popularmente conhecido apenas como Frei Caneca, foi um religioso e político brasileiro. Esteve implicado na Revolução Pernambucana (1817) e na Confederação do Equador (1824). Como jornalista, esteve à frente do Typhis Pernambucano.

A seu respeito, refere Evaldo Cabral de Mello:

"O homem que, na história do Brasil, encarnará por excelência o sentimento nativista era curiosamente um lusitano Jus Sanguinis"

Biografia

"Quem bebe da minha caneca tem sede de liberdade!"

Filho primogênito de um tanoeiro português, Domingos da Silva Rabelo, e de Francisca Maria Alexandrina de Siqueira, incorporou ao nome o apelido que o pai ganhara por sua profissão: Caneca. A família residia em Fora-de-Portas, Portugal, bairro edificado ao tempo dos Neerlandeses para o serviço do porto, de vocação artesanal e marcadamente portuguesa. A sua mãe tinha um primo carmelita, o que pode explicar que tenha-se tornado Noviço do Carmo, e tomado o hábito em 1796, no Convento de Nossa Senhora do Carmo, onde professou no ano seguinte, em 1797.

Ordenou-se em 1801, com a necessária dispensa apostólica de idade pois tinha 22 anos, e passou a ser conhecido como Joaquim do Amor Divino. Criado o Seminário de Olinda, obteve autorização para cursar ali as disciplinas que a Ordem não lhe havia oferecido. Frequentava a biblioteca do Seminário e a dos Oratorianos, em Recife, formando a sua notável erudição.

Em 1803 foi nomeado professor de Retórica e Geometria de seu convento, onde lecionou posteriormente Filosofia Racional e Moral. A partir de certo momento, o "seu interesse extrapolou os muros do claustro, como indica seu provimento na cadeira pública de geometria da comarca de Alagoas". Ali permaneceu pouco tempo, dada a perspectiva de nomeação para idêntica cadeira no Recife, a qual não se concretizou pela Revolução Pernambucana.

De idéias liberais, partilhava idéias republicanas e frequentou a Academia do Paraíso, um dos centros de reunião daqueles que, influenciados pela Revolução Francesa e pela Independência dos Estados Unidos, conspiravam contra o jugo português.

Movimento em Pernambuco e Prisão na Bahia

Participou ativamente da chamada Revolução Pernambucana ocorrida em 1817, que proclamou uma República e organizou o primeiro governo independente na região. Não há referência a participação sua, diz Cabral de Mello:

"Nos acontecimentos inaugurais da sedição de 6 de março, como a formação do governo provisório. Assim é que da relação dos eleitores que o escolheram, não consta seu nome. Sua presença só se detecta nas últimas semanas de existência do regime, ao acompanhar o exército republicano que marchava para o sul da província a enfrentar as tropas do Conde dos Arcos, ocasião em que, segundo a acusação, teria exercido de capitão de guerrilhas."

Era conselheiro do exército republicano do sul, comandado pelo coronel Suassuna. Com a derrota do movimento, foi preso e enviado para Salvador, na Bahia. Ali passou quatro anos detido, dedicando-se à redação de uma gramática da língua portuguesa.

Retorno a Pernambuco

Libertado em 1821, no contexto do movimento constitucionalista em Portugal, Frei Caneca voltou a Pernambuco e retomou as atividades políticas. Durante a sua viagem, chegou a ser detido ainda na antiga cadeia de Campina Grande.

Em 1821 esteve implicado no chamado Movimento de Goiana, uma segunda sedição emancipacionista que, com apoio dos principais proprietários da mata norte e algodoeira da província, proclamou adesão às Côrtes de Lisboa. Um exército de milícias rurais e da tropa de primeira linha marchou contra o Recife, sem ocupar a cidade. Os goianistas tampouco conseguiram adesão substancial na mata sul. A Convenção do Beberibe consagrou em setembro o Statu Quo, prevendo que as juntas de Recife e de Goiana continuariam a atuar nas áreas sob seu controle, à espera de decisão das Côrtes. Estas determinaram a eleição de uma Junta Provisória e foi instalado o primeiro governo autônomo da província em outubro de 1821.

A Junta Governativa de Gervásio

Frei Caneca apoiou a formação da primeira Junta Governativa de Pernambuco, presidida por um comerciante, Gervásio Pires Ferreira, que o nomeou para a cadeira pública de geometria da Vila do Recife. Foi uma Junta muito recifense, em que o poder veio ao clero, às camadas urbanas, ao comércio, às Forças Armadas, às profissões liberais - as forças derrotadas em 1817.

Gervásio Pires Ferreira foi a figura dominante de um governo que atuou para buscar o consenso, líder de um setor do comércio português já nacionalizado pela residência, pelo nascimento, por laços de família com a terra. E tinha pertencido ao governo do movimento de 1817, companheiro de Frei Caneca nas prisões da Bahia.

Em 1822, Frei Caneca que apoiou com entusiasmo a Junta, redigiu a "Dissertação sobre o que se deve entender por pátria do cidadão e deveres deste para com a mesma pátria". Queria dar formulação teórica a um dos principais objetivos de Gervásio Pires Ferreira, conciliar o comércio português da província com a nova ordem de coisas. Sua principal tese é a de que os portugueses domiciliados na terra e a ela ligados por vínculos de família e dos interesses deviam ser considerados tão pernambucanos quanto os naturais da terra.

O dilema era entretanto grande. Diz Evaldo Cabral de Mello, página 25 da obra citada:

"As Cortes de Lisboa, por um lado, e a regência de Dom Pedro, por outro, encarnavam, em termos das aspirações de 1817, opções igualmente legítimas, se bem que incompletas e contraditórias. Por um lado, o Soberano Congresso oferecia um regime liberal, sob uma monarquia constitucional, muito embora, a partir de fevereiro de 1822, ficasse claro no Brasil que elas cobrariam o preço da não restauração pura e simples do monopólio comercial, que era impossível ressuscitar, mas de um sistema preferencial para o comércio e a navegação portugueses. Por sua vez, a regência do Rio prometia a liberdade de comércio e a Independência mas com a fatura previsível da construção de um regime autoritário baseado no centro-sul."

O governo de Gervásio Pires Ferreira tentou ganhar tempo, à espera de uma conjuntura que lhe permitisse salvar ambas opções, sem descartar inteiramente a separação tanto de Lisboa quanto do Rio de Janeiro. (A Junta será anatematizada de Francisco Adolfo de Varnhagen a José Honório Rodrigues, acusada de carecer de sentimento nacional; sua defesa será feita por Barbosa Lima Sobrinho).

Sob a pressão de um motim castrense, a junta de Gervásio Pires Ferreira foi coagida a aderir à causa do Rio de Janeiro e terminou deposta por uma quartelada, formando-se um governo denominado Governo dos Matutos, em outubro de 1822.

A Junta dos Matutos

Em 23 de setembro de 1822 foi eleita a chamada Junta dos Matutos, que substituiu a Junta Gervasiana. Seu governo se estenderia até dezembro de 1823. Era dominado por representantes da grande propriedade territorial. Membros eleitos da Junta foram, como presidente, Afonso de Albuquerque Maranhão, como secretário José Mariano de Albuquerque, e como membros Francisco Pais Barreto, o Morgado do CaboFrancisco de Paula Gomes dos Santos, Manuel Inácio Bezerra de Melo, Francisco de Paula Cavalcanti de Albuquerque e João Nepomuceno Carneiro da Cunha.

É ao tempo do Governo dos Matutos que verdadeiramente Frei Caneca ingressou na liga ideológica. Datam de então, diz Cabral de Mello, sua polêmica com José Fernandes Gama e seu sobrinho, o desembargador Bernardo José da Gama, cabeças da conspiração que derrubara Gervásio Pires Ferreira, e as Cartas de Pítia a Damão. Tendo ficado comprometidos na Pedrosada, tentativa frustrada de derrubar a Junta dos Matutos, os Gamas tentaram recuperar-se na corte e delataram o que chamavam facção republicana da província, elaborando uma lista de pessoas na qual figurava o frade.

Segundo a mesma obra, página 15:

"Frei Caneca passou à oposição, sem combatê-la, porém, frontalmente, preferindo empenhar-se contra o grupo que, no Rio de Janeiro, pretendia ditar a sorte da província. Frei Caneca pronunciou mesmo a oração gratulatória por ocasião da cerimônia de ação de graças, na igreja do Corpo Santo, pela aclamação de Dom Pedro I como imperador. Só a partir da constituição do governo de Manuel de Carvalho Pais de Andrade que, sete meses depois da posse proclamará a Confederação do Equador, há sinais de colaboração estreita do frade com o poder, mas ainda sob a forma de atividade jornalística e, esporadicamente, dando seu parecer sobre algumas das grandes decisões que deveria tomar o governo."

A primeira de suas cartas saiu a 17 de março de 1823, logo após a Pedrosada. Eram publicadas no Correio do Rio de Janeiro, periódico de propriedade de João Soares Lisboa, que participaria da Confederação do Equador, morrendo em 30 de setembro de 1824, ferido em combate durante sua fuga pelo interior de Pernambuco ao lado de Frei Caneca e seus demais companheiros.

Este Pedrosa, ou Pedro da Silva Pedroso, era o governador das armas da província que refez contra Pais Barreto a aliança que derrubara Gervásio Pires Ferreira, sem que se pudesse destitui-lo, pelo apoio recebido dos Gama, na corte.

Frei Caneca nunca combateu a Junta dos Matutos, composta de representantes da mata norte e sul da província, cujos interesses eram divergentes. Preferiu centrar fogo contra a facção pernambucana da Corte que endossava a política pessoal do imperador, seja sob José Bonifácio, seja sob seus sucessores.

Quanto à Pedrosada, a devassa instaurada pronunciou Pedro da Silva Pedroso e Paula Gomes, membro do governo, e José Fernandes Gama, mas a proteção imperial fez com que nenhum fosse punido. Dividida e desmoralizada, a Junta dos Matutos arrastou uma triste resistência até dezembro de 1823 quando renunciou. Enfrentava de um lado a oposição dos antigos Gervasistas reunidos ao redor do intendente da Marinha Manuel de Carvalho Pais de Andrade e de Cipriano Barata, que regressara das Côrtes de Lisboa. Do outro, as pressões do Rio de Janeiro, que exigia de Pernambuco as quantias mensais do tempo do rei e ainda mais dois milhões, equivalentes às remessas feitas para Portugal após a partida do rei.

A Confederação do Equador

É indispensável conhecer-se o contexto político e provincial das obras políticas de Frei Caneca, a situação em que viviam Pernambuco e as demais províncias, para entender o movimento que representou a Confederação do Equador - abafado sob "o peso da tradição saquarema na historiografia brasileira da Independência", ou seja, o que Evaldo Cabral de Mello chama "a historiografia da corte fluminense e dos seus epígonos na República" que reivindicam para as três grandes províncias do Sudeste o papel de construtores da nacionalidade. O ciclo revolucionário pernambucano não pode, é claro, ser considerado separatista - mas a presunção de separatismo foi consequência do hiato ocorrido entre o processo de emancipação no Sudeste e no Nordeste. No Rio de Janeiro, diz Cabral de Mello, a Independência começou como uma disputa entre absolutistas e liberais em torno da organização do Reino Unido e mesmo depois não se cogitou de separação de Portugal mas tão-somente de preservação dos status adquirido pelo Brasil no interior do Império lusitano. A situação era muito diferente no Nordeste, onde a Independência já começou com uma disputa entre colônia e metrópole, com a diferença de que esta última já não estava em Lisboa mas no Rio de Janeiro.

Em 1823 durante o movimento conhecido como Pedrosada, Frei Caneca redigiu "O Caçador" e as "Cartas de Pítia a Damão". Diz Cabral de Mello, página 29 da obra citada:

"Na euforia que se seguiu à revolução liberal do Reino, as expectativas do comércio e da lavoura no tocante à redução da carga fiscal não eram menores do que no resto do Brasil. Eram talvez maiores, de vez que com a instalação da corte em 1808 ela fora sobrecarregada de novos tributos destinados inclusive à iluminação pública do Rio, prontamente revogados pela junta de Gervásio. (...) O estado de falência a que ficara reduzido o Banco do Brasil com o regresso de d. João VI e a criação das juntas provinciais haviam limitado seriamente a ação da Corte, que só dispunha dos recursos da alfândega e da província do Rio, de vez que as demais províncias também negaceavam. Destarte, a adesão do Norte ao imperador era sobretudo uma questão de premente caráter financeiro, o café não proporcionando até os meados dos anos 30 a principal rubrica da receita fiscal, a qual devia provir, por conseguinte, do açúcar e do algodão, produtos predominantemente nortistas."

Evaldo Cabral de Mello considera que seria mais apropriado, em vez de republicanismo pernambucano, considerar seu autonomismo. "O projeto da revolução era antigo em Pernambuco", comentaria posteriormente o desembargador da Alçada que julgou o movimento. Havia "uma releitura da história provincial à luz da modernidade revolucionária representada pela filosofia política do século das luzes e da Revolução Francesa."

Para Frei Caneca e o Partido Autonomista, escarmentados pelo fracasso republicano em 1817, "a autonomia provincial tinha prioridade sobre a forma de governo". Estariam prontos a entrarem num compromisso com o Rio de Janeiro, o qual, em troca da aceitação do regime monárquico, daria amplas franquias às províncias. Não haveria porque rejeitar a monarquia, desde que autenticamente constitucional e desde que preservasse as franquias. A leitura do jornal de Cipriano Barata, A Sentinela da Liberdade, desmente as acusações de republicanismo.

Em 1824 Frei Caneca se tornou um dos conselheiros de Manuel de Carvalho Pais de Andrade, opinando contra o reconhecimento de Francisco Pais Barreto, o Morgado do Cabo, como presidente de Pernambuco. Opinou pela invasão de Alagoas, com vistas a debelar as forças contra-revolucionárias do Morgado do Cabo e contra o juramento da Constituição outorgada por Dom Pedro I. Diz Evaldo Cabral de Mello que "Frei Caneca subestimava os meios à disposição da Corte do Rio, superestimando, por outro lado, a vontade local de resistência ao despotismo fluminense (...)".

Tomou parte, com Cipriano Barata, como um dos líderes na Confederação do Equador, movimento republicano e separatista. Seus argumentos não se dirigiam contra o imperador mas contra o que considerava a derrapagem autoritária de José Bonifácio.

Após o 7 de Setembro, "o acirramento da luta entre José Bonifácio e os liberais da Corte havia levado à censura da imprensa, com o fechamento de jornais e o atentado contra o diretor da Malagueta, e à prisão de mais de 300 indivíduos, os mesmos que se haviam batido pela Independência desde a partida de Dom João VI".

Havia outras razões de insatisfação: as exigências do erário fluminense, o projeto de Constituição divulgado pelo Correio Braziliense em setembro de 1822, a criação do batalhão de suíços, a fundação do Apostolado, a instituição da Imperial Ordem do Cruzeiro, vista como "o clube dos aristocratas servis".

O Typhis Pernambucano

Em 25 de dezembro de 1823 circulou o primeiro número do Typhis Pernambucano, jornal que seria a trincheira de Frei Caneca até à liquidação da Confederação. De sua leitura depreende-se que ainda considerava culpados da situação o Partido Português do Rio e o ministério que sucedera ao de José Bonifácio. A dissolução da Assembleia tomara Pernambuco de surpresa mas "de 2 de julho em diante a história da Confederação se tornou a narrativa de uma derrota". Dom Pedro I suspendeu as garantias constitucionais na província, punindo-a territorialmente pois amputou a Comarca do São Francisco que constituía a margem esquerda do Rio São Francisco, hoje incorporada ao território da Bahia. O Recife foi submetido a bloqueio naval, desta vez pelo Almirante Cochrane, que canhoneou a cidade. Pernambuco foi invadido pelo sul pelas tropas do Brigadeiro Lima e Silva - a mata sul canavieira permaneceu indiferente - e a 12 de setembro de 1824 seus soldados ocuparam Recife.

Outra vez derrotado, refugiou-se com parte das tropas no interior, indo para o norte, rumo ao Ceará. Esteve no distrito, hoje município, de Abreu e Lima, de onde, pouco depois, fugiu para o Ceará. Nessa ocasião, escreveu o "Itinerário".

Prisão e Fuzilamento

Frei Caneca foi detido no exercício de suas funções de secretário das tropas sublevadas, da quais era também orientador espiritual, pelas tropas imperiais a 29 de novembro, sendo conduzido para o Recife.

Em 18 de dezembro de 1824 ali foi instalada uma comissão militar sob a presidência do coronel Francisco de Lima e Silva, pai do futuro Duque de Caxias, para proceder ao seu julgamento sob a acusação do crime de sedição e rebelião contra as imperiais ordens de Sua Majestade Imperial. Com plenos poderes para julgar e condenar sumariamente, o acusado foi condenado à morte por enforcamento. O próprio condenado descreveu o seu julgamento:

"No dia 20 fui eu conduzido perante o assassino tribunal da comissão de que eram membros o general Francisco de Lima e Silva, presidente; juiz relator, Tomás Xavier Garcia de Almeida; e vogais, o coronel de engenharia Salvador José Maciel, o tenente-coronel de caçadores Francisco Vicente Souto; o coronel de caçadores Manuel Antônio Leitão Bandeira; o Conde de Escragnolle, que foi o meu interrogante."
("Itinerário", in: Frei Joaquim do Amor Divino Caneca. Coleção Formadores do Brasil, 1994. p. 604)

Nos autos do processo, Frei Caneca é indiciado como um dos chefes da rebelião, escritor de papéis incendiários, sendo os dois outros chefes, Agostinho Bezerra Cavalcanti, capitão de granadeiros e comandante do 4º Batalhão de Artilheiros Henriques, e Francisco de Souza Rangel, por ser do corpo de guerrilha e achado com os dois primeiros.

Ao todo foram executados onze confederados, dos quais três no Rio de Janeiro. O primeiro deles foi Frei Caneca.

A 13 de janeiro de 1825, foi armado o espetáculo do enforcamento diante dos muros do Forte das Cinco Pontas. Despojado do hábito religioso, ou seja, "desautorado das ordens na igreja do Terço, na forma dos sagrados cânones", ainda assim tendo três carrascos que se recusaram a enforcá-lo. A Comissão Militar ordenou seu arcabuzamento, visto não poder ser enforcado pela desobediência dos carrascos, atado a uma das hastes da forca, por um pelotão sob o comando do mesmo oficial.

Seu corpo foi colocado junto a uma das portas do templo carmelita, no centro do Recife, sendo recolhido pelos religiosos e enterrado em local até hoje não identificado.

Quanto aos demais protagonistas, conta Evaldo Cabral de Mello que Manuel de Carvalho se refugiou a bordo de fragata inglesa, indo viver em Londres, de onde só retornará após a abdicação para reiniciar uma carreira política que o levará à presidência de Pernambuco e ao Senado do Império. O poeta Natividade Saldanha, secretário da Junta, se asilou na Venezuela e depois em Bogotá onde exerceu a advocacia e morreu em 1830.

Curiosidades

  • O muro contra o qual o religioso foi arcabuzado, continua de pé, vizinho ao Forte das Cinco Pontas. O local está marcado por um busto e por uma placa alusiva, colocada pelo Instituto Arqueológico e Geográfico de Pernambuco em 1917.
  • A iconografia sobre Frei Caneca mais conhecida do público é o quadro "Execução de Frei Caneca", de Murillo La Greca.
  • O poeta e escritor João Cabral de Melo Neto descreveu, em versos, o último dia de Frei Caneca, em sua obra "O Auto do Frade".
  • O irmão de João Cabral de Melo Neto, o historiador Evaldo Cabral de Mello, foi o organizador e redigiu a introdução, a qual intitulou "Frei Caneca ou a Outra Independência", ao livro "Frei Joaquim do Amor Divino Caneca" da Coleção Formadores do Brasil, Editora 34, Ltda, 2001.

Fonte: Wikipédia

Alvarenga Peixoto

INÁCIO JOSÉ DE ALVARENGA PEIXOTO
(49 anos)
Advogado e Poeta

* Rio de Janeiro, RJ (1744)
+ Ambaca, Angola (1793)

Inácio José Alvarenga Peixoto era filho de Simão Alvarenga Braga e Maria A. Braga.

Inconfidente e poeta brasileiro nascido no Rio de Janeiro, de posição mediana entre os numerosos versejadores ativos na segunda metade do século XVIII, em Minas Gerais.

Estudou com os jesuítas, provavelmente em Braga, Portugal (1760) e ingressou na Universidade de Coimbra, onde se formou, com louvor em 1768. Aí conheceu o poeta Basílio da Gama, de quem se tornou amigo.

Acrescentou em 1769 a seu nome literário o sobrenome Peixoto e se assinava também, como integrante da Arcádia Mineira, com os pseudônimos de Alceu e Eureste Fenício.

Doutor em leis pela Universidade de Coimbra, foi juiz de Cintra e regressou ao Brasil em 1775 como ouvidor de Rio das Mortes, a atual São João del-Rei.

Deixando a magistratura, ficou na região, ocupando-se da lavoura e da mineração, e em 1781 desposou a poetisa Bárbara Heliodora Guilhermina da Silveira, com que teve quatro filhos: Maria Efigênia, José, Miguel e João de Alvarenga Braga. À esposa, Alvarenga peixoto dedicou alguns de seus melhores versos.

A sua diminuita obra inscreve-se entre a dos poetas do Arcadismo, e foi recolhida por Rodrigues Lapa. Apresenta alguns dos sonetos mais bem acabados do Arcadismo no Brasil. A temática amorosa foi uma das vertentes da sua poesia, em que também se observa uma postura crítica quanto à sociedade da época.

De sua obra restam apenas alguns sonetos e uma pequena obra laudatória. Teria escrito, segundo a tradição, o drama lírico Enéias no Lácio, hoje desaparecido. Suas composições existentes, reunidas em Obras Poéticas (1865) por Joaquim Norberto, foram reproduzidas por Péricles Eugênio da Silva Ramos na antologia Poesia do Ouro (1964).

Proprietário em Lavras no sul de Minas Gerais, tomou parte no famoso movimento nacionalista da Inconfidência Mineira, por discordar das pesadas taxações do reino.

Foi amigo dos poderosos da época e partilhava com os demais intelectuais de seu tempo idéias libertárias advindas do Iluminismo. Entre essas personalidades destacam-se os poetas Cláudio Manuel da Costa e Tomás Antônio Gonzaga (seu parente), o padre José da Silva Oliveira Rolim, o militar Joaquim José da Silva Xavier (Tiradentes), e Joaquim Silvério dos Reis, que delataria os conjurados.

Pressionado por dívidas e impostos em atraso, acabou por se envolver na Inconfidência Mineira. Denunciado e detido, em companhia de seu parente Tomás Antônio Gonzaga, foi conduzido ao presídio da Ilha das Cobras, no Rio de Janeiro. Negou sua participação no movimento, mas mesmo assim foi julgado e condenado à morte, pena comutada para o Degredo Perpétuo em Angola, onde permaneceu desterrado e morreu, no presídio de Ambaca em 1792.

Princesa Isabel

ISABEL CRISTINA LEOPOLDINA AUGUSTA MICAELA GABRIELA RAFAELA GONZAGA DE BRAGANÇA E BOURBON
(75 anos)
Última Princesa Imperial do Brasil

* Rio de Janeiro, RJ (29/07/1846)
+ Eu, França (14/09/1921)

Foi a última princesa imperial do Brasil e regente do Império por três ocasiões, na qualidade de herdeira de seu pai, o imperador Dom Pedro II, e da imperatriz Dona Teresa Cristina de Bourbon-Duas Sicílias. Foi a terceira Chefe de Estado brasileira após sua avó Maria Leopoldina e sua trisavó Dona Maria I. Foi cognominada a Redentora por ter, através da Lei Áurea, abolido a escravidão no Brasil.

Após seu casamento com o príncipe Gastão de Orléans, Conde d'Eu, em 1864, ocorreu uma junção matrimonial entre a Casa de Bragança e a de Casa de Orléans, originando o nome Orléans e Bragança, que foi passado, exclusivamente, aos descendentes de Gastão de Orléans e Dona Isabel. Também, por a mesma ter sido a herdeira do trono imperial brasileiro, os seus descendentes - os Orléans e Bragança - são os atuais herdeiros da extinta Coroa Imperial do Brasil.

A princesa Isabel foi também a primeira senadora do Brasil, cargo a que tinha direito como herdeira do trono a partir dos 25 anos de idade, segundo a constituição imperial brasileira de 1824.

Com a morte de seu pai, em 1891, tornou-se Chefe da Casa Imperial do Brasil e a primeira na linha sucessória ao extinto trono imperial brasileiro, sendo considerada, de jure, Sua Majestade Imperial, Dona Isabel I, Por Graça de Deus, e Unânime Aclamação dos Povos, Imperadora Constitucional e Defensora Perpétua do Brasil.

Nascimento e Infância

Isabel nasceu no Palácio de São Cristóvão, e foi a primeira filha do Imperador Dom Pedro II.

Batizada na Capela Imperial no dia 15 de novembro de 1846 pelo bispo capelão-mor conde de Irajá, seu nome foi dado em homenagem à avó materna, a rainha de Nápoles. Seus padrinhos de batismo foram o rei consorte Fernando II de Portugal e sua avó materna a rainha Isabel de Nápoles. Com a morte precoce de seu irmão Dom Afonso Pedro de Alcântara de Bragança, Isabel tornou-se a herdeira de seu pai. Neste mesmo ano de 1847 nasceria em 13 de julho a sua irmã e companheira de toda a mocidade, a princesa Leopoldina de Bragança e Bourbon.

Em 1848 nasceu o seu segundo irmão varão, o príncipe Dom Pedro Afonso, que morreu dois anos depois. Para herdar o trono imperial restava a princesa de quatro anos de idade, designada a partir de então como Princesa Imperial. O reconhecimento oficial como sucessora e herdeira do pai teve lugar a 10 de agosto de 1850, quando a Assembleia-Geral, reunida no Paço do Senado às 11 horas da manhã, proclamou-a herdeira do trono, de acordo com os artigos 116 e 117 da Constituição do Império.

A 29 de julho de 1860 completava Dona Isabel 14 anos e, de acordo com o artigo 106 da Constituição Imperial, deveria prestar o juramento de "manter a religião católica apostólica romana, observar a Constituição política da nação brasileira e ser obediente às leis e ao imperador."

Educação

A fim de prepará-la para seu papel, começou Dom Pedro II a preocupar-se com a formação da futura imperadora. Desde cedo, porém, o Imperador iniciou entendimentos para dar às filhas uma preceptora. Por indicação da tia das princesas, Francisca de Bragança, a escolhida foi a Condessa de Barral, filha do embaixador Domingos Borges de Barros, Visconde de Pedra Branca e esposa do nobre francês, o Conde de Barral, considerada pela maior parte dos autores - inclusive José Murilo de Carvalho, em seu livro "D. Pedro II" (Companhia das Letras, 2007) - como o grande amor do imperador Dom Pedro II. A condessa iniciou suas funções em setembro de 1855.

Para a educação de Dona Isabel e da sua irmã, numerosos mestres foram designados, que elaboraram um severo programa de estudos. Afirma D. Pedro II sobre a educação de suas filhas:

"O caráter de qualquer das princesas deve ser formado tal como convém a senhoras que poderão ter que dirigir o governo constitucional de um Império como o Brasil. A instrução não deve diferir da que se dá aos homens, combinada com a do outro sexo: mas de modo que não sofra a primeira. Convirá conformar-se, quando for de proveito, aos regulamentos da instrução pública primária e secundária. Poderá impor castigos, e quando forem leves, sem meu conhecimento prévio, devendo minhas filhas não saber ilegível que o tenho, quando isto não for conveniente, sendo o maior deles a reclusão em um dos quartos dos respectivos aposentos, assim como representar-nos, mesmo perante nossas filhas, sobre a justiça da concessão de algum prêmio."

Mas, apesar de todo este rigor, sua infância teve muitos momentos de descontração, ao lado da irmã Leopoldina. Em seu diário ela diz:

"Petrópolis, residência de verão, residência deliciosa: jardins floridos, canais cortando a cidade..."

Ou mais adiante:

"Eu fui de Petrópolis a pé até a cascata de Tamarati. A mana andou tão pouco a cavalo."

Em São Cristóvão, para amenizar o ambiente carregado de estudos e deveres, pequenas peças teatrais eram levadas à cena, em que as princesas desempenhavam os principais papéis na companhia dos amigos de infância, inclusive pequenos escravos.

A proximidade da princesa com os negros, desde a mais tenra infância, e o diálogo franco e cordial com eles estabelecido, inclusive nas brincadeiras infantis, pode vir a explicar sua futura inserção no movimento abolicionista. A questão ainda não foi convenientemente estudada pela historiografia brasileira.

Sob a influência de seu pai, o estudo das ciências, em particular da Química, ocupou um papel primordial na educação de Dona Isabel. O ensino das princesas dirigido pelo imperador refletia sua visão de uma educação universal com forte teor científico como essencial para um governante. O conteúdo do currículo seguido por Dona Isabel contrasta fortemente com a educação dada à maioria das mulheres brasileiras da época, inclusive aquelas de origem abastada. Dona Isabel nutria profundo interesse pelas questões ligadas ao desenvolvimento da educação no país, especialmente a educação pública, como fica patente na sua Fala do Trono, enquanto Regente do Império, em 1º de fevereiro de 1877:

"A instrução pública continua a merecer do governo a maior solicitude. Foram criadas no município da corte escolas de segundo grau, e as normais, destinadas a preparar professores para o ensino primário de ambos os sexos, terão de ser brevemente inauguradas. Nas províncias este ramo de serviço apresenta sensível progresso, limitado, porém pela falta de meios de que podem dispor. Se os melhoramentos materiais por elas empreendidas têm recebido vosso auxílio, justificada será qualquer despesa que autorizeis para coadjuvar esse grande elemento de civilização."

Casamento

Os preparativos para seu casamento foram iniciados na década de 1860. Por indicação de sua tia, Dona Francisca de Bragança (filha de Dom Pedro I), princesa de Joinville na França, vieram ao Brasil dois primos, os príncipes Gastão de Orléans, Conde d'Eu e Luís Augusto de Saxe-Coburgo-Gota, sobrinhos-netos do Rei Leopoldo I dos Belgas, sobrinhos de Dom Fernando II de Portugal, além de primos de segundo grau da Rainha Vitória do Reino Unido.

O imperador havia tratado, através de seus ministros, o casamento da princesa Isabel, herdeira do trono, com o duque Luís Augusto de Saxe-Coburgo-Gota, o segundo filho de Augusto de Saxe-Coburgo-Gota e da Princesa Clementina de Orléans. Ao mesmo tempo, o primo deste, Luís Filipe Maria Fernando Gastão de Orléans e Saxe-Coburgo-Gota, Conde d'Eu, foi prometido à Princesa Leopoldina.

Quando da chegada dos dois jovens, as princesas perceberam que deveria ocorrer uma troca, pois cada uma delas havia se encantado pelo pretendente da outra, e imediatamente solicitaram aos pais que a troca fosse realizada. Tanto Dom Pedro quanto Dona Teresa Cristina, favoráveis a que os casamentos fossem motivados não apenas pelas questões dinásticas, mas também pelos afetos - até porque, no seu próprio caso, havia ocorrido um choque inicial - consentiram imediatamente. Em 18 de setembro de 1864 o Príncipe Gastão de Orléans pediu a mão da Princesa Imperial do Brasil.

O casamento teve lugar na Capela Imperial, no Rio de Janeiro, a 15 de outubro de 1864. No mesmo dia os noivos partiram para a lua de mel em Petrópolis, e em 10 de janeiro de 1865 seguiram para a Europa, onde a princesa conheceu os sogros.

Gastão, batizado Louis Philippe Marie Ferdinand Gaston, nascera em 1842 e morreu em 1922 em águas brasileiras, a bordo do navio Massilia. Era não só Conde d'Eu como príncipe de Bourbon-Orléans, sendo feito depois marechal do exército brasileiro. Era filho de Luís Carlos Filipe Rafael d'Orléans, Duque de Nemours, logo, neto do Rei francês Luís Filipe I.

Gastão assumiria o comando das tropas brasileiras na fase final da Guerra do Paraguai, razão de preocupação para Dona Isabel, e fato que provocou muita oposição em diversos círculos, pois nem sempre foram sábias as decisões militares tomadas.

Finda a guerra o casal fez nova viagem à Europa, para visitar Leopoldina, doente. Leopoldina morreu de tifo em 7 de fevereiro de 1871. No mesmo ano Dom Pedro II fez sua primeira viagem à Europa e Dona Isabel assumiu a regência, aos 24 anos. Neste período foi assinada a 28 de setembro a Lei do Ventre Livre.

A ausência de filhos preocupava a todos. A princesa concebeu durante sua viagem à Europa, mas somente no sexto mês de gravidez começou a pensar na dificuldade de retornar ao Brasil para que aqui nascesse o herdeiro. Embarcou de volta dois meses depois e, já no Brasil, nasceu morta uma menina, em 28 de julho de 1874, no Palácio Isabel (atual Palácio Guanabara), batizada in articulo mortis com o nome de Luiza.

Finalmente, em 15 de outubro de 1875, quando comemoravam onze anos de casados, nasceu em Petrópolis o príncipe Dom Pedro de Alcântara.

Segundo Victor Villon: "A gravidez foi cheia de cuidados, o parto muito difícil e, no meio da aflição de todos, o Dr. Depaul, médico francês que viera especialmente para a ocasião, distorceu o braço da criança. Esse acidente deixaria seqüelas: Dom Pedro de Alcântara ficaria com braço atrofiado para o resto da vida."

Em 26 de janeiro de 1878 nasceu o segundo filho Dom Luís Maria Filipe de Orléans e Bragança. No mesmo ano o casal foi residir na França. Em 9 de agosto de 1881 lá nasceu o terceiro e último filho, Dom Antônio Gastão. No mesmo ano a família voltaria a viver no Brasil.

Postura Política

Liberal, a princesa uniu-se aos partidários da abolição da escravidão. Apoiou jovens políticos e artistas, embora muitos dos chamados abolicionistas estivessem aliados ao incipiente movimento republicano. Financiava a alforria de ex-escravos com seu próprio dinheiro e apoiava a comunidade do Quilombo do Leblon, que cultivava camélias brancas, símbolo do abolicionismo. Chegava mesmo a receber fugitivos em sua residência em Petrópolis:

"A Princesa Isabel também protegia fugitivos em Petrópolis. Temos sobre isso o testemunho insuspeito do grande abolicionista André Rebouças, que tudo registrava em sua caderneta implacável. Só assim podemos saber hoje, com dados precisos, que no dia 4 de maio de 1888, "almoçaram no Palácio Imperial 14 africanos fugidos das Fazendas circunvizinhas de Petrópolis". E mais: todo o esquema de promoção de fugas e alojamento de escravos foi montado pela própria Princesa Isabel. André RebouçasAndré Rebouças se hospedava, também estava comprometido até o pescoço, chegando a esconder 30 fugitivos em sua fazenda, nos arredores da cidade. O advogado Marcos Fioravanti era outro envolvido, sendo uma espécie de coordenador geral das fugas. Não faltava ao esquema nem mesmo o apoio de importantes damas da corte, como Madame Avelar e Cecília, condessa da Estrela, companheiras fiéis de Isabel e também abolicionistas. Às vésperas da Abolição final, conforme anotou Rebouças, já subiam a mais de mil os fugitivos "acolhidos" e "hospedados" sob os auspícios de Dona Isabel."

Conforme o artigo 46, capítulo 3, título IV, da constituição brasileira de 1824, os Principes da Casa Imperial são Senadores por Direito, e terão assento no Senado, logo que chegarem a idade de vinte e cinco anos. Dessa forma, em 1871, Dona Isabel Leopoldina tornou-se a primeira senadora do Brasil (a primeira senadora brasileira eleita foi Eunice Mafalda Berger Michiles). Há que se notar que foi a única a desfrutar desse dispositivo constitucional, haja vista que todos os príncipes do Brasil que a antecederam ou morreram antes dos vinte e cinco anos, ou se casaram com estrangeiros e partiram do país, à exceção de seu pai, que assumiu o Trono aos quatorze anos de idade. Depois dela, a ordem constitucional do Império caiu antes que os príncipes porvir pudessem tornar-se senadores.

"Isabel Cristina comemorou seu aniversário de 39 anos, em 1885, com uma solenidade no Paço Municipal da capital, o Rio de Janeiro. Sentada, tendo a seu lado o marido, foi a estrela da cerimônia em que diversos escravos foram alforriados. Conforme os nomes dos beneficiados eram anunciados pelo vice-presidente da Câmara, João Florentino Meira de Vasconcellos, eles seguiam para receber seus certificados de libertação das mãos de Isabel. Cada ex-escravo curvava-se e, em sinal de respeito e gratidão, dava um beijo na mão da aniversariante. A relação de afeto entre a mulher e os negros começava a ser demonstrada publicamente."

Em 30 de junho de 1887 assumiu a regência do império pela terceira vez, pois seu pai fora obrigado a afastar-se para tratamento de saúde na Europa. A abolição provocava grande oposição entre os fazendeiros escravocratas. Poderosos, esses escravocratas infundiram na opinião pública, através do Parlamento e da imprensa, a idéia de que a abolição da escravidão seria a bancarrota econômica do império, pois as prósperas fazendas de café e açúcar do Brasil de então eram todas elas, regadas com o suor do escravo. O negro era contado, medido e pesado e os juristas dos escravocratas criaram a tese jurídica de que o escravo era "propriedade" do senhor de engenho e, portanto, estavam sob amparo da Constituição, que garantia o "direito de propriedade". Eram tensas as relações entre a Regente e o Gabinete Ministerial conservador. A Princesa aliava-se ao movimento popular, enquanto o Barão de Cotegipe defendia a manutenção da escravidão.

Aproveitando-se da oportunidade oferecida por um incidente de rua, Isabel demitiu o ministério e nomeou o conselheiro João Alfredo, demonstrando determinação política e convicção do que considerava o melhor para o país, pois o Brasil foi a última nação do ocidente a abolir a escravidão. Na Fala do Trono, de 1888, Isabel dissera com o coração jubiloso: "Confio em que não hesitarei de apagar do direito pátrio a única exceção que nele figura..." O Conde d'Eu, marido de Isabel, ainda lhe advertiu: "Não assine, Isabel, pode ser o fim da Monarquia". Mas a Princesa estava determinada e respondeu prontamente ao marido: "É agora, ou nunca!". Afinal, a escravidão, que tanto envergonhara a raça humana no Brasil, já durava, em 1888, três séculos, vitimando 12 milhões de negros africanos. Estava aberto o caminho para a liberdade dos escravos no império.

Em 13 de maio de 1888, num domingo, aconteceram as últimas votações de um projeto de abolição total. Certa da vitória, a regente desceu de Petrópolis, cidade serrana, para aguardar no Paço Imperial o momento de assinar a Lei Áurea. Usou uma pena de ouro especialmente confeccionada para a ocasião, recebendo a aclamação do povo do Rio de Janeiro. O Jornal da Tarde, de 15 de maio de 1888, noticiou que "o povo que se aglomerava em frente do Paço, ao saber que já estava sancionada a grande Lei, chamou Sua Alteza, que aparecendo à janela, foi saudada por estrepitosos vivas." As galerias do Paço estavam repletas, e sob vivas e aplausos de uma multidão estimada em 10 mil pessoas, Isabel sancionou a Lei aprovada pelo Parlamento do Império.

O jornalista mulato José do Patrocínio, aliado da Coroa, invadiu o recinto sem que ninguém conseguisse detê-lo e atirou-se aos pés da Princesa Regente em prantos de gratidão. Isabel dava provas, de que seu reino era, sim, deste mundo, contrariando a ironia do conselheiro Saraiva que afirmara justamente o contrário, zombando do sentimento profundamente cristão de Isabel. A história há de fazer sempre justiça à "Princesa Redentora", título que lhe atribuiu José do Patrocínio, pois ela demonstrou no processo abolicionista firmeza, coragem e, sobretudo, nobre desapego ao cargo, o qual - lhe preveniram - haveria de ser dela tomado pela reação inevitável dos altos e egoísticos interesses escravocratas contrariados, tudo conforme relata o livro "Dom Pedro II e a Princesa Isabel", da Editora Lorenz, onde consta memorável testemunho do nobre abolicionista Joaquim Nabuco:

"No dia em que a Princesa Imperial se decidiu ao seu grande golpe de humanidade, sabia tudo o que arriscava. A raça que ia libertar não tinha para lhe dar senão o seu sangue, e ela não o queria nunca para cimentar o trono de seu filho. A classe proprietária ameaçava passar-se toda para a República, seu pai parecia estar moribundo em Milão, era provável a mudança de reino durante a crise, e ela não hesitou: uma voz interior disse-lhe que um grande dever tem que ser cumprido, ou um grande sacrifício que ser aceito. Se a Monarquia pudesse sobreviver à abolição, esta seria o apanágio. Se sucumbisse, seria o seu testamento..."

Em 28 de setembro o Papa Leão XIII lhe remeteu a "Comenda da Rosa de Ouro", como reconhecimento pela Abolição da Escravatura. Essa comenda pontifícia simboliza o reconhecimento do Papa a algum feito notável e que mereça regozijo de toda a Igreja.

A Princesa Isabel foi a única personalidade brasileira a receber a Rosa de Ouro. Ou outros dois exemplares foram dedicados à Basílica de Nossa Senhora Aparecida pelos PapasPaulo VI (1965) e Bento XVI (2007).

Mas a elite cafeeira não aceitava a abolição. Cotegipe, ao cumprimentar a princesa, vaticinou: "Vossa Alteza libertou uma raça, mas perdeu o trono". Mas a Princesa não hesitou em responder: "Mil tronos eu tivesse, mil tronos eu daria para libertar os escravos do Brasil"

De pensamento arrojado para sua época, Dona Isabel era partidária de ideias modernas, como o sufrágio feminino e a reforma agrária. Documentos recentemente descobertos revelam que a princesa estudou indenizar os ex-escravos com recursos do Banco Mauá.

A Professora Doutora Sueli Carneiro (Doutora em Educação pela USP e diretora do Geledés - Instituto da Mulher Negra), ao analisar carta da princesa Isabel, datada de 11 de agosto de 1889 - veiculada recentemente na Imprensa, coloca de maneira bastante ponderada:

"Mas há coisas que só podem ocorrer no Brasil. A revelação de um documento histórico cujo conteúdo é de grande importância para milhões de brasileiros descendentes de escravos reduziu-se, na matéria produzida pela TV, a mera reatualização dos nossos antigos manuais didáticos que eram prenhes na reiteração do caráter benevolente da princesa por decretar a Abolição.(...) No entanto, o melhor reconhecimento a se fazer à princesa seria pautar a discussão sobre o seu sonho malogrado de provimento aos ex-escravos de condições para sobreviverem e prosperar dignamente na sociedade brasileira — carência de que padecem ainda hoje os seus descendentes —, dando inclusive absoluta atualidade à carta. Porém, são precisamente editoriais raivosos de jornais contra as políticas para a redução das desigualdades raciais que conspiram contra os ideais defendidos pela princesa e enaltecidos na matéria. Compreende-se,então, o foco dado ao documento."

A República e o Exílio

Em 9 de novembro de 1889, poucos dias antes do golpe militar que instaurou a República no Brasil, a família imperial compareceu ao Baile da Ilha Fiscal, o último da monarquia:

"Dançou-se muito no Baile da Ilha Fiscal, mas o que os convidados não imaginavam, nem o imperador Dom Pedro II, é que se dançava sobre um vulcão. À mesma hora em que se acendiam as luzes do palacete para receber os milhares de convidados engalanados, os republicanos reuniam-se no Clube Militar, presididos pelo tenente-coronel Benjamin Constant, para maquinar a queda do Império. "Mais do que nunca, preciso sejam-me dados plenos poderes para tirar a classe militar de um estado de coisas incompatível com sua honra e sua dignidade", discursou Constant na ocasião, tendo como alvo justamente o Visconde de Ouro Preto.

Longe dali, ao lado da família imperial, o Visconde desmanchava-se em sorrisos ao comandar seu suntuoso festim. A família imperial chegou ao cais pouco antes das 10 horas. Dom Pedro II, fardado de almirante, a Imperatriz Teresa Cristina e o príncipe Dom Pedro Augusto embarcaram primeiro. Quinze minutos depois foi a vez da princesa Isabel e do Conde d'Eu. Uma vez no palácio, foram conduzidos a um salão em separado, onde já se achavam reunidos membros do corpo diplomático estrangeiro, oficiais e alguns eleitos da sociedade carioca. O guarda-roupa da imperatriz não chegou a causar impressão especial entre os convidados - um vestido de renda de chantilly preta, guarnecido de vidrilhos. A toalete da princesa Isabel, no entanto, causou exclamações de admiração pelo luxo e pela beleza. Ela portava uma roupa de moiré preta listada, tendo na frente um corpinho alto bordado a ouro. Nos cabelos, carregava um diadema de brilhantes."

Na sequência, pouco mais de um ano depois de testemunhar o júbilo popular com a abolição da escravatura, Dona Isabel veria a monarquia no Brasil ser extinta. Insuflados pelos radicais positivistas e apoiados pelos fazendeiros, os militares depuseram o gabinete do Visconde de Ouro Preto e instauraram uma ditadura republicana. O livro "Barão de Santo Angelo, O Espírita da Corte" (Editora Lorenz) analisa as motivações do golpe republicano e traz informações importantes sobre as revoltas e ressentimentos pessoais do líder Benjamin Constant contra o Monarca, fator considerado decisivo para a realização da quartelada que ensejou a proclamação a República.

Os chamados "ideais republicanos", na verdade, constituiriam um simples pano de fundo para justificar a insurreição que mudou a forma de Governo em 1889. Dona Isabel, com 43 anos de idade, seguiu com sua família para o exílio, na madrugada de 17 de novembro de 1889, depois de ter sido expedida, na véspera, uma intimação pelo Major Frederico Solón, o mesmo que houvera espalhado a calúnia, na Rua do Ouvidor, de que Dom Pedro II decretara a prisão de Deodoro e Benjamin Constant, notícia falsa que precipitou o golpe, com a cavalaria na rua.

A madrugada do embarque para o exílio era chuvosa e o mar estava revolto com graves riscos para as embarcações. Dom Pedro II sofria uma crise aguda do diabetes e embarcou, com dificuldade, amparado por seu médico particular, o Dr. Mota Maia, que com ele seguiu viagem. Foi nesse contexto dramático que a família real rumou para o exílio sem volta, depois de quase meio século de um Governo de paz e prosperidade, reconhecido pelos historiadores.

Segundo suas próprias palavras, Isabel deixou a pátria aos soluços, sob as ordens e intimações do tenente-coronel João Nepomuceno Mallet, que mais tarde iria insurgir-se contra o proprio Governo republicano que ele ajudou a instalar. Não faltou quem quisesse reagir, como foi o caso do Almirante Tamandaré, mas Dom Pedro II recusou qualquer reação e pacificamente deixou o território nacional, para entrar na História.

E o Brasil inaugurou a República sob forte crise, com fechamento do Congresso, banimentos, censura à imprensa, perseguição de jornalistas, autoritarismos. A inflação disparou e a economia entrou em crise. E assim foi praticamente durante toda a primeira década de República.

Os temores expressos na carta de três meses antes se confirmaram antes de que fosse possível legar aos negros libertos sua cota de justiça.

Dom Pedro II morreu em Paris, em 5 de dezembro de 1891, e ela passou a ser considerada pelos monarquistas imperatriz de jure do Brasil - Dona Isabel I.

Apesar da dor do exílio Dona Isabel teve uma velhice tranquila, instalada no castelo da família em Eu, na Normandia, propriedade de Gastão de Orléans (Castelo d'Eu). Rodeada pelos filhos e netos fez de sua casa uma embaixada informal do Brasil. Recebia brasileiros de passagem, ajudou o jovem Alberto Santos Dumont quando desenvolvia suas invenções. Passou os últimos anos da vida com dificuldades de locomoção. Em 1920 teve a felicidade de saber que a lei que bania a Família Imperial do Brasil havia sido revogada pelo Presidente Epitácio Pessoa.

Neste sentido, convém notar, como em todos os processos históricos, houve uma disputa judicial, iniciada logo após o exílio forçado, e durante a qual aconteceram avanços e retrocessos, pareceres favoráveis e desfavoráveis e uma série de constrangimentos pelos quais a família imperial teve de passar. Em 1903, por exemplo, foi julgado em 14 de janeiro um pedido de habeas corpus impetrado pelos republicanos Urbano Sampaio Neves, Olympio Lima e Alberto Veiga:

"Olympio Lima e outros impetram ordem de habeas corpus em favor de Gastão de Orléans, Conde d'Eu, sua mulher Isabel de Orleans e demais membros da ex-dinastia brasileira de Bragança, para que cesse o constrangimento ilegal de que são vítimas, por força do decreto que os baniu do território nacional, e pedem a anulação do citado decreto, alegando que ele foi revogado pela Constituição Federal."

Sobre o habeas corpus, sua elaboração e princípios, o site Histórias e Lendas de Santos afirma:

"A idéia de um habeas-corpus em favor da banida Família Imperial Brasileira nasceu do doutor Urbano de Sampaio Neves, ilustre advogado. Sua ação, como republicano, traduzira-se bem em seus trabalhos de jornalista no ultra-republicano Diário de Notícias. As conclusões a que chegara Urbano Neves são simples e objetivas: "Somente por ilegalidade, timidez ou indiferença é que a Família Imperial continua no exílio sob a pressão do decreto que a baniu do território nacional. Só por estranho capricho, ou revoltante ingratidão, é que se recusa sepultura em terra brasileira ao venerando Monarca que durante meio século dirigiu os destinos deste País". Urbano Neves levou sua idéia ao doutor Martim Francisco Ribeiro de Andrada - duplamente ilustre, pela ascendência e pelo talento - sugerindo-lhe que requeresse uma ordem de habeas-corpus, já que suas opiniões políticas o aproximavam da Monarquia, já porque a sua comprovada competência jurídica e o prestígio de seu nome dariam àquele recurso as proporções de verdadeiro acontecimento. O doutor Martim Francisco, porém, recusou a idéia. Escrúpulos de ordem moral e política, que a situação justificava, e porque a seus amigos e correligionários parecia inoportuna qualquer atitude que provocasse, por parte das autoridades republicanas, maiores desabrimentos e intolerâncias, deixava de intentar o recurso sugerido, aguardando melhores tempos e melhores circunstâncias. Suas idéias eram, porém, francamente favoráveis ao habeas-corpus e, por várias vezes, manifestou-se publicamente a seu favor. Uma vez que a iniciativa do recurso de habeas-corpus não partia do elemento dinástico, partisse, então, dos republicanos, como afirmação categórica do sentimento de justiça que deve presidir os regimes democráticos. E dessa vez não houve medo, receio, escrúpulo, precaução. Os dois mais brilhantes redatores de A Tribuna, Olympio Lima, seu fundador, e Alberto Veiga, talvez o mais perfeito estilista da imprensa santista, colocaram-se ao lado de Urbano Neves. E juntos, diante do País e da História, assumiram a inteira responsabilidade desse ato superior e necessário. Isso estabelecido, caberia, naturalmente, a Urbano Neves redigir a petição, já que teve a iniciativa da idéia e era dono do conhecimento profissional necessário, mas o advogado preferiu confiar a Alberto Veiga, sob sua assistência quanto à parte jurídica, aquela tarefa. Sem dúvida alguma, ninguém melhor do que Alberto Veiga, o mais completo redator, o mais perfeito articulista, para redigir o documento. E, igualmente, ninguém mais autorizado a ser um aliado naquele trabalho, pelo seu caráter, honra e sentimento de justiça, cerrando fileiras junto aos demais, pela causa."

Sobre a revogação do Decreto de Banimento propriamente dito, a notícia foi veiculada inicialmente pelo jornal "O Imparcial", do Rio de Janeiro, no dia 4 de setembro de 1920. O decreto 4.120, assinado em 3 de setembro de 1920, procurava corrigir uma distorção jurídica, onde uma família brasileira, que não cometera crime algum, fora expulsa do país de maneira arbitrária.

É a historiadora Luciana Pessanha Fagundes, em seu memorável artigo "Memórias da Monarquia: Dom Pedro II no Cenário Político da Década de 20" quem nos descreve as circunstâncias em que se deu esta revogação:

"Enfim, no dia 3 de setembro realizava-se no Salão de Despachos do Palácio do Catete a assinatura do decreto que revogava o banimento da Família Real. Para assinatura do decreto foi oferecida ao presidente uma caneta de ouro obtida especialmente para a ocasião com dinheiro arrecadado mediante subscrição pública promovida pelo jornal "A Rua". A cerimônia foi realizada com a presença de comissões de várias instituições importantes como o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, a Associação Brasileira de Letras e a Associação Brasileira de Imprensa. O decreto é caracterizado como uma "nova Lei Áurea" por Affonso Celso em artigo para o Jornal do Brasil. O presidente do IHGBLei Áurea para a lei assinada naquele dia se devia pelo fato de que, assim como a de 13 de maio, "essa lei repara uma grave injustiça" e também "redime do exílio a excelsa senhora que mereceu o cognome de Redentora". A república teria, então, inscrito nos anais da história uma "data luminosa semelhante aquela do Império". Revogado o banimento, são formadas rapidamente duas comissões, capitaneadas pelo IHGB, encarregadas de organizar a recepção dos despojos do imperador e da imperatriz."

Além do banimento - por si só um ato autoritário e injustificável - ocorreu um verdadeiro confisco dos bens (particulares) da Família Imperial. Pouco comentado pela historiografia brasileira é o fato de que praticamente todos os bens e pertences dos Orléans e Bragança foram leiloados:

"No Brasil de 1890 deram-se 13 leilões dos bens da Casa Imperial - objetos, móveis e semoventes. Procederam à avaliação dos móveis, carros, animais e objetos existentes na Quinta da Boa Vista e os vindos do Paço da Cidade. O tenente-coronel Costa Ferreira, da parte do Juízo da 2ª Vara de Órfãos e João Teixeira, por parte do dr. José da Silva Costa, procurador de Dom Pedro de Alcântara. O Juiz da 2ª vara, dr. Honório Coimbra nomeou para proceder ao leilão o leiloeiro Joaquim Dias dos Santos. Francisco Marques dos Santos, em seu artigo intitulado "O leilão do Paço de São Cristóvão", publicado no Anuário do Museu Imperial, vol. 1, 1940, fala dos absurdos, da desordem, da avaliação arbitrária e venda forçada dos bens da família."

Exilada, espoliada, com a saúde frágil, extremamente abalada pela morte de dois de seus filhos (Antônio, em 1918, e Luís, em 1920), a princesa Isabel faleceu em 14 de novembro de 1921. Foi sepultada no cemitério local, de onde seria trasladada em 6 de julho de 1953 para um jazigo no Mausoléu Imperial da Catedral de Petrópolis. Como afirma Nelly Martins Ferreira Candeias: "A Princesa Isabel conviveu com o predomínio agrário do tempo e declínio dos escravagistas marginalizados pelo golpe fatal da Abolição. Enfrentou a ideologia republicana dos adversários, a extinção da monarquia e as tristezas do exílio."

Interesse Pela Doutrina Espírita

Apesar de ser a Princesa Isabel católica praticante, consta de uma carta que Manuel de Araújo Porto-alegre, o Barão de Santo Ângelo, escreveu a seu amigo e professor dos filhos da princesa, Joaquim Manuel de Macedo, que Sua Alteza, um dia, perguntou-lhe: "Quem é meu Espírito protetor?". Manuel de Araújo Porto-alegre era espírita declarado e se regozijava disso, dedicando-se entusiasticamente à psicografia. A carta do Barão de Santo Ângelo, datada de 25 de dezembro de 1865, com doze páginas manuscritas, foi escrita da cidade de Dresda, na Alemanha, e se encontra arquivada no Arquivo Nacional, no Rio de Janeiro, tendo sido também transcrita, na íntegra, com análise de seu conteúdo, no livro "Barão de Santo Ângelo, O Espírita da Corte", de autoria de Paulo Roberto Viola, publicado pela Editora Lorenz. O documento porém nada elucida além de uma curiosidade por parte da princesa. Extremamente religiosa e ligada ao Papa e ao Ultramontanismo, colocava-se sempre ao lado da Igreja em diversas ocasiões. A religiosidade da Princesa e o desejo de seu Pai, o Grande Imperador Dom Pedro II, em ver o Brasil transformado em um Estado Laico constam do livro "Dom Pedro II e a Princesa Isabel, Uma Visão Espírita-Cristã do Segundo Reinado", publicação da Editora Lorenz, primeiro livro do gênero lançado no dia 13 de maio de 2008 na Academia Brasileira de Letras.

Fonte: Wikipédia