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Marçal de Souza

MARÇAL DE SOUZA
(62 anos)
Líder da Etnia Guarani-Nhandevá, Enfermeiro e Intérprete

* Ponta Porã, MS (24/12/1920)
+ Antônio João, MS (25/11/1983)

Marçal de Souza ou Marçal Tupã-I (Deus Pequeno), por muitos chamado de Marçal Guarani, foi um líder da etnia guarani-nhandevá (que habita o oeste do Brasil, nas fronteiras com Argentina, Bolívia e Paraguai), enfermeiro e intérprete da língua Guarani. Recentemente foi condecorado com a honra de Herói Nacional do Brasil pelo Governo Federal.

Marçal de Souza, foi defensor incansável dos povos nativos da América do Sul e um dos líderes precursores das lutas dos guaranis pela recuperação e pelo reconhecimento de seus territórios ancestrais, onde estão hoje Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Paraná e São Paulo, principalmente. Foi também um dos criadores do Movimento Indígena Brasileiro, tendo sido um dos fundadores e participado da primeira diretoria da União das Nações Indígenas (UNI), entidade que congrega indígenas brasileiros, fundada em 1980.

Aos 3 anos mudou-se para a aldeia de Te'ýikue, na cidade de Caarapó. Órfão aos 8 anos, passou a morar na Nhanderoga, nome dado a orfanatos de crianças indígenas, na Missão Caiuá, área indígena de Dourados. Aos 12 anos foi com um casal de missionários para Campo Grande. Conheceu um oficial do Exército que o levou para o Recife, onde realizou trabalho braçal em troca de comida, roupa e estudo.

De volta a Dourados, foi contratado pela Missão Caiuá como professor de crianças órfãs e intérprete de guarani. Em 1959 fez um curso na Organização Mundial de Saúde (OMS) e formou-se atendente de enfermagem, profissão que exerceu até sua morte em 1983.

Desde o início dos anos 70 denunciou a expropriação de terras indígenas, a exploração ilegal de madeira, a escravização de índios e o tráfico de meninas índias. Vítima de perseguições, em 1978 foi expulso de Dourados pela Funai e voltou a morar na aldeia Te'ýikue. Nesse ano, foi novamente transferido pela Funai, vai para a aldeia de Mbarakaju, em Antônio João.


Durante seu trajeto na luta em defesa das questões indígenas Marçal de Souza participou de diversos seminários, congressos e conferencias. Na luta por melhoria nas condições de vida de seu povo.

Em 1980, foi escolhido representante da comunidade indígena para discursar em homenagem ao papa João Paulo II em Manaus na primeira visita do papa ao Brasil. Ele afirmou em discurso ao pontífice. Em seu discurso falou sobre a invasão dos territórios indígenas, disse também, sobre os anseios da comunidade indígena brasileira e pediu para que o papa levasse seu clamor ao mundo:

"Nossas terras são invadidas, nossas terras são tomadas, os nossos territórios são invadidos… Dizem que o Brasil foi descoberto. O Brasil não foi descoberto não, o Brasil foi invadido e tomado dos indígenas do Brasil. Essa é a verdadeira história".

Marçal de Souza participou do congresso nos Estados Unidos da Organização das Nações Unidas (ONU) e do filme "Terra dos Índios".

Por sua rebeldia em denunciar e lutar pelos direitos de seu povo, ganhou diversos inimigos principalmente fazendeiros. No mesmo ano da visita do papa no Brasil, já transferido pela Funai, agora morando na aldeia Pirakuá no município de Antônio João, envolveu-se na luta pela posse de terras na área indígena de Pirakuá, em Bela Vista. A demarcação foi contestada pelo fazendeiro Astúrio Monteiro de Lima e seu filho Líbero Monteiro, que consideram a região parte de sua propriedade que era vizinha a dos índios.

Marçal de Souza foi vitima de perseguição por parte da Funai e ate mesmo por outras lideranças indígenas.

Morte

Após diversas ameaças e agressões, em 1983, Marçal de Souza foi brutalmente assassinado com 5 tiros no rancho de sua casa, na aldeia Campestre. Os acusados do crime, Líbero Monteiro de Lima e Rômulo Gamarra, acabam absolvidos em julgamento realizado somente dez anos depois, em 1993.

Marçal de Souza esta enterrado em Dourados, terra que viveu por bastante tempo e que deixou familiares, seu corpo esta sepultado no Cemitério Santo Antônio de Pádua. A luta de Marçal de Souza alarmou e acendeu a importante valorização e preservação dos povos indígenas.

Marçal de Souza foi um dos vários lideres assassinados na luta pela terra. Pessoa lembrada por Darcy Ribeiro em diversas escritas, foi também membro da igreja presbiteriana, enfermeiro, aculturado, interprete da língua guarani, conhecedor de diversas línguas estrangeiras.

Marçal de Souza já previa seu fim, Um pouco antes da sua morte ele teria dito: "Sou uma pessoa marcada para morrer, mas por uma causa justa a gente morre...".

Zumbi dos Palmares

ZUMBI
(40 anos)
Último Líder do Quilombo dos Palmares

* União dos Palmares, AL (1655)
* Viçosa, AL (20/11/1695)

Zumbi dos Palmares  é um conhecido líder quilombola,  para muitos o símbolo da resistência negra contra a escravidão. Foi o último chefe do Quilombo dos Palmares, localizado na parte superior do rio São Francisco, na Serra da Barriga, antiga capitania de Pernambuco. Sua história começa em 1655 com seu nascimento em Alagoas, em um dos mocambos de Palmares.  Zumbi, ou Zambi, vem do termo "nzumbe", do idioma africano quimbundo, e significa, fantasma, espectro, alma de pessoa falecida.

Não se conhece a data exata de seu nascimento. Com poucos dias de vida Zumbi foi capturado na região de Palmares pela expedição de Brás da Rocha Cardoso e dado de presente ao padre Antônio Melo, em Porto Calvo.  Batizado na igreja católica como Francisco, ele ajudava nas missas além de estudar português e latim. 


Apesar destas tentativas de aculturá-lo, Zumbi escapou em 1670 e, com quinze anos, retornou ao Quilombo dos Palmares. Com apenas vinte anos, em 1675, já era um respeitável estrategista militar e guerreiro, atuando na luta contra os soldados do Sargento-mor Manuel Lopes

1673 é a data do primeiro registro histórico referente a Zumbi. Seu nome aparece em relatos portugueses sobre uma expedição que foi derrotada pelos quilombolas.

O Quilombo dos Palmares, era uma comunidade auto-sustentável, um reino, ou república na visão de alguns, formado por escravos negros que haviam escapado das fazendas, prisões e senzalas brasileiras. Ele ocupava uma área próxima ao tamanho de Portugal e situava-se onde era o interior da Bahia, hoje estado de Alagoas. Naquele momento sua população alcançava por volta de trinta mil pessoas.

Por volta de 1678, o governador da Capitania de Pernambuco, Pedro de Almeida, cansado do longo conflito com o Quilombo dos Palmares, se aproximou do líder de Palmares, Ganga Zumba, com uma oferta de paz.  A proposta do governador consistia em dar liberdade para os negros do Quilombo dos Palmares perante a submissão à Coroa Portuguesa.

Ganga Zumba aceitou, mas Zumbi foi contra essa decisão alegando que não se podia dar a liberdade somente ao povo de Palmares havendo ainda milhares de outros negros sendo escravizados. Prometendo continuar a resistência contra a opressão portuguesa, Zumbi tornou-se o novo líder do Quilombo dos Palmares.

Busto de Zumbi dos Palmares (Avenida Presidente Vargas, Rio de Janeiro)

Morte

Quinze anos após Zumbi ter assumido a liderança, o bandeirante paulista Domingos Jorge Velho foi chamado para organizar a invasão do quilombo. Em 6 de fevereiro de 1694 a capital de Palmares foi destruída e Zumbi ferido. Apesar de ter sobrevivido, foi traído por Antônio Soares, e surpreendido pelo capitão Furtado de Mendonça em seu reduto, talvez a Serra Dois Irmãos. Apunhalado, resiste, mas é morto com 20 guerreiros quase dois anos após a batalha, em 20 de novembro de 1695. Teve a cabeça cortada, salgada e levada ao governador  Caetano de Melo e Castro. Em Recife, a cabeça foi exposta em praça pública, visando desmentir a crença da população sobre a lenda da imortalidade de Zumbi.

Em 14 de março de 1696 o governador de Pernambuco  Caetano de Melo e Castro escreveu ao Rei:

"Determinei que pusessem sua cabeça em um poste no lugar mais público desta praça, para satisfazer os ofendidos e justamente queixosos e atemorizar os negros que supersticiosamente julgavam Zumbi um imortal, para que entendessem que esta empresa acabava de todo com os Palmares."

Estátua de Zumbi dos Palmares inaugurada em 30/05/2008 na praça da Sé, Salvador, BA

Polêmicas

Alguns autores levantam a possibilidade de que Zumbi não tenha sido o verdadeiro herói do Quilombo dos Palmares e sim Ganga Zumba:

"Os escravos que se recusavam a fugir das fazendas e ir para os quilombos eram capturados e convertidos em cativos dos quilombos. A luta de Palmares não era contra a iniquidade desumanizadora da escravidão. Era apenas recusa da escravidão própria, mas não da escravidão alheia.[...]"

De acordo com José Murilo de Carvalho, em "Cidadania no Brasil", página 48:

"Os quilombos mantinham relações com a sociedade que os cercavam, e esta sociedade era escravista. No próprio quilombo dos Palmares haviam escravos. Não existiam linhas geográficas separando a escravidão da liberdade."

Segundo alguns estudiosos Ganga Zumba teria sido assassinado, e os negros de Palmares elevaram Zumbi a categoria de chefe:

"Depois de feitas as pazes em 1678, os negros mataram o rei Ganga-Zumba, envenenando-o, e Zumbi assumiu o governo e o comando-em-chefe do Quilombo."

Seu governo também teria sido caracterizado pelo despotismo:

"Se algum escravo fugia dos Palmares, eram enviados negros no seu encalço e, se capturado, era executado pela 'severa justiça' do quilombo."

Escravidão no Quilombo dos Palmares

Apesar de Representar uma resistência à escravidão, muitos quilombos contavam com a escravidão internamente. Esta prática levou vários teóricos a interpretarem a prática dos quilombos como um conservadorismo africano, mantendo as diversas classes sociais existentes na África, incluindo reis, generais e escravos.

Contudo, a escravidão nos quilombos em nada se assemelhava à escravidão dos brancos sobre os negros, sendo os escravos considerados como membros das casas dos senhores, aos quais deviam obediência e respeito. Semelhante à escravidão entre brancos, comum na Europa na Alta Idade Média.

Selo comemorativo Zumbi dos Palmares (1655-1695)

Tributos

Em 1995, a data de sua morte foi adotada como o Dia da Consciência Negra. O dia tem um significado especial para os negros brasileiros que reverenciam Zumbi como o herói que lutou pela liberdade e como um símbolo de liberdade. Hilda Dias dos Santos incentivou a criação do Memorial Zumbi dos Palmares.

Várias referências nas artes fazem tributo a seu nome:

  • Mencionado em diversas letras da banda Soulfly.
  • Mencionado na música "Ratamahatta", da banda Sepultura.
  • Mencionado na música "Apesar de Cigano", composta por Altay Veloso e Aladim Teixeira, e interpretada por Jorge Vercillo no álbum "Leve".
  • Seu nome é dado a um lutador no jogo feito em Adobe Flash: Capoeira Fighter 2.
  • Música "300 Anos" gravada por Alcione em 2007, composta por Altay Veloso e Paulo César Feital.
  • Musica "Palmares 1999" feita por Natiruts.
  • Musica da banda Vibrações"1655-Zumbi".

Cronologia

  • Mais ou menos em 1600: negros fugidos do trabalho escravo dos engenhos de açúcar, onde hoje são os estados de Pernambuco e Alagoas no Brasil, fundam na Serra da Barriga o Quilombo dos Palmares. A população de Palmares em pouco tempo já contava com mais de 3 mil habitantes. As principais funções dos quilombos eram a subsistência e a proteção dos seus habitantes, e eram constantemente atacados por exércitos e milícias.
  • 1630: Começam as invasões holandesas no nordeste brasileiro, o que desorganiza a produção açucareira e facilita as fugas dos escravos. Em 1644, houve uma grande tentativa holandesa de aniquilar com o Quilombo dos Palmares que, como nas investidas portuguesas anteriores, foi repelida pelas defesas dos quilombolas.
  • 1654: Os holandeses deixam o nordeste brasileiro.
  • 1655: Nasce Zumbi, num dos mocambos de Palmares.
  • Por volta de 1662 (data não confirmada): Criança ainda, Zumbi é aprisionado por soldados portugueses e levado a Porto Calvo, onde é "dado" ao padre jesuíta Antônio Melo. Este o batizou com o nome de Francisco. Zumbi passou a ajudar nas missas e estudar português e latim.
  • 1670: Zumbi aos quinze anos de idade foge e regressa a Palmares. Neste mesmo ano de 1670, Ganga Zumba, filho da Princesa Aqualtune, tio de Zumbi, assume a chefia do quilombo, então com mais de trinta mil habitantes.
  • 1675: Na luta contra os soldados portugueses comandados pelo Sargento-mor Manuel Lopes, Zumbi revela-se grande guerreiro e organizador militar. Neste ano, a tropa portuguesa comandada por Manuel Lopes, depois de uma batalha sangrenta, ocupam um mocambo com mais de mil choupanas. Depois de uma retirada de cinco meses, os negros contra-atacam, entre eles Zumbi com apenas vinte anos de idade, e após um combate feroz, Manuel Lopes é obrigado a se retirar para Recife. Palmares se estendia então da margem esquerda do São Francisco até o Cabo de Santo Agostinho e tinha mais de duzentos quilômetros de extensão, era uma república com uma rede de onze mocambos, que se assemelhavam as cidades muradas medievais da Europa, mas no lugar das pedras haviam paliçadas de madeira. O principal mocambo, o que foi fundado pelo primeiro grupo de escravos foragidos, ficava na Serra da Barriga e levava o nome de Cerca do Macaco. Duas ruas espaçosas com umas 1500 choupanas e uns oito mil habitantes. Amaro, outro mocambo, tem 5 mil. E há outros, como Sucupira, Tabocas, Zumbi, Osenga, Acotirene, Danbrapanga, Sabalangá, Andalaquituche.
  • 1678: A Pedro de Almeida, governador da capitania de Pernambuco, mais interessava a submissão do que a destruição de Palmares, após inúmeros ataques com a destruição e incêndios de mocambos, eles eram reconstruídos, e passou a ser economicamente desinteressante, os habitantes dos mocambos faziam esteiras, vassouras, chapéus, cestos e leques com a palha das palmeiras. E extraiam óleo da noz de palma, as vestimentas eram feitas das cascas de algumas árvores, produziam manteiga de coco, plantavam milho, mandioca, legumes, feijão e cana e comercializavam seus produtos com pequenas povoações vizinhas, de brancos e mestiços. Sendo assim o governador propôs ao chefe Ganga Zumba a paz e a alforria para todos os quilombolas de Palmares. Ganga Zumba aceitou, mas Zumbi foi contra, não admite que uns negros sejam libertos e outros continuem escravos. Além do mais eles tinham suas próprias leis e crenças e teriam que abrir mão de sua cultura.
  • 1680: Zumbi assume o lugar de Ganga Zumba em Palmares e comanda a resistência contra as tropas portuguesas. Ganga Zumba morre envenenado.
  • 1694: Domingos Jorge Velho e Bernardo Vieira de Melo comandam o ataque final contra a Cerca do Macaco, principal mocambo de Palmares e onde Zumbi nasceu, cercada com três paliçadas cada uma defendida por mais de 200 homens armados. Após 94 anos de resistência, sucumbiu ao exército português, e embora ferido, Zumbi conseguiu fugir.
  • 20 de novembro de 1695: Zumbi, então aos 40 anos, foi traído e denunciado pelo antigo companheiro Antônio Soares. Ele é localizado pelo capitão Furtado de Mendonça, preso, tem a cabeça cortada, salgada e levada, com o pênis dentro da boca, ao governador Caetano de Melo e Castro . Ainda no mesmo ano, Dom Pedro II premia com 50 mil réis o capitão Furtado de Mendonça por "haver morto e cortado a cabeça do negro dos Palmares do Zumbi".


Antônio Conselheiro

ANTÔNIO VICENTE MENDES MACIEL
(67 anos)
Líder Social e Líder Religioso

* Quixeramobim, CE (13/03/1830)
+ Canudos, BA (22/09/1897)

Mais conhecido na História do Brasil como Antônio Conselheiro. Figura carismática, adquiriu uma dimensão messiânica ao liderar o arraial de Canudos, um pequeno vilarejo no sertão da Bahia, que atraiu milhares de sertanejos, entre camponeses, índios e escravos recém-libertos, e que foi destruído pelo Exército da República na chamada Guerra de Canudos em 1896.

A imprensa dos primeiros anos da República e muitos historiadores, para justificar o genocídio, retrataram-no como um louco, fanático religioso e contra-revolucionário monarquista perigoso.

Filho do comerciante Vicente Mendes Maciel e de Maria Joaquina de Jesus, Antônio Vicente Mendes Maciel ficou órfão da mãe aos seis anos. Estudou aritmética, português, geografia, francês e latim. Entre suas leituras preferidas estavam As Aventuras do Imperador Carlos Magno e Os Doze Pares de França, adaptações de lendas populares da idade média arraigadas no folclore nordestino.

Aos 27 anos, perdeu o pai e começou a cuidar da loja da família, com a qual sustentava as quatro irmãs. Ficou dois anos à frente do negócio e, depois, passou a dar aulas numa escola de fazenda. Graças aos seus estudos e esforço pessoal, tornou-se escrivão de cartório, solicitador (encarregado de encaminhar petições ao poder Judiciário) e rábula (advogado sem diploma).

Em 1857, Antônio Maciel casa-se com Brasilina Laurentina de Lima, jovem filha de um tio seu. No ano seguinte, o jovem casal muda-se para Sobral, onde Antônio Maciel passa a viver como professor do primário, dando aulas para os filhos dos comerciantes e fazendeiros da região, e mais tarde como advogado prático, defendendo os pobres e desvalidos em troca de pequena remuneração. Passa a mudar-se constantemente, em busca de melhores mercados para seus ofícios. Primeiro vai para Campo Grande (atual Guaraciaba do Norte), depois Santa Quitéria e finalmente Ipu, então um pequeno povoado localizado bem na divisa entre os sertões pecuaristas e a fértil Serra da Ibiapaba.

Em 1861 flagra a sua mulher em traição conjugal com um sargento de polícia em sua residência na Vila do Ipu Grande. Envergonhado, humilhado e abatido, abandona o Ipu e vai procurar abrigo nos sertões do Cariri, já naquela época um pólo de atração para penitentes e flagelados, iniciando aí uma vida de peregrinações pelos sertões do nordeste. Para sobreviver, trabalhou como pedreiro e construtor, ofício aprendido com o pai. Restaurava e construía capelas, igrejas e cemitérios.

Esse trabalho e as pregações do Padre Ibiapina - que peregrinava pelo sertão fazendo obra de caridade - influenciaram Antônio Maciel. Ele passou a ler os Evangelhos e a divulgá-los entre o povo humilde, ouvindo também os problemas das pessoas e procurando consolá-las com mensagens religiosas. Devido aos conselhos, tornou-se conhecido como Antônio Conselheiro e arrebanhou um número crescente de seguidores fiéis que o acompanhavam pelas suas andanças.

À medida que a simpatia dos pobres por ele aumentava, surgiam também os inimigos, que se sentiam prejudicados. Por um lado, os padres, que viam seu prestígio diminuir diante das pregações de um leigo. Por outro, os latifundiários, que viam muitos empregados de suas fazendas abandonarem tudo para seguir o beato.

Em 1874, Antonio Conselheiro e seus seguidores se fixaram perto da vila de Itapicuru de Cima, no sertão da Bahia, onde fundaram o arraial do Bom Jesus.

No Sergipe, o jornal O Rabudo traz a primeira menção pública de Antônio Conselheiro como penitente conhecido nos sertões:

"Há seis meses que por todo o centro desta Província e da Província da Bahia, chegado do Ceará, infesta um aventureiro santarrão que se apelida por Antonio dos Mares. O que, a vista dos aparentes e mentirosos milagres que dizem ter ele feito, tem dado lugar a que o povo o trate por S. Antônio dos Mares. Esse misterioso personagem, trajando uma enorme camisa azul que lhe serve de hábito a forma do de sacerdote, pessimamente suja, cabelos mui espessos e sebosos entre os quais se vê claramente uma espantosa multidão de bichos (piolhos). Distingue-se pelo ar misterioso, olhos baços, tez desbotada e de pés nus, o que tudo concorre para o tornar a figura mais degradante do mundo".
(O Rabudo, 22 de Novembro de 1874)

Em 1876, já famoso como homem santo e peregrino, Antônio Conselheiro é preso nos sertões da Bahia, pois corre o boato de que ele teria matado mãe e esposa. É levado para o Ceará, onde se conclui que não há nenhum indício contra a sua pessoa: sua mãe havia morrido quando ele tinha seis anos. Antônio Conselheiro é posto em liberdade e retorna à Bahia. Entretanto, seu fervor religioso aumentou durante a temporada na prisão. Da mesma maneira, aumentou seu prestígio entre os pobres, que passaram a vê-lo como um mártir.

Em 1877, o Nordeste do Brasil passa por uma das mais calamitosas secas de sua história. Levas de flagelados perambulam famintos pelas estradas em busca de socorro governamental ou de ajuda divina. Bandos armados de criminosos e flagelados promovem justiça social com as próprias mãos assaltando fazendas e pequenos lugarejos, pois pela ética dos desesperados roubar para matar a fome não é crime. Cresce a notoriedade da figura de Antônio Conselheiro entre os sertanejos pobres. Para eles, Antônio Conselheiro, ou o Bom Jesus, como também passa a ser chamado, seria uma figura santa, um profeta enviado por Deus para socorrê-los.

Em 1888 acontece o fim da escravidão e muitos ex-escravos, libertos e expulsos das fazendas onde trabalhavam sem ter então nenhum meio de subsistência, partem em busca de Conselheiro.

Arraial de Canudos

Em 1893, cansado de tanto peregrinar pelos sertões e então sendo um fora da lei, Antônio Conselheiro decide se fixar à margem norte do Rio Vaza-Barris, num pequeno arraial chamado Canudos. Nasce ali uma experiência extraordinária: em Bello Monte (como a rebatizou Antônio Conselheiro, apesar de encontrar-se num vale cercado de colinas), os desabrigados do sertão e as vítimas da seca eram recebidos de braços abertos pelo peregrino. Era uma comunidade onde todos tinham acesso à terra e ao trabalho sem sofrer as agruras dos capatazes das fazendas tradicionais. Um lugar santo, segundo os seus adeptos. Os grandes fazendeiros e o clero sentem que seu poder está sendo ameaçado, e começam a se articular em busca de uma solução ao problema.

Canudos prosperou e se tornou incômoda para as autoridades políticas e religiosas locais, que procuravam um pretexto para acabar com ela.

A Guerra de Canudos

Em 1896 um problema comercial acerca de uma compra de madeira na cidade de Juazeiro deu motivo para que uma tropa de soldados da polícia baiana investisse contra os seguidores de Antônio Conselheiro dando início a Guerra de Canudos. Em 24 de novembro deste ano, é enviada a primeira expedição militar contra Canudos, sob comando do tenente Pires Ferreira. Mas a tropa é surpreendida pelos fanáticos de Antônio Conselheiro, durante a madrugada, em Uauá. Após uma luta corpo-a-corpo são contados mais de cento e cinquenta cadáveres de conselheiristas. Do lado do exército morreram oito militares e dois guias. Estas perdas, embora consideradas insignificantes quanto ao número nas palavras do comandante, ocasionaram o retiro das tropas.

Em 29 de dezembro de 1896 tem início uma segunda expedição militar contra Canudos. Assim como a primeira, esta expedição foi violentamente debelada pelos conselheiristas.

Em 1897 tem início a terceira expedição contra Canudos, comandada pelo capitão Antônio Moreira César, conhecido como O Corta-Cabeças, por suas façanhas heróicas na Revolução Federalista, no Rio Grande do Sul. Mas, acostumado aos combates tradicionais, Moreira César não estava preparado para eliminar Canudos, e foi abatido por tiros certeiros de homens leais a Antônio Conselheiro. A tropa foge em debandada, deixando para trás armamentos e munição. Para os conselheiristas, trata-se de uma prova cabal da santidade do beato de Belo Monte.

Em 5 de abril de 1897 tem início a quarta e última expedição contra Canudo. Desta vez o cerco foi implacável e até muitos dos que se rendiam foram mortos. Eliminar Canudos e seus fanáticos habitantes tornou-se uma questão de honra para o exército. O confronto estendeu-se até 5 de outubro de 1897, quando o exército tomou definitivamente o arraial.

Morte

Em 22 de setembro de 1897 morre Antônio Conselheiro. Não se sabe ao certo qual foi a causa de sua morte. As razões mais citadas são ferimentos causados por uma granada, e uma forte Caminheira (Disenteria).

No dia 5 de outubro de 1897 são mortos os últimos defensores de Canudos, e o exército inicia a contagem das casas do arraial.

A única foto conhecida de Antônio Conselheiro, místico rebelde e líder espiritual do arraial de Canudos 1893-1897, Bahia. Foto tirada duas semanas após sua morte, pelo fotógrafo Flávio de Barros, a serviço do Exército.

Em 6 de outubro de 1897, o cadáver de Antônio Conselheiro é encontrado enterrado no Santuário de Canudos. Sua cabeça é cortada e levada até a Faculdade de Medicina de Salvador para ser examinada pelo Drº Nina Rodrigues, pois para a ciência da época, "a loucura, a demência e o fanatismo" deveriam estar estampados nos traços de seu rosto e crânio. O arraial de Canudos é completamente destruído.

No dia 3 de março de 1905, um incêndio na antiga Faculdade de Medicina do Terreiro de Jesus, em Salvador (BA), destrói a cabeça de Antônio Conselheiro, que lá se encontrava desde o final da Guerra de Canudos, em outubro de 1897.

Antônio Conselheiro, Louco?

Recostituição da cabeça de Antônio Conselheiro
O diagnóstico de louco o mais específicamente de portador de uma Psicose Sistemática Progressiva (termo equivalente ao delírio crônico proposto por Valentin Magnan) e a paranóia dos italianos, (referindo-se à Eugênio Tanzi e Gaetano Riva) por uma célebre autoridade sanitária da época, o Drº Nina Rodrigues, no qual se fundamentram os escritos da época (inclusive de Euclides da Cunha), ainda hoje se constitui como um entrave para o reconhecimento de seu mérito como líder comunitário empreendedor, responsável pela organização de mais de 24 mil pessoas em um ambiente extremamente adverso e até mesmo como um homem religioso com verdadeiros ideais cristãos como se propunha a ser.

A pecha de loucura e fanatismo com os conceitos da época, de psicologia das multidões inspiradas na obra de Gustave Le Bon também são reponsáveis por toda uma lógica de interpretação das revoltas sociais como ocasionadas por influência de uma personalidade psicopática, a insanidade moral proposta por Henry Maudsley, num ambiente de ignorância, pobreza ou degenerescência tal como se designava na época, incluindo entre esses fatores psicossociais características biológico raciais.

Memorial Antônio Conselheiro

Há dois centros culturais relacionados à Antônio Conselheiro e a Guerra de Canudos. Um localizado em Quixeramobim no interior do Ceará, conta a história de seu conterrâneo, está situado no centro da cidade, próximo ao Banco do Brasil. O outro situado em Canudos, Bahia, criado pelo Decreto 33.333, de 30 de junho de 1986, (publicado no Diário Oficial de 1º de julho) mantido e administrado em parceria com a Universidade do Estado da Bahia (UNEB).

Fonte: Wikipédia e UOL Educação