ALZIRA VARGAS DO AMARAL PEIXOTO
(78 anos)
Arquivista
* São Borja, RS (22/11/1914)
+ Rio de Janeiro, RJ (26/01/1992)
Alzira Vargas do Amaral Peixoto, em solteira Alzira Sarmanho Vargas,
nasceu em São Borja, RS no dia 22 de novembro de 1914, filha de Getúlio Dornelles Vargas, que viria a ser presidente da República de 1930 a
1945 e de 1951 a 1954, e de Darci Sarmanho Vargas.
Com a vitória da Revolução de 1930 liderada pelo pai, e com a posse
deste na chefia do Governo Provisório em 03/11/1930, transferiu-se para o
Rio de Janeiro. Arquivista particular do pai desde 1932, em janeiro de
1937, quando cursava o último ano da Faculdade de Direito do Rio de Janeiro, foi oficialmente nomeada auxiliar de gabinete, passando a
integrar o Gabinete Civil da Presidência da República.
Em 1939, durante o
Estado Novo (1937-1945), casou-se com o interventor federal do estado
do Rio de Janeiro, o oficial de Marinha Ernani do Amaral Peixoto, com quem
teria uma filha. Ao lado dele, atuou como mensageira entre Getúlio Vargas e o
presidente americano Franklin Roosevelt, realizando várias viagens aos
Estados Unidos.
Almoço no Jockey Club, na Gávea, oferecido pelo chanceler Macedo Soares. À esquerda, Alzira Vargas. |
O assassinato do major Rubens Vaz, em 5 de
agosto, em atentado na Rua Toneleros, cujo alvo era o jornalista
oposicionista Carlos Lacerda, foi o estopim dessa crise, agravada quando
o inquérito policial revelou o envolvimento de membros da guarda
pessoal de Getúlio Vargas. Pressionado por generais e brigadeiros, Getúlio Vargas marcou
uma reunião extraordinária do seu ministério para a madrugada do dia
24.
Alzira e Amaral Peixoto participaram da reunião. Nesse encontro,
Alzira, divergindo da posição do Ministro da Guerra, general Zenóbio da Costa, defendeu a permanência de Getúlio Vargas no poder, baseada em informações
de que a oposição ao presidente entre os militares não era tão ampla
como se divulgava. Ao final da reunião, Getúlio Vargas decidiu licenciar-se da
presidência temporariamente. Em seguida, Alzira procurou o pai em seu
quarto, encontrando-o em companhia do seu tio Benjamim Vargas. O
presidente mostrou a ambos a chave de um cofre, advertindo-os de que,
caso lhe acontecesse algo, deveriam retirar dali alguns valores e papéis
de importância.
De manhã, Alzira recebeu um telefonema do general Ciro do Espírito Santo Cardoso em que este lhe comunicava que os generais haviam decidido
que a licença de Getúlio Vargas deveria ser definitiva. A conversa telefônica
foi interrompida quando alguém avisou-lhe de que Getúlio Vargas se suicidara.
Nessa mesma manhã, Alzira abriu o cofre e dele retirou, entre diversos
papéis, duas cópias do que passaria à história como a Carta-Testamento.
Cópia da Carta-Testamento de Getúlio Vargas, 24 de agosto de 1954:
"Mais uma vez, as forças e os interesses contra o povo coordenaram-se e
novamente se desencadeiam sobre mim. Não me acusam, insultam; não me
combatem, caluniam, e não me dão o direito de defesa. Precisam sufocar a
minha voz e impedir a minha ação, para que eu não continue a defender,
como sempre defendi, o povo e principalmente os humildes.
Sigo o destino que me é imposto. Depois de decênios de domínio e
espoliação dos grupos econômicos e financeiros internacionais, fiz-me
chefe de uma revolução e venci. Iniciei o trabalho de libertação e
instaurei o regime de liberdade social. Tive de renunciar. Voltei ao
governo nos braços do povo. A campanha subterrânea dos grupos
internacionais aliou-se à dos grupos nacionais revoltados contra o
regime de garantia do trabalho. A lei de lucros extraordinários foi
detida no Congresso. Contra a justiça da revisão do salário mínimo se
desencadearam os ódios. Quis criar liberdade nacional na potencialização
das nossas riquezas através da Petrobrás e, mal começa esta a
funcionar, a onda de agitação se avoluma. A Eletrobrás foi obstaculada
até o desespero. Não querem que o trabalhador seja livre.
Não querem que o povo seja independente. Assumi o Governo dentro
da espiral inflacionária que destruía os valores do trabalho. Os lucros
das empresas estrangeiras alcançavam até 500% ao ano. Nas declarações de
valores do que importávamos existiam fraudes constatadas de mais de 100
milhões de dólares por ano. Veio a crise do café, valorizou-se o nosso
principal produto. Tentamos defender seu preço e a resposta foi uma
violenta pressão sobre a nossa economia, a ponto de sermos obrigados a
ceder.
Tenho lutado mês a mês, dia a dia, hora a hora, resistindo a uma
pressão constante, incessante, tudo suportando em silêncio, tudo
esquecendo, renunciando a mim mesmo, para defender o povo, que agora se
queda desamparado. Nada mais vos posso dar, a não ser meu sangue. Se as
aves de rapina querem o sangue de alguém, querem continuar sugando o
povo brasileiro, eu ofereço em holocausto a minha vida.
Escolho este meio de estar sempre convosco. Quando vos humilharem,
sentireis minha alma sofrendo ao vosso lado. Quando a fome bater à vossa
porta, sentireis em vosso peito a energia para a luta por vós e vossos
filhos. Quando vos vilipendiarem, sentireis no pensamento a força para a
reação. Meu sacrifício vos manterá unidos e meu nome será a vossa
bandeira de luta. Cada gota de meu sangue será uma chama imortal na
vossa consciência e manterá a vibração sagrada para a resistência. Ao
ódio respondo com o perdão.
E aos que pensam que me derrotaram respondo com a minha vitória. Era
escravo do povo e hoje me liberto para a vida eterna. Mas esse povo de
quem fui escravo não mais será escravo de ninguém. Meu sacrifício ficará
para sempre em sua alma e meu sangue será o preço do seu resgate. Lutei
contra a espoliação do Brasil. Lutei contra a espoliação do povo. Tenho
lutado de peito aberto. O ódio, as infâmias, a calúnia não abateram meu
ânimo. Eu vos dei a minha vida. Agora vos ofereço a minha morte.
Nada receio. Serenamente dou o primeiro passo no caminho da eternidade e saio da vida para entrar na História."
(Getúlio Vargas)
Em 1973, doou os arquivos de seu pai,
que começara a organizar na década de 1930, ao Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil (Cpdoc) da Fundação Getulio Vargas (FGV).
Alzira Vargas Faleceu no Rio de Janeiro no dia 26 de janeiro de 1992.
O arquivo de Alzira Vargas do Amaral Peixoto encontra-se depositado no Cpdoc.
Fonte: Fundação Getúlio Vargas
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