Gildo de Freitas

LEOVEGILDO JOSÉ DE FREITAS
(63 anos)
Cantor, Compositor, Repentista e Trovador

* Porto Alegre, RS (19/06/1919)
+ Porto Alegre, RS (04/12/1982)

Gildo de Freitas é nome artístico do cantor e compositor brasileiro Leovegildo José de Freitas. Ele possuía um estilo muito próximo ao do também tradicionalista Teixeirinha, com quem, apesar de algumas divergências, por vezes fez parcerias e rivalizava em popularidade. Trabalhou em diversas profissões, mas era a rigor um trovador e cantador popular.

Nasceu em 19/06/1919 ás margens de estrada de chão batido, que em 1919 era principal ligação entre Porto Alegre e o Litoral Norte, no bairro Passo D'Areia então zona rural de Porto Alegre. Entretanto muitos confundem o local de nascimento achando que foi em Alegrete quando na verdade ele possui o titulo de Cidadão Alegretense mas não nasceu em Alegrete.

Seu pai Vergílio José de Freitas era Castelhano, e um sujeito muito difícil, o nome e sua mãe era Georgina Santos de Freitas.

Gildo de Freitas começou trabalhar muito cedo, aos 8 anos já puxava uma carreta carregada com frutas pela vizinhança. Se nada vendia levava uma surra do velho Vergílio. Gildo de Freitas tinha quatro irmãos, Juvenal, Alfredo, João José e Manoel José, e quatro irmãs, Maria Ledorina, Maria Geraldina, Maria José e Maria Esmeraldina, e de longe era o mais esperto dos irmãos.

Esteve na escola apenas por seis meses. A escola era onde é hoje o estádio do São José de Porto Alegre e o nome de sua professora era Dona Paulina. Desde os 12 anos volta e meia fugia de casa. Certa vez descobriu uma cancha de carreiramento em Canoas e se ofereceu para cuidar dos cavalos, e depois para cantar e tocar gaita, instrumento que aprendeu a manusear em casa, de maneira autodidata com a gaita do seu irmão Alfredo. Gildo de Freitas comprou sua gaita 8 baixos apenas quando tinha vinte anos.

Por volta dos 16 anos já era praticamente imbatível nos versos, aprendeu com outros trovadores da época tais como Inácio Cardoso, Genésio Barreto, Zezinho Fagundes, Bena Brabo. Mas seus companheiros de trovas eram Felindro Pinto de Oliveira e Otávio Martim.

Aos 18 anos Gildo de Freitas animava bailes em diversos locais da região metropolitana e um desses bailes foi interrompido no meio da noite pela policia. Otávio, 17 anos, amigo de Gildo de Freitas, responsável pela música juntamente com o Gildo, era esquentado. Reagiu a ordem dos militares dizendo que não iriam parar com o som coisa nenhuma. Os PMs não admitiram ter suas ordens desobedecidas. O clima esquentou e, garrafas e cadeiras voaram para todos os lados, e Otávio acabou sendo baleado. Ao ver a queda do amigo, Gildo de Freitas resolveu se entregar. Terminando com as brigas imaginou que o parceiro receberia atendimento logo. Acabou sendo pior pois, dominado, apanhou ainda mais. E ao ser informado da morte do companheiro, revoltou-se tanto que jamais conseguiria encarar um homem fardado sem reagir de forma virulenta.

Por essas e por outras se diz que Gildo de Freitas, gaiteiro, trovador, poeta popular e um grande brigão, jamais entrou em pé em uma delegacia. Em todas às vezes, e foram varias, que foi preso precisou ser arrastado para a cadeia e por muitos policias.

Gildo de Freitas ao longo de sua vida nunca aguentou injustiças sem intervir, daquele seu jeito jeito chucro de ser. Um cafetão explorando prostituta, um marmanjo impondo sua força contra uma mulher ou uma criança, um sujeito humilhando um bêbado, nada disso era suportável aos olhos do justiceiro Gildo de Freitas.

Politizado, assim que se tornou conhecido no meio regionalista ele se integrou aos comícios de campanha de Getúlio Vargas, Leonel Brizola, João Goulart, Alberto Pasqualini entre outros ilustres trabalhistas.


Passou a usar sua música e seu talento nos desafios de trova em prol no que ele acreditava. A trova era a arma para defender seu ponto de vista e do ponto de vista dos fracos e oprimidos. Em seus últimos anos de vida uma das atividades que ela mais praticava era a distribuição de comida aos pobres.

Essa faceta social é bem visível nas músicas que compôs e nos improvisos do repente gaudério tal qual nas músicas "Vida Brava", no clássico "Eu Reconheço Que Sou Um Grosso", "Infância Pobre" entre outras.

Gildo de Freitas era hábil tanto ao falar sobre o que conhecia, como filosofia campeira, boêmia e casos de amor, quanto ao abordar assuntos aparentemente estranhos a ele, como misticismo, fantasmas, o mundo dos sonhos e até o movimento hippie. Exemplo disso é a música "Prova de Repentista" do LP "De Estância e Estância". A música começa com um locutor anunciando Gildo de Freitas e pedindo que a platéia desse o tema para os versos do cantor, e saltou logo um gaiato pedindo versos para a vovozinha, debochando da capacidade de Gildo de Freitas em fazer versos para a vovozinha. O locutor partiu na defesa de Gildo mas como não seria diferente, ele disse que faria os versos e cantou para a vovozinha em improviso, e deu uma lição no rapaz. Assim era Gildo de Freitas, fazia versos sobre qualquer assunto, pessoa, tema, situação. Era o improviso a marca de Gildo de Freitas e a partir dessa lógica ele falava e fazia versos sobre o que lhe desse na telha.

Em 1941 Gildo de Freitas casa-se com Carminha e passa a ter morada fixa em Canoas, RS, mas continuam os contratempos com a policia. Gildo e Carminha tiveram 5 filhos: Jorge Tadeu, Neuza de Freitas, Paulo Hermenegildo, José Cláudio e Leovegildo José.

A década de 40 reservava muito sucesso a Gildo de Freitas. As trovas no Rio Grande do Sul viraram moda a partir de 1930 e dominavam festas, bailes, bares e programas regionalistas de rádio, desde os precursores, lançados pelo poeta Lauro Rodrigues, até os grandes hits da Gaúcha e Farroupilha como o Grande Rodeio Coringa. Haviam artistas metidos a repentistas por todos os lados e um público cada vez maior e mais dispostos a avaliá-los, mas Gildo de Freitas já se destacava entre eles.

Passou a frequentar os espaços mais nobres dedicados as trovas e a ganhar a vida com isso. Apesar de estabelecido em Canoas com Carminha, Gildo de Freitas não costumava passar longas temporadas em casa. Ganhar a vida com trovas significava viajar por todo estado, apresentando-se para o publico do interior, grande consumidor dos desafios de repente gaudério.

Era freqüente Gildo de Freitas encontrar novos parceiros nas rodas de trova no mercado público da capital, que situava-se próximo aos estúdios da Rádio Farroupilha e servia de ponto de encontro dos músicos regionalistas, e com eles partir em viagens pelo Rio Grande do Sul.

Por volta de 1948/1949 desapareceu de casa e chegou a ser dado como morto na capital gaúcha, mas reapareceu na fronteira gaúcha.

Em longa temporada passada no Alegrete, mal conseguiu caminhar, com problema de paralisia nas pernas. Em uma comemoração de eleição em Alegrete, foi carregado em uma cadeira para se apresentar, já que não conseguia caminhar. Mas não impediu o contato com pessoas ilustres do Rio Grande do Sul e fronteira Oeste, como Salgado Filho, Rui Ramos e o Drº Salvador Pinheiro Machado. Salgado Filho gostou tanto de Gildo de Freitas e de seus versos que lhe prometeu passagens áreas para qualquer lugar do Brasil. E por causa desse desaparecimento compôs "Carta Pra Mamãe" e "Casinha do Pé de Umbú".

Em São Borja, no ano de 1950, conheceu Getúlio Vargas e entrou em sua campanha política. Por conta dessa aproximação, a policia parou de persegui-lo, depois de ser detido umas 40 vezes ao longo da sua vida, até então mas orgulhoso por jamais ter entrado em pé em uma cadeia.

Entre 1953/1954, Gildo de Freitas conheceu Teixeirinha, com quem estabeleceu entre 1955/1959, o que o artista mais popular do estado chamaria bem ao seu jeito de "uma parceria completa, dessas em que se mergulha de pé, barriga e cabeça".


Sobre essa parceria, Nico Fagundes, apresentador do "Galpão Crioulo", em depoimento ao jornal Zero Hora, escreveu que um duelo de versos entre Gildo de FreitasTeixeirinha, podia durar horas e muitas vezes ficava sem vencedor. Um depoimento mostra que Teixeirinha também era um exímio repentista. Mas Teixeirinha ficou famoso como cantor e compositor e Gildo de Freitas ganhou fama como trovador. Lamentavelmente não existe nenhuma gravação com estes duelos, imagine o valor histórico que uma gravação dessa teria hoje.

Por volta de 1955 muda-se para o bairro Passo do Feijó e abre seu primeiro bolicho.

Com o declínio dos programas de radio ao vivo em 1961/1962, Gildo de Freitas resolveu largar a profissão de trovador e resolveu criar porcos. Mas como seu talento era para a música e repentismo e não para criação de suínos, largou a vida de criador de porco e voltou a lidar com trova e músicas. A música "Cobra Sucuri" de sua autoria e que Teixeirinha gravou em um LP de 1963 "Teixeirinha Interpreta Músicas de Amigos", chamou a atenção do produtor da gravadora de nome Pereira, e Gildo de Freitas é convidado a gravar um disco.

Em 1964 viajou a São Paulo para gravar o primeiro LP, "Gildo de Freitas o Trovador dos Pampas", com clássicos como "Acordeona", "Baile do Chico Torto", "Historia dos Passarinhos" e "Que Jeito Têm a Mariana". Alias, antes de provocar o Teixeirinha, Gildo de Freitas com a música "Que Jeito Têm a Mariana", provocou Pedro Raimundo.

Já em 1965 foi lançado o segundo LP "O Trovador dos Pampas - Vida de Camponês". Entre outras músicas estava "Baile de Respeito" que é a primeira música gravada por Gildo de Freitas em provocação a Teixeirinha.

Mantendo o ritmo, foi lançado o terceiro LP "Desafio do Padre e o Trovador", onde Gildo de Freitas trovou com o então padre Rubens Pillar (Que no fim dos anos 60, largou a batina, casou, e foi prefeito de Alegrete por 3 mandatos e ex deputado estadual, falecido recentemente), ainda tinha outros sucessos como "Definição do Grito" e também a presença de uma resposta ao Teixeirinha.

Gildo de Freitas estava então atingindo o sucesso, muitas viagens, mas as vezes precisava ficar hospitalizado devido aos problemas nas pernas e no pulmão.

Em 1968 chegou ao quarto LP intitulado "Gildo de Freitas e Sua Caravana", e seguiu as provocações e respostas ao Teixeirinha.

Em 1969 foi lançado o quinto LP "De Estância em Estância" com mais uma provocação ao Teixeirinha chamada "Resposta da Milonga". Uma provocação ao sucesso de Teixeirinha que era "Milonga da Fronteira", e a briga estava chegando ao auge. O sucesso dessa tática era evidente, pois até hoje essas trocas de versos geram repercussões.

A década de 70 marcou o auge de Gildo de Freitas e as brigas com Teixeirinha começaram a esquentar, não mais sendo tática para vender discos e sim provocações de verdade. Entre 1970 e 1980 ele gravou mais oitos LPs entre eles sucessos como o "Ídolo" e "Rei do Improviso". Mas seguiam as complicações de saúde e até capa de disco ele fotografou no hospital. Diz a lenda que até baile ele fez para os doentes, animando o hospital.

Em 1977 é inaugurada a Churrascaria Gildo de Freitas em Viamão, e nesse tempo ainda existia o Rodeio Gildo de Freitas onde os peões tinham que provar que eram bons para ficar em cima dos cavalos "velhacos" como o próprio Gildo de Freitas dizia.

Em 1981 ele gravou o LP "Rei dos Trovadores" e seguiram-se os contratempos com a saúde. As brigas com Teixeirinha foram amenizadas mas não impediu a "Resposta da Adaga de S".

Em 1982 foram realizadas suas últimas gravações. Trata-se do LP "Figueira Amiga" pela Continental, com a ultima provocação a Teixeirinha com a música "Que Negrinha Boa" e claro, com a música "Figueira Amiga".

Em novembro de 1982 foi levado aos estúdios da RBS TV por Antônio Augusto Fagundes e Ivan Trilha para sua última aparição pública em um "Galpão Crioulo". Além do apresentador Nico Fagundes estavam as Gauchinhas Missioneiras e Os Serranos. Foi a última oportunidade de ver Gildo de Freitas, sua última apresentação e talvez a única onde se viu ele debilitado e conformado.

Mas sua trova final foi em São Borja em data desconhecida. Essa trova ficou conhecida como "Mensagem Final" que está em um CD de nome "Rodeio Gildo de Freitas - Mensagem Final" da USA Discos lançado em 2001. Nesta apresentação fez versos de mais de oito minutos, praticamente se despedindo.

Gildo de Freitas morreu em 04/12/1982 e foi sepultado dia 06/121982 em Viamão, RS, no Cemitério Velho.

O dia 04/12, data de sua morte e de Teixeirinha, foi instituído como Dia Estadual do Poeta Repentista Gaúcho no Rio Grande do Sul, pela Lei Estadual RS 8.819/89.

Indicação: Miguel Sampaio

Um comentário:

  1. Grande Repentista gaucho.- Trabalhou na campanha politica de Getulio Vargas em 1950 . Foi grande parceiro e amigo Teixerinha por ironia do destino faleceu no mesmo dia do dele apos 3 anos.

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