Coronel Ustra

CARLOS ALBERTO BRILHANTE USTRA
(83 anos)
Militar

☼ Santa Maria, RS (28/07/1932)
┼ Brasília, DF (15/10/2015)

Carlos Alberto Brilhante Ustra foi um coronel reformado do Exército Brasileiro, ex-chefe, de 1970 a 1974, do Destacamento de Operações Internas - Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-CODI) do II Exército, um dos órgãos atuantes na repressão política, durante o período do Regime Militar no Brasil, ocorrido entre 1964 e 1985. Também era conhecido pelo codinome de Drº Tibiriçá.

De setembro de 1970 a janeiro de 1974, Ustra chefiou o DOI-CODI do II Exército em São Paulo, órgão encarregado da repressão a grupos de oposição à ditadura militar e aos grupos de esquerda que atuavam na região. No mesmo período, a Comissão de Justiça e Paz da Arquidiocese de São Paulo reuniu 502 denúncias de tortura no DOI-CODI paulista.

Segundo Thomas Skidmore descreve em seu livro "Brasil: De Castelo a Tancredo", em 1986, a então deputada Bete Mendes reconheceu em Ustra, adido militar no Uruguai durante o governo José Sarney, o homem que a torturou em 1970. A deputada enviou uma carta ao então presidente José Sarney, solicitando que ele fosse exonerado do cargo e pronunciou discurso sobre o assunto no Congresso Nacional. No entanto, o general Leônidas Pires Gonçalves, ministro do Exército à época, manteve Ustra no posto e também avisou que não demitiria nenhum outro militar por acusações de tortura. Isso tornou Ustra um protagonista da primeira crise militar do governo José Sarney.

Em resposta a Bete Mendes, em 1987, o ex-coronel lançou o livro "Rompendo o Silêncio", em que narra sua passagem pelo DOI-CODI, no período de 1970 a 1974, além da Operação Bandeirante (OBAN).

Em 2006, lançou o livro "A Verdade Sufocada", em que conta sua versão dos fatos que viveu durante a ditadura.

Em 2008, Ustra tornou-se o primeiro militar a ser reconhecido, pela Justiça, como torturador durante a ditadura. Embora reformado, ele continuou politicamente ativo nos clubes militares, na defesa da ditadura militar e nas críticas anticomunistas.

Condenação

Em 2008, por decisão em primeira instância do juiz Gustavo Santini Teodoro, da 23ª Vara Cível de São Paulo, o coronel Ustra tornou-se o primeiro oficial condenado em ação declaratória por sequestro e tortura, mais de 30 anos depois de fatos ocorridos durante a ditadura militar (1964-1985).

Publicada em 09/10/2008, a sentença é o julgamento, em primeira instância, ao requerimento de dois ex-guerrilheiros e seus filhos Janaína de Almeida Teles, Edson Luis de Almeida Teles, César Augusto Teles, Maria Amélia de Almeida Teles e uma quinta pessoa, Criméia Alice Schmidt de Almeida, que acusaram Ustra, agente de órgãos de segurança nos anos 70, de sequestro e tortura em 1972 e 1973, requerendo à Justiça que, através de uma ação declaratória, ele fosse reconhecido como torturador.

Na sentença, ficou reconhecido que o militar, na qualidade de chefe de operações do DOI-CODI de São Paulo, deveria saber que naquele lugar eram feitas sessões de interrogatório. Baseado em depoimento de Pérsio Arida ao final, julgou:

"Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido formulado pelos autores César Augusto Teles, Maria Amélia de Almeida Teles e Criméia Alice Schmidt de Almeida.... JULGO IMPROCEDENTE o pedido formulado pelos autores Janaína de Almeida Teles e Edson Luis de Almeida Teles..."
(Gustavo Santini Teodoro - Juiz de Direito)

O advogado do coronel Ustra, Paulo Alves de Souza, continuou afirmando que os ex-guerrilheiros, autores da ação, mentiam e anunciou que recorreria da decisão.

Em agosto de 2012, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP) rejeitou o recurso de Ustra, confirmando a sentença anterior que o declarara torturador.

Em junho de 2012, Ustra também fora condenado a indenizar por danos morais a esposa e a irmã do jornalista Luiz Eduardo da Rocha Merlino, morto em 1971. Merlino foi preso no dia 15/07/1971 em Santos, SP, e morto quatro dias depois. A versão oficial da sua morte, fornecida pelos agentes do antigo Departamento de Ordem Política e Social (DOPS), foi a de que ele cometeu suicídio enquanto era transportado para o Rio Grande do Sul.

Ordem dos Advogados do Brasil

A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), no uso de suas atribuições constitucionais, através do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, ingressou, em agosto de 2008, no Supremo Tribunal Federal (STF), com uma ação em que solicita àquela Corte para decidir se a Lei da Anistia inclui ou não crimes praticados por militares e policiais. A OAB considera que a lei de 1979 não isenta militares envolvidos em crimes, pois os tratados internacionais, dos quais o Brasil é signatário, dizem que crimes contra a humanidade perpetrados por agentes da Administração Estatal não prescrevem. Assim, apenas ações praticadas por militantes sem ligações com o aparelho estatal estariam beneficiados pela anistia.

A OAB pretende abrir a possibilidade de o Brasil revisar as ações praticadas por agentes do Estado, uma vez que estes possuíam em mãos todo o aparato estatal para tais ações, enquanto os que discordavam da ideologia do governo militar eram privados de suas liberdades.

Comissão da Verdade

Em maio de 2013, Ustra compareceu à sessão da Comissão da Verdade, a primeira aberta ao público em geral e transmitida pela televisão. De posse de um habeas-corpus que lhe permitia ficar em silêncio, mesmo assim ele respondeu a algumas perguntas, negando que tivesse cometido qualquer crime durante seu período no comando do DOI-CODI paulista e que recebeu ordens de seus superiores no Exército para fazer o que foi feito, alegando em sua defesa que "combatia o terrorismo".

Ustra também negou que qualquer pessoa tivesse sido morta dentro do DOI-CODI, afirmando que todos os mortos o "foram em combate nas ruas". Acusou a presidente Dilma Roussef de participar de quatro organizações terroristas mas, quando questionado sobre a existência dos chamados instrumentos de tortura "pau-de-arara" e "cadeira do dragão" nas dependências do órgão, exerceu seu direito de manter-se em silêncio.

Mesmo quando confrontado com um documento exibido por um membro da comissão, Cláudio Fonteles, um documento do próprio Exército, listando a morte de pelo menos 50 pessoas dentro do DOI-CODI no período em que foi comandado por Ustra, o ex-militar afirmou que o documento não provava que essas mortes tinham realmente acontecido nas dependências do órgão. Convidado a uma acareação com o atual vereador paulista Gilberto Natalini, que se encontrava na platéia e já havia dado seu depoimento sobre as torturas que lhe foram infligidas pessoalmente por Ustra naquela época, o militar recusou-se gritando que "não fazia acareação com ex-terrorista", o que provocou a reação do vereador aos gritos dizendo que era "um brasileiro de bem. O senhor é que é terrorista. Eu fui torturado pelo coronel Ustra!", levando ao encerramento da sessão.

Ouvido também em audiência pública antes do ex-coronel, o ex-sargento do Exército Marival Fernandes, que trabalhou na análise de documentos do órgão, entre 1973 e 1974, e quatro meses sob o comando de Ustra, testemunhou que o ex-comandante, então capitão, era o "Senhor da Vida e da Morte" do DOI-CODI e "escolhia quem ia viver e ia morrer".

Manifestações

Um grupo de 150 militantes do Levante Popular, do Movimento dos Pequenos Produtores e da Juventude do MST realizou dia 31/03/2014 um "escracho" em frente à casa do ex-coronel reformado do Exército Carlos Alberto Brilhante Ustra, em um bairro nobre de Brasília. Por meia hora, cantaram músicas do tempo da ditadura, colaram cartazes na vidraça de frente da residência e no portão e escreveram no asfalto que ali morava um torturador.

Morte

Carlos Alberto Brilhante Ustra morreu na madrugada de quinta-feira, 15/10/2015, em Brasília, aos 83 anos. Ele havia sido internado no Hospital Santa Helena para tratamento de um câncer. A família informou que ele fazia quimioterapia e estava com a imunidade baixa.

De acordo com boletim divulgado pelo hospital, Ustra teve falência múltipla de órgãos, provocada por uma pneumonia. Em 23/04/2015, ele foi encaminhado à UTI do Hospital das Forças Armadas (HFA) com suspeita de infarto, após um mal-estar.

O horário e local do velório e do enterro ou cremação do corpo não foram divulgados.

Sua morte foi lamentada publicamente como uma consagração da impunidade aos responsáveis pelos assassinatos e torturas cometidos pela ditadura militar no Brasil.

Miele

LUIZ CARLOS D'UGO MIELE
(77 anos)
Ator, Cantor, Produtor, Apresentador e Diretor

☼ São Paulo, SP (31/05/1938)
┼ Rio de Janeiro, RJ (14/10/2015)

Luiz Carlos d'Ugo Miele foi um produtor, ator, apresentador e diretor brasileiro de televisão, teatro, cinema e shows.

Era filho da cantora e instrumentista Irma Miele, cujo nome artístico era Regina Macedo. Aos 12 anos de idade, começou a trabalhar como rádio-ator numa emissora de rádio em São Vicente, SP, no programa "Meu Filho, Meu Orgulho" de Mário Donato. Mais tarde, protagonizou outros programas infantis na Rádio Tupi, ao lado de Régis Cardoso, Érlon Chaves e Walter Avancini.

Iniciou a carreira profissional como locutor da Rádio Excelsior, Rádio Tupi e Rádio Nacional. Em 1959, mudou-se para o Rio de Janeiro, onde conheceu o compositor Ronaldo Bôscoli, com quem formou a dupla Miele & Bôscoli, responsável pela direção e produção de diversos espetáculos, além de programas musicais em emissoras de televisão.

Em 1976, após a morte do humorista Manuel de Nóbrega, passou a apresentar "A Praça da Alegria" na Rede Globo, saindo do ar em 1979. O programa contou com a participação de Ronald Golias.

Na televisão, atuou na direção e produção dos programas musicais "Noite de Gala" e "Cara & Coroa", com Dori Caymmi e Sílvia Telles, na TV Rio.

"Dois no Balanço", "Se Meu Apartamento Falasse", com Cyll Farney e Odete Lara, "Rio Rei", "Os 7 Pecados", com Fernando Barbosa Lima, e "Musical em Bossa 9", na TV Excelsior, "O Fino da Bossa", "Show Em Simonal" e "Elis Especial", na TV Record, "Alô Dolly", "Dick & Betty 17", com Dick Farney e Betty Faria, "Fantástico", direção musical, "Elis Especial", "Praça da Alegria", "Sandra & Miele", "Cem Anos de Espetáculo", "Viva Marília""Batalha dos Astros", além de festivais de música, na Rede Globo, "Um Homem - Uma Mulher", com Tuca, "Cassio Muniz Show", criação dos comerciais, e "Programa Flávio Cavalcanti", na TV Tupi, "Miele & Cia" e "Ele & Ela", com Leila Richers, na TV Manchete, "Coquetel e Cocktail", no SBT, e "Escolinha do Barulho", na TV Record.


Como produtor e diretor de espetáculos de artistas como Roberto Carlos, Elis Regina, Wilson Simonal, Sérgio Mendes, Lennie Dale, Sarah Vaughan, Leny Andrade, Pery Ribeiro e Bossa 3 ("Gemini V"), Taiguara e Claudette Soares ("Primeiro Tempo 5×0"), Milton Nascimento, Marcos Valle, Joyce e Wanda Sá (Sucata, Rio de Janeiro), Alcione (Canecão, Rio de Janeiro), Agnaldo Timóteo; Joanna; Angela Maria e Lucinha Lins ("Spot Light"); Os Cariocas; Família Caymmi; Trio Irakitan e Rosana Tapajós (Beco das Garrafas, Rio de Janeiro); Regina Duarte ("Regina Mon Amour", no Canecão); Sandra Bréa e Pedrinho Mattar ("Caso Water-Closed"), e Dzi Croquettes ("Monsieur Pujol", Rio de Janeiro), além dos projetos "Chega de Saudade", "Vivendo a Rádio Nacional", "Vivendo Vinícius" e "Festival Internacional de Mágica".

Como showman, participou dos espetáculos "Miele & Juarez Machado" (Sucata, Rio de Janeiro), "Concerto Para Miele & Orquestra" (Hotel Maksoud Plaza, São Paulo), "Miele & Tuca" (Rui Barbossa e Sucata), "Miele no Palladium", com Rosemary, "Elis & Miele" (Teatro Clara Nunes e Teatro Maria Della Costa).

Atuou, ainda, como diretor de projetos especiais no Metropolitan, RJ, e como mestre de cerimônias do Prêmio Molière. Gravou o compacto simples "Miele e Carolina", com a participação de Carol Saboya, registrando as canções "A Menina e a TV" (Rolf Zuckowski), versão de Antonio Adolfo e Jésus Rocha, e "Cirrose" (Daltony Nóbrega e Ana Maria).

Em 1997, apresentou-se, com Roberto Menescal e Wanda Sá, no Mistura Fina, RJ, em espetáculo gravado ao vivo e lançado pelo selo Albatroz no CD "Uma Mistura Fina".

Em 1999 assinou a direção do espetáculo "Vivendo Vinícius", com Carlos Lyra, Toquinho, Miúcha e Baden Powell, apresentado no Metropolitan, RJ. Ainda em 1999, passou a exercer a função de diretor de projetos especiais na Casa de Cultura da Universidade Estácio de Sá, no Rio de Janeiro, onde produziu vários espetáculos, como "Um Brasileiro Chamado Jobim", com Roberto Menescal, Danilo Caymmi, Joyce, Cris Delanno e o conjunto Os Cariocas, "Minhas Duas Estrelas - Pery Ribeiro Canta e Conta - Dalva de Oliveira e Herivelto Martins", "Essa Bahia Chamada Caymmi", com Nana Caymmi, Dori Caymmi e Danilo Caymmi", "Jazz Para As Onze", com o Quinteto Paulinho Trompete e Rio Jazz Orquestra, no qual atuou como crooner, entre outros.


Em 2004 fez espetáculos no Tom Brasil em São Paulo, mostrando pela primeira vez em público o "Hino do Fome Zero" (Roberto Menescal e Abel Silva), cujo DVD foi dirigido por ele, e também publicou o livro "Poeira de Estrelas" (Ediouro). Ainda em 2004, foi responsável pela apresentação do espetáculo "Bossa Nova In Concert", realizado no Canecão no Rio de Janeiro, com a participação de Johnny Alf, João Donato, Carlos Lyra, Roberto Menescal, Wanda Sá, Leny Andrade, Pery Ribeiro, Durval Ferreira, Eliane Elias, Marcos Valle, Os Cariocas e Bossacucanova. O show contou com uma banda de apoio formada por Durval Ferreira (violão), Adriano Giffoni (contrabaixo), Marcio Bahia (bateria), Fernando Merlino (teclados), Ricardo Pontes (sax e flauta) e Jessé Sadoc (trompete), concepção e direção artística de Solange Kafuri, direção musical de Roberto Menescal, pesquisa e textos de Heloísa Tapajós, cenários de Ney Madeira e Lídia Kosovski, e projeções de Sílvio Braga. Também nesse ano, lançou o livro "Poeira de Estrelas" (Ediouro).

Apresentou-se, em 2005, no Bar do Tom, com o espetáculo "Bênção Bossa Nova", ao lado de Roberto Menescal e Wanda Sá. Nesse mesmo ano, lançou o DVD "Miele, Um Showman Brasileiro - Um Show de Música & Muito Humor" (CID), com festa no Bar do Tom. Ainda em 2005, interpretou o advogado Wexler no seriado "Mandrake" da HBO Brasil, baseado na obra de Rubem Fonseca.

O melhor momento da carreira de Miele foi o musical "Elis". O pior momento da carreira foi o "Programa Cocktail", exibido no SBT de agosto 1991 a agosto 1992. Miele disse em uma entrevista em 2002: "Aquele programa não era muito a minha praia". Ele preferiu esquecer e considerava um programa de mau gosto.

No fim de 2011 atuou no filme "As Aventuras de Agamenon, o Repórter" interpretando o sogro de Agamenon Mendes Pedreira.

Em 2012 atuou na minissérie "O Brado Retumbante" no papel de Nicodemo Cabral, O Senador.

Em 2014, atuou na minissérie "A Teia", no papel do ex-senador Walter Gama. Interpretou o magnata Jack Parker, na novela "Geração Brasil". Ainda em 2014, em agosto, participou da "Dança dos Famosos" no programa "Domingão do Faustão". Interpretou o vizinho garanhão Gustavo Pennaforte, no episódio "Ela é a Dona de Tudo" do sitcom "Trair e Coçar é Só Começar", do canal Multishow.

Seu último trabalho foi na novela "Geração Brasil", atuando como Jack Parker pai de Pamela Parker Marra.

Miele torcia pelo São Paulo Futebol Clube. Foi casado com Anita durante 47 anos e nunca tiveram filhos.

Morte

Luiz Carlos D'Ugo Miele foi encontrado morto em sua casa em São Conrado, Zona Sul do Rio de Janeiro, na quarta-feira, 14/10/2015. Bombeiros do quartel da Gávea foram acionados para uma ocorrência no local, mas Miele faleceu após sofrer um mal súbito, antes da chegada dos militares.

Segundo Vânia Barbosa, empresária e amiga de Miele e da família, a esposa do artista o encontrou caído no chão do escritório logo pela manhã e chamou os bombeiros, que constataram o óbito ao chegarem em sua casa, em São Conrado. Segundo ela, o mal súbito que acometeu o diretor pegou parentes de surpresa.

O velório ocorrerá a partir das 07:00 hs de quinta-feira, 15/10/2015, na Câmara dos Vereadores do Rio de Janeiro, no Centro, e será aberto ao público. O corpo será enterrado no Cemitério do Caju, às 14:00 hs.

Fonte: WikipédiaG1 e Diário de Pernambuco

Cláudia Barroso

AMÉLIA ROCHA BARROSO
(83 anos)
Cantora e Compositora

☼ Pirapetinga, MG (23/04/1932)
┼ Fortaleza, CE (09/10/2015)

Amélia Rocha Barroso, conhecida pelo nome artístico de Cláudia Barroso, foi uma cantora e compositora brasileira.

Aos 7 anos de idade, perdeu tragicamente o pai, o que que fez sua mãe se mudar com os quatro filhos para Santo Antônio de Pádua, RJ. A vocação artística foi despertada, ainda menina, quando começou a cantar nas festinhas da escola. Posteriormente, a família foi morar no Rio de Janeiro, no bairro do Méier.

Diante da necessidade da família, a menina Amélia começou a trabalhar como babá. Depois, passou a trabalhar numa fábrica de estojos para jóias. Aos 15 anos, casou-se e teve um casal de filhos. Durante muitos anos, Amélia se dedicou inteiramente aos filhos e ao marido.

Em 1957, já separada e com os filhos mais crescidos, resolveu que era o momento de tentar a carreira artística. Incentivada por uma amiga, dirigiu-se ao programa de calouros de Ary Barroso. Foi gongada na primeira apresentação, não por desafinar, mas por errar a letra da música "Risque", de Ary Barroso. Tentou, em seguida o programa de calouros de Renato Murce, na rádio Nacional do Rio de Janeiro, sendo bem sucedida e permanecendo por várias semanas na disputa, até ganhar o prêmio final.

Após a vitoriosa participação no programa de calouros de Renato Murce, foi convidada pela cantora Marisa Gata Mansa para fazer um teste na boate do Copacabana Palace, pois lá estavam precisando de uma crooner. Tendo passado no teste, ali surgiu seu primeiro trabalho como cantora profissional.


Em 1958, gravou pela primeira vez ao participar do LP "Meia Noite No Meia Noite", da gravadora Todamérica que contou com as participações de Moacyr Silva e Seu Conjunto e de Copia e Seu Conjunto. Nesse disco gravou a faixa "Não Adiante Chorar" (Eduardo Patané e Almeida Rego), acompanhada da Orquestra do Copacabana Palace, regida pelo maestro Nicolino Copia, o Copinha. Posteriormente, foi contratada para cantar em São Paulo, na boate Capitains Bar, do Hotel Comodoro. Ali cantou com diversos músicos, como Walter Wanderley, Paulinho Nogueira e Pedrinho Mattar. Por seu talento e versatilidade, tornou-se crooner muito disputada pelos donos de casas noturnas de São Paulo, pois cantava também em vários idiomas.

Recebeu da gravadora Odeon convite para gravar a música "Fica Comigo Essa Noite" (Adelino Moreira). Esse foi o seu primeiro disco solo, ainda em 78 rpm que trazia no outro lado "Não, Eu Não Vou Ter Saudade" (Vaucaire e C. Dumont), com versão de Romeu Nunes, disco lançado em fevereiro de 1962. No mesmo ano, sua interpretação de "Fica Comigo Essa Noite" foi incluída no LP "Em Dia Com o Sucesso - Volume 2" lançado pela gravadora Odeon.

Foram inúmeras as casas noturnas em que cantou, e também os diversos nomes do cenário musical brasileiro com que se apresentou, durante os anos 60, entre eles: Bar Baiúca, onde cantava com o Zimbo Trio, Boate Golden Ball, em que cantava com Johnny Alf, Boate Oásis, Boate Champanhota, em que cantava com Marta Mendonça, Boate Moleque, onde cantava com Noite Ilustrada, Boate Rosa Amarela, Boate Jogral, Boate Drink, de Djalma Ferreira, onde cantava com Jair Rodrigues, entre outras.

Em 1967, lançou um LP pela gravadora Fermata no qual interpretou as músicas "Esta é a Minha Canção (The Is My Song)" (Charles Chaplin), "Falem-me Dele (Parlez-moi de Lui)" (M. Rivgauche e J. Dieval), "Nenhum de Vocês (Nessuno Di Voi)" (Pallavicini e Kramer), com versões de Alexandre Cirus, "Eu Por Amor (Io Per Amore)" (P. Donaggio e V. Pallavicini), "É Mais Forte Que Eu (É Piu Forte Di Me)" (E. Polito e A. del Monaco), "O Silêncio (Il Silenzio)" (G. Brezza e N. Rosso), as três em versões de Fred Jorge, "Deus Como Te Amo (Dio Come Ti Amo)" (Domenico Modugno), versão de Demetrio Carta, "Amor Não é Brinquedo (Eine Ganze Nacht)" (J. Last e G. Loose), "Glória (In Excelsis Deo)" (S. Vasco, T. Del Rincon e T. Rendall), em versões de Juvenal Fernandes, "A Música Termina (La Música é Finita)" (U. Bindi e F. Califano), "Valsa Da Recordação (Vals Del Recuerdo)" (Kalender e B. Molar), versões de Salathiel Coelho, e "Começar De Novo" (Nóbrega e Souza, David Mourão e Ferreira). Nesse ano, gravou a marcha "Flores na Varanda" (Osvaldo Cruz e Celina Paiva), incluída na coletânea carnavalesca "Carnaval 68" do selo Som Maior, algo raro em sua carreira de cantora romântica.


Em 1968, duas versões interpretadas por ela foram incluídas no LP "Coleção De Sucessos" da gravadora Fermata: "Deus Como Te Amo" e "O Silêncio".

Em 1969, participou de outras duas coletâneas carnavalescas da gravadora Premier/RGE visando o carnaval do ano seguinte: "Carnaval 70", no qual foi incluída a gravação da música "Um Amor Igual Ao Meu" (Fernando Torelly e João Lopes), e "Carnaval 1970" com a marcha "Senhora Viúva" (Cachimbinho e A. Cruz).

Em 1970, recebeu convite para participar como jurada no Programa Silvio Santos, na TVS, posteriormente SBT. Sua atuação obteve tanto sucesso, que ela foi contratada pelo animador, passando a ser presença obrigatória no programa, o qual era levado ao ar, ao vivo, aos domingos. Um dia, ao dirigir-se a uma caloura, criticou a interpretação da música, atribuindo-lhe uma nota que causou polêmica no programa. Desafiada, então, pelo animador Silvio Santos a interpretar aquela música de forma melhor que a candidata, foi ao palco e cantou magistralmente, arrancando intermináveis aplausos do público e, principalmente, dos demais membros do juri. Logo em seguida, a gravadora Continental a contratou, iniciando uma fase de grande sucesso da cantora.

Em 1971, lançou seu primeiro LP pela gravadora Continental interpretando as músicas "A Vida é Mesmo Assim" e "Quem Mandou Você Errar", de sua autoria, "Pra Que Chorar" (Jorge Ricardo), "Amiga" (Anastácia), "Dona Tristeza" (Jacobina e Almeida Rego), "Juntinho é Melhor" (Fernando Barreto, Fernando Costa e Rossini Pinto), "Você Mudou Demais" (Dik Júnior), "Tudo Acabado" (J. Piedade e Osvaldo Martins), "Supertição" (Portinho e Wilson Falcão), "Rotina Do Amor" (Jota Domingos), "Resposta Da Carta" (Anastácia e Dominguinhos), e "Quem Foi Você" (Waldick Soriano). O selo Premier lançou o LP "O Amor Me Chama", uma coletânea de músicas lançadas anteriormente em compactos com destaque para "Dio Come Ti Amo". Ainda nesse ano, duas interpretações suas foram incluídas em coletâneas de sucessos. No LP "As 14 Mais Pra Frente - Volume 12" da Continental foi incluída a gravação de "Você Mudou Demais", e no LP "Grande Parada Brasil" também da Continental foi incluída a gravação do bolero "A Vida é Mesmo Assim".

Em 1972, lançou dois LPs. No primeiro LP destacou-se como sucesso a composição "Por Deus Eu Juro" (Cláudia Barroso), trazendo ainda as músicas "Amor Querido" (Cláudia Barroso), "Estou Cansada" (Cláudia Barroso), "Não Adianta Mais Chorar" (Jorge Ricardo), "Não Sei o Que Fazer" (Jorge Ricardo), "Está Faltando Alguém Em Minha Vida" (Pepe Ávila), "Eu Te Agradeço" (Alcyr Clayton e Paulo Marcos), "Você Perdeu a Sua Vez" (César e Círus), "Se Deus Me Ouvisse" (Almir Rogério), e "Presunção" (Anastácia). No segundo LP lançado no mesmo ano, registrou as músicas "Não Quero Ouvir Mais Falar Teu Nome" (Cláudia Barroso) e "Vai Não Te Quero Mais" (Cláudia Barroso), "Aviso" (Jorge Ricardo), "Confissão" (Jorge Ricardo), "Tentei a Qualquer Preço" (Osmar Nazareno e Portinho), "Mentira", (F. Pracánico, E. C. Flores e Pepe Ávila), "Amada Amante" (Roberto Carlos e Erasmo Carlos), "Humilhação" (José Carlos Gonzales), "Como Fui Boba Meu Deus" (Antônio Queiroz e Michel Bunariu), "Nem Te Ligo" (Jota Domingos), "Meu Coração Fechou a Porta" (Anastácia) e "Ausência De Tua Presença" (Moacir Bastos).


Ainda em 1972, sua versatilidade a levou a uma experiência como atriz, através de uma participação na novela "Bandeira Dois", levada ao ar pela TV Globo. Foi coroada, então, "Rainha dos Mmotoristas". Nesse período, mais precisamente, na primeira metade dos anos 1970, foi consagrada em todo o Brasil, sendo a cantora com maior vendagem de disco. Em função disso, nos dois anos seguintes voltou a lançar dois LPs anuais.

Em 1973, gravou no primeiro LP as músicas "Eu Quero Ser Feliz" (Cláudia Barroso), "Vai Chorar Muito Mais" (Cláudia Barroso), "Foi Tanto Amor Que Eu Perdi a Razão" (Cláudia Barroso e Zairo Marinozo), "Ah Se Eu Fosse Você" (Carlos Bonani), "Ontem e Hoje" (Getúlio Macedo e Irany de Oliveira), "Meu Caminho" (Gecy Falcão), "Vou Ficar Sozinha" (Alcyr Clayton e Paulo Marcos), "Eu Vim Dizer" (Carlos César e Alexandre Cirus), "Nem Pelo Amor de Deus" (César e Queiroz), "Minha Verdade" (Osmar Navarro e Portinho), "No Vai-Vem Do Mundo" (César e Círus) e "Nem Que o Mundo Se Acabe" (Anastácia e Dominguinhos).

Em seu segundo LP de 1973, registrou as músicas "Que Pena Você Veio Tarde" (Cláudia Barroso e Carlos Bonani), "Cinzas" (Cláudia Barroso e Gecy Falcão), "Acreditei Demais" (Carlos Bonani), "Não Preciso De Você" (Carlos Bonani), "Eu Só Quero Ver" (Carlos Bonani), "Mulher" (Custódio Mesquita e Sadi Cabral), "Carinhoso" (Pixinguinha e João de Barro), "Fim De Caso" (Dolores Duran), "Juazeiro" (Humberto Teixeira e Luiz Gonzaga), "Não Há Nada Mais Bonito" (Portinho e Osmar Navarro), "Que Mundo é Este Meu" (Waldick Soriano) e "Muito Obrigado Meu Amor" (Antônio dos Santos).

Ainda em 1973, mais duas coletâneas de sucesso incluíram gravações suas, no LP "Continental - 30 Anos De Sucessos" da gravadora Continental, onde foi incluída a canção "Você Mudou Demais". Já no LP "Sempre Sucesso - 12 Grandes Sucessos Que Serão Lembrados Eternamente", da Premier/RGE foi incluída sua gravação "O Silêncio".

Em 1974, mais dois LPs foram lançados pela Continental com gravações suas. No primeiro cantou "Eu Falei Pra Você" (Carlos Bonani), "Mal Me Quer" (Cristóvão de Alencar e Newton Teixeira), "Essa Agora é Boa" (Cláudia Barroso), "Por Mais Que Eu Queira Me Enganar Ainda Te Amo" (Cláudia Barroso), "Última Palavra" (Nelson Karan e Aloísio Marins), "Aliança Devolvida" (Milton JoséJosé Augusto), "Você Já Era" (Portinho e Osmar Navarro), "Ironia" (Gecy Falcão), "Não Me Condenem" (Júlio Nagib), "Deus Me Livre" (Anastácia), além de um pot-pourri com as canções "Segredo" (Herivelto Martins e Marino Pinto), "Ave Maria No Morro" (Herivelto Martins), "Feitio De Oração" (Vadico e Noel Rosa), "Folhas Mortas" (Ary Barroso) e "Nem Eu" (Dorival Caymmi).


No segundo LP, lançado também em 1974, registrou as músicas "Deixe Meu Marido Em Paz (Não Perca Seu Tempo)" (Cláudia Barroso), "Como Acabou Não Sei" (Cláudia Barroso), "Triste Adeus" (Cláudia Barroso), "Oh Moço Da Minha Rua" (Cláudia Barroso), "Quem Você Pensa Que É" (Elizabeth), "Porque Te Amo" (Luis de Castro e Milton José), "Me Faça Sua" (Martinha e Milton Carlos), "Amor Fracassado" (Juvenal Lopes), "Nem a Morte Vai Nos Separar" (Portinho e Osmar Navarro), "Vá Em Paz" (Juna), "Luz e Treva" (Nelson Sampaio) e "Amor Proibido" (Anastácia e Dominguinhos). Nesse LP, fez bastante sucesso com o bolero "Deixe Meu Marido Em Paz (Não Perca Seu Tempo)".

Em 1975 gravou LP que trazia as músicas "Casamento Fracassado" (Carlos Bonani), "Conselho" (Carlos Bonani), "Duas Almas" (Carlos Bonani), "Que Te Custa" (Anastácia), "Nada Sou" (Antoninho dos Santos), "Não Tem Solução" (Joãozito), "Nossos Filhos Não Pediram Para Nascer" (Cláudia Barroso), "Ninguém Pertence a Ninguém" (Portinho e Osmar Navarro), "O Homem Que Eu Amo" (Chico Xavier), "Você Vai Se Arrepender" (Milton José, Italúcia e Sabino Neto), "Já Tenho Alguém Em Seu Lugar" (Evaldo Barreto), "Eu Não Tive Um Bom Marido" (Evaldo Barreto).

Em 1976, lançou novo LP no qual fizeram sucesso as composições "Mulher Sem Nome" (Anastácia) e "Pedaço De Papel" (Anastácia). O disco incluiu ainda as composições "O Vento Levou" (Umberto Silva e Motta), "Nem Que Venha Pedir De Joelhos" (Milton José e José Augusto), "Para Que Recordar" (Fernando César), "Conselho De Mãe" (Cláudia Barroso e M. A. Porto), "Valeu a Pena o Que Eu Sofri" (Cláudia Barroso e Izilda Simões), "Cansada De Mentira" (Robson e Zébeto), "Fracassamos" (Herivelto Martins), "Pecado Mortal" (Carlos Bonani), "Vou Morrer De Rir" (Anastácia) e "Fique Com Ele Pra Você" (Zeca e Tom).

Em 1977, gravou o LP "Cara e Coragem" com música título da compositora Isolda, e que apresentou ainda como destaque as músicas "Mantendo Aparências" (Cláudia Barroso), "Ninguém é De Ninguém" (Umberto Silva, Toso Gomes e Luis Mergulhão), "Boa Amiga (Conselho)" (Anastácia), "Meu Dilema" (Anastácia e Dominguinhos), "Bobagem" (Isolda e Milton Carlos), "Minha Culpa" (Leal Brito 'Britinho' e Fernando César), "Envolvido Em Tempestade" (Marcos Wagner), "Com Quem Fica Nosso Filho" (Wilson FalcãoPortinho), "Homem Por Homem" (Evaldo Barreto), "Essas Moças" (Marcos Wagner) e "Mentiroso" (Valentino Guzzo e Laerte Freire).

Em 1978, gravou o LP "Conselho" que teve como destaque duas composições de sua autoria, "Deixe Meu Marido Em Paz" e "Nossos Filhos Não Pediram Pra Nascer". As outras músicas do disco foram, "Mentiroso" (Valentino Guzzo e Laerte Freire), "Quem Você Pensa Que É" (Elizabeth), "Amor Proibido" (Anastácia e Dominguinhos), "Casamento Fracassado" (Carlos Bonani), "O Homem Que Eu Amo" (Chico Xavier), "O Vento Levou" (Humberto Silva e Motta), "Conselho" (Carlos Bonani), "Pedaço De Papel" (Anastácia), "Amor Fracassado" (Juvenal Lopes) e "Nem a Morte Nos Separa" (Portinho e Osmar Navarro).


Em 1979, lançou LP com as músicas "Status" (Cláudia Barroso e S. A. Hanna), "Porta Arrombada" (Cláudia Barroso e Glauco), além de cinco versões das músicas latinas "Abraça-me" (Julio Iglesias e Ferro), versão de C. Santos, "Espinho (Espinita)" (Nico Jimenez e Walter José), "A Carta" (J. Nobre e A. do Valle), versão de Mourão Filho, "Canção Da Alma (Cancion Del Alma)" (R. Hernandez), versão de Jean Pierre, e "Maldito Amor (Ilusion Passajera)" (M. A. Solis), versão de Cleide Dalto. O disco ainda apresentou as canções "Comentários" (Rivelindo, Jean Pierre e Leon), "Graças a Deus" (Anastácia) e "Eu Não Sou Robot" (José Lisboa).

Em 1980, lançou seu último disco pela gravadora Continental no qual interpretou as canções "A Fase" (Elizabeth e Sérgio Bittencourt), "A Outra" (Geraldo Cunha), "O Silêncio (Il Silenzio)" (G. Brezza e N. Rosso), versão de Fred Jorge, "Eu Te Perdi" (Umberto Silva, Motta Vieira e Ozires de Mello), "É De Pedra Seu Coração" (Antoninho Santos), "Amor Na Tarde" (Anastácia), "Tire Seu Galo Da Rinha" (Anastácia), "Minha Sombra é Você" (Mário Zan e Messias Garcia), "Haja o Que Houver" (Fernando César e Nazareno de Brito), "Tudo Ou Nada" (Fernando César), além de duas versões suas para músicas de Armando Manzanero, "Pra Você e Para Mim (Para Ti y Para Mi)" e "Foi Uma Vez (Fue Uma Vez)".

Em 1981, a Continental lançou a coletânea "Disco de Ouro - Cláudia Barroso" reunindo 14 sucessos gravados por ela, "A Vida é Mesmo Assim", "Por Deus Eu Juro", "Vai Não Te Quero Mais", "Deixa Meu Marido Em Paz (Não Perca Seu Tempo)", "Mantendo Aparências", "Nossos Filhos Não Pediram Pra Nascer", "Noturno", "Quem Mandou Você Errar", "Amor Querido", "Vai Chorar Muito Mais", "Como Acabou Não Sei", "Estou Cansada", "Não Quero Mais Ouvir Falar Teu Nome" e "Aliança Devolvida".

No começo da década de 1980, passou alguns anos sem gravar. Retornou aos estúdios em 1986, quando lançou LP pela gravadora 3M interpretando as músicas "O Gavião" (Carlos Santorelli), "Deixa Que Eu Te Ame" (Hyran Garcete e Pepe Ávila), "A Minha Prece De Amor" (Silvio César), "Tira a Aliança Do Dedo" (Meirecler), "Ausência" (Sebastião Silva e Ivan Pires), "Jogo Sujo" (Carlos Colla), "Nós Dois" (Ed Wilson e Carlos Colla), "Salva-me Querido" (José Raul Valença e Manoel Valença), "Batendo Boca" (Cláudia Barroso) e "Meu Ídolo" (Voltaire e Neuber).

Até o final dos anos 80, período de seu maior sucesso, teve gravações incluídas em mais de 20 coletâneas. A partir da década de 90, sua carreira perdeu prestígio e ela passou a aparecer menos.

Em 1995, a Warner lançou o disco "Dose Dupla", contendo alguns de seus sucessos como "A Vida é Assim Mesmo" (Cláudia Barroso), "Quem Mandou Você Errar" (Cláudia Barroso), "Pra Que Chorar" (José Ricardo), "Rotina Do Amor" (Jota Domingos) e "Resposta Da Carta" (Anastácia e Dominguinhos).

Em 2000, gravou um CD ao vivo, pela gravadora CID. O disco visitou vários clássicos da MPB, como "Lama" (Ailce Chaves e Paulo Marques), "Quem Eu Quero Não Me Quer" (Raul Sampaio), "Tortura De Amor" (Waldick Soriano), além de outros como "Fracasso", "Poema", "Quase" e "Devolvi".

Em 2007, apresentou-se na Praça Independência na cidade de Corumbá durante os festejos pelo 229º aniversário de fundação da cidade.

Em 2008, em plena atividade, com a voz impecável, continuou apresentando shows por todo o Brasil, sempre encontrando o prestígio do público.


Por seu talento, a cantora mereceu do maestro Portinho a seguinte crítica:

"Um dia, na década de 60, eu estava em São Paulo com o Mário Duarte, na época, diretor artístico da Rádio Nacional de São Paulo e da Fermata-RGE, e este me convidou para tomarmos um aperitivo numa boate na Alameda Nothumann. Quando chegamos, fomos atendidos, e logo, a moça que estava com o conjunto passou a cantar. Acho que foi uma das coisas mais lindas que presenciei durante a minha carreira musical. Eu fiquei encantado com a Cláudia Barroso. Não só eu, também o Mário. A partir do momento em que ela começou a cantar, não vimos mais nada...
Naquela época a Cláudia não cantava apenas boleros e, naquela noite, ela procurou mostrar toda sua versatilidade, cantando também em inglês, italiano, espanhol e francês. Quando terminou o show, Cláudia chegou até nossa mesa e o Mário me disse:
'Esta é a talentosa Cláudia Barroso. Eu a quero a seu lado maestro. Convido-a para amanhã, ou dentro do mais breve possível, comparecer aos escritórios da Fermata-RGE para assinar um contrato conosco'.
Emocionadíssima, ela aceitou e já no dia seguinte, estava assinando um contrato. Logo em seguida, tratamos de selecionar seu repertório. O que eu posso dizer de Cláudia Barroso? Só posso elogiá-la. Como já disse antes, é uma cantora muito versátil, desembaraçada. Sabe o que quer e exige, e com muita razão. Porque é uma das maiores cantoras, não só do Brasil, é uma das maiores cantoras contemporâneas. Tem uma voz privilegiada, bonita, eu diria que ela não é soprano nem contralto, é um mesclado das duas coisas. Tem um grave cheio, sabe dizer as palavras, tem uma dicção perfeita e canta, com facilidade, qualquer gênero popular. Não há dificuldade em nada para Cláudia Barroso.
Outra coisa que me agrada em Cláudia Barroso é a sua amizade e compreensão com os músicos quando está no estúdio de gravação. Quando está elaborando o trabalho de base, ela procura fazer o melhor ambiente possível. Procura, então, conversar com os músicos, nos intervalos, conta algumas novidades. Ela gosta de trabalhar em equipe. Em sua opinião, os músicos, maestros, técnicos, produtores e divulgadores formam um todo, e que só esse todo pode proporcionar o futuro sucesso. Ela crê e diz francamente:
'Eu amo todos vocês, porque são um todo. Meu disco é um todo. Obrigada!'
Há muitos anos eu acompanho a carreira de Cláudia Barroso, e noto que, a cada disco, ela procura aprimorar a sua interpretação, que já era magistral."

Morte

Cláudia Barroso morreu às 06:00 hs de sexta-feira, 09/10/2015, aos 83 anos, em Fortaleza, CE, onde morava. A artista estava internada há 15 dias com problemas circulatórios e não resistiu. O velório ocorreu no Cemitério Jardim Metropolitano, na cidade de Eusébio, CE. O enterro ocorreu no sábado, 10/10/2015, às 10:00 hs, no mesmo local.


Discografia

  • 2000 - Popularidade (Warner Music)
  • 2000 - A Vida é Assim Mesmo - Ao Vivo (CID)
  • 1997 - Cláudia Barroso (RGE/Fermata)
  • 1996 - Eles e Elas - Cláudia Barroso e Lindomar Castilho (Warner Music)
  • 1995 - Dose Dupla - Cláudia Barroso e Waldick Soriano (Warner Music)
  • 1988 - Se Deus Me Ouvisse (Phonodisc)
  • 1986 - Cláudia Barroso (3M)
  • 1981 - Disco de Ouro - Cláudia Barroso (Continental)
  • 1980 - Cláudia Barroso (Continental)
  • 1979 - Cláudia Barroso (Continental)
  • 1978 - Conselho (Continental)
  • 1977 - Cara e Coragem (Continental)
  • 1976 - Cláudia Barroso (Continental)
  • 1975 - Cláudia Barroso (Continental)
  • 1974 - Cláudia Barroso (Continental)
  • 1974 - Cláudia Barroso (Continental)
  • 1973 - Cláudia Barroso (Continental)
  • 1973 - Cláudia Barroso (Continental)
  • 1972 - Cláudia Barroso (Continental)
  • 1972 - Claudia Barroso (Continental)
  • 1971 - O Amor Me Chama (Premier/RGE)
  • 1971 - Claudia Barroso (Continental)
  • 1967 - Cláudia Barroso (Fermata)
  • 1962 - Fica Comigo Essa Noite / Não, Eu Não Vou Ter Saudade (Odeon)

Indicação: Miguel Sampaio

Fernando Bonini

FERNANDO ANTÔNIO BONINI DA SILVA
(50 anos)
Desenhista e Quadrinista

☼ Niterói, RJ (17/09/1955)
┼ Valinhos, SP (08/10/2005)

(Por Bruno Machado - Edição U-turn - Dezembro de 2011)

Fernando Bonini, de nome completo Fernando Antônio Bonini da Silva, foi um criador de histórias em quadrinhos brasileiro. Fernando Bonini se tornou conhecido por ter sido um dos principais desenhistas de Zé Carioca e Urtigão.

Franco de Rosa entra no estreito quarto de pensão que recebeu seu último hóspede há pouco mais de quatro meses. A cama está desfeita, o lençol amarrotado pela última noite de sono. "Foi-se tranqüilo", pesaria ele seis anos depois, de frente para mim, em uma cafeteria no Centro. Certamente, seu velho amigo desenhista vagara por ali, algumas décadas antes. Recolhe alguns objetos pessoais que, no momento, não se recorda quais são e deixa o pequeno aposento.

Apesar de tanto em comum, Franco de Rosa é sincero: diz não ter grandes saudades do amigo, em parte por conta de sua melancolia. Lembra-se dele, sorridente entre outros cartunistas, nas mesas de bar. Sempre com o copo a mão, para que não bebessem da sua cerveja. Em outros momentos, entregava-se a uma tristeza profunda, esmurrava paredes, amassava desenhos. Mas não era agressivo com os outros. Franco de Rosa, inclusive, confessa que Fernando Bonini chegava a apanhar da mulher. Eles dois, inclusive, chegaram a dividir a mesma mulher: Fernando Bonini se casou, certa vez, com a ex-esposa de Franco e Rosa.

O que sobrou de sua tragicômica existência - bonequinhos de durepoxi e presentes recebidos pelo aniversário de 50 anos, recém-completos - está guardado em uma caixa de sapatos num apartamento na Avenida São Luís. O apartamento do editor e desenhista Franco de Rosa, com quem converso, a poucos metros de sua casa, entre uma e outra xícara de café. É um sábado ensolarado e frio, e poderia muito bem lembrar o dia em que Fernando Bonini foi enterrado, há seis anos, em Valinhos, no interior de São Paulo. A conversa por vezes não flui de maneira elucidativa: mesmo Franco, que conviveu com Fernando Bonini por tantos anos às vezes não parece atravessar o simples esboço desse rosto fluminense estreito, de poucas fotos, o farto bigode, sotaque da baixada, chiados nervosos herdados de Niterói.

Foram amigos e por muitas vezes, colegas de trabalho. Fizeram parcerias e tiveram vidas ligadas por coincidências - das quais Franco se lembra com alegria, mas sem sentimentalismo. Filho de um homem que se alternara e se desdobrara em diversas profissões, como barbeiro e palhaço, Fernando Bonini cresceu vendo os filmes de Jerry Lewis, de quem tiraria muito de sua inspiração para criar histórias. Muitas das situações que viveu também lembrariam muito os esquetes do comediante americano.

Em São Paulo, Franco de Rosa e Fernando Bonini foram vizinhos na infância, mas nunca souberam disso. Embora morassem um em frente ao outro, numa rua da pacata Santana, jamais jogaram bola juntos na rua e estudaram em escolas separadas. Dois completos estranhos, com uma paixão em comum, e que ainda se esbarrariam um punhado de vezes pela vida dos estúdios de quadrinhos.

Fernando Bonini tinha 15 anos quando foi descoberto por Primaggio Mantovi, que chegara ao Brasil com a derrota italiana na Guerra. Primaggio Mantovi era o mentor, Fernando Bonini o assistente de arte. Na extinta Rio Gráfica Editorial (RGE), desenhou tirinhas do "Recruta Zero" e do "Sacarrolha". Nessa época, ele ainda trabalhou com outros importantes nomes como Walmir AmaralGutenberg Monteiro e Evaldo.

Era início da década de 70, e fazia pouco mais de uma década que o desenho havia se instalado profissionalmente no país, graças às agências de publicidade e aos estúdios de Histórias em Quadrinhos, importadas diretamente dos Estados Unidos.  A função dos desenhistas brasileiros, nessa época, reduzia-se a fazer o que Franco chama de decoração: finalizar cada quadrinho, fazer pequenas adaptações para o público brasileiro. A produção nacional ainda era bastante incipiente, o que mudaria na década seguinte com artistas sedentos por mostrar um trabalho de cunho mais autoral e até experimental. Fernando Bonini era um desses artistas.

Foi na revista "Spektro" que Fernando Bonini  mostrou seus primeiros trabalhos autorais. Era final dos anos 70, quando surgiram seus personagens de traços duros, verticais, de queixos sempre muito grandes em histórias de terror e erotismo. A revista durou até 1982 com histórias que versavam sobre anjos, macumbas, demônios e encontros sexuais sobrenaturais.

Como todo desenhista, produzia melhor pela manhã, mas muitas vezes passava também a madrugada rabiscando originais.  Quando terminava uma história, dava-se férias de dois a três dias. Raramente escrevia um roteiro quadro-a-quadro de suas histórias. Simplesmente pegava a folha em branco com um rascunho mental do que iria fazer. Dali saíam os desenhos e a narrativa, sem qualquer organização formal prévia.

Os tempos de "Spektro", contudo, não duraram muito. Na verdade, Fernando Bonini não parava quieto em nenhum emprego. "Ele não queria ser funcionário, queria liberdade!", brinca Franco. Mal sabia ele que, anos depois, essa liberdade encontraria seu paroxismo nas ruas de São Paulo.

Com o fim de Riograf e da Vecchi, um novo pólo do desenho se instalou no país, no começo da nova década. Curitiba é a capital dos novos sonhos dos artistas de quadrinhos do país: a Grafipar, que anteriormente apenas publicava livros decidiu entrar no ramo. Para tanto, decidiu convocar um verdadeiro time de talentos que se estabeleceu nos limites da capital paranaense. Morando contiguamente, formaram o que se chamou na época de Vila dos Desenhistas. Eram Gustavo Machado - com quem Fernando Bonini dividia a moradia -, o próprio Franco de Rosa, Itamar Gonçalves, Watson Portela e Claudio Seto, este último, conhecido como o pioneiro do mangá no Brasil.

Ao que parece, a década de 80, a década perdida, parece ter sido a mais memorável de Fernando Bonini. É quando seu talento parece florescer, quando surgem seus melhores trabalhos e histórias. Um ser humano e um artista que atinge sua maturidade e se prepara para o declínio, pessoal e profissional.

Franco de Rosa se lembra com certa saudade dessa época, e numa frase solta, como se ligasse as pontas do passado e do presente, reitera: "Hoje nossos filhos são amigos. O filho dele vive por aí, é tatuador".

É nessa época que a faceta humorística de Fernando Bonini apareceu. Sua própria vida se revestiu de um tom de paródia rocambolesca, que se refletiu nos seus trabalhos posteriores, marcados pelo duplo-sentido, pelo quadrinho que mescla o erótico com o engraçado, com a situação absurda, com o humor de Lewis e seus filmes preto e branco.

Empilham-se as histórias cômicas deste período, e é dele que Franco de Rosa tem a imagem que se cristalizou na sua memória: o Fernando Bonini falante, rodeado de desenhistas, copo em punho para que os outros não tomassem da sua cerveja; a imagem de repente toma outra cor, e o artista torna-se introspectivo, com uma forte tendência para a contemplação melancólica da vida.

A cabeça de Fernando Bonini doía em mais de um lugar quando acordou na enfermaria do clube. Mal passara a dor e o sangue parara de lhe descer testa abaixo, quando deram com ele deitado na maca. Estendia olhares sedutores à enfermeira, acanhada ante o carinho que ganhava no pulso. Calculara mal o salto na piscina e dera com a cabeça no azulejo.

Fora algumas noites depois que chegou bêbado em casa na companhia de duas mulheres. Os vizinhos se constrangeram com a algazarra noturna. O som de algo que se despedaça na noite assombrada da Curitiba oitentista: Fernando Bonini acorda com a prancheta quebrada e um prejuízo em dinheiro. Levar mulheres pra casa? Nunca mais. Ou até a semana seguinte. Até recuperar o dinheiro que duas prostitutas roubaram.

Dorme em qualquer lugar.  Às vezes esquece onde mora, urina na rua. Não tem dinheiro para subir num ônibus, muito menos para apanhar o táxi. A cidade dorme deserta a noite fria, enquanto Fernando Bonini atravessa a rua. Não sabe se dorme, se sonha, se delira, mas dois olhos grandes o chamaram do outro lado. Um estranho parece requerer sua ajuda. A ficarem a dois palmos de distância, a revelação.

No dia seguinte, como explicar aos amigos? Perdeu o dinheiro, as chaves de casa. Limparam-lhe a carteira. Tinha algo nas mãos de certo, mas não conseguiria lembrar do que se tratava. A probabilidade de ter sido assaltado com um revólver, uma faca, uma colher ou um dedo é a mesma.

Risadas, risadas e mais risadas de um jovem grupo de desenhistas. Os anos 80 ardem-lhe feito febre, o talento doado ao desenho, ao rabisco, a música alta, a cerveja. A menina de muletas lhe chama a atenção. Ela está esquecida num canto da boite barulhenta e melancólica. A cabeça nas nuvens, a perna bamba. A perna dele, a perna dela. A noite inteira foi em vão, o esforço hercúleo. Ouviu apenas um monótono e sequenciado não. As pernas parecem feitas de borracha mole, prontas para se desafazerem-se no chão.  Foi-se o dinheiro das bebidas, os xavecos vencidos, repetidos, a conversa sem sentido, os sorrisos, as muletas. Tentaria mais uma vez, mas ela parece querer ir embora. Que ideia, sair à noite de muletas.  Não conseguira um beijo ou mesmo um abraço. Como ela poderia abraçar-lhe se mal consegue parar no chão sem precisar se apoiar em algo ou alguém? Na hora da saída, Fernando Bonini não resiste, e numa cena de Jerry Lewis, atrapalhado, gag de cinema, Moe Larry Curly,  risadas de auditório, esbarra nas muletas. A garota vai ao chão.

Fernando Benini foi assaltado incontáveis vezes e ser assaltado não era novidade. Rabiscos, nanquim, papéis pelo chão. Contando trocados. Todos os bares de Curitiba devem conhecer-lhe o nome. Recebe e mal vê o dinheiro. Centavo por centavo que se esvai em bebidas.

Não tardou para que a crise econômica que assolou o mundo chegasse à fria capital curitibana. Foram apenas quatro anos, mas dos mais intensos. Com o fim da Grafipar, chega ao fim também a Vila dos Desenhistas.

De volta a São Paulo, Fernando Bonini e Franco de Rosa parecem sentir no ar que os tempos são outros.  Mas a sorte lhes acena. Pois há empregos. Há desenhos, quadrinhos e revistas surgindo por toda parte. Há de se respirar aliviado, por que não?

É 1987, os títulos estrangeiros, sobretudo da Disney, convivem relativamente bem com a produção nacional de "Sérgio Mallandro", "Os Trapalhões" e "A Turma da Mônica". Embora os tempos sejam mais serenos, seu medo se realiza: Fernando Bonini se torna um funcionário. Pelos próximos anos ele permanecerá na Editora Abril, onde se tornará célebre por ser um principal desenhista dos quadrinhos do "Zé Carioca". Dessa época também são produções que nunca chegaram ao público, outras foram incineradas.

Nesse momento, a memória de Franco de Rosa borra-se de outros momentos, mas ainda é possível recuperar a memória de Fernando Bonini. Em termos. Seria a bebida, a rotina pálida, o peso da vida - uma soma dos três, quem sabe, que fez o desenhista abandonar uma vida que começava a se estruturar e trocá-la pela liberdade... das ruas? Se sua produção nessa época jamais se igualaria, e se ele parecia um artista bem-sucedido, por que largou tudo? Tais perguntas, provavelmente, jamais terão uma resposta satisfatória. Os murros nas paredes, o nervosismo, os episódios de depressão.

O que importa é que no final de 1998, Fernando Bonini passou a existir nas ruas de São Paulo. Chegou a morar dentro de um Fiat sem rodas, que certa vez foi lançado barranco abaixo. Desertas, à noite, as ruas de São Paulo têm regras e donos.

Exausto de tanto andar, novamente não sabe se dorme, se sonha, se delira. Desta vez, não vai até os grandes olhos que divisara do outro lado da rua: foge deles, e há algumas horas. Não saberia calcular o quanto já andara, mas as pernas doem e tudo que quer é um lugar quente para dormir. Mas a perseguição persiste por mais algumas horas. Seu inimigo parece onipresente nas sombras dos edifícios.

Se olhasse para o seu futuro, naquela noite, como em qualquer outra, não saberia dizer. Mas naquela noite tudo parecia pior. É como se andasse nos limites dos domínios da morte. A cidade, como um tabuleiro de xadrez, minunciosamente dividida entre seres invisíveis, seres que como ratos deixavam suas alcovas secretas, subterrâneas para reinar entre a sarjeta e o cheiro de mijo.

Na outra noite, acordara com os pés roxos e doídos. Doidos, haviam roubado-lhe os bens mais preciosos: um par de rotas meias. Houvera o cuidado de lhe devolver os não menos puídos sapatos aos pés, mas ainda era pouco contra o frio. Calor, ainda havia um pouco nos corações mendigos, mais do que num par de pés sujos.

Descalço, naquela noite era a presa. Ofegava entre becos, entre luzes amarelas. Nove de Julho, República, Maria Paula, São Luís - talvez aqui mesmo, onde ocorre esse diálogo, entre colunas de fumaça de cigarros e café - entre uma vitrine e outra, ele parou exausto. De repente os olhos, como dois faróis na noite se apagaram. Deixou-se apagar, não obstante alerta. O coração saindo pela boca. Mesmo os fortes caem no sono e, muitas vezes, falham.

Acorda do que parece ser um pesadelo para mergulhar em outro. Os faróis agora estão em seus olhos. Quentes e grandes, não apenas menos assustadores que o sorriso desdentado que os emoldura. A enfermeira ri, todos riem. Calculou mal o salto. Sangue. Uma mão de unhas imundas, um cano. A visão parece falha. A cabeça dói. Levanta e caminha, persiste na fuga, e mesmo que morto, vai sobreviver. E sobrevive.

Foi em 2000 que uma voz fraca pediu ajuda do outro lado do telefone. Franco de Rosa retirou o amigo de longa data da rua e deu-lhe novo emprego. Dessa época surgem os trabalhos para a editora Opera Graphica. Franco de Rosa me confessa que são trabalhos bons, e não raro, volumosos. Histórias longas, histórias de caráter quase confessional, um expurgo do sofrimento que aprendeu e arrancou do asfalto. Entre outras histórias mais comerciais, Fernando Bonini passa a desenhar quadrinhos do "Rei Leão" e do "Pica-Pau" para estúdios independentes. Os quadrinhos eróticos, verdadeira obsessão de Franco de Rosa, e um dos talentos de Fernando Bonini perde aceitação de mercado. O jeito é desenhar e escrever para crianças.

Mas novamente Fernando Bonini nos impõe um enigma, pois não tarda a voltar para a rua. Outra ligação, agora de um vizinho, informa Franco de Rosa que ele deixou o estúdio onde vivia provisoriamente. Os seus esforços em manter a cabeça do amigo livre dos fantasmas do asfalto falharam.

Mais um ano na rua, outro hiato na amizade entre Fernando Bonini e Franco de Rosa. Pouco se sabe desse período. Sabe-se, no entanto, que Fernando Bonini chegou a buscar ajuda espiritual, e numa de suas aventuras, embarcou numa viagem com uma seita messiânica até uma região qualquer. Meio do mato. Batida policial, pastores presos. Tráfico de drogas. Perdido no mundo.

Doente, desnutrido, cego de um olho - resultado de uma pancada na cabeça -, passou a vagar por Jacareí, também no interior de São Paulo, onde eventualmente conseguia comida e tomava banho em postos de gasolina. Foi novamente por telefone que pediu ajuda ao amigo pela última vez. Estava internado num hospital, e precisava de alguém que o tirasse de lá.

Franco de Rosa mais uma vez fez pelo amigo, instalando-o numa pensão em Valinhos, onde não permaneceu muito tempo. Não muito antes de morrer, fez seus últimos trabalhos, redesenhos, uma história de cangaceiros no estilo Disney, que importava? Parecia trabalhar quase que automaticamente no seu pequeno quartinho. Vida modesta, sem álcool, abstinência. Desgostoso com o rumo que tudo tomara? Talvez. Talvez pensasse no pai, palhaço e barbeiro. Não fosse desenhista, seria barbeiro, dizia. E de alguma forma, foi palhaço, imitando Jerry Lewis, os Três Patetas, fã de Chaves,  avesso ao rádio. A música o punha triste.

Das histórias que fez, a que Franco de Rosa guarda com mais entusiasmo é a do "Zé Mandioca". Paródia do quadrinho que tornou Fernando Bonini célebre - basta procurá-lo no Google, é assim que a História parece querê-lo, como o principal desenhista do "Zé Carioca" -, são histórias de um papagaio anão que se mete em problemas devido ao pênis muito grande.  Ao que parece, Fernando Bonini só desenhou duas das três histórias que existem. Da última, só há um roteiro.

Da última vez que Franco de Rosa viu Fernando Bonini, foi na noite anterior à morte. Ele parecia bem e há poucos dias havia ganhado sua festa de aniversário de 50 anos. Ganhou presentes numa festinha triste. Sua debilidade ainda era visível. As noites frias nas ruas de Jacareí, sem comida, diriam. Pobre coitado.

No dia da morte, saiu para tomar um café. Voltou e deitou-se na cama. Parece ter falecido no sono. O coração não resistiu. O coração que viveu uma infância quase nômade, os loucos anos 80 curitibanos e o inferno das ruas paulistanas. Fernando Bonini dormia em paz. Com o dinheiro que conseguiu, dos últimos trabalhos, chegou inclusive a pagar o próprio funeral, do qual participaram poucas pessoas.

Era dia ensolarado e Franco de Rosa fechou a porta do pequeno quartinho pela última vez. Levava consigo alguns objetos, que depositou no caixão do amigo. Lembra-se com carinho de quando, em Curitiba, o amigo chamou um policial loiro de polaca, e não fossem apartados, teria sido preso. Mas os murros nas paredes, a angústia e a dor que Fernando Bonini experimentou talvez indicasse aos mais indiferentes, aqueles que só dele recordavam sorridente, o copo em mãos, o bigode farto contra um rosto estreito, que era estava preso em vida, e nas ruas buscava a liberdade da solidão. Em vão.

Vai ver a morte o seduziu com suas promessas de liberdade e ele assim resolveu segui-la. Com sorriso na cara e os trejeitos de Jerry Lewis.

Fernando Bonini faleceu num sábado, dia 08/10/2005, vítima de um ataque cardíaco, aos 50 anos de idade.. Foi enterrado em Valinhos, no interior do Estado de São Paulo, localidade que residia nos últimos anos.


Desenho à lápis de Fernando Bonini
Obras
  • Desenhou histórias para a Editora Vecchi na revista "Sobrenatural" ("A Namorada do Julinho", "Roupas do Outro Mundo" e "O Melhor Pastel da Cidade").
  • Desenhou histórias eróticas para a Grafipar.
  • Para a Abril trabalhou nas publicações "Gugu", "Os Trapalhões", "Urtigão", "Recruta Zero" e "Sítio do Pica-Pau Amarelo".
  • Em 2002, "Os Exterminadores Sem Futuro", na Opera Graphica.
  • "Álbum Luciano", escrito por Primaggio Mantovi e publicado pela Via Lettera.


Fonte: Revista Babel

Tatiana Ivanovici

TATIANA IVANOVICI
(36 anos)
Jornalista e Articuladora Cultural

☼ Mogi das Cruzes, SP (1979)
┼ São Paulo, SP (10/06/2015)

Tatiana Ivanovici era uma jovem jornalista, nascida na periferia de São Paulo. Empreendedora, idealizou a Rede DoLadoDeCá e o site Do Lado De Cá que reúne todas as informações culturais da quebrada, sendo a primeira plataforma de comunicação das classes populares para as classes populares.

Tatiana Ivanovici era ávida conhecedora dos becos e vielas. Pós graduada na rua, virou jornalista e descreveu, como pouquíssimos, a periferia. Sem glamorizarão, sem frescura, meteu muito o pé na lama pra contar as histórias da favela e com o mesmo boot fez muita reunião com engravatado pra traduzir a língua das quebradas. Ela era conhecida por sua atuação focada na cultura jovem, urbana, música e todo o cenário efervescente das periferias do Brasil. Foi figura importante para o rap nacional, para o jornalismo e para o mercado de consumo.

Nascida em Mogi das Cruzes, SP, em sua própria biografia, Tati, como era chamada pelos amigos e conhecidos, se descrevia como alguém que escolheu viver não apenas para si, mas para as pessoas que viviam ao seu redor. E assim o fez. "Eu já vim do não, não tenho nada a perder", disse em entrevista ao site da Revista TPM em 2013.

Tatiana Ivanovici partiu assustadoramente cedo e de forma abrupta, mas deixou o legado de um dos primeiros veículos de comunicação do país voltados exclusivamente à periferia. O site DoLadodeCá, em alusão à música do Racionais MC's, mostrou, durante os anos em atividade, desde 2010, que o mundo é realmente diferente da ponte pra cá.


"No portal são divulgados talentos e iniciativas culturais que são frutos do celeiro que a periferia se tornou, além de assuntos que dizem respeito ao cotidiano e ao universo do entretenimento popular", dizia Tati, na descrição contida no site.

Tatiana Ivanovici é considerada pelo mercado de comunicação como insider das comunidades, mas com a visão clara sobre as necessidades das marcas. Na própria história, mesmo breve, mostrou, desde cedo, garra e determinação, o que chamou a atenção do jornalista Gilberto Dimenstein e passou pelo Projeto Aprendiz, onde ganhou a alcunha de "Aprendiz-Problema", por querer fazer várias coisas ao mesmo tempo. Trabalhou também em diversos veículos de comunicação como MTV, onde dirigiu o "Yo! MTV", voltado ao hip-hop, TV Futura e Folha de S.Paulo.

"Você não escolhe onde nasce, mas escolhe o que vai fazer da sua vida!"
(Tatiana Ivanovici)

"Jornalista de formação e articuladora cultural, trabalhei em diversos veículos de comunicação como TVs, jornais e revistas, onde minha atuação sempre foi focada em cultura jovem, urbana, música e todo cenário efervescente das periferias do Brasil. Agora desenvolvo o DoLadoDeCá, um portal onde são divulgados os talentos e iniciativas culturais que são frutos do celeiro que a periferia se tornou, além de assuntos que dizem respeito ao cotidiano e ao universo do entretenimento popular."
(Tatiana Ivanovici)

Morte

Tatiana Ivanovici faleceu na quarta-feira, 10/06/2015, aos 36 anos, vítima de um câncer silencioso e rápido no pâncreas com o qual já lutava. Muitos artistas e colegas como Criolo e Emicida, por exemplo, utilizaram as redes sociais para prestar suas condolências à jornalista.